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Coluna Vitor Vogas

Análise: o que explica o “gigante eleitoral” que virou Euclério Sampaio?

Análise 2: disputa pela Prefeitura de Cariacica não será propriamente para responder se Euclério será reeleito ou não. A importância dela será outra. É o que explicamos aqui

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De frente: Casagrande e Euclério; de costas, Sergio Vidigal e Arnaldinho

De frente: Casagrande e Euclério; de costas, Sergio Vidigal e Arnaldinho

A pesquisa eleitoral divulgada nesta quinta-feira (22) pela Rede Vitória mostra uma disputa que já nasce praticamente definida na eleição à Prefeitura de Cariacica. Até o dia 13 de agosto, quando foram feitas as entrevistas, Euclério Sampaio (MDB) acumulava 75,0 % das intenções de voto, contra 8,8% de Célia Tavares (PT) e 2,8% de Ivan Bastos (PL).

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A primeira pergunta que nos propomos responder aqui é: o que explica tamanho favoritismo para Euclério Sampaio, político longamente conhecido pelos cidadãos capixabas que, após quase duas décadas na Assembleia Legislativa, passou de deputado quase folclórico a prefeito altamente popular da terceira maior cidade capixaba e agora, potencialmente, um “fenômeno” eleitoral?

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O primeiro ponto a destacar é o tamanho do palanque de Euclério e a opulência de sua coligação. Euclério, aos 60 anos, virou o centro gravitacional da política cariaciquence. Não restou quase nenhum aliado para os demais. O favoritismo do prefeito, já anunciado na pré-campanha, proporcionou essa coligação enorme; esta, por sua vez, reforça agora o seu favoritismo.

Seja por méritos próprios, seja por sua boa avaliação, seja pela influência do governador Renato Casagrande (PSB) e do Palácio Anchieta, seja por capacidade de articulação política, seja pelo irresistível magnetismo exercido por quem governa, seja por simples conveniência e “adesismo” de grande parte das forças políticas (pendentes a se encostar em quem quer que esteja no poder), seja pela soma de todos esses fatores, a realidade concreta é que Euclério logrou construir não propriamente uma unanimidade política (e aliás é bom que assim seja), mas, sem dúvida alguma, uma grande unidade política ao seu redor.

Nesse aspecto, Euclério pode mesmo ser considerado um fenômeno (aliás, um inesperado fenômeno). Tal unidade política se reflete no gigantismo de sua coligação, a qual, por sua vez, se manifestou fisicamente na megaconvenção conjunta estrelada por ele no dia 21 de julho em uma casa de espetáculos em Cariacica, reunindo, segundo a organização, nada menos que 6 mil pessoas.

A coligação liderada por Euclério chama a atenção, em primeiro lugar, pela dimensão: nada menos que 14 partidos estão reunidos no palanque do prefeito e em torno dele. Em segundo lugar, por sua diversificação. É um palanque multifacetado do ponto de vista partidário, caleidoscópico do ponto de vista ideológico.

Ao redor de Euclério, estão do ultraconservador Republicanos (de Erick Musso, Pazolini e Messias Donato) ao progressista PSB (de Casagrande). Vemos desde partidos liberais como o União Brasil a trabalhistas como o PDT… Estão ali o MDB de Ricardo Ferraço, o PP de Josias da Vitória e Evair de Melo, o Podemos de Gilson Daniel… (e todos os nomes citados, além de líderes importantes, são potenciais candidatos ao Governo do Estado na eleição de 2026). Está com ele, ainda, o sempre influente Marcelo Santos (União), presidente da Assembleia Legislativa.

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E até dentro da Federação Brasil da Esperança (PT/PCdoB/PT), da principal oponente de Euclério, Célia Tavares, há segmentos que, de maneira disfarçada ou desbragada mesmo, perfilam-se ao atual prefeito – haja vista a dificuldade passada pela petista para fazer valer a sua candidatura, frente a um longo e desgastante processo de sabotagem interna, arrastado por meses e liderado por dirigentes locais do PCdoB e, sobretudo, do PV.

