Coluna Vitor Vogas
Paulo Hartung defende “um desses jovens talentosos” para governador do ES
Ex-governador filia-se nesta segunda-feira (26) ao PSD. Em entrevista a nossa coluna no Portal ES360, faz defesa veemente da “alternância” no Governo do Estado para evitar o personalismo e a formação de “condomínios de poder”

Paulo Hartung concedeu entrevista à Coluna Vitor Vogas na última quinta-feira (22/05/2025). Foto: Vivian Camargo
O ex-governador Paulo Hartung dará, nesta segunda-feira (26), um passo importante que marca a retomada de sua trajetória política. Às 15 horas, na sede da sigla em São Paulo, ele entrará oficialmente no Partido Social Democrático (PSD), após sete anos sem filiação partidária e 11 sem disputar eleições. Hartung é sempre cotado, em pesquisas e rodas políticas, como possível candidato a senador ou governador do Espírito Santo em 2026. Senador ele foi por quatro anos: de 1999 a 2002; governador, por três mandatos: de 2003 a 2010 e de 2015 a 2018. Mas uma nova candidatura, diz o próprio Hartung à coluna, não é de modo algum a motivação de seu ingresso no PSD.
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“A princípio, não pretendo [voltar a disputar algum mandato eletivo no ano que vem]”, afirma o ex-governador, na entrevista abaixo, concedida na manhã da última quinta-feira (22), no escritório do advogado e professor da UVV Henrique Herkenhoff, seu amigo e aliado, em Vitória. Por outro lado, no bom e velho estilo hartunguesco – oblíquo e enigmático –, o ex-governador não exclui a hipótese: “Não descarto nem encarto (risos). Não vou dizer que dessa água não beberei. Ninguém pode falar isso. O jogo é jogado, lambari é pescado”, despista, recorrendo a um dito de sua terra natal, Guaçuí.
Entretanto, após beber da mesma água, tomar três cafés expressos e passar quase duas horas com o ex-governador, saí da entrevista com uma convicção, já exposta aqui, reforçada: voltar a concorrer ao Governo do Estado (para um quarto mandato) passa longe dos planos atuais de Paulo Hartung. O conjunto de suas respostas aponta direção bem distante do Palácio Anchieta… e bem mais próxima de Brasília. O ex-governador mostra até certo aborrecimento com a insistência de quem se recusa a ler seus sinais. Afirma já ter dado sua contribuição na função de governador:
“Não tenha a menor dúvida! Os exemplos eu tenho dado um a um. As pessoas podem não querer ver ou fingir que não estão vendo”, diz ele, revelando que, em 2010, o ex-ministro José Dirceu (PT) foi a Vitória lhe pedir para ser candidato a senador (o que ele não fez) e lembrando que, em 2018, mesmo tendo o direito à reeleição para governador, não a pleiteou. Os exemplos que ele quer passar são de “desapego”.
Ainda mais enfático é Hartung ao responder o que ele defende para a próxima eleição a governador do Espírito Santo:
“O bom seria um jovem desses que tem aí, talentoso, ocupar esse espaço. Acho que seria bom para o Espírito Santo oxigenar a política do Estado”.
Nominalmente, da “safra” de jovens líderes políticos ascendentes no Espírito Santo, ele destaca dois nos quais vê potencial para o exercício da função: o prefeito de Vitória, Lorenzo Pazolini (Republicanos) – adversário do governador Renato Casagrande (PSB), a exemplo de Hartung –, e o de Vila Velha, Arnaldinho Borgo (sem partido), aliado de Casagrande. Enche ambos de elogios, bem distribuídos.
A respeito de Pazolini, Hartung nega que atue como conselheiro, muito menos “mentor” do prefeito da Capital: “Não sou mentor de ninguém nem quero essa função”.
Sobre Arnaldinho, afirma que é amigo dele há muito tempo, como era do pai dele (o falecido Arnaldo Borgo). O prefeito de Vila Velha busca se filiar ao PSD e quer assumir o controle do novo partido de Hartung no Espírito Santo. Para isso, no último dia 13, o “amigo de muito tempo” de Hartung encontrou-se pessoalmente em São Paulo com Gilberto Kassab, presidente nacional da sigla.
