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Coluna Vitor Vogas

Secretário da Fazenda: “Não temos rombo fiscal no Governo do Estado”

Benicio Costa explica o espantoso aumento das despesas públicas e do deficit primário previsto para este ano pelo governo Casagrande

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Benicio Costa é o secretário estadual da Fazenda. Foto: Divulgação (Secom-ES)

A princípio, os números assustam. A olho nu, a impressão é a de que a saúde fiscal do Espírito Santo está piorando. Por meio de um projeto de lei enviado para a Assembleia Legislativa e aprovado nessa terça-feira (21) pelos deputados, o Governo do Estado mexeu na Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO) e mudou (para pior) as metas fiscais estabelecidas até o fim do atual mandato do governador Renato Casagrande (PSB). Em 2024, o resultado primário será pior que o previsto inicialmente, assim como nos próximos dois anos.

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No entanto, segundo o secretário estadual da Fazenda, Benicio Suzana Costa, não há motivo algum para preocupação: “Não é um rombo fiscal. O resultado primário precisa ser visto por um conjunto de outras variáveis e não influencia em nada a nossa nota na Capag [Capacidade de Pagamento], atribuída anualmente pelo Tesouro Nacional. Há muitos anos o Espírito Santo é nota A [a melhor de todas] e continuaremos sendo nota A. Aliás, o Tesouro Nacional mudou sua metodologia e, pela primeira vez, dará aos estados a classificação A+, que é ainda melhor. Estamos caminhando a passos largos para pularmos para a nota A+, para sermos um dos poucos ou até o único estado com essa nota máxima”.

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O resultado primário pode não influenciar no “selo de saúde fiscal” do Espírito Santo, atribuído pelo órgão do Ministério da Fazenda, mas precisa ser compreendido em todas as suas nuances. Para o atual exercício, o governo inicialmente previa um deficit primário de R$ 244,5 milhões. Agora, admite um deficit primário de R$ 1,7 bilhão, piora de quase R$ 1,5 bilhão na meta fiscal.

A boa notícia é que a receita primária será maior que a prevista na LDO, pois o desempenho da arrecadação estadual está melhor que o esperado para este ano. Antes, o governo projetava uma receita primária de R$ 21,6 bilhões. Agora, reviu esse número para R$ 22,9 bilhões, o que corresponde a um aumento de R$ 1,3 bilhão.

Por outro lado, a despesa primária também foi revista para cima, em uma escala maior que a do aumento da receita. Na LDO, o governo previa R$ 21,8 bilhões. Agora, corrigiu essa previsão para R$ 24,6 bilhões, o que representa R$ 2,8 bilhões a mais em gastos primários só neste ano, conforme a tabela abaixo (em valores correntes e em R$ 1 mil):

Meta prevista na LDO de 2023

Meta revista

Variação

Receitas primárias (I)

R$ 21.648.900

R$ 22.904.134

+ R$ 1,3 bi

Despesas primárias (II)

R$ 21.893.470

R$ 24.607.538

+ R$ 2,8 bi

Resultado primário (I – II)

deficit de R$ 244.570

deficit de R$ 1.703.405

R$ 1,3 bi – R$ 2,8 bi =

– R$ 1,5 bi
(deficit R$ 1,5 bi maior que o previsto)

Portanto, o aumento da despesa supera o aumento da receita. Neste ano, o governo vai arrecadar mais que o esperado, mas vai gastar muito mais que o esperado, o que resulta na expansão do deficit primário.

Ainda assim, segundo o secretário da Fazenda, não há motivo para pânico, nem mesmo para preocupação. Reconhecendo que, para um olhar leigo, os números podem assustar, Benicio Costa procura apagar o incêndio com a explicação a seguir.

R$ 7,1 bilhões na poupança: “O governo tem dinheiro para investir”

Segundo Benicio, o governo decidiu gastar mais porque tem condições de investir mais sem ameaçar em nada o equilíbrio fiscal e financeiro do Estado. Em contabilidade pública, investimento entra como despesa, até porque não deixa de ser um tipo de gasto.

De acordo com o secretário, hoje a dívida pública do Estado é muito baixa e está absolutamente sob controle, enquanto a poupança do Estado (que não entra no cálculo do resultado primário) é muito alta: hoje, segundo o secretário, está em cerca de R$ 7,1 bilhões, dinheiro acumulado no caixa do Tesouro Estadual graças a superavits praticados nos últimos cinco anos.

