Coluna Vitor Vogas
A consolidação da pré-candidatura de Ricardo a governador, em 10 pontos
O grande fato que temos, a esta altura do processo eleitoral, é o estabelecimento do vice-governador como o favorito do governo Casagrande para ser o candidato de seu grupo ao Palácio Anchieta. Essa é a avaliação da coluna e é o que aqui tratamos de explicar

Ricardo Ferraço é vice-governador do ES. Foto: Mateus Fonseca/Governo-ES
A praticamente um ano do período oficial de campanha no ano que vem, muita água já passou por baixo da ponte eleitoral no Espírito Santo. Incrivelmente antecipada, a “pré-campanha”, na verdade, começou no início deste ano, quando o vice-governador Ricardo Ferraço (MDB), em entrevista exclusiva à coluna, declarou-se “pronto e preparado” para ser candidato a governador. Passados oito meses desde então, e a oito meses do momento-chave para a definição de candidaturas (abril de 2026), o grande fato que temos a esta altura do processo é justamente a consolidação da pré-candidatura de Ricardo. Essa é a avaliação da coluna e é o que aqui trataremos de explicar.
> Quer receber as principais notícias do ES360 no WhatsApp? Clique aqui e entre na nossa comunidade!
Logo que Ricardo se lançou, despertou fundadas desconfianças quanto à sua competitividade e à sua capacidade de se viabilizar eleitoralmente. O “será mesmo?” foi pontuado inclusive aqui. Afinal, é o velho Ricardo Ferraço, o mesmo que está aí na política desde os anos 1980. Após ter sido traumaticamente preterido em 2010 e “sangrado pelo fogo amigo” em episódio indelével de sua história, ter tomado um tombo nas urnas em 2018 ao buscar a reeleição no Senado e ter passado a primeira metade do atual governo meio “escondido” na Secretaria de Desenvolvimento, teria Ricardo condições de se firmar no páreo, ou essa pré-candidatura já nascia fadada a se mostrar um grande flop?
Um cara não tão simpático, não tão presente nas redes, não exatamente conhecido pela gentileza no trato com as pessoas, poderia brigar de igual para igual com concorrentes mais jovens e de reconhecido carisma, a ponto de se estabelecer como o candidato de Casagrande?
A esta altura, a resposta é sim. Tanto no entorno de Casagrande como entre adversários, não cabe mais a menor dúvida de que Ricardo é mesmo o pré-candidato que goza da preferência do governador. Dissipando suspeitas, ele logrou se firmar no páreo. E não há mais que se questionar se tem ou não condições de se manter na disputa. Seria brigar com fatos e números. Ricardo é, hoje, de fato, o favorito do governador e do governo. Se depender só de Casagrande, será ele o representante do Palácio Anchieta e do seu grupo na eleição para o Governo do Estado. Ponto.
Ricardo consolidou esse favoritismo, atenção, não para vencer a eleição (não é isso que estamos dizendo), mas para ser o candidato da situação.
Além dele, peneirada uma lista que começou bem extensa, quem é que resta como alternativa ao vice-governador dentro do mesmo grupo, liderado por Casagrande? Riscados Euclério (MDB) e Vidigal (PDT), resta o prefeito de Vila Velha, Arnaldinho Borgo (Podemos), que, em paralelo a Ricardo, mantém a pré-candidatura e segue firme na batalha para se viabilizar. Concorrendo internamente com o vice-governador, Arnaldinho, aliás corredor de rua, também está vivo nessa corrida, mas diríamos que, a esta altura da prova, ficou alguns passos para trás.
Abaixo, apresentamos os dez pontos que, em nosso entendimento, justificam a consolidação de Ricardo para ser o candidato governista à sucessão de Casagrande.
