Coluna Vitor Vogas
“Ele não faz política”? Os ousados movimentos de Pazolini para se fortalecer
O “dever de casa” com o Republicanos, a atração do Novo, o flerte com o PSD e um convite ao PP que bagunçou a política local. Pazolini vira a chave e vai à luta para remontar sua base e expandir seu grupo político
Para quem era criticado até por aliados, até dois meses atrás, por “não fazer política”, o prefeito Lorenzo Pazolini virou completamente a chave. Nos últimos tempos, tem se engajado em intensas articulações visando ampliar o seu grupo político e a base de apoio ao seu governo em Vitória – com o objetivo estratégico de se fortalecer para a reeleição. Bem-sucedidas até aqui, essas articulações têm sido conduzidas pelo presidente estadual do partido de Pazolini (Republicanos), mais consolidado a cada dia como operador político do prefeito: o ex-presidente da Assembleia Legislativa Erick Musso, tratado por colegas de partido como “eminência parda” na prefeitura.
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A guinada de Pazolini responde a uma necessidade urgente de sobrevivência e de reposicionamento no tabuleiro político-eleitoral para chegar competitivo no ano que vem, após um período crítico. Pelo caminho tomado por ele na primeira metade do governo (muitas brigas para dentro e para fora; desinteresse por composições), o prefeito entrou em 2023 cercado por adversários em ascensão e beirando o autoisolamento político – algo fatal para quem almeja a renovação do mandato.
Na nova configuração da Câmara de Vitória, Pazolini começou a perder o controle de sua base, que, nervosa, chegou a lhe impor pequenas derrotas, convocar secretário para depor, boicotar votação de interesse da prefeitura e reunião com secretário de Governo.
Em paralelo, correligionários do prefeito já não escondiam a insatisfação com a falta de espaço para eles mesmos e para o próprio Republicanos na administração do partido em Vitória. A relação com o próprio Erick chegou a um ponto muto ruim, logo após este assumir a presidência estadual do partido no lugar de Roberto Carneiro, em fevereiro. “Centralizador”, “fechado” e “pouco flexível” eram adjetivos comumente usados por aliados de Pazolini, em anonimato, para se queixarem do prefeito.
Mas o Cabo das Tormentas parece ter sido contornado, com um Pazolini agora muito mais flexível e capitão Erick ao leme da embarcação político-partidária. “Ele começa a ser um Pazolini mais político. Está muito mais flexível, disposto a ceder espaço, fazer acordos e nomeações”, atesta um correligionário.
A primeira virada de chave de Pazolini, já registrada aqui, foi parar de esticar a corda no cabo de guerra com o governo Casagrande, adotando uma postura pública mais equilibrada e institucional. Como exemplo, de fevereiro para cá, o prefeito já atendeu a duas reuniões no gabinete do governador, esteve ao lado dele na viagem-teste da primeira barca do aquaviário e posou para fotos com ele no carnaval de Vitória.
A segunda e decisiva virada é a resolução de abandonar o isolamento. Com a ajuda decisiva de Erick, o prefeito tem buscado recompor e expandir suas alianças, atraindo novas forças políticas para dentro de sua administração. Passou, enfim, a se dispor a “fazer política”, não no sentido pejorativo do termo, mas seguindo a fórmula clássica de negociar espaços na gestão em troca de apoio político e eleitoral.
É legítimo que potenciais aliados queiram ocupar espaços na máquina para se projetar, assim como é legítimo que o prefeito ofereça esses postos estratégicos para partidos que ele queira atrair, desde que os indicados demonstrem capacidade técnica para exercê-los.
É o que quase todos fazem. Para Pazolini, parecia um tabu. Mas foi o que ele passou a fazer, adotando uma linha de ação bem mais pragmática.
Primeiro passo: contemplar Amaro e o Republicanos
O primeiro passo foi arrumar a própria casa, resolvendo os problemas domésticos. Numa tacada só, o prefeito nomeou Diego Libardi para a Secretaria de Cidadania, Direitos Humanos e Trabalho e Rodrigo Ronchi para a de Esportes.
Pré-candidato a prefeito de Cachoeiro, o primeiro é filiado ao Republicanos e foi indicado pelo partido; o segundo é indicação pessoal do deputado federal Amaro Neto (Republicanos), que já estava até começando a ameaçar lançar-se candidato a prefeito de Vitória no lugar de Pazolini. A relação com o próprio Republicanos ficou bem mais pacificada.
