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Coluna Vitor Vogas

Helder anuncia que topa vir a governador pelo PT. Com condições

“Se nós tivermos uma candidatura pra valer, vocês podem ter certeza que eu posso, sim, representar o Partido dos Trabalhadores na eleição para governador do Espírito Santo. Agora, não brinquemos com isso”, discursou deputado, na posse do novo Diretório Estadual do PT-ES, sob gritos e “Helder governador”

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Helder Salomão pede calma à militância, durante a posse do novo Diretório do PT-ES. Foto: Rodrigo Gavini

Helder Salomão pede calma à militância, durante a posse do novo Diretório do PT-ES. Foto: Rodrigo Gavini

Na Bíblia, o Rei Salomão expressou sua sabedoria no célebre episódio da “divisão do bebê”. Julgando o caso em que duas mulheres reivindicavam a maternidade da mesma criança, o rei proferiu uma falsa sentença: partiria o bebê ao meio, dando uma parte (sem vida) para cada uma. Na verdade, foi um modo de descobrir a verdadeira mãe, testando a reação das duas reclamantes. Ele sabia que a real genitora preferiria ceder a criança a ver o filho morto. De fato, ao ouvir a sentença, uma das duas implorou pela vida do bebê; o rei, assim, pôde identificá-la como a verdadeira mãe.

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Outro Salomão, de nome Helder – aliás, ex-seminarista –, está hoje repartido ao meio, como aquele bebê teria sido. Na plenária de posse do novo Diretório Estadual do PT no Espírito Santo, na manhã de sábado (13), sob os gritos de “Helder governador!”, quem se expôs à militância do PT, em discurso muito franco, foi um Helder dividido em dois, visivelmente tomado por um grande conflito interior. Falando muito seriamente sobre o tema, em resposta aos anseios da militância, o deputado federal e ex-prefeito de Cariacica expressou o tamanho da responsabilidade e do dilema pessoal vivido por ele neste momento, entre ser ou não ser candidato a governador do Espírito Santo.

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A posse do novo Diretório, muito simbolicamente, foi realizada na terra de Helder, no auditório do Ifes de Cariacica, cidade governada por ele de 2005 a 2012. Durante o ato, não faltaram incentivos para que o PT lance mesmo candidato próprio a governador do Espírito Santo e para que Helder abrace essa missão. Até aliados de outros partidos expressaram apoio à ideia, como a deputada estadual Camila Valadão (PSol) e o ex-secretário estadual de Saúde Nésio Medeiros (PCdoB).

Mais importante: o próprio deputado estadual João Coser, eleito e empossado como novo presidente estadual do PT, assumiu, no discurso de posse, um compromisso perante a militância: “Vamos trabalhar para que o PT tenha uma candidatura ao Governo do Estado”. No entendimento de Coser, Helder saiu do evento como pré-candidato a governador pelo PT, com base no teor do próprio discurso. “Vocês ouviram o que o Helder falou.”

E o que foi que o Helder falou?

De fato, o deputado se disse pronto para assumir qualquer tarefa e colocou-se à disposição do partido e da militância para ser candidato a governador… mas somente se cumpridas uma série de condições. Helder, a priori, é pré-candidato a deputado federal, na chapa da federação do PT com o PCdoB e o PV, a qual terá, entre outros, João Coser e a também deputada federal Jack Rocha. Entretanto, ele diz topar se candidatar ao Governo do Espírito Santo, se essa candidatura for “pra valer”.

“Se nós tivermos uma candidatura pra valer, vocês podem ter certeza que eu posso, sim, representar o Partido dos Trabalhadores na eleição para governador do Espírito Santo. Agora, não brinquemos com isso.”

Significa dizer: se essa candidatura tiver o apoio total da direção nacional do PT e do próprio presidente Lula, recursos financeiros compatíveis com o tamanho do desafio e um palanque forte no Estado. Do contrário, avalia Helder, se não passar de uma “aventura”, essa candidatura pode ser um tiro no pé, atrapalhando, em vez de ajudar, o cumprimento das metas prioritárias do PT no Espírito Santo: reeleger o presidente Lula, reeleger o senador Fabiano Contarato, manter dois deputados federais na Câmara e ampliar a bancada do partido na Assembleia Legislativa (hoje, com dois deputados estaduais).

“Eu estou pronto para qualquer tarefa”, afirmou Helder. “Nós podemos, sim, ter um projeto majoritário. E acho que, se não tiver outra possibilidade, é o melhor caminho”.

