Dia a dia
Julgamento de Bolsonaro: veja os destaques do 1º dia
Primeiro dia teve fala de Moraes sobre pressões, acusação de Gonet com provas da trama golpista e defesa contestando acusações

STF inicia o julgamento de Bolsonaro e de mais sete réus da trama golpista. Foto: Fabio Rodrigues-Pozzebom/ Agência Brasil
O primeiro dia do julgamento de Bolsonaro e outros sete réus pela trama golpista teve recado do ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Alexandre de Moraes, acusação do procurador-geral da República, Paulo Gonet, e defesa dos acusados.
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Moraes, relator do processo, abriu a sessão. Ele citou pressões internas e externas sobre a Corte. No entanto, ressaltou que o papel do Supremo é julgar com imparcialidade e independência.
Na sequência, Paulo Gonet apresentou a acusação. O procurador listou provas que indicam a trama golpista. A defesa do tenente-coronel Mauro Cid, ex-ajudante de ordens de Bolsonaro, destacou a validade da delação premiada. Já os defensores dos demais réus contestaram as acusações apresentadas pelo Ministério Público.
Fala do relator
Antes de iniciar a leitura do relatório, Alexandre de Moraes defendeu a independência do Supremo. Sem citar nomes, afirmou que há uma organização criminosa “covarde e traiçoeira” que atua fora do país contra a Justiça brasileira.
“Uma verdadeira organização criminosa que, de forma jamais vista anteriormente em nosso país, passou a agir de maneira covarde e traiçoeira com a finalidade de submeter o funcionamento da Corte ao crivo de outro Estado estrangeiro.”
Ele também mencionou uma outra ação, aberta a pedido da PGR, que envolve o deputado Eduardo Bolsonaro (PL-SP). Segundo o ministro, o parlamentar teria atuado nos Estados Unidos para apoiar medidas de retaliação contra o Brasil e contra ministros da Corte.
Moraes destacou que a soberania nacional “jamais será vilipendiada, negociada ou extorquida”. Disse ainda que o STF lamenta as tentativas de ruptura democrática no país e relembrou a mais recente, em 8 de janeiro de 2023, que buscava implantar uma ditadura.
Na fala, reforçou que pacificação não pode ser confundida com impunidade. “A pacificação do país, que é o desejo de todos nós, depende do respeito à Constituição, da aplicação das leis e do fortalecimento das instituições, não havendo possibilidade de se confundir a saudável e necessária pacificação com a covardia do apaziguamento, que significa impunidade”.
O ministro também ressaltou que a ação penal segue o mesmo rito das mais de 1,6 mil abertas após os ataques de 8 de janeiro. Segundo ele, réus só serão condenados se houver provas acima de qualquer dúvida razoável. Caso contrário, deverão ser absolvidos.
Acusação de Gonet
O procurador-geral da República, Paulo Gonet, afirmou que não é necessária uma assinatura para caracterizar um golpe de Estado. Segundo ele, as próprias reuniões golpistas já configuram a tentativa.
“Para que a tentativa se consolide, não é indispensável que haja ordem assinada pelo presidente da República para adoção de medidas estranhas à realidade funcional”, disse. Para Gonet, os atos revelam a intenção de ruptura constitucional e de uso da força.
Ele detalhou os fatos que sustentam a denúncia. Entre eles estão ameaças ao Judiciário, ataques às urnas e planos para matar Alexandre de Moraes, Luiz Inácio Lula da Silva e Geraldo Alckmin. Também citou o uso da Polícia Rodoviária Federal para barrar eleitores no Nordeste e a instrumentalização da Agência Brasileira de Inteligência.
O procurador lembrou ainda as reuniões em que se repetia a frase “Lula não sobe a rampa” e os acampamentos em frente a quartéis. Para ele, os atos de terrorismo, como a tentativa de explosão de um caminhão em Brasília e a depredação de prédios públicos em 8 de janeiro, foram “o momento culminante da balbúrdia urdida”.