Feito o dever de casa, Pazoloni passou a olhar para fora.
Segundo passo: resgatar Aridelmo e atrair o Novo
Nesse sentido, um passo importante foi a nomeação de Aridelmo Teixeira (Novo) como secretário de Governo. Com isso, o Novo também passou a compor oficialmente a administração Pazolini, além de apoiar a sua reeleição, como admite o presidente estadual da sigla, Iuri Aguiar.
É um partido bem pequeno e que dá pouco tempo de TV e recursos de campanha a Pazolini, mas confere lastro à sua política de austeridade fiscal, materializada nos recorrentes anúncios de cortes de cargos comissionados.
Terceiro passo: convidar o PSD para a gestão
Ao mesmo tempo, sempre representado por seu procurador político (Erick), Pazolini tem mantido conversas com dirigentes de outras siglas de direita e centro-direita, como o PL, o União Brasil, o Podemos e o PSD.
A este último, o prefeito também chegou a oferecer uma secretaria, cujo ocupante seria ou o presidente estadual do PSD, Renzo Vasconcelos, ou alguém indicado por ele. A informação é confirmada por Renzo. Pelo menos por enquanto, por hesitação do dirigente do PSD, a conversa não evoluiu, mas Pazolini deixou clara sua intenção de contar com o PSD, hoje meio “solto” no mercado político capixaba.
Quarto e mais ousado passo: articular-se com o PP
Entretanto, a frente mais importante de Pazolini a fim de “conquistar território” foi aberta no último dia 12. Nessa data, o prefeito reuniu-se com o presidente do Progressistas (PP) em Vitória, Marquinhos Delmaestro, e com o único vereador do partido na Capital, Anderson Goggi. Ao vereador, ofereceu o comando da Secretaria Municipal de Cultura, hoje com Luciano Gagno. Goggi ainda está avaliando o convite e me disse que tomará uma decisão até sexta-feira (26).
Esse movimento é altamente estratégico em múltiplas direções.
Em primeiro lugar, no mar instável que virou o plenário da Câmara no início deste segundo biênio de mandato, Goggi era justamente um dos vereadores de centro que estava se desprendendo da base e assumindo uma postura cada dia mais independente. Chegou a flertar com a oposição e a votar com os vereadores de esquerda em algumas matérias. Trazendo Goggi para dentro da administração, Pazolini o transforma automaticamente em aliado.
Além disso, ao convidar Goggi para sua equipe, Pazolini naturalmente manifesta sua intenção de contar com o PP em seu governo e em sua base de apoio tanto agora como na campanha. Ou, invertendo o raciocínio, para garantir a adesão do PP a seu governo e a sua reeleição, ele abre agora para a sigla um belo espaço em seu primeiro escalão.
“É um conjunto. Ele não está levando o vereador porque o vereador é bonito, tem olhos verdes, cabelo louro… e olha que nem tenho nada disso. É também uma aproximação que ele está querendo fazer com o PP”, reconhece o próprio Goggi, confirmando o convite.
“Esse gesto que o Pazolini está fazendo é para ter o PP na base dele”, ratifica Delmaestro.
O principal, então, é compreender esse movimento para muito além do vereador. É um movimento de atração do PP, que está longe de ser um partido qualquer, por dois fatores.
O tamanho do PP e a relação da sigla com Casagrande
Diferentemente do Novo, trata-se de um partido de grande porte, que no ano passado elegeu uma das maiores bancadas na Câmara dos Deputados e, portanto, dispõe de um dos maiores tempos de TV e de uma das maiores cotas do Fundo Eleitoral para financiar candidaturas país afora no ano que vem. Tendo o poderoso presidente da Câmara, Arthur Lira, o PP fez parte da coligação de Jair Bolsonaro no ano passado e transita no mesmo campo de Pazolini: a centro-direita.
Porém, o fator mais importante – e que deflagrou verdadeira crise interna – é que o PP faz parte da base do governo Renato Casagrande (PSB), notório adversário político de Pazolini.
Apesar da reaproximação institucional e das aparências ditadas ultimamente por civilidade e cordialidade, o governador não superou as graves acusações públicas, nunca provadas, feitas contra ele pelo prefeito no ano passado. Em 2024, fará o que estiver ao seu alcance para derrotar o desafeto nas urnas. Nesse contexto, quem estiver com Casagrande estará contra Pazolini.