Helder disse que jamais seria candidato a governador se dependesse apenas de seu desejo pessoal, mas que está pronto para assumir a missão se esse for de fato um projeto “coletivo” e “partidário”, das bases do PT capixaba ao presidente Lula.

“Eu estou pronto para qualquer decisão partidária, para qualquer decisão coletiva, desde que a gente faça isso com o aval e a participação direta do Lula e do PT nacional, porque, se não for bom para o Lula, não podemos insistir aqui. Se não for para a gente ampliar o nosso tamanho aqui, nós não podemos colocar o nosso desejo pessoal. Até porque, se fosse o desejo pessoal, eu não seria candidato a governador nunca. Agora, eu sou de projeto. Esse partido já me deu tanto em termos de realização política que eu não tenho o direito de ficar reivindicando o meu desejo pessoal em detrimento daquilo que é mais importante para o nosso projeto político.”

Para Helder, a eleição para governador do Espírito Santo talvez será uma das mais difíceis para o PT. “Mas, se for pra valer, se for para ter um palanque forte, se for para disputar as eleições, para discutir o futuro e o presente do Espírito Santo, eu sou o primeiro a levantar a mão. Não terá fuga, não terá passo atrás. Agora, também não podemos incorrer numa aventura que vai nos trazer prejuízo lá na frente.”

Evocando seus 61 anos de idade e 43 de filiação ao PT e dizendo querer “falar sério” com os militantes sobre o tema, Helder de fato fez uma fala muito sincera, expondo de maneira muito clara (e até didática) por que uma candidatura a governador no Espírito Santo pode ser até ruim para o PT se não estiver conectada com os objetivos estratégicos maiores do partido em nível nacional e se não contar com apoio incondicional da direção nacional do partido, tanto político como financeiro.

Segundo ele, um palanque esvaziado a governador do Espírito Santo enfraquecerá as demais candidaturas do PT para todos os cargos no Espírito Santo, inclusive a de Lula.

“Tem que ser combinado com a direção nacional, porque senão não tem nem dinheiro nem apoio político. E aí sabe o que vai acontecer? Vai ser ruim para o Lula. Porque um palanque esvaziado aqui, cada um cuidando das suas eleições, não vai ajudar o Lula. Não vai ajudar o Contarato. Vai atrapalhá-lo. Porque, se não tem candidatura forte, se não tem apoio político, se não tem estrutura, vai atrapalhar. Vai colocar em risco a possibilidade de a gente fazer dois federais. Precisamos pensar nisso, gente. Não é uma engenharia fácil. Se o Helder sobe para governador, como é que fica a chapa de federal?”

Nas últimas eleições gerais, em 2022, Helder foi o candidato a deputado federal mais votado no Espírito Santo, superando a marca de 120 mil votos. É, naturalmente, considerado o principal puxador de votos para ajudar o partido a repetir as duas cadeiras em 2026. Se ele desfalcar a chapa, para ser candidato a governador, um buraco grande será aberto, colocando em sério risco a meta de voltar a fazer dois federais. Nesse caso, a deputada estadual Iriny Lopes – segundo Helder e Coser – poderia preencher seu lugar. Mas não tem a mesma projeção de votos.

O xadrez nacional

Outro ponto fundamental da fala de Helder foi a necessidade de conexão de uma candidatura a governador do Espírito Santo com o planejamento nacional do PT. Com a experiência de quem exerce seu sétimo mandato eletivo – o terceiro na Câmara dos Deputados –, Helder tem a consciência de que qualquer candidatura majoritária no Espírito Santo não depende só do Espírito Santo – peça pequenina de um jogo bem maior, jogado pelos dirigentes nacionais.

O PT governa o país e quer manter o poder central. Nacionalmente, tem aliados importantes e, para seguir na Presidência da República, depende desses aliados importantes. Estamos falando de forças partidárias que hoje estão no governo Lula, como o MDB, o PSB e o PDT.

Ora, hoje, no Espírito Santo, os três partidos citados como exemplo estão no governo Casagrande (PSB), que tende a lançar a candidatura do atual vice-governador Ricardo Ferraço ao Palácio Anchieta. Ricardo é ninguém menos que o presidente estadual do MDB, sigla que o PT, por evidente, quer ter na coligação de Lula à reeleição. No plano local, a pré-candidatura de Ricardo tem o apoio declarado das direções estaduais do PSB de Casagrande e do PDT de Sérgio Vidigal e Weverson Meireles (siglas que também estão no governo Lula).

