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Coluna Vitor Vogas

O papel cumprido no esquema de roubo de heranças pelo juiz Bruno Fritoli

Para MPES, participação do juiz substituto foi “essencial para o êxito das empreitadas” da suposta organização criminosa. Saiba aqui por quê

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MPES faz operação contra juízes e advogados suspeitos de fraude

MPES faz operação contra juízes e advogados suspeitos de fraude. Foto: divulgação MPES

Juízes de Direito, advogados e outros agentes públicos e particulares se organizaram em uma quadrilha para, reiteradamente, com um modus operandi sofisticado, roubar o dinheiro de heranças de pessoas mortas em comarcas do Espírito Santo e de todo o território nacional. Dizendo-o da maneira mais simples, foi esse o esquema milionário desbaratado, na última quinta-feira (1º), pelo Ministério Público Estadual (MPES), por meio da Operação Follow the Money (“siga o dinheiro”, em inglês).

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Segundo a investigação, conduzida em segredo judicial pela Procuradoria-Geral de Justiça (por envolver autoridades com prerrogativa de foro), foram praticadas diversas infrações penais, como os crimes de associação criminosa, lavagem de capitais, corrupção ativa e passiva, falsificação de documento público, particular e ideológica, sendo a prisão preventiva de alguns integrantes da quadrilha “medida imprescindível para o andamento das investigações”.

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Em uma decisão do desembargador Sérgio Ricardo de Souza no processo, datada de 19 de julho e obtida por nossa equipe de jornalismo, o relator do inquérito da Follow the Money registra que as investigações realizadas pelo MPES fornecem indícios de que os investigados utilizavam, reiteradamente, técnicas para identificar pessoas já falecidas, sem herdeiros necessários ou interessados, com valores vultosos em contas de instituições financeiras e/ou imóveis.

Uma vez localizados esses mortos com elevado patrimônio, cheios de dinheiro “parado na conta” e sem ninguém a reclamar essas quantias, os investigados pleiteavam, perante o Poder Judiciário, o cumprimento de supostos acordos extrajudiciais, com bloqueios de contas e bens e, posteriormente, levantamento, liberação e saque de valores.

Em meio ao sofisticado esquema, de proporções nacionais, um juiz “teria sido essencial para o êxito das empreitadas delitivas”, segundo o MPES. Os elementos apurados apontam o magistrado Bruno Fritoli Almeida, agora preso preventivamente e afastado das funções administrativas e judiciais por ordem de Sérgio Ricardo, como integrante de um dos quatro núcleos da suposta quadrilha: o do Poder Judiciário. À época dos fatos investigados, ele atuava como juiz substituto na comarca de Barra de São Francisco e Ecoporanga, no norte do Espírito Santo.

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“As provas produzidas evidenciaram indícios veementes da existência de uma organização criminosa com um nível de organização e capilaridade que ultrapassa as fronteiras do município de Barra de São Francisco. Tal organização se utiliza do Poder Judiciário para postular ações sem lastro probatório mínimo, possivelmente decorrentes de negócios jurídicos fraudulentos ou simulados, com a finalidade de enriquecimento ilícito, mediante a dilapidação do patrimônio de pessoas falecidas”, afirma o MPES.

Os autos permitem concluir que os investigados tiveram êxito em levantar a quantia de R$ 7.084.856,54, por meio de oito alvarás judiciais, identificados até o presente momento nas investigações (mas o número pode ser maior).

“Depreende-se do caderno investigativo que, aparentemente, o advogado Ricardo Nunes de Souza, em conluio com outros advogados e partes, localizavam pessoas falecidas em todo o território nacional, sem herdeiros necessários e com valores vultosos em suas contas bancárias, e ajuizavam ações judiciais com finalidade fraudulenta, a fim de levantar valores sem a percepção por eventuais interessados”, explica o relator nos autos.

Para tanto, eles realizavam acordos extrajudiciais fraudulentos, simulando litígios com outros advogados que “representavam” a outra parte.

“Neste contexto, há fortes indícios de que as lides [processos, disputas jurídicas] que deram origem à tramitação dos processos nas comarcas e que culminaram com o levantamento de importâncias significativas teriam sido simuladas para a obtenção dos valores, objeto da investigação, de forma ilícita”, explana o desembargador.

