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Coluna Vitor Vogas

TJES quer ampliar gratificação para mais desembargadores

Projeto apresentado na segunda pelo tribunal e quase votado ontem na Assembleia contém um jabuti: um penduricalho que já é pago a ocupantes de alguns cargos de direção no TJES será estendido a outros desembargadores, ocupantes de outras funções

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Tribunal Pleno do TJES durante sessão (14/09/2023). Crédito: Assessoria de Comunicação do TJES

Tribunal Pleno do TJES durante sessão (14/09/2023). Crédito: Assessoria de Comunicação do TJES

Projeto de lei complementar enviado na segunda-feira (7) pelo Tribunal de Justiça do Estado (TJES) à Assembleia Legislativa prevê uma profunda reforma na estrutura administrativa do Poder Judiciário Estadual. Com mais de 30 páginas, o projeto muda quatro leis estaduais. Prevê a criação de 50 cargos comissionados para assessoramento de juízes e de funções gratificadas para servidores efetivos da área de Tecnologia da Informação e Comunicação. Também institui um inédito Laboratório de Inovação e Inteligência Artificial para reforçar essa área, além de novas supervisões e coordenadorias na Justiça Estadual.

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Tudo isso se lê na justificativa oficial do projeto, assinada pelo presidente do TJES, o desembargador Samuel Meira Brasil Jr.

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Uma “mudança extra”, porém, não está na justificativa, mas se encontra lá no meio do projeto: se este for aprovado pela Assembleia e sancionado pelo governador Renato Casagrande (PSB), uma gratificação que já é paga a ocupantes de alguns cargos de direção no TJES será estendida a outros desembargadores, ocupantes de outras funções na estrutura do tribunal.

No jargão legislativo, é o chamado “jabuti”: medida inserida em um projeto de lei que trata de assunto totalmente diferente. É o caso do penduricalho em questão. Mesmo não sendo oficialmente o objeto da proposição do TJES, nem constando na ementa do projeto, “passará” de toda maneira e também se tornará lei se o projeto for sancionado.

O penduricalho em questão é previsto pela Lei Complementar nº 234, de 2002, que trata do Código de Organização Judiciária do Estado do Espírito Santo. Essa lei prevê o pagamento de uma gratificação aos desembargadores que exerçam cargos de chefia no TJES. O valor corresponde a um percentual do subsídio dos desembargadores, incorporado ao contracheque dos beneficiados.

O percentual varia conforme o cargo ocupado. O benefício se soma à remuneração de cada um. Em linguagem do dia a dia, é um extra.

Hoje, o benefício “só” é pago ao presidente do TJES (30% do subsídio de um desembargador); ao vice-presidente (25%); ao corregedor-geral de Justiça e ao vice-corregedor (20% cada um); aos presidentes de Câmaras Isoladas, ao ouvidor judiciário, aos supervisores e ao diretor da Escola da Magistratura (15% cada um).

Além disso, os membros do Conselho Superior da Magistratura recebem uma gratificação no percentual de 1/30 dos vencimentos (3,33% do subsídio) por sessão a que comparecerem.

O projeto que tramita na Assembleia amplia essa lista. E aumenta o percentual para os membros do Conselho Superior da Magistratura.

Se o projeto for aprovado e sancionado, os membros do Conselho Superior da Magistratura passarão a ter direito a uma gratificação mensal fixa correspondente a 15% do salário dos desembargadores.

Além disso, a gratificação de 15% passará a ser paga, mensalmente, aos membros da Comissão de Reforma do Judiciário, aos membros da Comissão de Regimento Interno e à chefe da Ouvidoria da Mulher do TJES.

Quem já recebe a gratificação, do presidente ao diretor da Escola da Magistratura, seguirá a recebê-la nos percentuais já previstos e discriminados acima.