E o PP, vou me corrigir, não apenas “faz parte da base do governo Casagrande”. É um dos sócios mais importantes do movimento liderado pelo governador no Estado, pelo menos desde 2014, quando, vencendo um braço de ferro interno, Marcus Vicente ficou com a presidência estadual e levou o PP a apoiar Casagrande contra Hartung.
Sob a regência de Vicente, hoje secretário estadual de Serviços Urbanos, o apoio ao socialista foi reeditado em 2018 e 2022. Até o começo de abril, seria inimaginável ver o PP caindo nos braços de Pazolini, ou mesmo flertando com ele.
Só que esse barco também já zarpou.
O papel-chave de Da Vitória nessa guinada
No mês passado, em costuras feitas por cima, diretamente em Brasília, o deputado federal Josias da Vitória assumiu a presidência estadual no lugar de Vicente, por decisão da cúpula nacional. Apesar de também sempre ter sido um bom aliado de Casagrande, a disposição do deputado em relação ao governo mudou radicalmente. Desde a virada do ano, Da Vitória está seriamente brigado com o governador, por motivos que esmiuçaremos em outra oportunidade, mas que passam, entre outros pontos, por pleitos não atendidos.
E, apesar de suas declarações em contrário (“Nada mudou”), o fato é que, agora à frente do PP, Da Vitória tem dado ao partido uma direção bem diferente daquela de Vicente, conduzindo-o gradativamente para fora do governo Casagrande e do movimento liderado pelo governador – por razões que também detalharemos melhor em outra análise, mas que passam pelas pretensões eleitorais de Da Vitória em 2026.
Em resumo, Da Vitória também virou a chave do PP. O movimento de bastidores que culminou com o convite de Pazolini a Goggi nada mais é que o resultado de intensas articulações do presidente estadual do PP com o do Republicanos, Erick Musso – e pode-se incluir nessa conta o outro deputado federal do PP-ES, Evair de Melo.
Os dois parlamentares do PP almoçaram com Pazolini em março e, desde então, se encontraram várias vezes, em privado ou em público, incluindo o show de Roberto Carlos na Praça do Papa, no dia 21 de abril (foto de abertura desta análise).
A relação de Da Vitória com Erick é excelente desde os tempos em que foram colegas na Assembleia. No ano passado, o progressista apoiou o republicano para o Senado, após não ter conseguido ser candidato a senador pelo grupo de Casagrande – o governador preferiu apoiar Rose de Freitas (MDB), em um dos fatores que explicam o desgaste acumulado entre os dois.
A vontade de Da Vitória em compor com o Republicanos e levar o PP para a gestão Pazolini deixou em situação delicadíssima Marcus Vicente e Marquinhos Delmaestro, muito mais ligado a Vicente – assim como Goggi, aliás. Em conversa com a coluna, Delmaestro confirmou o convite de Pazolini a Goggi em sua presença, mas não disfarçou o desconforto. Ele também é secretário-geral do PP no Estado, assessor especial da Casa Civil no governo Casagrande e foi um dos fiadores do apoio do PP à reeleição do governador em 2022.
O que diz Goggi sobre o rolo
Com mandato muito voltado para a área cultural, o vereador Anderson Goggi se diz muito satisfeito com o convite de Pazolini, classificado por ele com um “gesto bacana”, mas diz ainda não ter se decidido.
Na conversa com Pazolini, o vereador apresentou algumas condições. A mais importante delas: que seu mandato na Câmara Municipal não seja assumido por seu 1º suplente, Baiano do Salão (PTB) – um desafeto dele –, e sim pelo 2º suplente, Ronalt Ribeiro (PTB) – com quem tem muito boa relação.
Para isso, a Prefeitura de Vitória teria de dar alguma ótima compensação para Baiano, absorvendo-o em algum espaço vistoso na máquina municipal. Mas o próprio Baiano não tem o menor interesse nesse arranjo. Naturalmente, prefere assumir o mandato na Câmara e montar o próprio gabinete.
Goggi, no entanto, refez o discurso. Agora não vê isso como o fim do mundo: “É legítimo e é o direito dele. Não tenho nada contra ele assumir. Quem tem direito a assumir a suplência é o primeiro suplente”.
Dizendo que vai se decidir até sexta-feira (26), o vereador está a avaliar muito bem os prós e contras. Pré-candidato à reeleição, está levando em consideração o pouco tempo que terá como secretário: menos de um ano, calcula, entre a posse e a obrigação de se desligar do cargo de ordenador de despesas.
