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Coluna Vitor Vogas

Análise – Bolsonarismo e lulismo: os maiores derrotados desta eleição no ES

A aposta na polarização, a expressão de radicalismos e a tentativa de nacionalizar a disputa foram estratégias que se provaram completamente furadas nestas eleições municipais. No domingo, PT e PL tendem a obter resultados muito ruins em território capixaba. Sob estratégia suicida de Magno Malta, PL corre o sério risco de protagonizar, no ES, um fiasco em nível nacional

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Jair Bolsonaro e Lula

Jair Bolsonaro e Lula

O deputado Eduardo Bolsonaro (PL), filho 03 do Jair, veio a Vila Velha no fim de junho para impulsionar o lançamento do Coronel Ramalho (PL) a prefeito de Vila Velha. Após chamar o pai de “imbroxável e incomível”, gravou um vídeo ao lado do vereador Igor Elson, candidato do PL a prefeito da Serra, afirmando: “A Serra não vota na esquerda!”

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Antes de tudo, o deputado carioca por São Paulo demonstrou profundo desconhecimento sobre o município do qual resolveu falar. Nas últimas sete eleições municipais, desde 1996, os serranos elegeram prefeitos filiados a partidos de esquerda: Vidigal quatro vezes (sempre pelo PDT) e Audifax três vezes (PDT, PSB e Rede). E mais: tirando Fundão, a Serra foi a cidade da Grande Vitória onde Lula, adversário de Bolsonaro, foi mais votado em 2022.

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A poucos dias do 1º turno, o vereador Igor Elson não tem, realisticamente, chance alguma de chegar ao 2º turno. Em nenhuma pesquisa eleitoral publicada por qualquer instituto, chegou a 10% das intenções de voto. Nenhum dos três candidatos que podem passar ao 2º turno (Audifax, Weverson e Muribeca) fizeram uma campanha pautada na dicotomia entre direita e esquerda.

Mas esta reflexão não é sobre a Serra, nem sobre Igor Elson, muito menos sobre Eduardo Bolsonaro. Abrimos o texto com esse exemplo porque ilustra perfeitamente duas constatações: 1) a estratégia totalmente sem sentido usada por muitos agentes políticos nestas eleições municipais, baseada na batalha ideológica entre direita e esquerda que dominou a política nacional nos últimos anos; 2) o fracasso retumbante dessa estratégia nas eleições municipais no Espírito Santo. Dito do modo mais direto possível: quem apostou nisso se deu mal.

Ao menos neste estado, a história das eleições 2024 não será contada pelas lentes da polarização ideológica entre a extrema-direita bolsonarista e a esquerda lulopetista, tampouco pelas lentes da radicalização ideológica, do “combate à esquerda”, a determinado partido, a esse ou àquele campo político. Isso (felizmente) ficou em um plano menor.

Definitivamente, a disputa para prefeituras municipais não foi nacionalizada, dando lugar ao debate, muito mais urgente, necessário e produtivo, sobre os temas locais, que dizem respeito de fato ao dia a dia do “cidadão que vive na cidade”, ou da “cidade onde vive o cidadão”.

Em determinados municípios, com horário eleitoral gratuito, inserções do presidente Lula pedindo votos para o candidato do PT se alternaram com as do ex-presidente Bolsonaro pedindo votos para o do PL: Vila Velha, Serra, Cariacica, Cachoeiro de Itapemirim… Em nenhuma dessas grandes cidades, os candidatos desses dois partidos chegarão perto da vitória – não obstante os “apelos” insistentes dos respectivos “gurus” das duas agremiações políticas.

Pedidos de voto de Fernando Haddad para candidatos petistas… Dizer “faz o L” ou “sou do time do Lula”, como Roberto Carlos na Serra, Babá em Vila Velha e Célia Tavares em Cariacica… O Coronel Ramalho (PL), em Vila Velha, chegou a exibir um pedido de votos do deputado por São Paulo e pastor Marco Feliciano (PL)…

O PL trouxe Michelle Bolsonaro para atividades de campanha em Colatina, Linhares, Vila Velha, e até Nikolas Ferreira, deputado mineiro, para fazer campanha na Serra… Que influência isso terá, ou teria, sobre a definição de voto de qualquer eleitor, salvo aqueles eventualmente fanáticos pelo político ou pelo partido A ou B?