Na entrevista abaixo, o ex-governador nega que tenha sido ele o mediador desse colóquio e que tenha tomado parte nessa articulação – ideia que deixou o Palácio Anchieta de cabelo em pé. “Ninguém precisa disso, não. Tenha paciência… Kassab é um cara que conversa com todo mundo.”
De todo modo, as palavras de Hartung são de grande incentivo para Pazolini e Arnaldinho. Mais que renovação política, o ex-governador faz uma defesa veemente da alternância de poder como um princípio vital da democracia que, segundo ele, precisa ser aplicado no Espírito Santo. Esta é a parte da entrevista que pode ser melhor compreendida como uma crítica (ou alerta) do ex-governador em relação a seu arquirrival, que no ano que vem completará, como ele, um total de 12 anos despachando no Palácio Anchieta.
“Se tem um ponto forte na democracia é a alternância. Você vê um grupo que vai ficando no poder, aquilo vai virando um condomínio de poder. Você vê que o olhar para aquilo já parece que é uma coisa pessoal, de propriedade pessoal. Então seria muito bom que esse movimento de alternância ocorresse no Espírito Santo”, argumenta Hartung.
Casagrande não poderá se reeleger governador no próximo ano, mas trabalha para fazer seu sucessor e manter seu grupo político à frente do Poder Executivo Estadual. A aposta prioritária do mandatário, hoje, é Ricardo Ferraço (MDB). Além de não ser “um desses jovens” destacados por Hartung nem fazer parte da “matéria-prima para a renovação” (outra expressão do ex-governador), Ricardo tornou-se, desde 2010, tão adversário dele quanto o é o próprio Casagrande (se não mais).
Se concorrer ao Governo do Estado não é o foco nem a motivação de Hartung, por que, então, agora, a filiação ao PSD? Aí chegamos ao real ponto de interesse enfatizado por ele: participação, com relevância e ressonância, no debate político nacional. “Estou o tempo inteiro no debate político sobre o país. […] Estou no debate nacional. E agora vou dar mais tração na minha presença no debate.”
Desde que passou a faixa de volta para Casagrande, em 2019, Hartung foi para a iniciativa privada, mas seguiu contribuindo com ideias no debate público sobre os grandes temas nacionais, de segurança pública a sistema tributário, de educação a modernização do Estado brasileiro… Dá palestras, entrevistas e publica artigos, além de ser um dos colaboradores do movimento RenovaBR.
Até a próxima eleição presidencial – e com ela em mente –, o ex-governador está convencido de que, filiado a um grande partido, suas ideias poderão ganhar muito mais “tração” (palavra muito usada por ele) no debate nacional, isto é, maior ressonância, amplificando o alcance da sua voz e do seu pensamento. “É importante ter, nos partidos políticos, pessoas como eu: mais programáticas. Minha cabeça é programática.”
Programática e pragmática. Ao mesmo tempo, a opção de Hartung pelo PSD obedece a um critério bastante pragmático de alguém, como ele mesmo admite, talhado e treinado na arte da “sobrevivência política”: atento às oscilações da maré e às tendências do cenário político brasileiro, Hartung está convicto de que (“felizmente”) estamos passando por um processo de acelerado enxugamento do nosso quadro partidário. Vislumbra que, em poucos anos, poucas siglas vão sobreviver:
“Os partidos estão se organizando no país. […] Hoje o país caminha, vou fazer uma brincadeira com a linguagem da área privada, com fusões e aquisições. Estamos indo para um jogo de cinco, seis partidos”.
Hartung almeja, desde já, ocupar um lugar estratégico em um grande partido que na certa estará entre esses cinco ou seis sobreviventes que darão as cartas na política brasileira a partir de 2026. Quem o alertou para isso, segundo ele, há cerca de dez anos – isto é, com uma década de antevisão –, foi o próprio Kassab, reputado pelo ex-governador como membro da “família das corujas”: mais que uma águia política, por seu poder de enxergar não só longe como no escuro.
Hartung conta que, lá no comecinho do PSD, Kassab veio ao Estado e lhe pediu para ajudá-lo a montar a agremiação. O partido do ex-prefeito de São Paulo nunca teve envergadura no Espírito Santo, mas de fato, pela presidência estadual, já passaram nomes como José Carlos da Fonseca Júnior e Neivaldo Bragato, aliados de longa data do ex-governador.
