fbpx

Coluna Vitor Vogas

O plano de Evair para chegar ao Governo do ES e o risco de sua aposta

Deputado procura se firmar como expoente da direita bolsonarista no ES, preenchendo o vácuo de Manato… Mas terá essa direita radical ainda espaço e apelo eleitoral até 2026?

Publicado

em

Evair de Melo (PP) é deputado federal e um dos nove vice-líderes da oposição na Câmara. Crédito: Renato Araújo/Câmara dos Deputados

Evair Vieira de Melo (PP) é pré-candidato a governador do Espírito Santo em 2026. Foi o que ele mesmo reiterou em entrevista ao EStúdio 360, telejornal da TV Capixaba, na última segunda-feira (28). Para isso, a aposta do deputado federal é claríssima, assim como sua estratégia. Evair quer se firmar como principal referência política da direita no Espírito Santo – mais especificamente, da direita bolsonarista –, preenchendo o vácuo de representação deixado pela saída de cena de Carlos Manato (ainda no PL), após as duas derrotas consecutivas do ex-deputado federal nas últimas duas eleições para o Governo Estadual, em 2018 e 2022.

> Quer receber as principais notícias do ES360 no WhatsApp? Clique aqui e entre na nossa comunidade!

A estratégia de Evair para se consolidar nesse papel salta de cada polêmica protagonizada por ele com ministros em comissões temáticas da Câmara e de cada voto minoritário dado por ele em projetos de interesse do Executivo apreciados em plenário: radicalizar na oposição ao governo Lula (PT) – ainda que seu partido, o PP, esteja na iminência de entrar oficialmente na base do governo.

Receba as notícias da coluna no grupo de Whatsapp do Vítor Vogas.

Na entrevista ao EStúdio 360, Evair fez questão de marcar sua posição pró-Bolsonaro e contrária ao governo Lula e à esquerda de modo geral, seguindo à risca a cartilha do bolsonarismo de fomentar a polarização ideológica e o discurso de “nós contra eles”, “direita versus esquerda”, sendo esta última tomada por começo, meio e fim de todo mal a ser combatido. “A agenda de esquerda é uma agenda de atraso, que olha sempre para o passado”, condenou.

O deputado usou vários momentos da entrevista para se reafirmar como um genuíno representante da direita. Afirmou que, na construção de sua candidatura ao governo, está “conversando muito com partidos, instituições e segmentos de direita”. Em contrapartida, “não tem diálogo com os grupos ideológicos de esquerda”.

Enquanto acusou o governo Lula de estar a promover um desmonte econômico no país, o deputado exaltou “os resultados produzidos pelo governo Bolsonaro no campo da direita”: “São resultados extraordinários!”

No afã de se valorizar, Evair exagerou um pouco. Por duas vezes, chegou a dizer que é “líder da oposição na Câmara”, função que ele na verdade não ocupa nem jamais ocupou. O deputado na verdade é um dos nove vice-líderes da oposição na Casa, desde 25 de abril. O líder é Carlos Jordy (PL-RJ).

“Naturalmente, como fui vice-líder do governo Bolsonaro na Câmara e estou como líder da oposição hoje ao governo Lula, defendo o legado de Jair Bolsonaro e, muito mais que Bolsonaro, essas premissas [da direita] na política brasileira”, afirmou Evair, ao EStúdio.

Puxando para si a imagem de candidato antissistema, à margem dos “grandes acordos políticos”, Evair também destacou nunca ter feito parte de grandes articulações para se eleger em nenhum de seus três mandatos na Câmara. “Não vou vir [ao governo em 2026] debaixo de nenhum escudo e nenhuma proteção.” Essa imagem de “político não político” também agrada ao eleitor bolsonarista e ajudou a catapultar o até então deputado do baixo clero à Presidência da República em 2018.

Resta evidente que, para Evair, não cabe a menor discussão. O deputado está convencido de que essa polarização, acentuada nos últimos anos de Lula/PT x Bolsonaro, chegou para ficar na realidade política brasileira e que, portanto, as próximas eleições gerais, daqui a três anos, ainda serão fortemente regidas por esse signo, inclusive nas disputas estaduais – como se deu em 2022.

Do alto dessa convicção, Evair não tem perdido um segundo: aproveita cada oportunidade regalada por seu mandato na Câmara Federal para polarizar e polemizar com expoentes do governo Lula e para firmar posição contra a agenda prioritária do governo, votando contra, basicamente, tudo o que venha do Planalto.

