Coluna Vitor Vogas
Por que Euclério Sampaio entrou na briga pelo Senado?
Analisamos os desdobramentos eleitorais dessa reviravolta do prefeito. Como o próprio Euclério Sampaio ganha com isso? Como Casagrande e Ricardo Ferraço também se beneficiam?

Euclério Sampaio é prefeito de Cariacica. Foto: assessoria da Prefeitura de Cariacica
Mudando radicalmente a posição ocupada por ele no tabuleiro eleitoral capixaba, Euclério Sampaio (MDB) lançou-se, para valer, como pré-candidato a senador, na última segunda-feira (25). Protagoniza, assim, uma reviravolta. “Estou muito animado”, afirmou. Impulsionado pelo apoio de igrejas importantes no meio evangélico, como a Assembleia de Deus e a Quadrangular, o prefeito de Cariacica não só se lançou como começou a se movimentar: nesta terça-feira (26), almoçou com seis vereadores de Vitória e um de Vila Velha.
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A reorientação de Euclério nesse jogo tem múltiplos desdobramentos. Em primeiro lugar, das primeiras declarações dadas pelo prefeito à coluna sobre o tema, a única em que é muito difícil acreditar é a de que ele ainda pretendia conversar sobre isso com o governador Renato Casagrande (PSB) e o vice-governador Ricardo Ferraço (MDB). Ora, Euclério é não só um dos principais aliados de Casagrande como é, no momento, o maior apoiador da pré-candidatura de Ricardo a governador na Grande Vitória. Nesse jogo de xadrez, ele não faz nenhum movimento sem antes combinar muito bem combinado com os dois.
É preciso partir da premissa de que a entrada de Euclério na briga pelo Senado e o novo papel que ele passa a cumprir nesse jogo atende aos interesses estratégicos do Palácio Anchieta. Ponto. Ao mesmo tempo, fortalece o próprio prefeito no referido tabuleiro. O inesperado lançamento de Euclério favorece, ao mesmo tempo, ele mesmo, Ricardo e Casagrande. De quais maneiras? Vamos lá.
O próprio Euclério
Em primeiro lugar, ao se apresentar como pré-candidato ao Senado pelo grupo de Casagrande, Euclério fortalece a si mesmo. Volta a ser um player importante na mesa de negociação da qual vai sair a coligação governista em 2026, a mesma na qual já têm assento os principais aliados e líderes partidários da coalizão de Casagrande – com este sentado a uma cabeceira, e Ricardo à outra. Aliás, ao fazer esse movimento, Euclério recupera o lugar à mesa que ele havia perdido quando recuou de ser candidato a governador para apoiar Ricardo. Agora, amplifica muito o seu poder de negociação.
Querem um exemplo? Para muita gente, o verdadeiro sonho dourado de Euclério é ser candidato a vice-governador de Ricardo (quiçá por outro partido que não o MDB). Ora, agora o prefeito tem uma candidatura a senador para negociar nesta mesa: “Olha, até topo desistir de ser candidato ao Senado em favor de algum aliado, desde que…”
Ricardo Ferraço
Em segundo lugar, Ricardo se beneficia. Investigador aposentado da Polícia Civil e pastor licenciado da Igreja do Evangelho Quadrangular, Euclério tem excelente trânsito junto a entidades de classe de forças estaduais de segurança pública e convenções formadas por líderes religiosos evangélicos. Prova disso foi dada nos últimos dois dias. Já na largada da sua pré-campanha, recebeu nota pública de apoio de todas as convenções das Assembleias de Deus no Espírito Santo (com influência política direta sobre um mar de fiéis) e da própria Igreja do Evangelho Quadrangular.
Como principal cabo eleitoral de Ricardo Ferraço na Grande Vitória, Euclério poderia realizar pessoalmente o elo da pré-campanha do filho de Theodorico com tais segmentos? Poderia. Mas também essa operação agora é potencializada. Uma coisa é Euclério tentar “angariar” apoios políticos para Ricardo sendo “só” prefeito de Cariacica. Outra coisa é ele efetuar essa mesma operação como pré-candidato ao Senado. Aí vira uma pré-campanha casada, facilitando a transferência de apoios. “Olha, vocês estão me apoiando para o Senado, mas meu candidato a governador é Ricardo. Peço a vocês que o apoiem também”.
Casagrande
Em terceiro lugar, o movimento de Euclério pode beneficiar profundamente Renato Casagrande. O governador é, potencialmente, o maior beneficiário. E isso por vários motivos.
Não tem deputado do PL, não tem prefeito do Republicanos… Nas convicções pessoais, nas crenças religiosas professadas, na ideologia verdadeiramente abraçada, não consigo ver hoje, na Grande Vitória, um líder político que possa ser mais corretamente apontado como um “conservador de direita” do que Euclério Sampaio. Em algumas matérias, beira o reacionarismo. Como prefeito isso se dilui um pouco, mas Euclério é, na essência, um ultraconservador de direita.
A Renato Casagrande, convém ter ao seu lado um segundo candidato ao Senado exatamente com esse perfil, dividindo com ele a mesma chapa. Por que não? Do ponto de vista ideológico, os dois são bastante diferentes. Casagrande está na centro-esquerda. Mas Euclério é, antes de tudo, um aliado do governador que já deu reiteradas provas de sua fidelidade incondicional.