Agora, o que Hartung pretende é chegar ao PSD para ser uma das suas cabeças pensantes, ajudando a elaborar o programa do partido e a formular o seu projeto de país… o qual deve ser defendido pelo candidato do PSD à Presidência da República (Ratinho Júnior ou Eduardo Leite) ou a ser apoiado pelo PSD (Tarcísio de Freitas). “Minha demanda é por participação.”
Quando diz estar no debate nacional e querer participar, Hartung demonstra, mais uma vez, disposição em ser um personagem relevante na disputa presidencial, seja no background – como formulador –, seja até, se chance houver, completando alguma chapa.
Abaixo, a primeira parte da entrevista do ex-governador. Boa leitura!
O senhor não disputa mandato eletivo desde 2014. Desde novembro de 2018, está sem filiação partidária. Foi quando o senhor saiu do MDB. E está sem exercer mandato eletivo desde que encerrou o terceiro e último governo, no fim de 2018. Agora, está na iminência de se filiar ao Partido Social Democrático (PSD) em São Paulo, segunda-feira, às 15 horas. Essa sua volta à vida partidária representa também, governador, o seu retorno à vida pública?
O que você chama de “vida pública”?
O senhor está voltando a exercer a atividade política de modo mais direto? A partir da filiação, pretende voltar a disputar mandatos?
No debate político sobre o Brasil, eu estou nele o tempo inteiro. E vou continuar. Estou dizendo isso porque acho que tem uma nuance importante. Aos trancos e barrancos, os partidos estão se organizando no país. Eu me lembro que recebi o Kassab aqui no Palácio Anchieta. Essa foto é famosa. O Kassab estava organizando o PSD e veio conversar comigo. E ele falou: “Paulo, o processo de organização partidária vai ocorrer no país”. O Kassab é meio da família das corujas. A coruja enxerga no escuro. Tem muito tempo que ele me falou isso. E ele falou assim: “Vai chegar uma hora que nós vamos ter cinco, seis partidos que vão ser representativos. Esse mundo de partidos que você está vendo aí vai desaparecer. E eu vou organizar um desses partidos”. Esse partido era o PSD. Ele já tinha essa visão. E me chamou para ajudá-lo a montar o PSD no Espírito Santo. Lá atrás ele me convidou para isso. Bem, a vida está mostrando que ele estava certo. Eu tenho que falar isso para as pessoas: os partidos estão se organizando. Estamos caminhando para ter poucos partidos, diferentemente daquele negócio de 28 partidos no país.
E, para estar no debate nacional, vai ser importante estar em um partido político. É isso. O que está me levando a me filiar? É isso.
Para poder se habilitar a pleitear algo, quer dizer, para poder “entrar no jogo eleitoral”, o primeiro passo é estar filiado a um partido consistente, relevante…
Para estar no debate nacional. Eu estou no debate nacional, como sociedade civil, desde que saí do governo, no final de 2018.
Para você ter tração nas suas opiniões, naquilo que você defende, é importante que você esteja em um partido político.
Estando filiado a um partido relevante, sua voz ganha eco, ganha ressonância maior?
O país está começando a ter partidos. Está começando a ganhar uma conformação. E é importante ter, nos partidos políticos, pessoas como eu: mais programáticas. Minha cabeça é programática. Todo mundo sabe disso. Concorde comigo ou não, eu tenho ideias do que tem que se fazer com o Estado brasileiro, por exemplo, o que tem que se fazer com o ambiente de negócios…
O senhor está falando de pensar o país, um projeto de país?
É isso aí. Você pode, como sociedade civil, continuar militando. Você pode ser sociedade civil, ter uma filiação partidária e dar mais tração às suas ideias, ao que você defende e assim por diante. Isso é o que está me levando à filiação partidária.
Mas o senhor pretende voltar a disputar algum mandato eletivo no ano que vem?
A princípio, não.
A princípio, não? Não está entrando por isso?