Os votos polêmicos

Nessa oposição sistemática, Evair tem adotado posicionamentos que, por vezes, colocam-no à direita até da bancada do PL. Um exemplo: na votação da reforma tributária, no começo de julho, 20 deputados do partido de Bolsonaro votaram a favor da PEC 45/2019, o que rendeu barracos homéricos no grupo da bancada no zap. Enquanto isso, Evair deu um dos 118 votos contrários à matéria no 1º turno e ainda publicou no Twitter e no Instagram: “Bom para o PT, ruim para o Brasil”. No 2º turno, foi dele um dos 113 votos contra a PEC.

Já no dia 22 de agosto, na votação final do arcabouço fiscal na Câmara após o projeto voltar do Senado, o deputado capixaba ficou em “minoria ainda menor”: foi autor de um dos 64 únicos votos contra o projeto idealizado por Fernando Haddad (PT), ante 379 votos favoráveis. Posição novamente marcada.

Antes disso, em 23 de maio, na primeira votação do plano fiscal do ministro da Fazenda na Câmara, Evair já dera um dos 108 votos contra o projeto de lei complementar (ante 372 favoráveis).

Em 5 de maio, o ex-presidente do Incaper juntou-se a um grupo ainda menor de radicais: foi o único deputado capixaba a votar contra o projeto da igualdade salarial entre homens e mulheres e um dos 36 únicos a votar contra a matéria, sendo 24 deles do PL, entre os 513 deputados federais.

A sucessão de tretas com ministros

Mantendo-se fidelíssimo ao ex-presidente agora tornado inelegível por oito anos, Evair tem flertado com a oposição mais extrema: nos salões do Congresso, participa de manifestações pedindo o impeachment de Lula, pelos motivos mais irrisórios, como o fato de o presidente ter opinado que a deposição de Dilma Rousseff (PT) em 2016 teria sido um “golpe”.

Na mesma balada, o mais insigne filho de Conceição do Castelo tem feito um grande esforço para se envolver regularmente em atritos de grande repercussão com alguns dos mais badalados ministros do governo Lula.

Um deles foi com o já citado Haddad. No dia 17 de maio, durante reunião conjunta de três comissões da Câmara, na qual o ministro da Fazenda foi explicar o projeto do novo arcabouço fiscal, Evair disse na cara do petista que “todo mundo reconhece a sua limitação”. Ouviu do ministro que ele mesmo nunca conheceu ninguém mais limitado que Jair Bolsonaro.

Uma semana depois, no dia 24 de maio, durante audiência da Comissão do Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável da Câmara, Evair censurou a ministra do Meio Ambiente, Marina Silva (Rede), por ela ter usado o trocadilho “ogronegócio” para se referir a certo setor do agronegócio brasileiro (o que desmata).

“A senhora vai lacrar, naturalmente, com esse tema aqui”, disse o parlamentar à ministra. “Desculpa, deputado, mas eu sou uma mulher preta, pobre, que chegou aqui porque ralou muito, não é porque lacrou”, rebateu Marina, sob aplausos, explicando que usara a expressão em um “esforço de retórica”.

Na última quarta-feira (30), em déjà vu, ou segundo round, com a ministra do Meio Ambiente, Evair voltou a bater boca com Marina em público, dessa vez no fim de uma audiência da Comissão de Minas e Energia da Câmara.

O capixaba indagara a ministra acerca de obras sem licenciamento ambiental incluídas no PAC. Após a resposta de Marina, Evair voltou a lhe cobrar uma explicação. Altiva, Marina retrucou-lhe: “Eu falei, e o senhor estava no telefone e não escutou. Mas eu relevo porque sei que o senhor tem dificuldade em ouvir uma mulher”. Ao que Evair revidou: “A senhora fugiu do Acre, foi para o estado de São Paulo, não mora no seu estado de origem”. Em seguida, o deputado teve o microfone cortado, mas ainda pôde-se ouvi-lo dizer: “Sobe o nível, ministra! Nós temos que subir a régua. Para de se vitimar com isso”.

Marina respondeu que a régua estava bem alta até aquele momento e que não se deixaria intimidar por Sua Excelência. Evair continuou esbravejando palavras inaudíveis, fora do microfone, sendo admoestado pelo deputado Gabriel Nunes (PSD-BA), 3º vice-presidente do colegiado.