1. A fila sucessória
O primeiro fator, fundamental, diz respeito à conjuntura ditada pela legislação eleitoral. Casagrande quer ser candidato a senador. Seu partido deseja que ele o seja. Todos os seus aliados querem o mesmo. Para isso, porém, ele vai precisar renunciar ao cargo de governador em abril. Quem assume, automaticamente, como o primeiro na fila sucessória, é o próprio Ricardo Ferraço. Nesse caso, uma vez investido do cargo, Ricardo estará em pleno exercício do primeiro mandato de governador; assim, em sendo candidato, estará tecnicamente concorrendo à reeleição.
Essa solução interessa ao atual governador e a seu grupo por dois motivos. Além de permitir a Casagrande renunciar tranquilamente para ir disputar o Senado, faz com que a fila sucessória ande mais rapidamente. Se Ricardo vencer em outubro, emendará um segundo mandato de governador e, já tendo sido reeleito, estará impedido de concorrer ao mesmo cargo na eleição seguinte; isso dá margem para que, em quatro anos, no pleito de 2030, novo integrante desse mesmo grupo possa ascender ao poder, acelerando-se a alternância.
> “Venda da democracia”: Justiça precisa moralizar a Câmara da Serra
Já o contrário poderá representar um curto-circuito nos planos de Casagrande. Ele próprio já reiterou que só uma hipótese pode levá-lo a decidir ficar no cargo até o fim e concluir o seu governo (o que equivale a abrir mão de ir para o Senado): se ele sentir que sua permanência será imprescindível para manter a unidade de sua grande coalizão durante a disputa pela sua sucessão. Isto é, para evitar um colapso. Isso até pode ocorrer, mas, se realmente ocorrer, é porque algo terá dado muito errado. É tudo o que o governador não quer.
2. “Candidato natural”
O próprio governador tem declarado de maneira cada vez mais aberta a preferência dele por Ricardo. Começou de maneira cautelosa e até um pouco “envergonhada”. Em entrevistas no fim do ano passado, ao lançar na praça sua primeira lista de possíveis candidatos ao governo, abriu-a com Ricardo Ferraço, frisando que, pelo motivo acima, ele seria um “candidato natural”. Mas teve o cuidado de acrescentar que Ricardo precisava se viabilizar, e mais: citando pelo nome Arnaldinho, Euclério e Vidigal, disse que outros aliados importantes não podiam “ser descartados”.
Pouco depois, Ricardo lançou-se. E, com o vice já lançado, Casagrande tratou de ampliar sua lista: aos quatro nomes já mencionados, acrescentou os dos deputados federais Gilson Daniel (Podemos) e Da Vitória (PP).
Mais recentemente, a lista de Casagrande encurtou-se à metade. Segundo o governador, os únicos aliados que seguem conversando com ele sobre projeto de candidatura são Ricardo, Arnaldinho e Da Vitória. Mas ele mesmo “perdeu a timidez” e passou a declarar sem rodeios sua preferência pelo “Plano Ricardo”.
No mês passado, após reunião a sós com Ricardo e Arnaldinho para alinhamento de rota, o governador disse ter dito ao prefeito de Vila Velha que o vice-governador é seu projeto prioritário. Disse, ainda, que Arnaldinho sabe disso.
Casagrande também já disse discordar da tese pública defendida por Arnaldinho, em artigo, segundo a qual o eleitor capixaba sinaliza querer um próximo governador mais jovem, representante de uma nova geração de políticos. Em entrevista a este espaço, o governador opinou que esse não será um fator determinante na escolha do eleitorado.
3. Previsibilidade de Casagrande
Quem espera surpresas nas decisões e movimentos políticos de Casagrande, morre de tédio. Em seus muitos anos como governador, ele sedimentou a marca da previsibilidade.
Sem exceção, de 2019 para cá, sempre que se viu numa situação em que precisava escolher alguém (um desembargador do TJES, o chefe do MPES etc.) ou em que poderia apoiar alguém (o presidente da Assembleia, um conselheiro do TCES), ele fez exatamente o que se esperava dele, ou o que ele mesmo já indicara como a direção que tomaria. O caminho é sempre o mais lógico e previsível. Ele também não é de dizer uma coisa e fazer outra, só para despistar. Não é seu estilo.