Você me perguntou por que estou entrando. Estou entrando pela razão que lhe disse. Veja, eu tenho ideias claras de como é que se moderniza o nosso país, como é que se transforma o potencial desse país em oportunidade para os seus filhos, principalmente para a juventude brasileira, que precisa ter esperança no futuro. Estou no debate. As pessoas todas que se encontram comigo, em qualquer lugar do Brasil, que me conhecem, sabem que não parei de dar contribuições para poder tentar melhorar as coisas no país. Estou no debate nacional. E agora vou dar mais tração na minha presença no debate.
No entanto, governador, quando o nome Paulo Hartung é mencionado no ambiente político em geral, em qualquer roda de conversa política, principalmente, é claro, no Espírito Santo, sempre surgem fortes especulações a respeito de uma possível nova candidatura do senhor no ano que vem. Diante da sua iminente filiação, da sua volta à militância partidária no PSD, essas especulações são crescentes. O senhor descarta essa possibilidade ou pode vir a abraçá-la?
Eu já te respondi. Eu não descarto nem encarto (risos). Não vou dizer que dessa água não beberei. Ninguém pode falar isso. O jogo é jogado. Eu vou usar uma expressão lá de Guaçuí, de Iúna, lá do Caparaó: “o jogo é jogado, lambari é pescado”. A vida vai rolando.
Mas hipoteticamente, quando a gente pensa nessa possibilidade de uma eventual nova candidatura, o senhor hoje se enxerga mais no plano nacional ou na esfera estadual? Qual é a dimensão em que se encaixa hoje o seu projeto?
Essas dimensões não existem, a não ser em um raciocínio estático. Para você ter um projeto nacional, esse projeto tem que estar presente no Rio Grande do Sul, tem que estar presente no Pará, tem que estar na Bahia, tem que estar no Ceará, tem que estar no Rio de Janeiro, tem que estar em São Paulo, tem que estar no Espírito Santo… porque o poder é multifacetado… que é uma coisa que não está sendo praticada no Brasil. Eu ouvi isso da primeira vez em uma conversa a que eu fui levado pelo saudoso Gerson Camata com o doutor Tancredo Neves. Eu tinha 25 anos de idade quando fui levado a essa conversa. Quando você disputa uma eleição, você não ganha o poder, mas um pedaço do poder. Mesmo se você ganhar no primeiro turno, por exemplo, toda eleição que eu disputei majoritária eu virei ela no primeiro turno… Mas você não ganhou ali o poder. Você ganhou um pedaço do poder. Então, para você governar, você tem que dialogar com as outras partes. Isso é a política. É a ferramenta da política. Você não tem o municipal, o estadual, o nacional. Você tem a disputa política.
O que eu sonho, como brasileiro, é como é que a gente pode liderar o Brasil numa direção em que o país transforme esse imenso potencial dele em oportunidade? Como é que a gente sai dessa coisa de um populismo quase rudimentar que a gente vive neste país de tempo em tempo, quase na maioria do processo, e consegue racionalidade que dialogue com a população? É preciso saber fazer as coisas pra que as coisas sejam sustentáveis. Quantos voos de galinha já vimos com coisas malucas? Enfiam dinheiro público, fazem um voozinho de galinha, daqui a pouquinho estamos numa recessão econômica, no desemprego, na inflação e assim por diante. Como é que a gente faz uma coisa sustentável com um país como este? Tem um potencial enorme. Nós estamos vivendo um mundo que precisa fazer transição energética em função da questão climática. Como é que a gente insere isso para que o Brasil dê um salto? Meu sonho é esse. Meu sonho é militar por isso. Agora, isso precisa de parlamentar, precisa de deputado federal, precisa de senador, precisa de governador, precisa de prefeito, precisa de sociedade civil ativa. É isso que eu estou te respondendo.
E o senhor pode voltar a ser candidato ao Governo do Espírito Santo no ano que vem?
Acho que o bom seria um jovem desses que tem aí, talentoso, ocupar esse espaço. Acho que seria bom para o Espírito Santo oxigenar a política do Estado.
Fadiga de material é uma expressão da física, mas que vale muito para a política. O Espírito Santo já sofreu muitos desacertos graves. Precisamos evitar esse processo. E o jeito de evitar é com a alternância de poder. Por isso é que eu gosto da democracia. Quando um grupo começa a ficar muito tempo no poder, isso não é um bom sinal.
Nessa função, o senhor acredita já ter dado a sua contribuição?