O próprio Jair veio ao ES na última segunda-feira (30) e, em frente ao 38º BI, fez um comício esvaziado e um discurso melancólico, que é a síntese maior do nosso argumento aqui: a “campanha real” passou muito longe disso.

Tanto que, na esta altura do processo, é possível afirmar aqui e agora: na noite do próximo domingo (6), as urnas reservam, no Espírito Santo, um resultado geral muito frustrante para os candidatos, dirigentes e militantes tanto do PT como do PL. Não vai dar outra.

Mas calma, estamos falando de duas forças políticas completamente diferentes, opostas em muitos sentidos. A constatação pode valer para ambos, levados pela mesma água, mas não dá para tratar de PL e de PT da mesma forma. Neste ponto, é preciso desdobrar e expandir a nossa análise.

E aqui é preciso constatar: a “frustração” será ainda maior para o PL. Por quê? Por um motivo simples: o grau de “frustração nas urnas” é proporcional ao grau de expectativa de um bom desempenho.

O PT: terceira eleição seguida em branco?

Ora, sejamos muito francos: alguém em sã consciência, dentro e fora do PT – tirando talvez os militantes mais iludidos –, esperava de verdade que o partido do presidente Lula alcançasse um resultado expressivo desta vez nas eleições para prefeito do Espírito Santo?

O PT, é verdade, voltou ao governo central e deu sinais de recuperação no Estado nas últimas eleições parlamentares. Mas é inegável que, nos últimos anos, o Espírito Santo tem se consolidado como um colégio eleitoral muito conservador e mais inclinado a votar em candidatos do centro para a direita. O antipetismo “pegou” por aqui.

Nas últimas duas eleições presidenciais, Bolsonaro venceu – e bem – no Espírito Santo. Na eleição municipal de 2016, o PT só elegeu um prefeito em terras capixabas (o de Barra de São Francisco). Na de 2020, não fez nem um sequer, num universo de 78 municípios.

Nesse sentido, não seria difícil, para o PT, conseguir melhorar sua situação. Qualquer número acima de zero é melhor que zero. Mantendo os pés no chão, a Federação Brasil da Esperança, formada por PT, PV e PCdoB, lançou 24 candidatos a prefeito, incluindo as quatro cidades da Grande Vitória que podem ter 2º turno, mas sem grandes ilusões.

Em entrevista concedida à coluna em maio, a presidente estadual do PT, Jack Rocha, evitou fixar uma meta de prefeitos eleitos e preferiu enfatizar a eleição de vereadores, tratando-a como prioridade.

De fato – aí, sim, pelo voto de legenda e muito mais ideológico –, o número de vereadores do PT no Espírito Santo deve crescer bem, o que aliás não será muito difícil, já que o ponto de partida também é muito baixo: hoje, o PT tem pálidos 13 vereadores nos 78 municípios capixabas. Na Grande Vitória, são só duas: Karla Coser (Vitória) e Elcimara Loureiro (Serra).

Mas, nas disputas pelas prefeituras, dificilmente o partido conseguirá encher os dedos de uma mão no próximo domingo. Dificilmente. Se fizer alguns poucos prefeitos, será em cidades pequenas do interior. E existe ainda a chance de João Coser ir para o 2º turno contra Pazolini (Republicanos) em Vitória.

Esse, o PT. E quanto ao PL?

PL: algo deu muito errado no meio do caminho

Situação completamente inversa era vivida pelo partido de Jair Bolsonaro no Estado. A expectativa de poder do PL era inversamente proporcional à do PT e proporcional ao ótimo resultado extraído das urnas pela sigla de direita que se tornou o abrigo partidário do ex-presidente da República.

Em 2022, assim como no resto do país, o PL colheu resultados históricos das urnas no Espírito Santo, nas eleições parlamentares. Além do retorno de Magno Malta ao Senado e da chegada de Gilvan à Câmara Federal, o partido elegeu a maior bancada da Assembleia, com cinco parlamentares (um de cada seis deputados estaduais).

O partido saiu de 2022 na crista da onda, vivendo seu melhor momento político no Espírito Santo. Tinha tudo para quebrar a banca nestas eleições municipais, preparando o terreno também para um ótimo resultado nas próximas estaduais, em 2026.

Mas algo deu muito errado no meio do caminho.

Hoje, o partido de Bolsonaro tem apenas um prefeito em todo o Espírito Santo: Tiago Rocha, de São Gabriel da Palha. No próximo domingo, assim como o PT, o PL dificilmente elegerá mais de cinco prefeitos no Estado… mas com uma grande diferença matemática: sob a liderança de Magno Malta, o partido bolsonarista lançou nada menos que 50 candidatos a prefeito.