> Tensão na esquerda: subsecretário de Direitos Humanos cai atirando em secretária
4. Atração de aliados pesados
Tornemos àquela segunda lista de potenciais candidatos citados pelo próprio Casagrande. Dos cinco membros que não são Ricardo, três, nos últimos meses, já fecharam com ele, e um quarto dá sinais de que caminha para isso. A exceção é Arnaldinho.
Vidigal já declarou apoio a Ricardo. Euclério também o fez, enfaticamente. Gilson Daniel, idem. Da Vitória não chegou a declarar que Ricardo é seu candidato (ainda nutre esperanças de concorrer), mas já afirmou que tem o compromisso de construir o projeto majoritário (eleições para o Governo do Estado e o Senado) com Casagrande e o vice-governador.
A essa lista, juntam-se outros políticos influentes do Espírito Santo que também já aderiram à pré-candidatura de Ricardo, como o presidente da Assembleia, Marcelo Santos (novo presidente estadual do União Brasil).
Isso além de alguns partidos pesados que já embarcaram no projeto, como o PSB e o Podemos. Juntos, os dois somam mais de 30 prefeitos no Espírito Santo. A poderosa federação União Progressista (União Brasil + Progressistas), pilotada por Da Vitória e Marcelo Santos, também está embicada para Ricardo.
5. Trabalho de projeção massiva
Desde que nos deu aquela entrevista em janeiro, Ricardo tem imergido em um intenso trabalho de aumento da projeção política, usando tudo o que a máquina pública estadual pode lhe proporcionar nesse sentido. Logo no mês seguinte, desligou-se da Secretaria de Desenvolvimento, a fim de ficar liberado para se viabilizar – leia-se fazer política. Inaugurou, então, sua maratona pré-eleitoral. Além de percorrer o Espírito Santo de cabo a rabo – não raro, com entregas oficiais –, Ricardo tem sido escalado para capitalizar agendas positivas do Governo do Estado.
Em julho, passou a ser oficialmente tratado como o “coordenador” do Programa Estado Presente, cujos números na redução da violência são expressivos. Com o tarifaço de Donald Trump, foi designado para coordenar o comitê encarregado de formular medidas econômicas de enfrentamento às consequências da medida.
6. A força do governo
Pesquisa após pesquisa, todos os números comprovam: o atual governo está muito bem avaliado. A última da Paraná Pesquisas, divulgada na semana passada, traz a administração de Casagrande aprovada por 80% dos entrevistados.
O governador tem conseguido o feito – é preciso frisar isto, pela atipicidade do fato – de atingir o seu melhor momento político, em termos de aprovação e popularidade, no penúltimo dos seus 12 anos de mandatos somados. Se confirmada a candidatura de Ricardo, será esse o seu principal cabo eleitoral.
> Vidigal procurou Paulo Hartung: “Precisamos de dois bons candidatos ao Senado”
E é preciso lembrar o ponto 1: durante a campanha e já nos meses anteriores, Ricardo estará no cargo de governador. A aposta do Palácio Anchieta é na transferência direta para ele do prestígio de Casagrande e da boa avaliação de um governo do qual ele é sócio e pelo qual estará a responder.
Da redução expressiva de homicídios ao fim do pedágio da Terceira Ponte, da reativação do aquaviário ao Fundo Cidades, do bom ranqueamento no Ideb à nota A nas finanças, da expansão do ensino integral à aguardada inauguração do Cais das Artes… O governo, representado por Ricardo, terá o que apresentar na campanha.
7. Apoio empresarial
Ricardo é, disparadamente, o preferido do empresariado capixaba. É o candidato, diria Elio Gaspari, do andar de cima. Tem trânsito com o setor produtivo incomparavelmente melhor que seus dois principais concorrentes, Arnaldinho e Lorenzo Pazolini (Republicanos).