Não tenha a menor dúvida! Os exemplos eu tenho dado um a um. As pessoas podem não querer ver ou fingir que não estão vendo.
Eu saio em 2010 como o governador mais bem avaliado do país e não disputo a eleição [para o Senado]. Olha bem! O José Dirceu veio aqui me pedir para ser candidato a senador. Ele está vivo. Pode perguntar a ele. Eu disse a ele: “Olha, Zé, eu acho que já estou com um pé fora da canoa dos mandatos eletivos. Vou continuar debatendo o país e assim por diante”. Isso lá em 2010. Aí tive aquilo que Dona Cristina [Gomes, esposa de Hartung] chama de uma “recaída” em 2014 (risos). E aí disputei a eleição de Governo do Estado. Terminando o mandato [em 2018], podendo ser candidato à reeleição, fui para a iniciativa privada. E é uma coisa bacana também, que acho um outro exemplo para as lideranças: você pode ir lá exercer mandato, depois voltar para a sua vida profissional, ter uma vida na área privada, seja como profissional liberal, seja como dirigente de uma empresa, de um setor e assim por diante. Muita gente entra no setor público e acha que tem que morrer ali, como se só existissem mandatos! Aí não consegue o mandato, vai para um cargo público de livre nomeação ou vai para um negócio partidário. Digo isso olhando o trabalho que faço no RenovaBR.
“De volta para o futuro”, para 2026, o senhor volta a destacar a importância da renovação política e da formação de novos líderes. E, na resposta anterior, o senhor me disse que, para o cargo de governador, seria bom que fosse um desses “jovens talentosos” que aí estão. Dentro desse rol de novos e jovens líderes políticos, quem o senhor destaca? Quem vê com potencial para ser o próximo governador e que pode até vir a contar com o seu apoio?
Vou voltar a dizer: oxigenar a política é sempre muito importante. Quando se discute democracia, as pessoas muitas vezes dizem “mas pela democracia é mais difícil fazer as coisas”. Olhando ali os autocratas deste mundo fazendo as coisas, vão lá, mandam fazer e fazem… Na democracia, muitas vezes você tem a descontinuidade de coisas importantes quando você tem a alternância de poder. Mas a alternância oxigena o poder.
Se tem um ponto forte na democracia é a alternância. Você vê um grupo que vai ficando no poder, aquilo vai virando um condomínio de poder. Você vê que o olhar para aquilo já parece que é uma coisa pessoal, de propriedade pessoal. Então seria muito bom que esse movimento de alternância ocorresse no Espírito Santo.
Tem gente qualificada para isso? Você tem uma safra de novos políticos no Espírito Santo que, além de serem bons de votos, que é uma questão essencial, estão se mostrando bons administradores. Temos nomes? Temos nomes. Sou eu que tenho que escolher isso? Não sou eu. Já escolhi muita coisa na vida…
Quais nomes, por exemplo?
O prefeito da Capital [Lorenzo Pazolini] mostrou isso. Tentaram empurrar a eleição em Vitória [em 2024] para o segundo turno numa pressão danada… E ele se elegeu no primeiro turno. É um fato da política. Mostrou o seu talento. E está administrando a cidade bem. Outro dia vieram amigos meus de São Paulo aqui a Vitória e ficaram encantados. Eu até brinquei: “Mas é que teve um ex-prefeito que…” (risos).
Um de 30 anos atrás… (risos)
Está aí a cidade bem cuidada. Você atravessa a ponte e está o Arnaldinho cuidando de Vila Velha. É fácil cuidar de Vila Velha? Não é. Eu, quando o Rodney [Miranda] me pediu o apoio para ser candidato a prefeito [em 2012], eu disse: “Cuidado, Vila Velha costuma tirar o tapete das lideranças que assumem a prefeitura”. Falei com ele. Está lá o Arnaldinho fazendo uma administração exitosa na cidade. Estou citando dois que já foram reeleitos. Poderia citar outros. O que estou querendo dizer com esses dois nomes, sem excluir ninguém, é…
São dois nomes mais postos como possíveis candidatos…
E governam municípios com eleitorado grande e que são meio “vitrine” no Espírito Santo. Mas tem outros. Ou seja, tem matéria-prima suficiente para a renovação.
