Coluna Vitor Vogas
Nésio pode voltar à Secretaria de Saúde do ES? Saiba a resposta e as razões
Ex-chefe da Sesa foi exonerado nesta quinta (22) do cargo de Secretário Nacional de Atenção Primária à Saúde no governo Lula
Secretário estadual de Saúde durante quase todo o governo passado de Renato Casagrande (PSB), Nésio Fernandes (PCdoB) perdeu nesta quinta-feira (22) o cargo de secretário nacional de Atenção Primária à Saúde, exercido por ele desde o início do atual governo Lula (PT). Na noite de ontem (21), veículos como o Estadão e a Folha de S. Paulo informaram que a exoneração seria publicada na edição desta quinta-feira (22) do Diário Oficial da União, o que não se concretizou. Mas, por volta das 16 horas, o Ministério da Saúde (MS) confirmou, em comunicado oficial, a decisão tomada pela ministra Nísia Trindade.
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A iminência da exoneração despertou uma interrogação no meio político capixaba: será que o médico sanitarista pode voltar a atuar política e/ou profissionalmente no Espírito Santo? Mesmo dentro da Secretaria de Estado da Saúde (Sesa), a notícia suscitou um misto de expectativa e apreensão quanto a um possível retorno do ex-secretário ao cargo, no lugar do seu sucessor, Miguel Paulo Duarte Neto.
O futuro de Nésio ainda é turvo, mas podemos sublinhar uma certeza: para o governo Casagrande, ele não volta. Chance zero de retorno.
Não que o próprio Nésio almeje retornar, mas essa possibilidade simplesmente não está posta na mesa do governador. No alto escalão do governo, o entendimento geral é o de que, hoje, não há espaço para Nésio na equipe. A princípio, o ex-secretário deve ficar em Brasília.
Entre fontes de alto gabarito do governo Casagrande, o que há é gratidão a Nésio pelo seu trabalho à frente da Sesa de 2019 a 2022 (sobretudo na gestão da pandemia), reconhecimento ao bom profissional e ao legado deixado por ele (com a Fundação iNOVA Capixaba e o ICEPi), além de solidariedade pela sua queda no MS. Mas não há a menor intenção de reaproveitá-lo na Sesa. “A equipe está montada e fechada”, crava um governista de alta patente.
Com a projeção alcançada nacionalmente como secretário de Atenção Primária à Saúde do MS, a expectativa é que Nésio rapidamente consiga ser reabsorvido pela burocracia do SUS em algum cargo de direção, ou que receba convites para trabalhar na Secretaria de Saúde de outras unidades da federação – vale lembrar que, no último governo Casagrande, ele presidiu o Conselho Nacional de Secretários de Saúde (Conass). E não está totalmente descartada a hipótese de ele ser remanejado para outro cargo na gigantesca estrutura do próprio MS.
Por que Nésio não voltará de jeito nenhum para o governo Casagrande? Há neste raciocínio, antes de tudo, uma questão de ordem pessoal. Ele e sua família estão instalados na capital federal. Depois de assumir o cargo no segundo escalão do MS, Nésio levou sua mulher e seus filhos para morarem com ele. Não tem raízes que o prendam ao solo capixaba.
Casagrande satisfeito com Miguel
O sucessor de Nésio, Miguel Paulo, pode não estar “brilhando” no cargo, mas não é mal avaliado internamente. Seu trabalho agrada ao governador. Já os prefeitos são outra conversa…
Vindo da iniciativa privada, Miguel é considerado um bom gestor hospitalar, sua área de especialização. Entende bem menos de SUS que Nésio (forjado no “chão” da rede pública como médico sanitarista), mas está aprendendo e, segundo um gestor hospitalar da rede estadual, compensa a falta de experiência com capacidade de escuta. Nem um pouco chegado a microfones e holofotes, é bem menos “político” que Nésio, mas, dependendo do ponto de vista, isso pode até ser uma coisa boa.
Prefeitos não o aceitariam
Há também resistências de ordem política, as mesmas que custaram a Nésio o emprego no auge da campanha eleitoral de 2022.
A grande maioria dos prefeitos das cidades capixabas era e continua sendo aliada do governo Casagrande, tendo apoiado a sua reeleição. Por conta de um conjunto de mudanças implementadas por Nésio na dinâmica da Sesa com os municípios, eles não engoliam o secretário. Foi assim que, aproveitando a melhor oportunidade, os prefeitos se juntaram para forçar a sua queda.
Nos primeiros dias de um inesperado 2º turno contra Manato (PL), momento mais crítico da campanha de Casagrande à reeleição, em uma plenária com a presença de quase todos em um hotel em Vitória, os prefeitos exploraram a seu favor a vulnerabilidade política de Casagrande e pediram a cabeça de Nésio ao governador, que, nas cordas, assentiu e entregou-a para eles, atendendo à condição implícita para a manutenção do apoio dos seus maiores cabos eleitorais nos municípios.