Proporcionalmente, o partido caminha a passos firmes para um fiasco: é possível que não chegue a eleger 10% dos candidatos a prefeito lançados no Espírito Santo.

“Algo deu muito errado no meio do caminho”. O que, exatamente?

1. O radicalismo equivocado

A primeira resposta já está dada. Sob a condução de Magno Malta, os candidatos a prefeito do PL de norte a sul do Espírito Santo chegaram para esta eleição com discurso radicalizado, levando para a campanha a estratégia de combate (ou demonização) da esquerda, acreditando que o caminho das pedras era nacionalizar as disputas locais. A aposta, já dissemos, foi errada.

Quem ditou essa estratégia, ou foi seu porta-voz por aqui? Magno Malta.

Após ter apoiado Lula e Dilma no passado, Magno bebeu da fonte do bolsonarismo, decidiu mergulhar na fonte e dali não mais saiu. O risco é acabar se afogando e levando com ele o PL. Magno se radicalizou como poucos de 2014 para cá, numa mistura de “anticomunismo” com fundamentalismo religioso que nem o próprio Bolsonaro consegue alcançar.

A título de exemplo, citemos aqui o Coronel Ramalho, “cristão novo” no PL. É um candidato altamente qualificado e promissor. Tem currículo, sabe se expressar, fez algumas críticas pertinentes ao atual prefeito de Vila Velha, apresentou um excelente plano de governo (verdade seja dita: muitíssimo melhor que o de Arnaldinho, que é uma carta de intenções sumária).

Mas, por inspiração de Magno, o coronel perdeu-se nas mesmas águas do senador, gastando energia demais em uma estratégia que jamais teve a menor chance de “pegar”: a de rotular Arnaldinho como “candidato de esquerda”. Primeiro: não o é. Segundo: e daí se fosse? Ele está bem avaliado? Quais são os méritos e os problemas de sua administração? O que o adversário pode fazer melhor que ele? Eis os pontos muito mais relevantes.

2. O sectarismo

O segundo ponto da explicação, que tem muito a ver com o radicalismo, é o sectarismo que tem sido a chave das decisões e dos movimentos da direção estadual do PL, sob a liderança de Magno. Aliás, quando falamos em “direção estadual do PL”, estamos falando, basicamente, do senador Magno Malta. Ao longo deste quarto de século, o partido no Espírito Santo é comandado pelo senador e por mais ninguém.

Não existe um diretório estadual permanente, constituído em convenção ou congresso, pelo voto dos membros do PL. O que existe é uma comissão estadual provisória, presidida por Magno e formada por outros poucos membros (todos postos ali pelo senador), a qual vai sendo renovada ad eternum pela direção nacional (Valdemar Costa Neto).

Não existem, portanto, decisões colegiadas no PL. Na prática, é Magno quem decide tudo, em nome de todos. E, dentro do partido, a palavra dele é lei.

Ninguém no PL tem coragem de assumir declarações sobre isso, mas, reservadamente, muitos membros do partido expressam insatisfação com a condução de Magno e com a concentração de poder nas mãos do senador, até porque, para muitos, sua estratégia eleitoral, pautada por sectarismo e isolacionismo extremo, foi a perdição para os candidatos do PL.

De fontes do partido, que preferem não mostrar a cara, este colunista ouviu ao longo da campanha adjetivos como “maluca” e “suicida” para definir a estratégia de Magno.

Sustentando que o PL é a “única direita”, a “verdadeira direita” (enfim, o sinônimo de “direita” no Brasil), Magno condenou os candidatos do partido, inclusive os mais competitivos, ao extremo isolamento eleitoral.

Não é que ele não tenha se empenhado em conduzir articulações no período anterior à campanha, a fim de viabilizar coligações fortes que sustentassem os palanques de seus candidatos. Ele foi além: proibiu os candidatos do partido de se coligarem, basicamente, com todos os partidos relevantes – incluindo em seu index não só siglas notoriamente de esquerda, mas também algumas de direita (o PP, o Republicanos), que estiveram com Bolsonaro em 2022, considerando-as também de esquerda.

Restou claro que, para Magno, quem não é PL é de esquerda, logo não serve para se aliar ao PL. O pragmatismo mandou lembranças, num dos maiores tiros no pé de que se tem notícia no Espírito Santo, em matéria de estratégia política.

