Coluna Vitor Vogas
Com apoio de Casagrande, Marcelo será reeleito presidente da Assembleia
União Brasil selou apoio ao projeto eleitoral liderado por Casagrande em 2026. Com isso, atual presidente da Ales consolidou sua reeleição com as bênçãos de Casagrande e Ricardo Ferraço em Brasília
Não eram nem 5 horas da manhã e a escuridão ainda dominava as ruas de Cariacica quando Marcelo Santos (União) postou um story anunciando: “O dia vai pegar fogo hoje”. O presidente da Assembleia não se referia somente ao calor previsto para esta quarta-feira (22), já captado pelos termômetros antes de o sol raiar. Ele estava a caminho do Aeroporto de Vitória, onde pegou o primeiro voo da capital capixaba com destino a Brasília. Ao lado dele, embarcaram o governador Renato Casagrande (PSB) e o vice-governador Ricardo Ferraço (MDB). Os três viajaram juntos e com o mesmo objetivo.
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Na agenda oficial do governador, não consta nenhum compromisso. Os três, a princípio, teriam audiência com o ministro dos Transportes, Renan Filho (MDB). Mas a viagem do trio teve outro propósito urgente, de natureza muito mais política: buscar uma audiência com os dirigentes nacionais do União Brasil, presidido desde junho do ano passado pelo advogado Antônio de Rueda, para tratarem da posição do partido no tabuleiro político-eleitoral do Espírito Santo.
A conversa com o presidente nacional do União de fato ocorreu. E teve tudo a ver com a próxima eleição da Mesa Diretora da Assembleia Legislativa do Espírito Santo (Ales), marcada para 3 de fevereiro.
Como já analisamos aqui, a definição do próximo presidente da Casa está muito nas mãos do governador, que tem ampla maioria em plenário e já declarou que apoiará um candidato. Os dois únicos que chegaram a se articular para obter o apoio de Casagrande são o próprio Marcelo, candidato declarado à reeleição, e o deputado Vandinho Leite (PSDB). Este, a princípio, era o preferido de Ricardo Ferraço.
Marcelo já havia consolidado favoritismo na disputa de bastidores. O atual presidente goza de ampla preferência entre os outros deputados. Mas, para sair a declaração de apoio de Casagrande, faltavam alguns ajustes e acertos que passam diretamente pela próxima eleição ao Governo do Estado, em 2026. É aí que entra o União.
Para bancar a reeleição de Marcelo na Assembleia, Casagrande, é claro, colocou um preço. A principal contrapartida esperada era a garantia de que Marcelo e o União Brasil estarão com ele e com Ricardo Ferraço no projeto “sucessão 2026”, apoiando seja Ricardo, seja quem for o candidato do grupo político liderado pelo governador no Espírito Santo.
Essa era a condição principal do governo na definição da presidência da Mesa: o próximo presidente da Assembleia, com mandato até janeiro de 2027, tem de estar firme e forte no projeto conduzido por Casagrande para a própria sucessão. Hoje, a principal aposta do governo é Ricardo Ferraço, como o próprio Casagrande admite, e o vice-governador já começa a trabalhar para se viabilizar.
Em abril de 2026, Casagrande pretende renunciar para ser candidato a senador. Esse é o plano prioritário. Nesse caso, Ricardo assumirá o cargo de governador, tornando-se o “candidato natural” à sucessão. Do ponto de vista do Palácio Anchieta, quem estiver então sentado à presidência da Assembleia não pode criar complicações políticas nem representar nenhum risco para o governador Ricardo Ferraço. E o União, no Espírito Santo, precisa estar comprometido a ficar no palanque montado por Casagrande para a disputa majoritária.
Tudo somado, Casagrande e Ricardo não querem correr o risco de sofrerem um cavalo de pau, até lá, nem de Marcelo nem do União Brasil. Para darem sustentação à reeleição do presidente da Assembleia, eles precisavam ter essa certeza. Esse era o único detalhe que faltava para a formalização de apoio. Agora, a certeza veio.