Ora, se quase todas as forças em Cariacica estão com Euclério, que outras forças sobram para fortalecer as campanhas de Célia e Ivan Bastos, isto é, para lhes dar justamente aquela “força extra” de que eles muito necessitam não exatamente para virar um jogo em que começam muito atrás, mas para protagonizar uma virada sem precedentes na recente história política capixaba? Fica difícil imaginar.

No que Célia e Ivan podem se fiar, então, na esperança de forçar um (hoje improvável) 2º turno? Em primeira análise, podem investir, é claro, cada um a seu canto, no voto mais ideológico dos respectivos setores do eleitorado representados por eles.

Célia e Ivan, nessa disputa, representam, respectivamente, a candidata do PT e do petismo e o candidato de Bolsonaro e do bolsonarismo. Ambos podem concentrar-se numa estratégia de campanha voltada prioritariamente para os respectivos nichos de eleitores que têm aquele voto ideológico mais enraizado… Se uma estratégia assim for bem-sucedida (com mais petistas votando em Célia, e bolsonaristas em Ivan), é certo que ambos terão condições de crescer…

A questão é se será suficiente para, pelo menos, forçar um 2º turno. Talvez nem isso baste.

A preços de hoje, para que isso de fato aconteça, Euclério teria de cometer uma sucessão de deslizes muito grandes ao longo da curta campanha… Ou, no auge do processo eleitoral, teria de explodir alguma bomba (uma grande operação policial, um escândalo de corrupção)… E (1) talvez nem isso fosse suficiente para ensejar tamanha reviravolta; (2) só estamos aqui a lançar hipóteses, sem nenhum elemento que indique que algo assim possa de fato ocorrer.

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O que explica Euclério como “fenômeno eleitoral”?

Pedaços da resposta já foram lançados acima.

É preciso ter em mente, antes de tudo, que Euclério assumiu a Prefeitura de Cariacica após oito anos de uma administração frustrante do seu antecessor, Juninho, o qual terminou o segundo mandato mal avaliado, mas tão mal avaliado que nem sequer lançou um candidato à sucessão, preferindo “submergir” na campanha de 2020.

É aquela coisa: para quem tem muito pouco, e está acostumado a ter pouco, o pouco que se faça já é muito. Euclério foi beneficiado pelo ponto em que assumiu Cariacica e pelo baixo nível das expectativas da população. O pouco que ele fizesse já valeria muito. Mas sejamos justos: não é que ele tenha feito “pouco”… Ao contrário.

Alicerçado na sua antiga parceria política com o governador e no apoio financeiro e administrativo do Governo do Estado, Euclério fez, nos últimos quatro anos, mais entregas na cidade do que a população cariaciquense estava acostumada a ver. Graças principalmente aos investimentos estaduais, que de repente passaram a irrigar as ruas e a orla da cidade, a administração do ex-deputado pôde deslanchar e capitalizar politicamente.

Segundo relato de fonte próxima a Casagrande, o governador gosta muito mesmo de Euclério, em um nível pessoal. Às vezes, do nada, telefona para o aliado, para saber se ele está precisando de algo. Além disso, Casagrande assumiu, como resolução pessoal, priorizar investimentos em Cariacica, eterna “prima pobre” da Grande Vitória, para equalizar as diferenças entre os municípios da Região Metropolitana.

Essa “dependência excessiva” de Euclério em relação ao governo Casagrande na certa será explorada por oponentes durante a campanha. Mas os frutos eleitorais são colhidos agora por ele.

Ademais, impera reconhecer que Euclério também teve seus méritos. Destacamos aqui dois, regularmente relatados a este colunista por colaboradores do prefeito.

O primeiro é o de, efetivamente, ser um prefeito incansável, daqueles que acordam cedo para trabalhar e assim seguem até a hora de dormir. Faz questão de acompanhar in loco as obras, os serviços, o dia a dia da cidade… Incorporou o “xerife”, o síndico… Cobra da equipe, mas também delega. Eis o segundo ponto.

