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Coluna Vitor Vogas

Saiba por que pré-candidato do PL foi preso em operação do MPES

Juíza manteve prisão temporária do veterinário e político Thiago do Nascimento, investigado pelos crimes de extorsão e lavagem de dinheiro. Coluna explica o caso em detalhes e traz novos elementos sobre a investigação, o cumprimento da ordem de prisão e a audiência de custódia realizada ontem

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Thiago Nascimento ao centro, entre Gilvan da Federal e Pastor Carlos Salvador. Foto: Reprodução Instagram

Em audiência de custódia realizada no fim da tarde de ontem (24), a juíza Paula Cheim Jorge, titular da 2ª Vara Criminal de Vila Velha, decidiu manter a prisão temporária do veterinário, empresário e autodeclarado “político de direita” Thiago Oliveira do Nascimento (PL), decretada por ela mesma, a pedido do Ministério Público Estadual (MPES).

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Tratado até então (mas não mais) por agentes políticos do PL como possível candidato do partido à Prefeitura de Vila Velha, Nascimento foi preso na última terça-feira (23) na Operação Criptovet, conduzida pelo Grupo de Atuação Especial de Combate ao Crime Organizado (Gaeco) do MPES.

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Filiado ao PL desde o fim de outubro, o veterinário e empresário bolsonarista é investigado pelos crimes de extorsão e lavagem de dinheiro. O procedimento investigatório criminal corre em segredo de Justiça. Foi instaurado a partir de denúncia formulada, no último dia 19 de outubro, pela suposta vítima da extorsão: um empresário multimilionário da Índia.

Casado e pai de dois filhos, o empresário começou a se relacionar com uma brasileira em 2015, em um caso extraconjugal. O relacionamento durou até 2020. Depois disso, de acordo com a investigação do MPES, a moça voltou a morar no Brasil – precisamente, em Vila Velha – e se envolveu amorosamente com Thiago do Nascimento. Este, então, segundo apurou o Gaeco, descobriu não só o caso amoroso pregresso da mulher com o milionário indiano, mas fotos comprometedoras dos dois juntos, entre outros dados armazenados por ela ao longo do relacionamento que constituem provas do affair extraconjugal e intercontinental.

Em poder desse material, conforme a investigação do MPES, o veterinário capixaba entrou em contato com o empresário indiano em 2021, ameaçando divulgar as imagens comprometedoras para a imprensa internacional, a família do empresário e seu círculo social, caso ele não lhe pagasse a quantia exigida em troca do silêncio.

Temendo por sua reputação e consequentes perdas para seus negócios – sobretudo tendo em vista o contexto empresarial e cultural tradicionalíssimo de seu país de origem –, o indiano, por mais de dois anos, cedeu à chantagem de Nascimento, que perdurou até a última terça-feira, dia da prisão do veterinário e ex-possível candidato a prefeito pelo PL.

Durante esse tempo, a soma dos valores repassados pelo empresário a Nascimento em troca do seu silêncio chegou perto de R$ 9 milhões, considerado o câmbio de hoje, segundo apurações do MPES.

As quantias eram repassadas para o autor da chantagem por meio de transferências ou pagamentos em carteiras de criptomoedas como Bitcoin ou Ethereum (daí o nome dado pelo Gaeco à operação). Precisamente, o Gaeco identificou um total de 19 transações do empresário indiano em favor do veterinário capixaba, movimentando US$ 1.803.613,00. Vejam bem: isso é “apenas” o que os investigadores conseguiram comprovar, por ora.

As suspeitas de lavagem de dinheiro

Aos membros do Gaeco, causou espanto a acelerada evolução patrimonial do investigado. As autoridades envolvidas no inquérito pretendem acionar o Conselho de Controle de Atividades Financeiras (Coaf) para compartilhamento de informações.

Como a quantia acumulada em dois anos era logicamente incompatível com os rendimentos de um veterinário e seria impossível explicar a origem das somas vultosas, Nascimento, segundo a investigação do Gaeco, passou a operar para lavar o dinheiro sujo, visando dar aparência de legalidade ao patrimônio multiplicado ilegalmente. Como? Com base nas apurações do MPES, movimentando as quantias por meio de transações imobiliárias e empresariais.

Só nos últimos dois anos, apontam as investigações do MPES, Nascimento movimentou mais de R$ 5 milhões em compra e venda de imóveis no município de Vila Velha, entre terrenos, sala comercial, vagas de garagem e apartamentos localizados nos bairros Itaparica, Itapuã e Praia da Costa, área mais valorizada do município. Em agosto de 2022, ele adquiriu um apartamento duplex de 350 metros quadrados a uma quadra do mar em Itapuã.