Casagrande e Ricardo conseguiram o que queriam
Casagrande e Ricardo conseguiram o que queriam. Após a reunião com Rueda, o União Brasil anunciou apoio integral ao projeto eleitoral liderado por Casagrande em 2026 (foto acima). Não falta mais nada para o anúncio de apoio a Marcelo por parte do governador.
O próprio Marcelo Santos declarou:
Hoje, em Brasília, ao lado do governador Renato Casagrande e do vice Ricardo Ferraço, nos reunimos com Antônio de Rueda, presidente nacional do União Brasil. O encontro confirmou o apoio do nosso partido ao projeto político e administrativo liderado pela dupla Renato e Ricardo. Além disso, atendendo a um convite meu e do presidente nacional, o prefeito Euclério Sampaio retornará ao partido, assumindo um papel crucial na Executiva Estadual do ES.
A importância do União Brasil para Casagrande e Ricardo
No Espírito Santo, o União é presidido desde março de 2022 por Felipe Rigoni, reeleito presidente em convenção estadual realizada em abril de 2023. Ele tem mandato à frente da Executiva Estadual até 2027. Nos últimos dois anos, porém, o comando do União no Estado tem sido alvo de um imbróglio político e judicial. Em junho do ano passado, Marcelo entrou no União e tentou tomar a presidência de Rigoni, em articulação direta com Antônio de Rueda. O próprio Casagrande precisou intervir para manter o partido com Rigoni.
Independentemente de quem ficar na presidência estadual – Marcelo, Rigoni ou, agora, Euclério Sampaio –, Casagrande queria manter o poderoso e ascendente partido em sua coligação majoritária em 2026. Com um dos melhores resultados no país nas últimas eleições municipais, a sigla de direita é dona de uma das maiores bancadas na Câmara Federal. Consequentemente, tem uma das maiores cotas do Fundo Partidário e um dos maiores tempos na propaganda eleitoral de TV e rádio.
E ele conseguiu o que queria.
Marcelo tem a preferência dos colegas
Na disputa pela presidência da Mesa Diretora da Ales, o principal “eleitor” se chama Renato Casagrande. Mas, se dependesse só dos deputados estaduais, que realmente votam, Marcelo Santos já estaria reeleito.
Segundo alguns deputados ouvidos pela coluna sob condição de anonimato, o atual presidente “pacificou a Casa” e agrada bastante aos colegas, da esquerda à extrema-direita.
De Camila Valadão, do PSol, a Lucas Polese (PL), Marcelo transita e se relaciona muito bem com todos os colegas, independentemente do partido e do posicionamento político-ideológico. Até com Theodorico Ferraço (PP), agora de volta à Prefeitura de Cachoeiro, ele fumou o cachimbo da paz. Os dois eram inimigos históricos. Theodorico é pai de Ricardo.
Como presidente da Casa, Marcelo adotou uma postura de “defensor da instituição”, na linha “mexeu com um deputado, mexeu comigo”. Emblemática nesse sentido foi sua atuação para ajudar a libertar Capitão Assumção (PL), em fevereiro do ano passado, quando o ministro Alexandre de Moraes determinou a prisão do deputado.
Outro grande exemplo foi sua defesa de Pablo Muribeca (Republicanos) quando, em meio à briga com Sérgio Vidigal (PDT), a Justiça proibiu o deputado de acessar dependências de unidades de saúde na Serra.
Marcelo não cerceia a liberdade de expressão e o exercício do mandato de ninguém. Mesmo sendo aliado de Casagrande, respeita a atuação da oposição. Discretamente, até buscou conter alguns arroubos, por exemplo, de Lucas Polese. O jovem deputado do PL foi o autor dos mais inflamados discursos contra o governo Casagrande em plenário.
