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Coluna Vitor Vogas

Evair e o voto contra reforma tributária: “Agora estão em desespero”

Em entrevista à coluna, após dizer “bom pro PT, ruim pro Brasil”, deputado bolsonarista explica por que deu um dos poucos votos contra a PEC na Câmara

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Deputado Evair Vieira de Melo. Crédito: Zeca Ribeiro/Câmara dos Deputados

Falando a uma plateia formada pela nata do empresariado capixaba, o vice-presidente da República, Geraldo Alckmin (PSB), defendeu enfaticamente o projeto da reforma tributária aprovado em dois turnos pela Câmara dos Deputados entre os dias 6 e 7 de julho: “A indústria está super tributada. A reforma desonera totalmente investimentos e importações, unifica impostos e simplifica o sistema tributário”.

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Minutos antes, a presidente da Federação das Indústrias do Espírito Santo (Findes), Cris Samorini, aproveitando a presença de Fabiano Contarato (PT), fez um pedido direto ao senador, diante dos mesmos empresários: “Temos uma missão, senador: dar celeridade à reforma”.

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As falas foram feitas na última quinta-feira (27), durante a cerimônia em celebração aos 65 anos da Findes, no Ilha Buffet, prestigiada por Alckmin, pelo governador Renato Casagrande (PSB), por prefeitos e por congressistas do Espírito Santo. Entre estes, o deputado federal Evair de Melo, autor de um dos três únicos votos da bancada capixaba contrários à PEC 45/2019, relatada pelo deputado Aguinaldo Ribeiro (PP-PB) e patrocinada pessoalmente pelo presidente da Câmara Federal, Arthur Lira (PP-AL) – ambos do mesmo partido de Evair.

Logo após votar contra no 1º turno, com a noite do dia 6 já avançada, Evair publicou no Twitter: “Eu tenho JUÍZO!!! Se é bom pro PT é ruim pro Brasil, meu avô dizia isso, meu pai fala isso e eu fui educado assim!”

Ato contínuo, no Instagram, ele abriu um post com a mesma frase, mas deu explicação mais extensa.

A justificativa de Evair mereceu críticas (inclusive aqui). Primeiro, por ter tratado como “obra do PT” uma PEC que nasce em 2019, no princípio do governo Bolsonaro, que passou por várias mãos e que vai muito além dos interesses do atual governo petista (ou de qualquer outro governo).

Segundo, por reduzir a uma questão ideológica uma pauta que na verdade diz respeito ao desenvolvimento econômico brasileiro e que interessa, acima de tudo, àqueles que empreendem no país.

Terceiro porque, a meu ver, em que pesem os ajustes certamente necessários no texto que ora segue para o Senado, votar contra o projeto na Câmara correspondeu a votar contra os interesses de quem mais sofre com o manicômio tributário em que vivemos: os empresários brasileiros, maiores beneficiários da simplificação e da unificação de tributos sobre o consumo que são os dois alicerces do projeto.

Em entrevista à coluna, dada durante a cerimônia da Findes, Evair marcou um grande contraponto, afirmando que não é bem assim, muito pelo contrário. Segundo ele, os empresários capixabas agora estão em desespero com o que saiu da votação no plenário da Câmara, pois somente após a aprovação teriam se dado conta de uma série de pegadinhas presentes no texto. “Quem votou favorável não conhecia o texto.” Segundo ele, o Senado precisará praticamente refazer todo o projeto.

Sobre seu voto contrário, Evair afirma e reafirma que o texto final de Aguinaldo Ribeiro só foi apresentado 20 minutos antes da sessão e que ninguém teve de fato tempo hábil para analisá-lo em detalhes. O açodamento na votação é sublinhado pelo deputado como principal razão do seu voto.

Já o fator ideológico, que salta de suas postagens, é relativizado pelo parlamentar: ele nega ter votado contra o projeto porque esse “é bom para o PT”, mas ratifica sua desconfiança: “Não confio no PT. […] Um texto que eu não conhecia e que o PT defendia, eu fiquei com um pé atrás”.

O deputado bolsonarista chega a dizer que, se o mesmo projeto, com a mesma redação, tivesse sido apresentado pelo governo Bolsonaro, até o ano passado, ele também teria votado contra. “O texto é muito ruim.”

Confira o nosso pingue-pongue com o deputado e as suas explicações completas:

Por que o senhor votou contra o texto da reforma tributária tal como foi apresentado e apreciado pelo plenário no dia 7 de julho?

