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Coluna Vitor Vogas

STJ revoga prisão de ex-juiz suspeito de roubar heranças no ES

Acolhendo pedido da defesa de Bruno Fritoli, ministro Reynaldo Soares da Fonseca concedeu a ele habeas corpus e substituiu prisão por cautelares. Destituído do cargo pelo STF, Fritoli foi investigado, preso e denunciado na Operação Follow The Money. Para o MPES, ele era peça fundamental em organização criminosa que fraudava processos judiciais para liberar e sacar dinheiro parado de pessoas mortas sem herdeiros no ES

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Fachada da sede do TJES. Crédito: Assessoria do TJES

O ex-juiz Bruno Fritoli Almeida foi posto em liberdade nesta terça-feira (12) por decisão do Superior Tribunal de Justiça (STJ). Acolhendo pedido de habeas corpus formulado pela defesa do ex-juiz, o ministro Reynaldo Soares da Fonseca, relator do recurso, revogou a prisão preventiva decretada no dia 1º de agosto pelo desembargador Sérgio Ricardo de Souza, do Tribunal de Justiça do Estado do Espírito Santo (TJES). O ministro substituiu a prisão por medidas cautelares impostas contra Fritoli pelo mesmo desembargador, em decisão anterior, de 19 de julho.

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Investigado na Operação Follow the Money, deflagrada em 1º de agosto, e denunciado pelo Ministério Público do Espírito Santo (MPES), Fritoli é suspeito dos crimes de organização criminosa, lavagem de capitais, corrupção ativa, corrupção passiva, fraude processual e falsidade documental.

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De acordo com as investigações conduzidas pelo Grupo de Atuação Especial de Combate ao Crime Organizado (Gaeco) do MPES, ele seria peça fundamental de uma organização criminosa que teria se especializado em se apropriar ilegalmente do “dinheiro parado” de heranças não reclamadas. O funcionamento do suposto esquema é esmiuçado aqui.

Segundo o MPES, os integrantes da suposta quadrilha conseguiriam sacar o dinheiro das heranças por meio de ações judiciais simuladas e acordos fraudulentos. O papel fundamental cumprido pelo então juiz no esquema seria o de emitir sentenças em processos supostamente fraudados, movidos por advogados que integravam a mesma organização criminosa.

Os alvarás emitidos pelo então juiz determinavam a liberação de valores milionários de contas de pessoas já falecidas sem herdeiros, em favor dos representantes das partes, em disputas jurídicas simuladas. Assim, os advogados integrantes do esquema conseguiam sacar os valores, que eram então redistribuídos entre os membros da suposta associação criminosa.

As investigações foram conduzidas em sigilo, tendo o desembargador Sérgio Ricardo de Souza, do TJES, como relator do inquérito. O processo ainda tramita em segredo de Justiça.

No dia 19 de julho, a pedido do MPES, o relator determinou a aplicação de medidas cautelares em face de Fritoli, que já era suspeito de atuar, na condição de juiz, para ameaçar e coagir testemunhas e advogados. Àquela altura, ele também já era investigado, na esfera administrativa, pela Corregedoria Geral de Justiça do TJES. Nessa primeira decisão, o relator também determinou a suspensão do porte de armas do então juiz, que dispunha de um arsenal em seu nome: uma carabina, uma espingarda, uma pistola e um rifle.

Duas semanas depois, atendendo a novo pedido do MPES, o desembargador Sérgio Ricardo decretou a prisão preventiva (sem prazo determinado) de Fritoli. A principal alegação foi a de que, por sua autoridade e sua atuação como juiz, ele poderia seguir buscando ameaçar testemunhas e interferir na instrução processual, além de possibilidade de violação ou eliminação das provas oriundas de sua atividade jurisdicional.