Aliás, sob a presidência de Marcelo, o governo não teve quase nenhum trabalho com a oposição na Assembleia. Até o irascível Assumção mostrou-se muito mais contido nos últimos dois anos. Esse é um dos pontos que o governo “deve” a Marcelo. Mas não é o único.
Marcelo foi um bom presidente para Casagrande
Desde que foi levado por Casagrande à presidência da Assembleia, Marcelo soube retribuir, garantindo ao Palácio Anchieta estabilidade política e institucional no relacionamento com a Casa. Ainda mais importante: governabilidade.
Sob a presidência de Marcelo, todo projeto vital para o governo Casagrande passou em plenário, passou bem, passou rápido e, não raro, passou com Marcelo passando o trator por cima sem a menor cerimônia (acelerando votações e até contagens de votos).
Restringindo a análise a esse campo, Marcelo foi um bom presidente para o governo Casagrande. Quem disser o contrário está mentindo. Isso é uma coisa.
A única dificuldade para Marcelo, agora removida, estava naquele “fator excepcional”, justamente o que mais tem peso agora. Governabilidade: check. Estabilidade: check. Mas, quando entramos na coluna “compromisso com o projeto Ricardo”, o governo esbarrou em certa desconfiança com relação ao atual presidente da Assembleia, suscitada pelo próprio Marcelo, devido a uma série de movimentos extra-Assembleia realizados por ele ao longo de 2024, nos terrenos político, partidário e eleitoral.
A pulga atrás da orelha…
Podemos citar, rapidamente, a “esticada de corda” dada por Marcelo, no início do ano passado, dificultando um pouco a ida de Davi Diniz, candidato do Palácio Anchieta, para o cargo de conselheiro do Tribunal de Contas do Estado (TCES); seu apoio a Lorenzo Pazolini (Republicanos), adversário do Palácio, na eleição a prefeito de Vitória; a já citada investida contra Rigoni na disputa pela presidência do União Brasil.
A tudo isso, soma-se um fator de bastidores: Marcelo teria colocado em sérias dúvidas as chances de viabilização eleitoral de Ricardo Ferraço.
Essa “cesta de episódios” gerou dúvidas no governo quanto à lealdade do presidente da Assembleia e ao nível do seu compromisso com a eleição de Ricardo (ou de quem quer que Casagrande apoie para governador) em 2026. Não dá para negar.
É isso, apenas isso, que explica o fato de Marcelo, sendo aliado do governo e querido por todos os pares, não ter ainda recebido o anúncio oficial de apoio do governador, a menos de duas semanas para a eleição da Mesa. É só isso que lhe dificultou (ou retardou) uma reeleição que, em qualquer outro contexto, estaria resolvida sem crise e com bastante antecedência.
Agora, porém, acabaram as dúvidas e desconfianças. A foto acima fala por si.
Marcelo fez sua parte
Para convencer Casagrande a renovar seu apoio a ele, Marcelo tratou de persuadi-lo de que, não obstante alguns desencontros e rotas desalinhadas em 2024, ele está fechado e não abre com o seu projeto eleitoral em 2026, garantindo apoio a Ricardo (ou a quem quer que venha a ser o candidato governista). Vale dizer: nada de levar o seu apoio ao polo que está sendo constituído por Pazolini, Paulo Hartung, entre outros.
Sabendo jogar o jogo e ciente dessa condição, Marcelo se apressou em fazer a devida “correção de rota”: no dia 11 de dezembro, aproveitou uma coletiva de imprensa convocada por ele na Assembleia para renovar suas juras de lealdade a Casagrande. Afirmou categoricamente que estará no projeto de sucessão liderado pelo governador. Fez questão de dizer que seu apoio a Pazolini restringiu-se à disputa em Vitória, e morreu ali. Sublinhou à exaustão a “estabilidade” proporcionada por ele ao governo.
