Coluna Vitor Vogas
A Insustentável Leveza do Ser(gio Meneguelli)
Ex-prefeito ainda pode ter esperanças de manter candidatura ao Senado? O que realmente pode explicar que seu próprio partido lhe puxe o tapete? E o que ainda pode virar o jogo a favor dele?

Estão querendo derrubar Meneguelli do skate. Foto: Facebook de Sérgio Meneguelli
Sérgio Meneguelli é uma pessoa leve, e não só fisicamente (deve pesar menos de 65 quilos e com certeza não passa de 1,65m). É leve também no jeito de fazer política e de encarar a vida, fugindo de formalidades, preconceitos e dogmas, como aliás provou recentemente, em entrevista franca a esta coluna.
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Mas, na mesma entrevista, o levíssimo ex-prefeito de Colatina não pesou bem as palavras, indispondo-se com o comando nacional do próprio partido, o Republicanos. Para seus críticos, toda essa “leveza” se confunde com “leviandade” (em espanhol, um homem que pesa pouco é, literalmente, liviano) e pode ter tornado insustentável a sua pré-candidatura ao Senado pelo Espírito Santo. É o que indica, a princípio, a declaração do presidente nacional do partido de Meneguelli, o deputado federal Marcos Pereira: “Tenho comigo que uma coisa que começa errada tende a terminar errada. Se o cenário é este, talvez seja melhor nem começar”.
Esse posicionamento é definitivo? A candidatura do ex-prefeito de Colatina evaporou mesmo, subiu no telhado, empacotou, foi pelos ares? Ou ainda há salvação para ele? São perguntas que os agentes políticos capixabas se fazem “em peso” neste momento, até porque é preciso colocar na balança o seguinte: com somente uma vaga em disputa, a eleição ao Senado no Espírito Santo será uma com Meneguelli e outra totalmente diferente sem ele.
Se conseguir sobreviver ao terremoto que atingiu sua candidatura, o ex-prefeito de Colatina será um dos favoritos, se não o grande favorito.
Dentro do Republicanos do Espírito Santo, há quem esteja convencido de que, se conseguir ser candidato, Meneguelli será o próximo senador pelo Espírito Santo, no lugar de Rose de Freitas (MDB). Se conseguir ser candidato. O sentimento é compartilhado até dentro do Palácio Anchieta, que vai lançar um representante do grupo de Renato Casagrande (provavelmente, a própria Rose). Sob anonimato, aliados do governador, mesmo tendo o ex-prefeito como adversário eleitoral, o respeitam e o consideram o verdadeiro favorito para o cargo de senador.
Pesquisas de intenção de voto publicadas por outros veículos regionais em maio confirmam a competitividade de Meneguelli: ele largou na ponta, empatado com o ex-senador Magno Malta (PL) – e aí pode morar uma possível explicação para seu abatimento no ar, em plena ascensão.
O que temos no momento é a paradoxal situação de um pré-candidato que, se mantido, tem chances reais de ganhar, mas que pode nem sequer conseguir ser candidato por opção da direção do seu partido. Para ser mais exato, da direção nacional do seu partido.
Por que Meneguelli pode não ser candidato
Em primeiro lugar, é preciso compreender uma coisa: a direção estadual do Republicanos pode até ter seus planos e projetos, mas quem decidirá se Meneguelli será ou não candidato é a cúpula nacional da sigla – altamente vinculada à Igreja Universal do Reino de Deus (IURD) e alguns segmentos evangélicos. Foi essa a ala que se sentiu mais incomodada e ofendida com declarações do ex-prefeito, que criticou, por exemplo, a existência da bancada evangélica e pessoas “conservadoras demais” – segundo ele, “radicais”.
É preciso também ter em mente quem é o Republicanos, hoje, e qual a casa que o partido ocupa no tabuleiro do jogo político pesado que está sendo jogado nacionalmente: nesse xadrez, os dois bispos do partido são peças a serviço do presidente Bolsonaro e jogam para evitar que ele sofra o xeque-mate nas urnas.
No plano nacional, o partido de Meneguelli é um aliado incondicional de Bolsonaro, cujo partido é o PL, cujo presidente no Espírito Santo é o ex-senador Magno Malta, ninguém menos que o principal concorrente de Meneguelli. Entenderam?
No Espírito Santo, não falta quem alimente a teoria de que no fundo, para favorecer Magno (e, extensivamente, Bolsonaro), a direção nacional do Republicanos já queria mesmo se livrar da candidatura de Meneguelli, precisando só de uma desculpa para isso. As declarações do ex-prefeito teriam sido só o pretexto ideal que eles buscavam para sacramentar essa puxada de tapete. Como diz um experiente articulador político capixaba que passou muitos anos em Brasília: “Marcos Pereira não é para amadores”.
Há ainda um fator que não pode ser ignorado e que o próprio Pereira verbalizou em sua resposta à coluna: “Não vejo viabilidade de investir numa pré-candidatura que, lá na frente, pode não ficar no partido, já que senador não tem fidelidade partidária”.
De fato, de maneira questionável, a Justiça Eleitoral entende que a exigência da fidelidade partidária só se aplica a cargos eletivos preenchidos pelo sistema proporcional de votação (vereadores e deputados), mas não a cargos majoritários (incluindo senadores, mesmo que estes também sejam parlamentares). O mandato de um deputado não pertence ao mandatário, mas ao partido pelo qual se elegeu; o de um senador pertence ao senador, que pode trocar livremente de partido no decurso do mandato. Discutível, mas é assim que funciona.