E é precisamente a combinação destes dois fatores, endividamento baixo com poupança elevada, o que levou o governo a decidir expandir seus gastos com investimentos públicos até 2026. Não faz sentido, segundo Benício, fazer superavit atrás de superavit como um fim em si mesmo. O objetivo do ente público que persegue o superavit primário é fazer caixa para conseguir investir ou para reduzir a dívida pública. Como o Governo do Espírito Santo não precisa se preocupar nem com uma coisa nem com a outra, pode se permitir praticar deficit primário este ano e em 2025, sem que isso tire o sono de ninguém nem afete em nada o seu “selo de bom pagador”.

O Estado já tem dinheiro em caixa e não precisa economizar para abater a dívida pública… logo, não tem por que ficar perseguindo superavit primário e pode gastar mais do que vai arrecadar este ano, de maneira planejada e sem dor na consciência. A alternativa seria continuar economizando, juntando esse dinheiro em caixa sem gastar (o que, aliás, foi motivo de críticas de adversários de Casagrande na última campanha eleitoral).

Mas, se o governo tem perfeitas condições de reverter parte dessa poupança para ampliar o gasto público com investimentos sociais, ainda que isso em termos orçamentários gere um deficit primário, ora, por que não fazê-lo? É o raciocínio exposto pelo secretário:

“A palavra ‘deficit’ assusta um pouquinho, mas precisa ser compreendida dentro de um contexto. O deficit é preocupante quando você precisa gerar caixa para investir ou para pagar dívida. O Espírito Santo hoje tem muita poupança, e o nosso endividamento é negativo. Não faria sentido ficarmos fazendo superavit primário, porque o superavit serve basicamente para duas coisas: ou para fazer poupança ou para pagar dívida. A maioria dos estados têm dívidas grandes, então eles fazem superavit para pagar suas dívidas. A nossa dívida corrente líquida é baixa, enquanto a nossa poupança é alta, então não faz sentido ficarmos fazendo poupança agora se podemos fazer mais investimentos”.

Como destaca o chefe da Sefaz, é importante que o Espírito Santo acelere agora os gastos com investimentos públicos para se preparar melhor para os impactos negativos que a reforma tributária sobre o consumo, aprovada pelo Congresso no ano passado, certamente vai acarretar sobre a arrecadação estadual em poucos anos.

“Nossos benefícios fiscais vão acabar a partir de 2033, mas, a partir de 2029, já vão começar a se desidratar. E 2029 é logo ali. Então é importante darmos um upgrade agora nos investimentos porque, com isso, vamos conseguir preparar melhor o Espírito Santo para o futuro.”

R$ 600 milhões a mais em gastos com pessoal

O secretário enfoca muito o gasto na forma de investimento, mas, diante da pergunta inevitável, ele também admite: parte desse aumento de quase R$ 3 bilhões na previsão de despesas primárias em 2024 decorre da necessidade de o governo ampliar os gastos com o funcionalismo público estadual.

No fim do ano passado, o governo concedeu um reajuste escalonado, em quatro parcelas até dezembro de 2026, para servidores da área da segurança pública. Agora, acaba de conceder reajuste linear de 4,5% para os cerca de 97 mil servidores ativos, aposentados e pensionistas vinculados à folha de pagamento do Estado. Segundo Benicio, cerca de 20% desses quase R$ 3 bilhões a mais (algo em torno de R$ 600 milhões) serão direcionados a gastos extras com pessoal só neste ano.

“É lógico que aí entra um pouquinho de despesa com pessoal, que é despesa orgânica. Temos a entrada de novos servidores, o reajuste linear, a progressão de carreira de servidores. Então temos aí um pedacinho, uns 20%, para despesa com pessoal. Desses quase R$ 3 bilhões, R$ 600 milhões, no máximo, vão cobrir gastos com pessoal. O resto é investimento, principalmente em infraestrutura, para prepararmos o Espírito Santo para o futuro sem incentivos fiscais.”