Ora, os prefeitos de então são os mesmos de agora. Se a resistência a Nésio já era grande então, quando ele estava no cargo, por que haveria de ser menor agora que ele já não está? Os prefeitos não o aceitam mais. O nome de Nésio não passa.
O fator Ricardo Ferraço
Cumpre lembrar, ainda, que o vice-governador Ricardo Ferraço (MDB) provavelmente assumirá o Governo do Estado em abril de 2026 no lugar de Casagrande, que deve buscar uma vaga no Senado.
Ora, sob a ótica ideológica, Ricardo tem perfil oposto ao de Nésio. O que um tem de direita liberal e empresarial, o outro tem, literalmente, de comunista. Ricardo, aliás, na montagem do secretariado do atual governo, perdeu de certo modo para Nésio a queda de braço pela indicação do novo secretário de Saúde.
Ricardo por muito pouco não emplacou no cargo o nome de sua predileção, o médico Remegildo Gava Milanez, ligado ao mundo corporativo da medicina privada. Remegildo já estava praticamente certo. Só não foi confirmado porque deu a este espaço uma entrevista em que, de certa forma, “sentou-se na cadeira” antes da hora, isto é, antes de ter o nome carimbado e anunciado por Casagrande, “desautorizando” sem querer o governador.
Deu Miguel Paulo, que já havia trabalhado diretamente com Nésio.
Em todo caso, com a perspectiva de chegada de Ricardo ao Palácio Anchieta em abril de 2026, Nésio, se voltasse agora, teria pouco mais de dois anos de vida útil na Sesa. Não compensa para ele. Seria dar um passo atrás na carreira pública.
Os motivos da queda
O Estadão e a Folha de S. Paulo publicaram a informação de que a queda de Nésio seria consequência das pressões exercidas pelo Centrão no Congresso e, particularmente, pelo deputado Arthur Lira (PP). O presidente da Câmara vive o auge da crise política com o Palácio do Planalto – tanto que ele e o presidente Lula (PT) marcaram reunião para esta quinta-feira (22) em busca de um melhor entendimento. O Estadão também publicou que Lira negou qualquer influência na exoneração de Nésio e ligou para Nísia pedindo a ela para explicar ao PT e ao PCdoB por que decidiu demiti-lo.
Como não é segredo para ninguém, o Centrão representado por Lira, desde o início do governo Lula, quer colocar suas garras no Ministério da Saúde. O sonho do PP na verdade era derrubar a ministra e capturar o comando da pasta.
Então sim, evidentemente, Nésio caiu, em grande parte, por conta de fatores externos. Nísia teria sucumbido às pressões do Centrão. Mas isso não explica tudo. Pelo que apuramos, pesaram também algumas questões internas relativas ao trabalho do secretário.
Sem nenhum questionamento ou desabono à sua competência e dedicação como gestor da saúde, Nésio viria recebendo críticas por sua atuação na Secretaria de Atenção Primária à Saúde, nas assembleias de colegiados formados por secretários municipais, estaduais e trabalhadores do MS. Também teria se envolvido em conflitos com outros secretários da pasta.
Acima de tudo, viria “destoando” do resto da cúpula do MS, no sentido de lhe faltar “alinhamento” com as outras áreas do Ministério e com o próprio gabinete da ministra Nísia, no que tange à publicação e à divulgação das políticas desenvolvidas pela secretaria gerida por ele.
Na nota à imprensa, o MS foi protocolar na justificativa e no agradecimento de Nísia: “O ajuste na equipe do Ministério é um processo natural ao longo da gestão e não foi baseado em nenhum tipo de pressão interna ou externa. A ministra da Saúde Nísia Trindade agradece a colaboração de Nésio Fernandes que, com sua experiência, muito contribuiu para a gestão deste Ministério”.
Nésio é substituído no cargo por Felipe Proenço, professor da Universidade Federal da Paraíba. Ele é um dos precursores do Programa Mais Médicos e já integrava a equipe da Secretaria de Atenção Primária à Saúde.
“Encantador de serpentes”
Nésio é, reconhecidamente, um homem persuasivo, dotado de grande habilidade retórica – no popular, ele é muito bom de lábia. Como poucos, sabe vender a si mesmo e, principalmente, as suas ideias, em geral “fora da caixa”. Colegas que trabalharam com ele no governo passado dão testemunho do seu espantoso poder de convencer qualquer um de qualquer coisa, qualidade que despertava tanto admiração quanto certa perplexidade e até apreensão entre eles.
Um colaborador de Casagrande o descreve com uma metáfora:
“O Nésio vai falando com você, vai falando com você, e você vai se convencendo da ideia… E, enquanto ele vai falando, vai tirando a ideia da caixinha e espalhando pela sala… e você vai deixando ele espalhar. Aí, quando você se dá conta, tem várias coisas tiradas da caixa que ficaram espalhadas ali, e você não sabe o que fazer com aquilo nem como pôr de volta na caixinha.”
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