Segundo Gonet, a omissão em punir “recrudesce ímpetos de autoritarismo” e ameaça a vida democrática. Ele sustentou que Bolsonaro seria o principal beneficiado pela trama e, ao mesmo tempo, líder da organização criminosa que tentou romper a ordem institucional.
“Não há como negar fatos praticados publicamente, planos apreendidos, diálogos documentados e bens públicos deteriorados”, afirmou. Para o procurador, as provas são materiais e comprovam o plano golpista. Ele encerrou pedindo a condenação de todo o núcleo considerado central na articulação da tentativa de golpe.
As defesas
Mauro Cid
A primeira defesa a se manifestar foi a do tenente-coronel Mauro Cid, ex-ajudante de ordens de Bolsonaro. O advogado Jair Ferreira destacou a validade da delação premiada, fechada com a Polícia Federal em 2023, e negou que Cid tenha sido pressionado. Ferreira acrescentou que o militar não tinha conhecimento dos planos para assassinar autoridades, pediu baixa do Exército por não ter condições de seguir na carreira e solicitou a confirmação do acordo de colaboração, com todos os termos firmados.
Em seguida, o advogado Cezar Bittencourt também defendeu Cid, afirmando que não existem fatos concretos que justifiquem a ação penal contra ele. Ressaltou ainda que não há mensagens atribuídas ao militar propondo ou incentivando qualquer atentado contra a democracia, argumento usado para reforçar que a acusação não se sustenta diante das provas apresentadas.
Alexandre Ramagem
O advogado Paulo Cintra, que representa Alexandre Ramagem, ex-chefe da Abin e deputado federal, afirmou que seu cliente não integrava mais o governo federal no período citado pelo Ministério Público como atuação do núcleo central da suposta trama golpista. Ele também negou que Ramagem tenha participado da elaboração de mensagens para desacreditar o sistema eletrônico de votação.
Segundo Cintra, o ex-chefe da Abin não atuava como orientador de Jair Bolsonaro, apenas reunia reflexões do então presidente em documentos como presidente.docx e presidenteinformatse.docx. O advogado rejeitou ainda a acusação de que Ramagem teria utilizado a agência para monitorar autoridades, entre elas o ministro Alexandre de Moraes.
Almir Garnier
O advogado Demóstenes Torres, responsável pela defesa do ex-comandante da Marinha Almir Garnier, afirmou que não existe nexo causal que individualize a conduta do militar em relação às ações ilícitas descritas na acusação. Para ele, a denúncia apresenta uma “narrativa globalizante”, sem detalhar a participação atribuída a cada investigado.
Torres sustentou que, no caso dos acusados apontados como integrantes do chamado núcleo central, é necessário esclarecer de forma objetiva quais atos foram praticados por cada um deles. Ele pediu a anulação da delação de Mauro Cid.
Anderson Torres
A defesa de Anderson Torres, ex-ministro da Justiça, afirmou que a minuta de golpe encontrada em sua casa já circulava na internet antes de ser apreendida. Após a manifestação, o ministro Cristiano Zanin suspendeu a sessão, que será retomada nesta quarta-feira (3).
Bronca de Carmem Lúcia
Durante a sessão, a ministra Cármen Lúcia corrigiu o advogado do deputado Alexandre Ramagem, que tratou voto impresso e voto auditável como sinônimos. Ela destacou que o processo eleitoral brasileiro já é amplamente auditável e frisou que a defesa confundiu os termos.”Uma coisa é a eleição com processo auditável, outra coisa é o voto impresso.”, frisou.
O advogado afirmou que usou as expressões como equivalentes porque esse entendimento ocorreu no contexto da investigação, mas a ministra reforçou a diferença entre os conceitos. “Uma coisa é a eleição com processo auditável, outra coisa é o voto impresso. O que se fez foi o tempo todo dizer que precisava de voto impresso, que tem a ver com o segredo do voto, a lisura e a rigidez do direito de cada cidadã e cidadão votar só de acordo com o que ele pensa e ninguém saber disso.”