R$ 700 milhões para recuperar cidades do sul do ES

Uma ressalva feita pelo secretário é que, ao revisar as metas fiscais para 2024 e os próximos dois anos, o Governo do Estado foi extremamente conservador: pelo “princípio da prudência”, jogou para cima a previsão de despesa primária e pode ter subestimado a previsão de receita primária, gerando essa diferença negativa (o deficit primário) de R$ 1,7 bilhão. Mas isso não necessariamente vai se cumprir e, dependendo do desempenho dos números, esse deficit poderá ser menor do que o projetado agora.

“O princípio da prudência nos manda sempre jogar a receita para baixo e a despesa para cima, porque devemos sempre prever o pior cenário possível. Isso não quer dizer que teremos esse aumento todo de despesa, enquanto o aumento da receita pode ser até maior, então provavelmente essa diferença será menor. O cenário provavelmente vai ser de um desempenho de receita maior e um desempenho de despesa menor do que está ali. Mas é bom lembrar que tivemos uma catástrofe recente no sul do Estado, então achamos por bem jogar a despesa para cima. Estamos prevendo R$ 700 milhões a mais em gastos neste ano só para recuperar essas cidades atingidas pelas inundações em março”, revela o secretário.

“Questão orçamentária”

Por um ângulo mais técnico, Benicio também explica que o cálculo do resultado primário é muito mais uma questão orçamentária do que retrato da situação financeira do Estado. Isso porque, por metodologia, se o governo pega parte da sua poupança (dinheiro guardado graças ao superavit de anos anteriores) e gasta de alguma forma no atual exercício, esse dinheiro entra no cálculo da despesa primária deste ano, mas não é incluído no cálculo da receita primária, ou seja, só é contabilizado como despesa em 2024.

Isso, segundo o secretário, gera uma “distorção orçamentária”: “Se pegamos receita de um exercício anterior para fazer um investimento neste ano, isso gera uma aparente distorção orçamentária. Quando falamos de resultado primário, estamos medindo as receitas e despesas do mesmo exercício. Se você tirar dinheiro da sua poupança e investir, por exemplo, na construção de um hospital, você cria uma despesa contabilizada naquele exercício, mas não cria uma receita. Na contabilidade, esse dinheiro entra como despesa do exercício, mas não entra na parte da receita”.

Para facilitar a compreensão, ele faz uma analogia com o nosso orçamento doméstico:

“Imagine que você tem sua casa lá, seu apartamento, tem as despesas do seu dia a dia e quer fazer uma reforma. Para fazer essa reforma, você tem duas opções: ou vai ao banco pegar um empréstimo ou, se você tiver uma poupancinha, você pega um pedaço da sua poupancinha e investe nessa reforma. Com isso você estará criando uma despesa nova naquele ano, mas não estará criando uma receita nova. No seu orçamento doméstico, você pode ter um ‘deficit primário’ naquele ano, mas você ainda tem a maior parte da sua poupança preservada.”

O crescimento da arrecadação

O secretário ainda faz outra ressalva de ordem técnica: mesmo com deficit primário estimado agora em R$ 1,7 bilhão para 2024, é perfeitamente possível que o Estado feche o ano no azul, ou seja, o Estado pode fazer, ao mesmo tempo, deficit primário e superavit nominal.

“Você ter um deficit primário não quer dizer que você terá deficit orçamentário no final do ano. Isso porque o deficit primário leva em consideração só as receitas primárias correntes. Só que o Estado também tem outras receitas que não entram nessa conta do resultado primário. Um bom exemplo foi a venda da ES Gás. Então, ao mesmo tempo, o Espírito Santo pode fazer deficit primário e superavit nominal. Isso vai depender muito do desempenho das receitas, mas é muito comum e é perfeitamente possível.”

Segundo Benicio, o desempenho da arrecadação estadual até agora neste ano está indo muito bem, superando as expectativas do próprio governo. “No primeiro quadrimestre, tivemos um crescimento real de 14% na comparação com o mesmo período do ano passado. Então temos um cenário muito bom para o Estado.”

A dívida pública

Por fim, de acordo com o secretário, em abril deste ano, a dívida pública total do Estado era de R$ 7,6 bilhões, com uma disponibilidade bruta de R$ 9,9 bilhões, o que resulta em uma dívida líquida negativa de R$ 2,3 bilhões (equivalente a – 9,58% da receita corrente líquida estadual).

“É importante frisar que a maior parte dessa dívida é de médio e longo prazo, e nossa disponibilidade de caixa é bem maior que a dívida. O Espírito Santo é o único Estado com essa situação tão confortável.”


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