O ciclo de 24 anos de revezamento de Casagrande e Paulo Hartung acabará em 2026? Sim. A opinião predominante é a de que foi um ciclo virtuoso para o Espírito Santo, principalmente para quem depende de uma boa ambiência de negócios e de estabilidade institucional para prosperar em seu ramo econômico. Em parte do empresariado capixaba, a expectativa é que Ricardo no poder possa significar uma sobrevida para esse ciclo, uma extensão de mais quatro anos, para que em 2030, aí sim, seja consumada a virada definitiva. Ricardo, nesse sentido, poderia fazer um governo de “transição de ciclos”.
Além disso, poucas coisas são mais apreciadas por grandes empresários do que previsibilidade. E é isso que enxergam em Ricardo.
8. Controle do MDB
Se as discussões nacionais do MDB com o Republicanos evoluírem para uma federação, este ponto aqui terá de ser apagado e revisto. Afinal, trata-se simplesmente do partido de Lorenzo Pazolini, adversário do Palácio Anchieta e líder das sondagens da Paraná Pesquisas. Nesse caso, Ricardo terá de lutar, junto às cúpulas nacionais, pela presidência dessa federação no Espírito Santo.
Mas o fato é que, hoje, Ricardo é o presidente estadual do MDB, bancado pela direção nacional, sem nenhum risco de ser apeado do cargo ou de não ter a legenda para se candidatar.
Arnaldinho não pode dizer nada semelhante. Desde que saiu do Podemos, em março, está sem partido. E busca, em corrida contra o tempo, uma legenda que tope acomodar sua candidatura. No momento, as opções para ele são siglas de pequeno porte, como o Novo e o PRD.
> Uma regra fundamental na eleição para o Senado que pode mudar tudo
9. Competitividade
Por mais que qualquer levantamento eleitoral a esta altura seja muito precoce e diga pouco com relação à chegada, os primeiros números servem de parâmetro quanto à posição na largada. Por exemplo, um índice de intenções de voto medíocre, a um ano da campanha, poderia jogar água no chopp de qualquer um, mesmo com todos os fatores acima concorrendo a seu favor.
Está longe de ser o caso de Ricardo. Na já citada pesquisa da Paraná, divulgada na semana passada, o vice-governador obteve 22,5% na estimulada do 1º turno, ficando em segundo lugar, atrás de Pazolini (28,1%). No 2º turno, Ricardo registrou 38,7%, contra 44,8% do prefeito de Vitória. Em ambos os casos, há quase um empate técnico, no limite da margem de erro.
Isso, vale dizer, num momento em que Ricardo não tem tinta na caneta, não tem a “pena mágica” de governador (sim, é uma alusão a “Dumbo”: aquela pena que faz até elefante voar).
10. A dependência política de Ricardo
Por fim, um fator que não aparece e que, mesmo reservadamente, poucos ousam dizer em voz alta: a candidatura de Ricardo convém mais a Casagrande e sua entourage porque ele depende, politicamente, da articulação feita por eles em seu nome. É uma maneira de mantê-lo atrelado.
Todo o peso e o uso da máquina pública estadual. Toda a engenharia política colocada a seu serviço. A robusta coalizão de forças partidárias que ele está herdando. A própria chegada dele ao comando estadual do MDB, em 2023… Nada disso é obra do acaso, nem mérito pessoal de Ricardo. Está sendo colocado a seu dispor, para que ele consiga se eleger.
Historicamente, Ricardo nunca foi um expert em construir partidos, coligações, articulações políticas. Herdeiro de Theodorico Ferraço, ele na realidade nunca precisou se preocupar demais com isso. Havia quem cuidasse dessa parte por ele. E, agora, também há.
Se realmente for candidato e se tornar o sucessor de Casagrande, Ricardo terá para com ele uma imensurável dívida política.
Claro que isso interessa ao credor.
LEIA TAMBÉM
> MPES decide não propor acordo a vereadores da Serra suspeitos de corrupção
> A mulher que comandará a nova agência estadual de investimentos
> Quem pediu o auxílio-alimentação na Câmara de Vitória. E quem não pediu
> A volta de Majeski: qual cargo ele disputará e em qual partido deve entrar
> Rigoni joga a toalha e renuncia à presidência estadual do União Brasil