Especificamente sobre o prefeito de Vitória, o senhor está conversando sobre política com ele, ou mesmo sobre a administração, o aconselhando de algum modo? Está mais próximo dele, ou se aproximando dele, do ponto de vista político?
Eu estou a quase mil quilômetros de Vitória na maioria do meu tempo. Se você pegar uma semana minha de trabalho, estou muito em São Paulo e Brasil afora. Não estou aqui no dia a dia.
É que o senhor por vezes é apontado como um conselheiro, ou até como mentor, ou, no mínimo, um incentivador do prefeito. O senhor confirma isso?
Não. Eu torço por essa meninada toda. Mas não sou mentor de ninguém, nem quero essa função. Sou conselheiro lá do RenovaBR. Então, de vez em quando, um candidato a prefeito liga para mim, um prefeito liga para mim: “Paulo, tô com uma confusão aqui. Tem esse caminho, esse caminho… Você já viveu alguma coisa parecida?”. Se eu tiver vivido, eu dou um conselho para a pessoa, digo como cuidei da questão e assim por diante. Mas não sou mentor de ninguém. Escrevo muito. Dou muitas entrevistas. Aonde sou chamado, faço palestra, debato… Minhas ideias estão claras para o país inteiro.
E especificamente sobre Arnaldinho? O senhor tem conversado com o prefeito de Vila Velha? E quanto ao episódio da conversa dele no dia 13 com o Gilberto Kassab e à possível filiação dele ao PSD? O senhor teve participação nisso?
Eu sou amigo de Arnaldinho pelo pai dele [Arnaldo Borgo], que já nos deixou há alguns anos. Somos amigos de muito tempo. Isso é uma coisa que vem de longe. Eu me lembro quando Rodney me disse: “Vou fazê-lo membro de minha equipe. Esse menino tem futuro!” [Arnaldinho foi secretário de Assistência Social no governo de Rodney Miranda em Vila Velha]. E está aí, é uma coisa bacana. Foi vereador, secretário do Rodney, agora reeleito prefeito…
E o senhor ajudou a abrir esse canal de diálogo dele com Kassab?
Ninguém precisa disso, não. Tenha paciência… Kassab é um cara que conversa com todo mundo.
O senhor não participou da mediação?
Não. Não precisa disso o prefeito de uma cidade importante como Vila Velha, um líder importante, com essa votação que teve.
Mas o senhor gostaria dele no PSD, já que é o seu futuro partido, muito em breve?
Isso aí cada um tem que fazer sua análise. Você não tem que induzir ninguém a nada. Você tem que deixar cada um fazer sua análise, fazer seu cálculo, o que é melhor… Vamos sair de um caso. As pessoas estão me procurando, e o que tenho dito para elas é o seguinte. A primeira pessoa a quem eu disse isso, lá atrás, foi o Audifax Barcelos. Falei: “Audifax, vá para um partido grande”. Essa coisa dos pequenos partidos vai ficar complicada no país. Não tem aquela história de coelhinhos no interior, que tem mais coelhinhos do que casinhas? (Risos) E os coelhos saem todos nervosos atrás de uma casinha…
Dança das cadeiras em festa infantil…
Dança das cadeiras. Então o que tenho aconselhado a todos é: procure a sua casinha, procure a sua cadeira e vá para um partido que tenha dimensão nesse quadro que está aí. Tem muitas coisas em extinção no quadro partidário brasileiro. Todo mundo só vê o PSDB em extinção. Não é só o PSDB. Então, essas dicas eu dou. Estou treinado. São muitos anos de treinamento nessa área.
Na sobrevivência política?
Na sobrevivência política. Eu não sou filho de político. Não recebi herança política de ninguém. Venho do movimento estudantil, do movimento de juventude. Tive que abrir o meu caminho com a minha própria capacidade de desviar de obstáculos e assim por diante. Então tenho um treinamento espetacular. Seu Paulo [Gomes, pai de Hartung] era comerciante, industrial, contador, muito embora tenha sido um bom conselheiro meu, mas não era um homem de eleição, da rua. Não recebi herança de pai, de tio… Saí do zero. Comecei no movimento estudantil do Salesiano, depois na Ufes, virei o primeiro presidente do DCE com uma votação espetacular… E aí entrei na vida partidária e tive que aprender essa coisa. Mas era uma outra estrutura partidária. Hoje, não.