Aos integrantes do Gaeco, também não passou em branco o fato de que, desde 2021, o médico veterinário abriu algumas empresas para além de sua área de atuação profissional. A lista inclui uma empresa de produções sediada na Praia da Costa, com capital social de R$ 120 mil, uma de material de construção na Praia de Itaparica com capital social de R$ 120 mil e uma segunda empresa de material de construção com capital social de R$ 600 mil.

Chamou a atenção do Gaeco que, só cinco meses após ter constituído sociedade com o pai nesse último negócio, o investigado tenha se retirado da empresa, vendendo suas cotas de R$ 300 mil – no que o MPES enxerga como indício de outro método de lavagem de dinheiro.

Tampouco passou despercebido o crescimento exponencial, em intervalo curtíssimo, do capital social de sua empresa original, a clínica veterinária Animed, situada na Praia da Costa: entre 2019 e 2023, o número declarado saltou de modestos R$ 30 mil para R$ 1,5 milhão. Imagens extraídas do Google Maps também provam que a clínica passou por uma substancial reforma, tanto interna quanto externa, de 2021 para cá.

Há ainda uma outra empresa, chamada Construcater Ltda., aberta por ele com três sócios e com capital social de R$ 1 milhão. Sócio majoritário, o veterinário entrou no negócio com R$ 700 mil, o equivalente a 70% das cotas. Ao MPES, causou estranheza o fechamento da empresa somente oito meses após sua criação.

O súbito crescimento patrimonial do “veterinário mais próspero de Vila Velha” também se refletiu na seara eleitoral.

Em 2022, em sua primeira empreitada nas urnas, a maior parte de sua campanha a deputado estadual foi bancada com doações de uma pessoa física: ele mesmo. Ironicamente, ele foi candidato pela Rede Sustentabilidade, partido de esquerda federado com o PSol, mas o próprio se descreve no Instagram como “político de direita”.

Na ocasião, à Justiça Eleitoral, Nascimento declarou patrimônio total de quase R$ 10 milhões em bens e R$ 350,8 mil como valor total recebido por sua campanha, sendo ao menos um terço revertido do próprio patrimônio. O valor é muito acima da média para um candidato a deputado estadual de primeira viagem, em um partido nanico como a Rede.

Ele hoje é suplente da deputada Camila Valadão (PSol) na Assembleia Legislativa, tendo tornado-se figura pública e nutrindo aspirações políticas maiores, como evidenciam suas postagens no Instagram desde o último dia 26 de outubro, data de sua filiação ao PL, sob as bênçãos de personalidades do partido como o senador Magno Malta e o deputado federal Gilvan da Federal.

A maré começa a virar

Em outubro, no entanto, quiçá cansada de ser tão coagida, a vítima da extorsão procurou o MPES, formulando a representação e robustecendo a denúncia com farto material comprobatório: e-mails e mensagens trocadas em inglês com Nascimento ao longo do período, com tradução juramentada em português.

Eis que no dia 6 de dezembro, com a investigação já instaurada, o Gaeco, liderado pelo promotor de Justiça Thiago Pinhal, pediu à juíza Paula Cheim Jorge a adoção de uma série de medidas, concedidas pela magistrada, as quais propiciaram o aprofundamento das apurações: interceptação telefônica dos celulares usados pelo veterinário; quebra de sigilo telemático de suas duas contas de e-mail; quebra de sigilo de dados, inclusive telemáticos, de seus arquivos guardados em nuvem; e interceptação dos metadados de suas contas de Whatsapp.

Resumindo: Nascimento tornou-se então um alvo, grampeado por todos os lados. Poucos dias depois, como o veterinário seguisse contatando a vítima a fim de lhe extrair ainda mais dinheiro, o Gaeco solicitou à 2ª Vara Criminal que autorizasse a realização de busca e apreensão de objetos em imóveis do suspeito.

As diligências foram autorizadas, mas os mandados levaram mais de um mês para serem cumpridos. Por que ficaram em aberto por tanto tempo? Porque teve início, então, um jogo de gato e rato.

O investigado deslocava-se bastante, viajando sempre de madrugada. Desde a expedição dos mandados, ele viajou, por exemplo, para Portugal e para Teixeira de Freitas, no sul da Bahia (bem no dia em que o Gaeco planejava cumprir a ordem de busca e apreensão). No meio do caminho, veio o recesso do Judiciário, bem na virada do ano.