“Estou avaliando muito se a gente aceita ou não. Foi um diálogo muito bacana com Pazolini e um gesto bacana da parte dele. Eu e o partido estamos muito gratos a ele por essa lembrança e essa valorização. Posso não aceitar, mas, só por ele ter lembrado, fico muito grato”, afirma o vereador e vice-presidente do PP em Vitória.
Delmaestro: “Não vou indicar ninguém”
Ainda segundo Goggi, se ele recusar o convite, a direção municipal do PP não vai indicar ao prefeito nenhum nome no lugar dele – entendendo que o convite é pessoal e intransferível ao vereador. Delmaestro mantém o mesmo entendimento.
Porém, se isso ocorrer, o presidente municipal não descarta que a nova direção estadual (leia-se Da Vitória) indique outro quadro do partido, para selar o ingresso do PP na administração Pazolini. “Se eles quiserem fazer isso, podem fazer. Aí vão conversar por cima e vão fazer, mas não vai passar pela base do partido em Vitória”, avisa Delmaestro.
Goggi e Delmaestro terão uma conversa decisiva na quinta-feira (25).
O convite a Assis para a Defesa Civil
Pazolini também está tentando acomodar em sua equipe Sérgio de Assis Lopes, mais conhecido como Tenente Assis, candidato derrotado a deputado federal pelo PTB em 2022. No dia 28 de março, o prefeito o nomeou para o cargo de assessor adjunto da Coordenadoria Municipal de Proteção e Defesa Civil, na Secretaria de Obras.
Mas Assis é servidor do Governo do Estado, efetivo do Corpo de Bombeiros, e o processo de cessão ficou travado. No dia 4 de abril, Pazolini designou outra servidora para responder pelo mesmo cargo “até a data de conclusão do processo de cessão e posse do servidor Sérgio de Assis Lopes”.
PL, Podemos, União Brasil: diálogo franco com outras siglas
Além do PP e do PSD, Erick Musso tem mantido conversas frequentes com dirigentes e líderes do PL, partido de Bolsonaro, e com siglas de centro-direita como o Podemos e o União Brasil (UB).
Os dois últimos dificilmente entrariam no governo Pazolini, até porque são partícipes do governo Casagrande. O Podemos tem dois secretários de Estado; o UB tem um: ninguém menos que Felipe Rigoni, seu presidente estadual.
Mas, no caso desses três partidos, mesmo que as conversas dificilmente evoluam para participação na gestão de Pazolini, podem se desdobrar em alianças já na próxima eleição municipal e até em 2026, com a formação de um bloco de centro-direita unido para chegar ao Palácio Anchieta.
Na aproximação com o PL, Erick já se reuniu com o deputado estadual Capitão Assumção e, há poucos dias, com o presidente do partido em Vila Velha, Carlos Salvador, braço direito do senador Magno Malta.
Também há poucos dias, Erick teve uma reunião ampla em Vila Velha com o prefeito Arnaldinho Borgo, o deputado federal Victor Linhalis e o presidente da Câmara de Vila Velha, Bruno Lorenzutti (trio do Podemos), e com outros três membros do Republicanos: o presidente da Câmara de Vitória, Leandro Piquet, o vereador de Vila Velha Devanir Ferreira e o deputado estadual Hudson Leal. “Na pauta, parceria do Podemos com o Republicanos no município”, postou Erick.
Com o presidente estadual do União Brasil, Felipe Rigoni, Erick conversa regularmente, até porque os dois cultivam excelente relação. No ano passado, uniram forças nas eleições parlamentares, mas nenhum dos dois teve sucesso. O deputado estadual Denninho Silva, presidente do UB em Vitória, é apoiador declarado da reeleição de Pazolini, sendo visto constantemente com o prefeito.
Republicanos declara apoio à reeleição de Euclério
Erick também já se reuniu com o prefeito Euclério Sampaio (UB) e, num grande aceno para o UB, o Republicanos anunciou apoio antecipado à reeleição dele em Cariacica, no dia 17 de abril. Isso também pacifica a relação de Pazolini com Messias Donato (Republicanos), o deputado federal de Euclério em Brasília.
Messias era um dos colegas de partido de Pazolini que andavam tensos com ele. Ele a Pazolini conversaram bastante antes do anúncio de apoio a Euclério.
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