Calculadora: o incremento salarial

Hoje, o salário bruto de um desembargador é de R$ 41.845,49. Desse modo, com a gratificação, os respectivos vencimentos saltam para:

Presidente

  • Gratificação: R$ 12.553,64 (30%)
  • Total: R$ 41.845,49 + R$ 12.553,65 = R$ 54.399,13

Vice-presidente

  • Gratificação: R$ 10.461,37 (25%)
  • Total: R$ 41.845,49 + R$ 10.461,37 = R$ 52.306,86

Corregedor-geral de Justiça e vice-corregedor

  • Gratificação: R$ 8.369,09 (20%)
  • Total: R$ 41.845,49 + R$ 8.369,09 = R$ 50.214,58

Presidentes de Câmaras Isoladas, ouvidor judiciário, supervisores, diretor da Escola da Magistratura e, se o projeto virar lei, também a ouvidora da Mulher, os membros do Conselho Superior da Magistratura, da Comissão de Reforma do Judiciário e da Comissão de Regimento Interno

  • Gratificação: R$ 6.276,82 (15%)
  • Total: R$ 41.845,49 + R$ 6.276,82 = R$ 48.122,31

O cálculo, logicamente, só diz respeito ao benefício em análise. Não considera uma série de outros penduricalhos a que os desembargadores têm direito.

Sem acúmulo

É importante ressaltar que um mesmo desembargador não pode acumular essa gratificação pelo eventual exercício de dois ou mais cargos de chefia. Se o novo projeto do TJES for sancionado, essa vedação seguirá valendo. Nesse caso, o desembargador deve escolher (optando, naturalmente, pelo maior percentual).

Para darmos um exemplo concreto, o atual presidente do tribunal, Samuel Meira Brasil Jr., também é um dos cinco membros titulares do Conselho Superior da Magistratura. Ele não pode acumular os 30% de gratificação que já recebe pelo exercício da presidência com a gratificação a que teria direito pela participação no Conselho.

A “pegadinha”

A extensão do penduricalho no TJES está bem “nas letras miúdas” do extenso projeto de lei complementar enviado à Assembleia. Foi preciso ler com lupa seus artigos e comparar com a redação vigente das leis que se quer modificar.

De acordo com o Art. 2º do novo projeto apresentado, o Art. 127 da Lei Complementar 234/2002 passa a vigorar com nova redação.

Abaixo, podemos comparar as redações do mesmo artigo.

Redação atual (vigente):

Art. 127. Pelo efetivo exercício, além dos subsídios, perceberão mensalmente, o Presidente 30% (trinta por cento), o Vice-Presidente 25% (vinte e cinco por cento), o Corregedor-Geral da Justiça 20% (vinte por cento), o Vice-Corregedor 20% (vinte por cento), e os Presidentes de Câmaras Isoladas, o Ouvidor Judiciário, os Supervisores e o Diretor da Escola 15% (quinze por cento), respectivamente, a título de gratificação, vedada a acumulação, mas permitida, no entanto, a opção. (Redação dada pela Lei Complementar nº 788, de 19 de agosto de 2014)

Redação dada pelo projeto em tramitação na Ales (grifos nossos):

Art. 127. Pelo efetivo exercício, além dos subsídios, perceberão mensalmente, o Presidente 30% (trinta por cento), o Vice-Presidente 25% (vinte e cinco por cento), o Corregedor-Geral da Justiça 20% (vinte por cento), o Vice-Corregedor 20% (vinte por cento), e os Presidentes de Câmaras Isoladas, o Ouvidor Judiciário, a Ouvidora da Mulher, os Supervisores, os membros do Conselho Superior da Magistratura, os membros da Comissão de Reforma do Judiciário, os membros da Comissão de Regimento Interno e o Diretor da Escola 15% (quinze por cento), respectivamente, a título de gratificação, vedada a acumulação, mas permitida, no entanto, a opção.

Os potenciais beneficiados com a extensão

Hoje, os membros do Conselho Superior da Magistratura são os desembargadores:

  • Samuel Meira Brasil Junior (presidente)
  • Namyr Carlos de Souza Filho (vice-presidente)
  • Willian Silva (corregedor)
  • Fernando Estevam Bravin Ruy (efetivo)
  • Fernando Zardini Antonio (efetivo)
  • Arthur José Neiva de Almeida (suplente)
  • Jorge Henrique Valle dos Santos (suplente)

Os membros da Comissão de Reforma do Judiciário são os desembargadores:

  • Samuel Meira Brasil Junior (presidente)
  • Helimar Pinto (efetivo)
  • Arthur José Neiva de Almeida (efetivo)

Já os membros da Comissão de Regimento Interno são os desembargadores:

  • Robson Luiz Abanez (presidente)
  • Fernando Zardini Antonio (efetivo)
  • Jorge Henrique Valle dos Santos (efetivo)

A atual chefe da Ouvidoria da Mulher é a desembargadora Rachel Durão Correia Lima.