Hoje o país caminha, vou fazer uma brincadeira com a linguagem da área privada, com fusões e aquisições. Estamos indo para um jogo de cinco, seis partidos.
Felizmente, na sua avaliação?
Felizmente. Lá atrás, o Kassab me falou: “Esse troço vai ganhar consistência novamente”. Felizmente. Eu me lembro que uma vez fui jantar com o Fernando Henrique, então presidente da República, lá no Palácio da Alvorada, com o Roberto Freire [líder do então PPS, atual Cidadania, pelo qual Hartung exerceu parte de seu mandato como senador]. Ele disse: “É muito bom receber vocês aqui, mas quase todo dia eu tenho que receber parlamentares”. Se fosse lá na Europa, o presidente ou primeiro-ministro recebia o líder do partido e dialogava com o partido, porque o líder fala pelo partido. Aqui, não. Aqui, cada parlamentar é uma instituição. Foi a expressão usada pelo Fernando Henrique naquele jantar. Você imagina o que é o trabalho de um presidente.
E olha que FHC era bom nisso e gostava da tarefa… Imagine uma Dilma, um Bolsonaro…
Mas agora, devagarzinho, isso está se organizando no país. Por isso, voltando àquela sua outra pergunta, acho que tenho uma contribuição a dar, porque esses partidos vão se tornar um pouco mais programáticos. Acho até que o PSD pode sair na frente nisso, em ter um programa. Se você olhar para o partido, está lá o S de “social”, está lá o D, que é o compromisso com a democracia. São duas questões importantes. Mas você também tem o desenvolvimento. Saber, por exemplo, o que o partido pensa sobre carga tributária, sobre tributação progressiva etc.
Sobre essa contribuição que o senhor acredita e espera poder dar, retomando a sua linha de raciocínio, o senhor entra no PSD para ser esse formulador?
Para ser um deles.
De que maneira exatamente o senhor espera contribuir nesse projeto nacional de construção de um programa para o partido?
Intelectualmente. Escrevendo questões para o partido, raciocinando sobre questões que o partido vai enfrentar no debate nacional, ajudando a formar gente. O partido faz seu congresso lá no Ceará. Se eu tiver condições de ir para falar no congresso, eu vou falar.
Então a priori, independentemente de qualquer projeto eleitoral, de candidatura etc., o senhor entra para ser uma das mentes pensantes do PSD e ajudar a formular o programa do partido para o país?
Entro para tracionar o que já estou fazendo. Já estou fazendo isso, debatendo este país, dando as minhas contribuições. O último artigo que escrevi no Estado de S. Paulo é sobre segurança pública. Tem tudo ali que aprendi na área de segurança. O Brasil está debatendo esse assunto hoje, tardiamente. Ainda não tem uma política nacional de segurança pública. Fui lá e coloquei minhas ideias. É só um exemplo.
Só que hoje, se você estiver dentro de uma estrutura partidária, essas ideias ganham ressonância, inclusive dentro do Congresso Nacional, que decide.
Por falar nisso, governador, até para elevar a qualidade do Congresso Nacional, especificamente do Senado Federal, o senhor pode ser candidato a senador novamente pelo Espírito Santo?
Já fui senador. Aliás, eu já percorri isso. A única coisa que eu não fui foi presidente da República. Nem vice-presidente. Mas tentei. Vamos ser claros.
E vereador.
Vereador eu quase fui. Em 1982 [primeira eleição de Hartung], quando eu comecei a campanha, era para vereador de Vitória. Você também não sabe disso. Depois o pessoal de Guaçuí, liderado pelo saudoso Luiz Moulin [ex-prefeito de Guaçuí, falecido em 2023], veio e me convenceu a mudar de vereador para deputado estadual. Quase fui vereador de Vitória. Até fiz um mês de campanha para vereador. Depois é que eu virei a chave para deputado estadual.
E senador novamente? O senhor pode ser?
Eu já fui. Eu já percorri essa questão. Não tem demanda minha por isso.
Minha demanda é por participação. É isso que eu estou fazendo. Nunca deixei de fazer. E acho que dá uma tração maior fazer com a estrutura partidária.
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