Tudo isso considerado, podemos perguntar: e se, perto de julho do ano que vem, vier uma resolução da cúpula nacional do PT vetando a candidatura própria do partido ao Governo do Espírito Santo para não atrapalhar a candidatura do MDB (Ricardo Ferraço), como parte de um plano maior, ainda que Ricardo seja tudo menos um apoiador de Lula?

Bastante realista e cauteloso, Helder demonstra ter perfeita consciência dessa possibilidade. Diante da militância, fez questão de citar “aliados como o PDT, o MDB, o PSB” e declarou o seguinte: “Nós não podemos subordinar o projeto do Lula a um projeto estadual. Temos que casar esses projetos”.

Ainda mais clara ficou essa compreensão quando Helder citou o exemplo, ainda fresco, da eleição geral de 2022: a militância e parte dos dirigentes locais do PT queriam lançar Contarato a governador, mas, semanas antes das convenções, sua pré-candidatura foi retirada por ordem da cúpula nacional do PT. O PSB de Casagrande emplacara Geraldo Alckmin como vice de Lula e retirara a candidatura de Márcio França ao Governo de São Paulo para apoiar Fernando Haddad. O apoio a Casagrande no Espírito Santo era uma das contrapartidas no tabuleiro do jogo nacional. E assim foi feito.

“Nós vimos o que aconteceu em 2022. Na hora H, nós tivemos que recuar da pré-candidatura do companheiro Contarato a governador. Nós sabemos da necessidade de uma composição ampla para que Lula seja reeleito”, lembrou Helder, pragmático.

Helder criticou muito o modo como tem se dado, de modo geral, as discussões eleitorais no Espírito Santo até este momento, com priorização de nomes em detrimento de projetos.

“Só tem sentido a gente ter uma candidatura aqui se for, primeiro, para a gente discutir projeto, e não para discutir nome. E hoje o debate no Espírito Santo está se dando em torno de nomes. Eu não vejo nenhum candidato da direita, da extrema-direita, dizer o que pensa sobre o Espírito Santo. Eles estão discutindo nomes. Nós vamos discutir projetos.”

O ex-prefeito de Cariacica frisou a necessidade de que eventual candidatura tenha, mais que o aval, a presença pessoal de Lula. Do contrário, nada feito.

“Só existe possibilidade de ser bom para todo mundo e não ter prejuízo, inclusive para o Lula, para o Contarato, para a nossa chapa federal, para a nossa chapa estadual, se for um projeto coletivo, em unidade de ação política. E isso significa que precisamos ter o aval do presidente Lula. Não só o aval. Nós temos que ter o presidente Lula apoiando decisivamente o projeto aqui no Espírito Santo.”

Dando a exata dimensão da seriedade do tema tratado e da decisão a ser tomada – que não pode se basear meramente no entusiasmo das bases partido –, Helder advertiu a militância para que “não brinquem” com o projeto do PT: “Não brinquemos com o projeto do PT. Com o Helder vocês podem brincar, mas não brinquemos com o projeto do PT. Não brinquem com o enfrentamento ao fascismo. Não brinquem com a possibilidade de termos um prejuízo coletivo para o partido. Não brinquem”.

Dia 24: conversa com a direção nacional

Como encaminhamento prático, dirigindo-se especificamente ao agora presidente estadual do PT-ES, João Coser, Helder ressaltou a necessidade de eles terem uma conversa direta, o mais rápido possível, com a direção nacional do partido, para começar a resolver a vida do PT no Espírito Santo. (e a dele mesmo).

“Temos que falar com a Nacional da nossa disposição, que nós topamos sim, mas topamos pra valer, topamos para fazer aqui no Espírito Santo um movimento que pode sim surpreender, apesar de todas as dificuldades”, disse o deputado. “Precisamos conversar com o Lula e com a direção nacional e ter um entendimento de qual é o caminho que nós vamos seguir.”

Em resposta, João Coser anunciou que, no próximo dia 24, eles irão a Brasília para tratar do assunto pessoalmente com o novo presidente nacional do PT, Edinho Silva, e, se possível, também com a ministra-chefe da Secretaria de Relações Institucionais, Gleisi Hoffmann, e com o próprio presidente Lula.