Até que na última segunda-feira (22), por meio do sistema de interceptação e monitoramento georreferenciado, o Gaeco descobriu que, no dia seguinte, o alvo se encontraria hospedado no Hotel Sheraton, na Praia do Canto.

Para enfim conseguir dar cumprimento aos mandados de busca e apreensão e cessar as tentativas de extorsão contra o empresário da Índia, o MPES, na terça-feira mesmo, solicitou à titular da 2ª Vara Criminal de Vila Velha a decretação da prisão temporária de Nascimento. Deferindo o pedido, a juíza expediu a ordem de imediato. No mesmo dia, foram cumpridos os mandados de prisão e, finalmente, as medidas de busca e apreensão.

Um detalhe que chama a atenção é que, no mesmo dia, pouco antes de ser preso, o veterinário chegou a enviar uma última mensagem à vítima da extorsão a fim de pressioná-la. Como consta nos autos, Nascimento ameaçava sua presa diariamente, em tom que se tornou mais ameaçador e agressivo no decorrer de 2023.

Também ficou mais descuidado com o passar do tempo (ou, simplesmente, deixou de medir riscos e consequências). Se no início da coação, ainda em 2021, valia-se de perfis falsos e até de números de terceiros para entrar em contato com o empresário indiano, em dada altura chegou a lhe informar espontaneamente o próprio nome, endereço e até números de documentos pessoais, objetivando receber um vultoso pagamento via transferência bancária.

Na terça-feira, o suspeito foi localizado e preso no referido hotel cinco estrelas da Praia do Canto. Dali, foi conduzido para o Centro de Detenção Provisória de Viana 2, onde está custodiado. Além dos objetos apreendidos com ele no quarto do hotel, os mandados de busca e apreensão foram cumpridos em outros imóveis associados a ele, como o luxuoso apartamento duplex (em reforma) onde ele mora, a uma quadra do mar, na Praia de Itapuã, além de outro apartamento no mesmo bairro e de um terceiro na Praia da Costa.

A audiência de custódia

Ontem, primeiro dos cinco dias de prisão temporária, na 2ª Vara Criminal de Vila Velha, foi realizada a audiência de custódia de Thiago Oliveira do Nascimento, representado no caso pelos advogados Carolina da Silva Fração, José Alarcon Bechara e Nilzemery Gomes Kempim.

Da audiência, presidida pela juíza Paula Cheim Jorge, também participaram dois integrantes do Gaeco: Thiago Pinhal e o também promotor de Justiça Luciano Rocha de Oliveira. Todos, inclusive o próprio Nascimento, participaram por videoconferência. Os representantes do MPES pediram a manutenção da prisão temporária, enquanto a defesa requereu a soltura do investigado, salientando os fatos de ele nunca ter sido preso antes, reunir bons antecedentes e manter residência fixa.

A juíza decidiu manter a prisão temporária.

Ela entendeu que, não obstante a argumentação da defesa quanto à desnecessidade da prisão, há nos autos elementos que indicam exatamente o contrário.

Para a magistrada, em face da obstinação de Nascimento na prática do suposto delito, a prisão se prova necessária como meio de cessá-la de uma vez por todas, além de evitar a sensação de impunidade e o descrédito nos órgãos estatais instituídos.

A segregação, alegou ela, mostra-se imprescindível neste momento para as investigações em curso relacionadas à suposta conduta ilícita por parte do investigado. Em liberdade, avaliou Cheim Jorge, o suspeito certamente representaria obstáculo à colheita de provas, podendo inclusive intimidar a vítima e testemunhas, haja vista que, de 2021 até o momento da prisão, manteve a coação, a extorsão e as ameaças em face do milionário empresário indiano.

Ainda segundo o entendimento da titular da 2ª Vara Criminal de Vila Velha, com base na leitura dos autos, destacadamente os diálogos entre vítima e investigado, é possível constatar fortes indícios de autoria e participação, em tese, de Thiago Oliveira do Nascimento nos crimes em apuração.

A juíza também manteve, por ora, o sigilo dos autos.

Nessa sexta-feira (26), será aberto o lacre do material apreendido nos imóveis de Nascimento.

O MPES provavelmente pedirá à juíza a prorrogação da prisão temporária por mais cinco dias. Findo esse prazo, poderá, em tese, requerer a conversão da temporária em prisão preventiva (por tempo indeterminado).


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