Por esse ângulo, o temor dos dirigentes nacionais do Republicanos seria o de injetar os preciosos recursos da cota do partido em um candidato que, logo após eleito, pode dizer “tchau e bênção” (Meneguelli é católico) e buscar outra legenda. Além de várias outras insinuações que podem ser lidas em suas palavras, foi o que o vereador de Vila Velha Devanir Ferreira quis dizer ao declarar que eles não querem eleger “outro Contarato”.
Por que talvez ainda haja esperanças para Meneguelli
Se nacionalmente o partido é controlado por líderes religiosos evangélicos, no Espírito Santo isso não é bem assim. Na verdade, em solo capixaba, podemos dizer que coexistem dois Republicanos:
De um lado, há o Republicanos da ala evangélica e mais ideológica, representada pelo vice-presidente estadual, Devanir Ferreira, pastor licenciado da IURD – e, aliás, antecessor de Roberto Carneiro no cargo de presidente estadual;
Do outro, há o Republicanos formado por pessoas que até podem ser cristãs, evangélicas etc., mas que é altamente pragmático e vai reto em direção a um projeto de poder estadual que não é limitado por crenças, convicções e valores religiosos. Isso faz parte, mas não é condição.
Esse segundo é o Republicanos do próprio Roberto Carneiro, de Lorenzo Pazolini, de Erick Musso, de Amaro Neto, de Hudson Leal, entre outros. Esse grupo político, jovem na média de idade, tem aspirações políticas legítimas, quer crescer e de fato tem crescido como grupo político local.
Para isso, nos últimos anos, fez uma série de “contratações”. Em 2020, filiou e conseguiu eleger um grande número de prefeitos pelo interior, além de Pazolini em Vitória. Nesse mutirão de filiações de quadros competitivos, ninguém ficou testando os conhecimentos bíblicos dos pré-candidatos nem medindo o seu grau de comprometimento com o conservadorismo e os valores cristãos hasteados no Manifesto do Republicanos.
A direção local do partido filiou essas pessoas com base em um critério simples e pragmático: o potencial eleitoral de cada um. Foi exatamente o que levou Roberto Carneiro e Erick Musso a convidarem Meneguelli a entrar no Republicanos – convite aceito em março de 2020.
Devanir chegou a dizer que Meneguelli precisa explicar por que mudou após se filiar… mas ele não mudou! Todo mundo sempre conheceu o estilo dele, que tem décadas de mandatos em Colatina. Vamos resumir: o cara era amigo íntimo da “conservadora” Elke Maravilha, presa na ditadura militar. E, convenhamos (1): Roberto e Erick não o levaram para o partido por seus valores e opiniões, mas por sua popularidade e densidade eleitoral; convenhamos (2): ninguém estava se importando muito com o que ele pensa… até ele verbalizar tudo o que pensa.
“Ele vai ganhar, pô!”
Revelando esse lado bem mais objetivo do partido, um republicano resumiu para a coluna: “Temos que ser práticos. Se ele for candidato, ele vai ganhar a eleição para o Senado, pô!” Com visão conciliatória, a mesma fonte avalia que, deixando a poeira abaixar, todos os envolvidos devem buscar conversar e se entender. Ou seja, Meneguelli precisa ser ouvido pelos dirigentes.
Pelo que apurei, no que depender de Roberto Carneiro, nem tudo está perdido para Meneguelli. Seu caso ainda pode ter volta. E, no que depender do próprio Meneguelli, ele vai lutar até o fim para sustentar sua candidatura.
Gasto? Que gasto?
Além disso, do ponto de vista financeiro – por conta daquela preocupação relacionada a um “desperdício de recursos” –, a verdade é que a direção nacional do Republicanos talvez nem precise investir na campanha de Meneguelli.
Como self-made politician (um político que se fez sozinho, sem padrinhos e autossuficiente) e com a popularidade acumulada nos últimos anos nas redes sociais, graças à fama – logicamente, falsa e hiperbólica – de “melhor prefeito do Brasil”, Meneguelli pode fazer uma campanha econômica e autossustentável. “Aquele celular dele vale mais que milhões de reais”, sintetiza um republicano.
Ampliação do eleitorado
E, se for estritamente pragmática – e quiser de fato eleger um senador contra Magno, algo incerto, como dito acima –, a direção nacional do Republicanos pode perceber que a pele camaleônica do “conservador super liberal” vestida por Meneguelli pode até ser algo vantajoso do ponto de vista eleitoral.
Ao assumir posicionamentos liberais, ainda que estes se choquem com os “valores cristãos” consagrados nas escrituras do Republicanos, o ex-prefeito pode expandir seu eleitorado para além daquele mais fiel e tradicional do partido (o dos bancos das igrejas), atingindo eleitores de centro e até de esquerda. Pode na verdade tornar-se ainda mais competitivo. Se os bispos o deixarem competir.
Conclusão
Nesse sentido, a resposta dura de Marcos Pereira pode ter sido só um movimento necessário, pontual, a fim de dar uma resposta firme e imediata a uma militância religiosa revoltada com as falas de Meneguelli e sequiosa de linchamento e cassação da pré-candidatura; um movimento calculado para aplacar a ira cristã da ala mais ideológica.
Pode ser que, ao ver as próximas pesquisas e calcular o custo-benefício, a direção nacional da legenda não seja tão intransigente assim nos seus valores, e essa aparente situação irreversível possa ser revertida.
Mas é possível que o levíssimo ex-prefeito leve mesmo uma “foiçada”, como diria o Jair, saída diretamente do Planalto…
Enfim, ainda não é possível determinar com absoluta precisão se a candidatura de Meneguelli foi mesmo para o saco ou se ainda há luz no fim do túnel para ele.
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