Em suma, Marcelo deu toda a impressão de ter convocado aquela coletiva para transmitir recados principalmente a Casagrande. Ato contínuo, seguiu para o Palácio Anchieta, onde foi recebido pelo próprio no tradicional almoço de fim de ano oferecido pelo governador aos deputados. Na ocasião, ao lado de Casagrande e de Ricardo e diante dos colegas, desdobrou-se em elogios ao vice-governador.
A reunião com Rueda nesta quarta e o anúncio de apoio do União ao projeto de Casagrande e Ricardo selam isso.
Custo político para tirar Marcelo seria muito alto
A favor de Marcelo, é preciso ainda ponderar um último fator: o “custo político” dessa eleição para Casagrande.
Pragmático que só ele, o governador sempre busca o melhor custo-benefício, isto é, o menor custo político em cada situação. Ao confronto, prefere a conciliação de interesses.
Ora, tirar Marcelo da presidência da Ales implicaria um custo político muito alto, bem mais alto do que deixá-lo no comando da Casa.
No curto prazo, a opção mais cômoda para o governo, de engenharia política bem mais simples, é avalizar a permanência de Marcelo. Nesse caso, não é preciso fazer nada. Bastava selar um bom acordo com ele, deixando tudo como está – como de fato foi feito. Com a renovação do apoio, Marcelo já está no lucro.
Já para tirar Marcelo e bancar a eleição de Vandinho, a engenharia seria bem mais complexa.
Em primeiro lugar, Marcelo não aceitaria placidamente perder a presidência e voltar a ser só mais um deputado em plenário, até porque tem altas pretensões eleitorais: quer ser deputado federal. Se perdesse o comando da Assembleia, perderia uma máquina política com orçamento de mais de R$ 200 milhões por ano até a próxima eleição. Teria de ser prodigamente contemplado e compensado – no mínimo, com uma secretaria de alta visibilidade, e não há muitas sobrando neste momento no governo Casagrande…
Além disso, há as centenas de comissionados mantidos na Assembleia, em cargos ligados à Mesa, por Marcelo e pelos deputados mais próximos a ele. Com um novo presidente, tudo isso mudaria, e muita gente sairia perdendo. Sentindo-se igualmente contrariados, aliados de Marcelo que perdessem espaço em uma “nova ordem” na Assembleia também poderiam criar problemas para o Executivo, despejando essa insatisfação em plenário, nas votações de interesse do governo.
Enfim, ao contrário da opção “manter Marcelo”, tirá-lo não seria nada fácil. Teria um custo elevado.
Marcelo também depende do governo em 2026
Marcelo é pré-candidato a deputado federal em 2026. Com isso em mente, também não é interessante para ele romper com o governo Casagrande, pois depende do governador para montar uma chapa competitiva no União Brasil.
A partir do acordo com Marcelo, o governador pode trabalhar para fortalecer a chapa de federais do partido. O primeiro passo é a permanência de Felipe Rigoni e do deputado estadual Bruno Resende, também pré-candidato declarado a deputado federal.
Falando apenas em hipótese, se Marcelo “trair” o governo Casagrande, este pode operar para “realocar” Rigoni e Bruno Resende, enfraquecendo a chapa do partido. O risco para Marcelo é muito alto. Até por suas pretensões, ele também está “preso” a Casagrande.
Eles têm, enfim, uma simbiose: relação de mútua dependência.
Marcelo não concorre com os colegas em 2026
Marcelo é pré-candidato a deputado federal. Vandinho, a priori, é candidato à reeleição para estadual. O fato de Marcelo não ser candidato a estadual – como a grande maioria dos colegas – também agrada muito aos seus pares na Assembleia.
Os deputados em geral não gostam muito da ideia de ver um “potencial concorrente” sentado na presidência da Assembleia. É quase “concorrência desleal”. Já um presidente que vai concorrer a deputado federal pode não só ser apoiado por eles como ajudá-los nos respectivos projetos de reeleição em 2026.
Em vez de concorrente direto, ele vira um parceiro eleitoral, numa relação de “ganha-ganha”.
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