O texto é muito ruim e nos foi entregue 20 minutos antes da votação. Ninguém conhecia o texto. Quem votou favorável não conhecia o texto, tanto que todo mundo está dizendo agora que vão consertar no Senado. Não tinha razão alguma para a gente votar com a pressa que votou. O texto é confuso, sem definições claras. Eu não seria irresponsável de assinar um contrato de 150 páginas que eu não pudesse minimamente ler. Então a pressa, a forma açodada como o texto foi apresentado e votado, não me dava segurança alguma para votar.

Depois disso o senhor seguramente já leu o projeto na íntegra. Na sua avaliação, quais são os principais problemas?

Nós não temos definição de alíquota [do futuro IBS, que unificará o ISS e o ICMS]. Existe chance de uma bitributação, uma vez que o Estado pode criar os seus impostos. Ninguém pagará menos. Os entes federados, tanto estados como municípios, estão em pânico aí porque não têm uma definição de como será a distribuição [do IBS arrecadado]. E cria uma profunda insegurança jurídica, porque tem contratos assinados de 20, 30 anos, que ficam completamente acéfalos com esse texto que está aí. É injustificável. Eu não consigo entender como alguém consegue defender esse texto. Ninguém conhecia o texto.

No entanto, logo depois da votação no plenário da Câmara, na noite daquela quinta-feira (6/7), o senhor foi às suas redes sociais para explicar seu voto e postou que havia votado contra porque o projeto é “bom para o PT”, logo “ruim para o Brasil”. Deu a entender que tinha votado contra por uma questão ideológica…

Eu abri uma aspa. Meu texto é muito maior do que isso. Eu só abri uma aspa no começo para fazer um posicionamento. Eu não ia votar num texto que o PT defendia. O PT defende o texto. É uma posição política minha clara. Eu não confio no PT. E eu estava certo. Eu abri uma aspa na cabeça do texto, mas depois estendi muito mais. Meu texto tem mais de 20 linhas.

Queria entender melhor esse ponto. O que o senhor está me dizendo é que o fator partidário e ideológico também pesou na sua decisão?

Um texto que eu não conhecia e que o PT defendia, eu fiquei com um pé atrás.

Mas o senhor confirma que o voto contrário também se deu por uma questão de posicionamento ideológico, para marcar posição?

Em hipótese alguma. Foi por desconfiança. Defendi reforma administrativa e reforma tributária o tempo todo na Casa. O problema é que o texto, como foi apresentado e por quem foi apresentado, pela minha experiência na Casa, era para colocar o pé atrás.

Só para deixar claro: se o mesmo texto tivesse sido apresentado por um deputado do PL, ou por um governo do PL, ou pelo governo Bolsonaro no ano passado, o senhor teria votado a favor?

Esse texto eu votaria contra.

Mesmo que tivesse sido apresentado pelo governo Bolsonaro, pela equipe do Paulo Guedes, e sido votado até o ano passado?

Mesmo assim. Eu votaria contra. Se me entregassem um texto de reforma tributária quinze minutos antes, eu votaria contra. Eu votei a favor da reforma da Previdência, da reforma trabalhista, da terceirização, da reforma do saneamento…

Mas a PEC 45/2019 não foi longamente discutida, deputado?

Não, não.

Tudo bem, houve algumas alterações em cima da hora, destaques e tal, mas o projeto em si foi apresentado pelo relator dez dias antes ou mais…

Não foi.

Eu me refiro ao relatório preliminar, do deputado Aguinaldo Ribeiro, do seu partido, que passou por um grande debate. Esse “pré-projeto” foi apresentado bem antes à imprensa e à sociedade*. Foi submetido aos governadores, que debateram e apresentaram suas sugestões de mudança até a véspera da votação. O relator cedeu em alguns pontos, mas as concessões também foram noticiadas pela imprensa antes da votação…

Nada disso vale. O que vale é o texto final.

Mas e aquela comissão especial, presidida pelo deputado Reginaldo Lopes (PT-MG)?** Ele e o Aguinaldo Ribeiro vieram à Assembleia Legislativa do Espírito Santo no dia 19 de junho, para participar de um seminário sobre a reforma tributária, inclusive com a sua presença….

Ali eu não disse nada, inclusive. Essa comissão na verdade foi um grupo de trabalho. No Brasil, quando você não quer resolver, você cria grupo de trabalho. Ninguém conhecia o texto. O Aguinaldo não entregou. Falava aqui, falava ali, falava aqui, falava ali… Mas o texto só foi entregue 20 minutos antes.

Deveria ter passado por outras comissões, no seu entendimento?

Eu acho que tinha que ter sido feito como as outras reformas. Botar numa comissão especial, o texto ser aprovado lá, e não teria problema nenhum. No dia em que votou, o Aguinaldo podia ter lido o texto. Passado o recesso, na segunda-feira a gente votava. Alguém consegue me explicar por que foi votado daquela forma? Tanto que os empresários aqui hoje são unanimidade em me pedir para ajudar a corrigir no Senado.