Nomeações de juízes bloqueadas

Apesar de ampliar gratificações para servidores e desembargadores, criar 50 cargos comissionados de assessoria e novos órgãos no TJES, o projeto apresentado, segundo a justificativa do presidente do tribunal, representará economia de R$ 6,5 milhões até o fim de 2027.

A explicação para essa “mágica” não consta na justificativa do projeto. Mas reside em um dos seus últimos artigos (de novo: só lendo com lupa). O tribunal pretende bloquear a nomeação de juízes que poderiam atuar em algumas Varas e Juizados nas cidades de Vitória, Vila Velha, Cariacica e Colatina.

Trata-se de cargos para exercício da magistratura que existem oficialmente na estrutura do TJES, mas que não se encontram providos. Poderiam ser preenchidos por futuro(s) concurso(s) público(s), mas, se o projeto virar lei, o preenchimento de tais vagas ficará bloqueado.

Foi a maneira encontrada para “compensar” as despesas a serem geradas com a criação dos cargos comissionados e funções gratificadas.

Por outro lado, essa “compensação” não está clara o bastante: se essas vagas para juízes não estão providas, onde será feita a economia? Como posso “deixar de gastar” algo que já não estou gastando?

Quando deve ser votado?

O projeto de lei do TJES foi pautado para votação pelo presidente da Assembleia Marcelo Santos, na terça-feira (8), em sessão extraordinária, mediante aprovação de requerimento de urgência protocolado por ele mesmo. Durante a extraordinária, contudo, o presidente retirou o projeto de pauta e anunciou que pretende colocá-lo em votação na próxima segunda-feira (14).

Mais e mais benefícios

O Código de Organização Judiciária do Estado do Espírito Santo traz uma lista impressionante de benefícios que ajudam a compreender por que, frequentemente, os vencimentos totais de juízes e desembargadores em um mês ultrapassa os R$ 100 mil, furando com sobras o teto constitucional, correspondente ao subsídio dos ministros do STF.

Tecnicamente, tais auxílios, gratificações, vantagens pessoais e eventuais não são considerados verbas remuneratórias, por isso não são descontados pela regra do abate-teto.

De acordo com a referida lei, além da gratificação de que trata esta coluna, pelo exercício de função de direção, os magistrados da ativa do Poder Judiciário do Espírito Santo têm direito a:

. salário-família.

. diárias.

. indenização de transporte, desde que o magistrado não use veículo oficial para ir trabalhar.

. gratificação pela prestação de serviço à Justiça Eleitoral (hoje, um juiz de Direito ganha mais R$ 6.350,51 para atuar na 1ª instância, enquanto um desembargador recebe mais R$ 10.042,88 para atuar no TRE-ES).

. gratificação adicional de 5% por quinquênio de serviço.

. gratificação de 10% sobre seus vencimentos, quando membro do Colégio Recursal.

. gratificação de 10% para o juiz diretor do Foro, somente para os casos em que a função seja exercida cumulativamente com a atividade jurisdicional, calculada sobre seus subsídios.

. gratificação por prestação de serviços extraordinários, correspondente, para juízes e desembargadores, a 1/30 dos vencimentos, por sessão ou plantão judiciário, limitado, no tribunal, ao máximo de cinco sessões mensais.

. ajuda de custo para despesas relativas ao exercício funcional, paga em cada exercício, equivalente a um subsídio integral.

. auxílio-saúde, fixado por resolução do Conselho da Magistratura.

. ajuda de custo, de caráter indenizatório, no valor de um subsídio integral, quando nomeados ou promovidos, para atender às despesas de mudança e transporte.

. gratificação de 10% do subsídio mensal, quando requisitados ou designados para a prestação de serviço permanente no Gabinete da Presidência, da Vice-Presidência, no auxílio da Corregedoria Geral de Justiça, neste caso, limitado a um magistrado, bem como nas Coordenadorias criadas no âmbito do TJES.

. três meses de férias-prêmio a cada quinquênio ininterrupto de serviço público.

. gozo de férias anuais remuneradas com adicional de 1/3 do salário normal.

Há, ainda, o auxílio-alimentação, atualmente no valor de R$ 2.643,58 para desembargadores e juízes de Direito.