Ainda na condição de juiz, Fritoli foi preso preventivamente na manhã do dia 1º de agosto, data da fase ostensiva da Operação Follow The Money, deflagrada pelo Gaeco com o apoio da PMES. Na mesma data, foram cumpridos outros mandados de prisão contra empresários e advogados que também fariam parte da suposta organização, além de outro juiz de 1º grau, Maurício Camatta (obrigado a usar tornozeleira eletrônica). A operação foi autorizada por Sérgio Ricardo, que expediu todas as ordens de prisão e de medidas cautelares. A organização suspeita foi desbaratada.

No mesmo dia, por ser juiz de direito, Fritoli foi conduzido a uma cela especial no Quartel de Maruípe, sede da PMES, na capital do Espírito Santo. O relator também decretou o afastamento cautelar de Fritoli do cargo de juiz, mantido em decisão do Pleno do TJES, na tarde de 1º de agosto.

No dia 12 de agosto, por decisão do ministro Nunes Marques, do Supremo Tribunal Federal (STF), Fritoli perdeu o cargo de juiz de direito (saiba mais abaixo).

Em 23 de agosto, o procurador-geral de Justiça, Francisco Martínez Berdeal, chefe do MPES, denunciou Fritoli e outras 19 pessoas na Operação Follow The Money. Eles são acusados de corrupção, lavagem de dinheiro, organização criminosa e uso de documento falso.

Além da condenação, o MPES pede o pagamento de R$ 34 milhões em dano moral coletivo.

O MPES considera que a participação de Bruno Fritoli Almeida no esquema investigado na operação era de “suma importância”. O procurador-geral de Justiça apontou “veementes indícios” de que o então magistrado assinava despachos em processos fraudados. Em alguns casos, de acordo com a investigação, ele expediu pessoalmente os alvarás para levantamento de valores em contas de pessoas já falecidas, sem acionar o cartório judicial.

Alguns alvarás só foram descobertos após investigações da Corregedoria Geral de Justiça do TJES. O órgão de investigação interna identificou alvarás assinados pelo juiz sem nem sequer anexar os respectivos documentos aos autos de processos, “com o intuito claro de impedir a descoberta da fraude”.

Os investigadores passaram a suspeitar da ligação de Fritoli com a “máfia das heranças” ao constatar que parte do valor de um alvará de R$ 1,7 milhão, expedido por ordem do então juiz, foi usada para quitar parcela de um rancho de 321 mil metros quadrados em Ecoporanga, cidade de 25 mil habitantes no norte do Espírito Santo, situada a cerca de 310 quilômetros de Vitória.

À época dos fatos investigados, ele atuava como juiz substituto justamente na comarca de Barra de São Francisco e Ecoporanga.

> O papel cumprido pelo juiz Bruno Fritoli no esquema de roubo de heranças investigado pelo MPES

Perda do cargo de juiz

Em 2023, Bruno Fritoli Almeida perdeu o cargo de juiz de direito na Justiça Estadual do Espírito Santo. Essa confusão remonta ao concurso público do TJES prestado por Fritoli para ingresso na magistratura, como juiz substituto, em 2014. Mesmo tendo sido reprovado em uma fase do concurso, ele conseguiu ser nomeado em maio de 2015. Desde então, vinha se mantendo no cargo por força de decisões judiciais… até que, em 2023, o TJES o exonerou do cargo.

Fritoli, então, recorreu ao Conselho Nacional de Justiça (CNJ). O ministro Luiz Felipe Salomão, corregedor nacional de Justiça, o reinvestiu no cargo, liminarmente. Mas, no dia 12 de agosto deste ano, o ministro Nunes Marques, do Supremo Tribunal Federal (STF), revogou a liminar do CNJ, destituindo-o do cargo de juiz. Firitoli já estava preso havia 11 dias no Quartel de Maruípe.

Transferência de presídio

Relator da ação criminal no TJES, o desembargador Sérgio Ricardo negou habeas corpus reclamado pela defesa de Fritoli, representada pelos advogados Rafael Lima, Larah Brahim e Mariah Sartório.