Ironicamente, os poucos candidatos do PL que têm chances reais de vitória no domingo foram justamente aqueles que, ignorando a resolução de Magno, compuseram por sua conta boas coligações locais (como o de São Gabriel da Palha).

3. Desagregação interna

A quem olha de fora, isso talvez não transpareça, até porque a estrutura do partido é muito fechada, mas há sérias desavenças e disputas internas de egos entre os expoentes do PL no Espírito Santo. Para bradar “Deus, pátria, família e liberdade”, todos gritam a uma voz, em ordem unida. Nos bastidores, falta a mesma unidade.

Em alguns momentos, essas fraturas apareceram. As disputas internas, a falta de pragmatismo e o sectarismo ditado por Magno fizeram as grandes chances de triunfo do PL desmoronarem, antes da campanha, em alguns dos municípios onde o partido poderia ter lançado os candidatos mais competitivos.

Dois exemplos marcantes: Cachoeiro e Guarapari, dois redutos de direita no Espírito Santo, nos quais Bolsonaro foi imensamente bem votado contra Lula em 2022.

4. Exemplo concreto nº 1

Se havia uma cidade capixaba importante onde o PL tinha tudo para fazer o prefeito era Cachoeiro de Itapemirim. A quinta cidade mais populosa do Espírito Santo é, hoje, um bolsão eleitoral bolsonarista. E, se havia um pré-candidato do PL com chances enormes de vitória no Estado, era o vereador Juninho Corrêa, em Cachoeiro.

Magno foi terminantemente contra uma coligação do PL com o PP, partido do pai de Juninho, na maior cidade do sul. Em fevereiro, sem disfarçar os motivos da decisão, Juninho anunciou a desistência da pré-candidatura e a desfiliação do PL. Disse, ainda, que voltaria para o seminário para se ordenar padre.

A última parte não rolou. O seminário teve de esperar, e Juninho seguiu atuante no processo eleitoral. Seu recuo deu espaço para um não planejado retorno triunfal de Theodorico Ferraço. Aos 86 anos, o ícone do conservadorismo de direita na política capixaba está muito perto de voltar à Prefeitura de Cachoeiro para seu quinto mandato, pelo PP (ironia 1), tendo como vice ninguém menos que Juninho (ironia 2), que migrou para o Novo.

Enquanto isso, o candidato do PL em Cachoeiro, Léo Camargo, não chega a 10% nas pesquisas, no maior reduto bolsonarista no Espírito Santo.

5. Exemplo concreto nº 2

Em Guarapari, o ex-vereador Zé Preto foi um dos cinco deputados estaduais eleitos pelo PL em 2022. Ao contrário dos outros quatro, decidiu imediatamente entrar na base do governo Casagrande (PSB) em plenário. Pecado mortal para Magno, pois ele e o PL fazem oposição ao “governo socialista”.

Zé Preto já chegou à Assembleia como pré-candidato a prefeito de Guarapari. Era (e segue sendo) altamente competitivo. Magno não fez questão alguma de reter esse ativo eleitoral. Passou a escantear Zé Preto, até que este decidiu sair.

Sem legenda garantida no PL, o deputado pediu a Magno liberação para mudar de sigla. O senador lhe deu a carta de anuência. Zé Preto foi para o PP e hoje briga palmo a palmo com outro candidato de direita, o vereador Rodrigo Borges (Republicanos), pela Prefeitura de Guarapari.

Na cidade da Grande Vitória, com cerca de 120 mil habitantes, em um dos movimentos menos compreensíveis deste pleito, Magno decidiu lançar o vilavelhense deputado Delegado Danilo Bahiense (PL), numa candidatura meio “torta”, que também não tem chegado a 10% em pesquisas.

Para piorar o bate-cabeça interno, o ex-deputado Carlos Von (PL), que estava inelegível, recuperou os direitos políticos com a campanha já inaugurada. Julgando-se mais competitivo (e possivelmente o seria), chegou a se movimentar visando substituir o delegado na cabeça da chapa. Magno não quis nem ouvir a ideia, por lealdade aos seus.

Ninguém pode duvidar da lealdade, virtude também muito importante na política. Mas, pelo menos nesta eleição municipal no Estado, darão todos um “abraço dos afogados” na fonte do bolsonarismo… a qual, a prosseguir assim, vai secar rapidamente por aqui.


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