Jogando como pré-candidato à segunda vaga no Senado, Euclério ajuda Casagrande a minar as possíveis candidaturas de outros aspirantes ao Senado que, como o prefeito de Cariacica, pertencem à direita conservadora, mas que, diferentemente do prefeito, são adversários de Casagrande. Exemplo gritante é a publicitária Maguinha Malta (PL), filha do senador Magno Malta (PL). Euclério, por seu perfil, pode tirar da filha de Magno alguns votos de eleitores de direita (mas não de extrema-direita), bolsonaristas mas nem tanto.
Emblemática nesse sentido foi a declaração de Euclério à coluna na segunda-feira, logo após se lançar (ou ser lançado por igrejas): “Eles [pastores] sabem que minha postura é a mesma há 25 anos. Eu faço o que prego. Tem gente que prega ‘Deus, pátria, família’ e não pratica isso…”. A indireta tem endereço certo.
Considerando que haverá duas vagas no Senado em disputa e que cada eleitor terá direito a dois votos para o cargo, Euclério pode ajudar Casagrande a receber o segundo voto dos eleitores dele, se ambos forem parceiros de chapa.
O próprio prefeito poderá pedir seu segundo voto para Casagrande, e vice-versa. Por divisão de palanque, campanha casada, afinidade política etc., alguns eleitores de Euclério, sabendo-o aliado de Casagrande, poderão confiar a ele o seu segundo voto ao Senado – mesmo que Casagrande, de direita, tenha muito pouco.
Pressão sobre Da Vitória
O movimento de Euclério também pode ser interpretado como uma forma de colocar uma espada na cabeça de um grande amigo e antigo parceiro político dele: o deputado federal Josias da Vitória (PP), futuro presidente estadual da Federação União Progressista (União Brasil + PP).
Da Vitória já afirmou ter disposição para ser candidato majoritário (a governador ou a senador). Também já declarou que construirá o projeto eleitoral majoritário (Governo do Estado e Senado), à frente da federação, em diálogo com Casagrande e Ricardo Ferraço.
Mas até agora não anunciou se é pré-candidato a senador; não declarou explicitamente apoio a Ricardo para governador; e mantém aquele jogo ambíguo de deixar um pé na canoa do Governo do Estado e outro na da Prefeitura de Vitória, cuja vice-prefeita é Cris Samorini, do PP, e cujo prefeito é Pazolini, potencial adversário do governo Casagrande na corrida ao Palácio Anchieta.
Todo o papel estratégico atribuído acima a Euclério poderia ser perfeitamente cumprido por Da Vitória, líder político de direita e eleitor de Bolsonaro em 2022 (embora não tão conservador quanto Euclério nos costumes). Só que o deputado até agora não marcou posição de forma mais assertiva.
Euclério, então, entrou nesse vácuo. Tipo: “Olha, machão, você não diz se quer ou se não quer… eu tô querendo!”. “Machão” é como o prefeito costuma chamar seus aliados.
Trata-se, pois, além de tudo, de uma maneira de pressionar Da Vitória a mergulhar de uma vez por todas no projeto do Palácio Anchieta.
Reação ao movimento de Vidigal com Hartung
Como registramos aqui, Sérgio Vidigal (PDT) foi conversar pessoalmente, no último dia 18, com o ex-governador Paulo Hartung (PSD). Como o próprio ex-prefeito da Serra relatou à coluna, ele foi ao encontro de Hartung por “missão pessoal” e incentivou o ex-governador a examinar a ideia de voltar a concorrer ao Senado. “Precisamos de dois bons nomes lá”, justificou Vidigal. O primeiro “bom nome”, apoiado pelo ex-prefeito, é o de Casagrande.
Desse modo, o movimento de Euclério também pode ser lido como uma reação ao de Vidigal. Tipo assim: “Se Vidigal está indo ao campo adversário para tentar convencer o inimigo a ser candidato ao Senado, por que é que eu também não posso me lançar a essa vaga?”
De novo: reação palaciana, não do Prefeito individualmente.
Almoço com vereadores de Vitória
Sem brincar em serviço, Euclério convidou vereadores de Vitória, “invadindo” o território de Pazolini, para almoçarem com ele nesta terça-feira. Comeram uma boa picanha em uma churrascaria da cidade. A adesão não chegou a ser ruim: seis vereadores compareceram. Entre eles, sintomaticamente, os três do PSB, partido de Casagrande.
Mas na certa teria sido maior a mesa se não fosse pela “operação esvaziamento” ditada pela gestão de Pazolini. Seguindo a orientação de cima, repassada por emissários do prefeito de Vitória, muitos deixaram de atender ao convite de Euclério. No almoço, o prefeito de Cariacica falou animadamente de sua pré-candidatura ao Senado.
Os comensais foram estes:
- Aloísio Varejão (PSB)
- Armandinho Fontoura (PL) – que “profetizou” o lançamento de Euclério, em discurso na Câmara de Vitória, na semana passada
- Baiano do Salão (Podemos)
- Bruno Malias (PSB)
- João Flavio (MDB)
- Pedro Trés (PSB)
De quebra, participou do almoço um vereador de Vila Velha: Patrick da Guarda (PL).