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“Ressalta-se a complexidade e rapidez da atuação organizacional criminosa, cuja colheita de informações sobre pessoas falecidas, com grandes investimentos bancários paralisados, possui capilaridade em todo [o] território nacional”, observa, ainda, Sérgio Ricardo.

“Quando ajuizada a ação judicial, tramita com enorme celeridade e, em poucos dias, conclui-se o seu intuito criminoso de se apropriar de valores paralisados em conta corrente bancária de vítimas já falecidas”, conclui o relator.

Assim, a organização “raspava o tacho” de falecidos com somas vultosas paradas na conta e sem herdeiro a reclamar a herança.

Eram eles mesmos que “herdavam” tais valores, apropriando-se criminosamente do dinheiro por meio do mesmo modus operandi, baseado na simulação de disputas judiciais pelo “espólio” do morto.

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A participação de Bruno Fritoli Almeida

Registra nos autos o procurador-geral de Justiça, Francisco Martínez Berdeal:

“Com relação ao juiz e investigado Bruno Fritoli Almeida, verifica-se sua participação de suma importância para o êxito do esquema criminoso, uma vez que todos os processos que geraram a presente representação tramitaram sob sua condução processual e obtiveram decisões favoráveis aos demais investigados. Assim, constata-se a existência de veementes indícios de que o magistrado proferia decisões e sentenças em processos possivelmente fraudados, em benefício dos demais integrantes da organização criminosa, sendo que, em algumas oportunidades, chegou a expedir pessoalmente os alvarás para levantamento dos valores, sem que o cartório judicial fosse demandado para tal”.

A participação do juiz no esquema seria fundamental na medida em que ele “proferia sentenças favoráveis aos integrantes da organização criminosa, bem como expedia os alvarás para levantamento dos valores, alguns dos quais somente foram descobertos após diligências encetadas pela Corregedoria do Poder Judiciário, eis que foram confeccionados pelo próprio magistrado sem que o cartório judicial fosse demandado”.

O relator do inquérito, Sérgio Ricardo de Souza, relata que “o procedimento demonstra a existência de indícios veementes de que as decisões judiciais prolatadas pelo magistrado investigado não foram tomadas segundo sua liberdade de decidir ou porque foi levado a erro pelas partes e advogados, existindo informação de que [ele] foi alertado da possível ocorrência de fraude processual, […] não tendo adotado medidas aptas a impedir a continuidade das ações fraudulentas, pelo contrário”.

Além disso, segundo consta no Termo de Visita Correicional realizado pela Corregedoria Geral de Justiça do TJES na 1ª Vara Cível de Barra de São Francisco e na Vara Única de Ecoporanga, em procedimento aberto para apuração de possíveis irregularidades na condução dos processos, “Bruno Fritoli expediu e assinou alvarás judiciais sem a respectiva juntada aos autos, com o intuito claro de impedir a descoberta da fraude”.

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“Por isso”, justifica o relator, “o seu afastamento cautelar se mostra essencial para o aprofundamento das investigações e o descortinamento dos fatos delituosos teoricamente praticados no âmbito da atuação jurisdicional do magistrado, justamente diante da possibilidade deste membro do Poder Judiciário de eliminar provas físicas e eletrônicas constantes nos autos de processos cuja tramitação a si são atribuídas a titularidade e das possíveis testemunhas a serem inquiridas possuírem relação profissional de subordinação e hierarquia com estes magistrados”.

Sérgio Ricardo conclui que, “ante a existência de indícios da prática de crimes pelo magistrado, no desempenho dos cargos e com abuso deles, causando mácula na reputação, credibilidade e imagem do Tribunal de Justiça do Estado do Espírito Santo, estão presentes os requisitos mínimos para o seu afastamento cautelar das funções jurisdicionais. Tal medida é suficiente para evitar qualquer risco de influência em relação aos demais investigados, violação das provas oriundas de sua atividade jurisdicional, intimidação às testemunhas (servidores públicos) ou ingerência na produção de provas”.


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