No início deste mês, além de manter a prisão de Fritoli, o relator determinou sua transferência para a Penitenciária de Segurança Média 1, no município de Viana, uma unidade comum do sistema prisional do Espírito Santo. O motivo da mudança, segundo a decisão, foi a perda do cargo de juiz de direito e das prerrogativas inerentes à função pública. O acusado de fato chegou a ser transferido, passando a cumprir sua prisão preventiva, como preso comum, na referida penitenciária em Viana.

Os advogados de Fritoli recorreram ao STJ.

Os fundamentos da decisão

Autor da decisão favorável a Fritoli, o ministro Reynaldo Soares da Fonseca avaliou que ficou “evidente o constrangimento ilegal” do ex-juiz.

Além de revogar a preventiva, o ministro impôs “o restabelecimento da primeira decisão, de 19/7/2024, que aplicou ao paciente [Bruno Fritoli] as medidas cautelares alternativas à prisão, as quais podem ser readequadas pelo Relator do processo [Sérgio Ricardo de Souza], em razão da nova realidade processual”.

O ministro do STJ concedeu o habeas corpus com base, sucintamente, em três argumentos apresentados pela defesa.

O primeiro é que, a esta altura, Fritoli já foi até denunciado, não havendo mais que se falar em “coação de testemunhas no curso da investigação”: “A investigação foi concluída, a denúncia foi ofertada e o paciente continua preso sem qualquer outro motivo superveniente”, anotou o ministro.

O segundo é que as supostas ameaças aludidas pelo MPES estariam relacionadas à sua antiga condição de juiz e autoridade do Poder Judiciário, a qual ele já não exerce desde 12 de agosto – há exatos três meses, portanto: “[…] tais ameaças também estão relacionadas à condição de magistrado, que não mais subsiste”.

O ministro acrescentou: “[…] embora a nova decisão [de Sérgio Ricardo] tenha feito menção a outros aspectos para manter a prisão para resguardar a ordem pública, reitero que tais motivos não se sustentam. A uma, porque o paciente foi afastado das funções de juiz, não havendo risco de reiteração; e, a duas, porque a investigação foi concluída e a denúncia oferecida, não havendo mais razões para prisão preventiva com a finalidade de interromper as ações de suposta organização criminosa, já identificada e desarticulada”.

O terceiro argumento é que, segundo o ministro, o próprio relator do processo, desembargador Sérgio Ricardo de Souza, em despacho de sua lavra, já teria reconhecido que não houve propriamente fato novo entre sua decisão de decretar medidas cautelares contra Bruno Fritoli, no dia 19 de julho, e a sua decisão posterior de expedir a ordem de prisão contra o então magistrado, cumprida em 1º de agosto; o desembargador teria reconhecido, ainda, que Fritoli não descumpriu as medidas cautelares antes da ordem de prisão, mesmo sem ter conhecimento de que tais cautelares já pesavam contra ele:

“Como visto, o Relator reconheceu que as autoridades tinham conhecimento dos fatos relacionados à supostas ameaças quando foram decretadas as medidas cautelares. Reconheceu também que as declarações foram apresentadas em momento posterior à primeira decisão que aplicou medidas cautelares para justificar a prisão, mesmo não tendo o paciente descumprido as medidas impostas, das quais nem tinha tomado ciência”, registrou Reynaldo Soares da Fonseca.

“Portanto, não há dúvida de que as declarações com os registros das supostas ameaças já existiam antes da decretação da prisão, situação fática antecedente omitida no primeiro pedido e posteriormente inserida no segundo tão somente para agravar a situação do paciente. Esse contexto demonstra a desnecessidade da prisão, visto que não ocorreu fato superveniente a justificar a determinação da restrição total da liberdade do paciente imposta, em agravamento à decisão anterior que aplicou medidas cautelares restritivas”, concluiu o ministro.

Traduzindo em bom português: para o ministro, as cautelares teriam bastado desde o início, razão pela qual ele ordenou que se volte a esse ponto.


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