Coluna João Gualberto
A banalização do voto parlamentar
Reflexão sobre a importância do voto responsável revela como escolhas impulsivas podem comprometer o futuro político e social do país

Voto responsável. Foto: Freepik
Conceitualmente, são muitas as chamadas razões de voto dos eleitores. Ou seja, quando votam, as pessoas têm formas diferentes de decidir, dependendo de sua compreensão do papel que o seu escolhido vai desempenhar no sistema político. Um mesmo eleitor pode votar por razões e motivos diferentes, dependendo do cargo que está em disputa.
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Creio que as razões que levam alguém a votar para os cargos ditos executivos (presidente da república, governador do estado e prefeito), no caso brasileiro, não são as mesmas que o fazem decidir nas eleições dos parlamentares, quando são escolhidos vereadores, deputados e mesmo senadores. Creio que, de fato, o voto mais banal no Brasil é aquele para a escolha dos vereadores. Explico melhor.
Em vez de se informar sobre as funções desse importante ator no processo decisório de uma cidade, normalmente a maioria dos eleitores chega quase ao dia das eleições sem saber em quem votar. As pesquisas de opinião mostram que, a 15 dias do pleito, mais da metade dos eleitores ainda não decidiu seu voto para vereador, muitas vezes sem nem mesmo ter pensado sobre o caso. Tanto isso é verdade que existe uma ação eleitoral chamada boca de urna, que, como sabemos, consiste em abordar o eleitor a caminho ou nas proximidades de sua seção eleitoral e oferecer panfletos de determinado candidato, na tentativa evidente de captar seu voto no último minuto.
Por si só, a existência desse tipo de abordagem já demonstra a pouca importância que costumamos dar à eleição para vereador, decidida em cima hora. Normalmente a razão de voto nesse cargo tem a banalidade das pequenas escolhas. O candidato pode ser um parente próximo ou distante, receber o voto em troca de um favor prestado ou mesmo sem razão alguma: diante da obrigatoriedade do voto, simplesmente escolhe-se um nome qualquer. É aí que entra a famosa boca de urna.
Os votos para deputados estaduais e federais exigem um pouco mais de reflexão, afinal não há aquela multidão de candidatos como para as câmaras de vereadores, nem se trata de uma eleição disputada por vizinhos. Como não se sabe exatamente o que fazem os deputados em seus dois níveis, escolhemos o nome mais sonoro, uma liderança comunitária mais perto do nosso cotidiano, alguém que já governou nossa cidade ou até mesmo aquela pessoa que nos desperta uma simpatia pessoal mais forte.
É como se os cargos em disputa não tivessem responsabilidade política nos destinos da sociedade. De fato, pouco sabem os eleitores das funções dos deputados. Levando-se em conta esse desconhecimento relativo, os candidatos prometem o que não podem cumprir, fazem, de propósito, confusão entre o papel legislativo e o executivo. Prometem obras que sabem que não farão. As emendas parlamentares, ao ampliar o papel de carreador de recursos dos deputados federais e dos senadores, confundiu ainda mais os processos de escolha. Os deputados são agora muito mais influentes do que foram no passado na decisão de obras.
Quando analisamos a relevância, por exemplo, da Assembleia Legislativa do Espírito Santo, em sua trajetória histórica de 190 anos, nos damos conta de que ela foi palco de decisões importantes e que por lá transitaram projetos definitivos para a história política capixaba. Tudo que diz respeito ao processo capixaba de desenvolvimento passou por aquela casa, como, por exemplo, o traçado das nossas ferrovias, tão importantes no século XIX e na primeira metade do século XX. Toda a nossa malha logística, como pontes, túneis, portos e rodovias também foram lá discutidas.
Podemos dizer que tudo de importante que o executivo estadual fez em nosso estado foi motivo de muita discussão nas comissões e no plenário da Assembleia. Não apenas as obras físicas, mas elementos como as campanhas de vacinação, as reformas do ensino, o transporte e tantas outras políticas públicas vitais para todos. Escolher o voto para deputado por simpatia ou porque o candidato fez uma campanha engraçada representa riscos e irresponsabilidade.
O mesmo podemos dizer para os que recebem o mais banal dos votos, os nossos vereadores municipais. Eles decidem muitas questões que afetam a vida dos bairros onde vivemos e afetam pontos tão importantes quanto a escola de nossos filhos e o funcionamento das unidades de saúde que usamos.
Os brasileiros costumam sempre desqualificar seus representantes políticos, chamando a atenção para os seus graves defeitos, muitas vezes verdadeiros. Por outro lado, porém, gostam de usar o seu voto para expressar deboche e irreverência. Essa é a raiz do problema: precisamos entender que estamos visceralmente envolvidos nesse processo que tanto criticamos. Por isso, não podemos e não devemos banalizar nosso voto, pois ele é a arma que usamos para intervir na construção da vida política nacional. Voto é responsabilidade.
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