Os dividendos e os riscos para Evair

Todos esses teretetês são completamente estéreis, não mudam em um milímetro para cá ou para lá os rumos do governo e da política nacional, mas não é isso o que importa no caso, para fins político-eleitorais. O frame já está ali, o recorte já foi produzido para viralização nas redes bolsonaristas. E, ainda que a postura de Evair mereça críticas em outros ambientes, na certa faz grande sucesso dentro do nicho ao qual ele se endereça. Questão de target, diriam os publicitários. Ele claramente definiu seu público-alvo e é só nele que mira, o tempo todo.

O risco, para Evair, é que esse alvo eventualmente encolha muito até 2026 ou até que já esteja a encolher, sem que ele mesmo o perceba. Ainda é cedo para fazer este prognóstico, o qual dependerá, primordialmente, do desempenho do governo Lula, mas… quem realmente garante que essa polarização tão acentuada (e emburrecedora, a meu juízo) resistirá até 2026? Quem assegura que, até lá, essa radicalização política ainda encontrará ressonância junto à nossa sociedade e atrairá um grande número de adeptos?

Indo mais longe, quem é capaz sequer de afirmar que o bolsonarismo ainda estará de pé? O ex-presidente, não é demais lembrar, encontra-se hoje acuado e acossado por um punhado de investigações que tendem a lhe reduzir ainda mais o tamanho político, na mesma medida em que ampliam as contas que ele precisa prestar à Justiça e ao povo brasileiro.

Pode ser que discursos e posições mais radicais que tanto sucesso fizeram nos últimos anos percam força e adesão com o tempo, conservando seu apelo apenas sobre um nicho muito específico e minoritário da sociedade, aquele real e incorrigivelmente radicalizado, por certo insuficiente para se vencer qualquer eleição majoritária. Incluindo aquela a governador do Estado.

O aconselhamento de Camata

Na entrevista ao EStúdio, Evair revelou que a orientação para ele construir na direita sua carreira política partiu de um conselheiro inusitado: o falecido governador e senador Gerson Camata.

“Quem sempre me deu a orientação para seguir na direita no Espírito Santo foi o nosso saudoso governador Gerson Camata. Ele me disse sempre de um Estado conservador, de princípios, que valorizava a família, a Igreja, os valores culturais muito importantes, então ele sempre me orientou a, quando possível, seguir pela direita. E é isso que me move, que organiza o meu mandato para que, lá em 2026, eu possa estar preparado para disputar o governo do meu Estado.”

A revelação é inusitada porque o próprio Camata, em vida, jamais se assumiu como um político de direita. Embora tenha começado sua carreira, nos primórdios da ditadura militar, como vereador pela Arena, o jornalista elegeu-se governador em 1982 pelo MDB, partido que concentrava a oposição ao governo dos generais pela via institucional. Depois disso, entre 1987 e 2010, exerceu três mandatos seguidos no Senado pelo PMDB.

Reservadamente, Camata até podia se dizer um homem de direita (como está morto, jamais poderemos tirar a teima com ele). Publicamente, não existe esse registro. Talvez isso confirme outra afirmação feita por Evair em sua entrevista ao EStúdio: até a ascensão do bolsonarismo em 2018, muitos políticos brasileiros de direita simplesmente não se declaravam assim, por vergonha ou receio da rejeição popular, devido ao estigma negativo que ficou sobre a direita em geral no país no início da Nova República, após a ditadura militar que governou de 1964 a 1985.

“Esse assunto da direita é um assunto muito novo na política nacional”, formulou Evair. “Só no governo Jair Bolsonaro é que essas coisas começaram a ficar mais claras e evidentes. Mesmo pessoas do passado que eram da direita tinham essa dificuldade de fazer esse julgamento. A gente tinha dificuldade de se posicionar, portanto o governo Bolsonaro deu essa oportunidade, e todos nós que estávamos na Câmara, que estamos na política hoje, temos posições muito mais claras e definidas e temos um norte a seguir.”

Cumpre ressalvar que Evair iniciou sua carreira política pelo Partido Verde (PV), pelo qual se elegeu para seu primeiro mandato na Câmara, em 2014. Desde o ano passado, o partido faz parte da federação Brasil da Esperança, com o PT e o Partido Comunista do Brasil (PCdoB).