A Findes inclusive, como instituição, está preocupada, pelo que o senhor tem conversado?

Todos os empresários que me abordaram aqui hoje me disseram: “Evair, temos que corrigir no Senado”. Espera aí. Por que não corrigimos na Câmara, então?

Quais são as principais preocupações do empresariado?

Primeiro, ninguém conhece a alíquota padrão [do futuro IBS]. Segundo, o setor de serviços, em que se precisava fazer algumas correções, está completamente inseguro. E o nosso estado depende muito do setor de serviços. Nós fizemos o dever de casa e temos um ambiente fiscal para atrair negócios. Não podíamos perder contratos. Perdemos contratos. Isso para nós é uma ameaça. Os estados não foram orientados. O Tarcísio [de Freitas, governador de São Paulo], quando votou favorável, ele olhou para São Paulo***. São Paulo é um estado que ganha. Então tem muitas dúvidas, tem muita insegurança, tem muitos contratos assinados. E nós não tivemos tempo de discutir isso.

E quais são as correções que os empresários agora pedem para que se faça no Senado?

Na verdade vamos ter que fazer um novo texto. É praticamente um novo texto, de alíquotas, de prazos, de concessões, dos benefícios, definir os critérios do Conselho Federativo, que vai fazer a redistribuição para os estados. Eles estão em pânico.

Esse texto, tal como passou na Câmara, não será mantido de jeito nenhum no Senado?

Em hipótese alguma. Acho que 90% do texto vai ser alterado. PEC é igual salame: pode ser fatiada. Aquilo que for aprovado igual no Senado pode ser sancionado. Aquilo que for diferente vai voltar para a Câmara. Então tem um longo caminho a ser percorrido.

Então, para resumir os motivos do seu voto contrário à PEC 45/2019 na Câmara, foi uma combinação de dois fatores? Primeiro, a pouca antecedência? Segundo, o fato de ter sido apresentado pelo PT da forma como foi?

Eu não confio no PT. Tenho desconfiança no PT, ué!

Então foi por uma combinação do açodamento com a desconfiança?

Com a desconfiança. E hoje estou convicto de que eu estava certo.

Deputado, reza uma antiga máxima na política que “o ótimo é inimigo do bom”. Todos se dizem favoráveis à reforma tributária, mas cada um defende a sua, cada um quer ter a sua, cada um almeja a própria reforma e ninguém vai conseguir a reforma ideal para si mesmo. Considerando o sistema tributário caótico em que vivemos há décadas, não é melhor a Câmara ter aprovado essa reforma tributária do que nenhuma reforma tributária e as coisas continuarem como estão e como sempre estiveram? O senhor concorda ou discorda disso?

A reforma tributária é um transplante de órgãos. Se todos os exames não estiverem em dia, ela não pode se fazer. Ela não é uma reforma como outra qualquer. Eu volto a dizer: é um transplante de todos os órgãos. O paciente precisa estar estabilizado, com os exames em dia, senão você não pode botar o paciente na mesa de cirurgia. Acho que teve uma irresponsabilidade. Não concordo que o ótimo é inimigo do bom. Volto a dizer: votei na reforma trabalhista, na previdenciária, na do saneamento. Votei em todas as reformas. Inclusive acho que foi uma irresponsabilidade ter votado a reforma tributária sem ter discutido a administrativa. Ninguém pode programar a receita sem fazer uma graduação da sua despesa. Tanto que o Arthur [Lira, presidente da Câmara] já mudou o discurso.

O senhor acha que a reforma administrativa deveria ter sido pautada e votada antes da tributária?

Deveria ter sido casada. Eu tenho que fazer uma previsão de receita em cima do plano das despesas correntes líquidas contratadas. Então deveria ter tramitado junto. E o governo do PT é um governo gastador e irresponsável, que já tem um déficit do PIB exorbitante contratado para 2024. Ele está desesperado. E fez uma reforma tributária sem discutir a administrativa. Tanto que o Arthur Lira agora, elegantemente, já começou a falar em votar a administrativa. Sem passar o recibo, indicou que nosso grupo estava certo, pois questionamos o tempo todo.

* O pré-projeto de Aguinaldo Ribeiro foi apresentado no dia 22 de junho.

** Na verdade foi um grupo de trabalho coordenado pelo deputado Reginaldo Lopes (PT-MG).

*** Evair quis dizer que Tarcísio de Freitas apoiou o projeto da reforma, pois obviamente, como governador, não votou na matéria.