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Investigador aposentado da Polícia Civil, Euclério tem conhecimentos limitados sobre saúde pública, educação e diversos outros temas inerentes à administração pública. E tem plena consciência disso. O que ele fez tão logo assumiu? Tendo a humildade de reconhecer tais limitações pessoais, cercou-se de gente que sabe e que entende muito mais que ele nas respectivas áreas, dando a cada secretário autonomia para trabalhar.

A “prova viva” disso, personificação do que estamos a dizer, foi a escolha de Euclério para ser sua candidata a vice-prefeita: ninguém menos que Shymenne de Castro (PSB), sua ex-secretária de Governo e Recursos Humanos. É uma técnica da Prefeitura de Cariacica, contadora de carreira da Secretaria de Finanças.

Democracia e oposição: qual papel podem ter Ivan e Célia?

Sendo assim, se não tiverem mesmo chance real de vitória, qual papel cumprirá Ivan Bastos? Qual caberá a Célia?

Respondo: o papel da oposição.

É esse quiçá o papel mais nobre e imprescindível em um regime democrático: o de fazer as críticas necessárias, de apontar as falhas e equívocos da gestão de Euclério (com certeza os há aos montes), de botar o dedo nas feridas certas, de enfatizar o que vai mal na administração e o que é preciso melhorar na prestação dos serviços públicos municipais. Célia, em especial, com seu aguçado senso crítico e sua excelente oratória (lapidada ao longo de décadas de sala de aula), poderá cumprir um papel fundamental nesse aspecto.

Independentemente de quem tenha ou não chances de ganhar, uma eleição é muito mais que mero cumprimento de formalidade exigida pela legislação eleitoral, pela Constituição Federal e pelo nosso sistema democrático de escolha dos governantes e exercício do poder delegado pelo povo, por sufrágio universal.

Se toda unanimidade é burra, o mesmo vale para uma “quase unanimidade” – como aquela diante da qual parecemos estar.

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E, já que citamos Nelson Rodrigues, grande cronista do nosso futebol, citemos também uma velha máxima do velho esporte bretão: “a vitória esconde os erros”. Quando determinado time só vence, partida atrás de partida, pode se criar a falsa sensação de que tudo está perfeito e não há mais nada a melhorar técnica e taticamente. Uma derrota ocasional faz bem.

Tornando da bola à política, as críticas, para qualquer gestor, se feitas com respeito e propriedade, deveriam ser sempre bem-vindas… E o período eleitoral é justamente o momento privilegiado para que elas apareçam.

Euclério, verdade seja dita, governou em céu de brigadeiro, sem uma voz sequer de oposição na Câmara Municipal… E governar sem críticas nem oposição é um negócio perigoso. Além de acomodação e do autoengano de que tudo está perfeito, pode gerar autoritarismo e sensação de onipotência.

Diga-se de passagem, Euclério, por incrível que pareça, nas raras ocasiões em que precisou se haver com críticas, já deu demonstrações de lidar muito mal com elas. As poucas que recebeu de público geraram reação desproporcional, revelando certa veia autoritária, inoportuna e não compatível com um governante que se pretenda democrata… Imagine se tivesse de lidar com oposição verdadeira e ressonante no dia a dia do governo!

Além disso, nos últimos meses, chegaram à coluna relatos, inclusive de gente que habita o governo de Euclério, dando conta de certa paranoia, vigilância e “caça às bruxas” contra servidores da Prefeitura de Cariacica que apoiam Ivan Bastos ou Célia.

Que a oposição, então, faça seu trabalho… Que o prefeito responda a contento. Que tudo se dê dentro dos limites das normas de civilidade e convivência num ambiente democrático.

Que os eleitores falem através das urnas. Que a voz das urnas prevaleça. E que o escolhido exerça com sabedoria o poder a ele delegado pela soberana vontade popular.


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