Coluna Vitor Vogas
CPI dos Explosivos implode na Assembleia Legislativa
Um a um, todos os membros da CPI dos Explosivos e Combustíveis renunciaram em uma semana, deixando o presidente, Denninho Silva, com a bomba na mão

Denninho Silva preside CPI dos Combustíveis. Foto: Lucas S. Costa/Ales
Por extenso, ela se chama CPI do Uso e Manuseio de Explosivos e Combustíveis. Nos bastidores, é mais conhecida como a CPI dos Combustíveis, a CPI dos Explosivos, ou, simplesmente, a “CPI do Denninho”, proponente, presidente e “dono” da comissão desde que ela foi oficialmente instaurada, no dia 1º de março de 2023. Mas seus dias estão contados. Na Assembleia Legislativa, a CPI dos Explosivos acaba de implodir. Ficou sem combustível, após um movimento de renúncia em massa dos seus membros, articulado por ninguém menos que o presidente da Casa, Marcelo Santos (União).
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Num intervalo de uma semana, todos os integrantes da CPI, à exceção do próprio Denninho Silva (União), comunicaram formalmente a renúncia a Marcelo Santos, incluindo os outros dois titulares e os três suplentes da comissão.
A debandada começou no dia 11, com a saída do suplente Danilo Bahiense (PL). No dia 15, foi a vez da suplente Raquel Lessa (PP) e de João Coser (PT), titular e relator da CPI. As renúncias em série continuaram no dia seguinte (16), com o requerimento protocolado por Pablo Muribeca (Republicanos). No dia 18, o último dos suplentes, Mazinho dos Anjos (PSDB), fez o mesmo, deixando Denninho solitário.
Logicamente, com um membro apenas, uma Comissão Parlamentar de Inquérito não tem condições de se manter. O próximo passo deve ser a extinção do colegiado. E o objetivo do movimento, como indica a nossa apuração, é exatamente esse.
Em caráter oficial, todos os agora ex-membros alegam o mesmo, com ligeiras variações: falta de tempo, acúmulo de tarefas e necessidade de se concentrarem em outras atividades. Mas há mais que isso.
Pedindo anonimato – para não jogar mais gasolina no incêndio –, mais de um envolvido na debandada relatou ter retirado o nome para atender a um pedido direto de Marcelo Santos. O presidente agiu para esvaziar e desmontar a CPI, que, pela condução de Denninho, viria causando alguns incômodos a ele mesmo e à Assembleia.
O deputado Mazinho dos Anjos, último a renunciar, confirmou o pedido por parte do presidente da Casa: “Não sei o motivo, não sei qual foi o andamento, como foram as discussões, como foi a condução. Eu era um mero suplente. O presidente me pediu para retirar a assinatura e eu atendi ao pedido”.
Oficialmente, o escopo da CPI dos Combustíveis é o seguinte: “Apurar e investigar a comercialização, o uso e manuseio de explosivos e combustíveis no âmbito do estado do Espírito Santo”. As investigações têm a ver, por exemplo, com a venda de combustível adulterado.
De acordo com o Regimento Interno da Ales, uma CPI deve ter duração de 90 dias, prorrogáveis. Não há um limite de prorrogações. Os trabalhos só não podem entrar pela legislatura seguinte.
Segundo relatos, até outros membros da CPI vinham há muito tempo incomodados com a condução do presidente da comissão – a qual, não por acaso, ganhou o apelido de “CPI do Denninho”. Desde o início, os trabalhos ficaram centralizados no deputado da Grande Goiabeiras e era ele quem concentrava tudo: documentos, convocações, tomada de depoimentos, diligências externas. Era o dono do posto e o frentista.
A CPI chega ao ocaso sem relatório final. Aliás, nem final nem parcial. Como toda a documentação é concentrada por Denninho, o relator, João Coser, não teve subsídios para esboçar nada que se assemelhasse a isso. Portanto, a CPI os Combustíveis termina sem conclusões, isto é, sem terminar.
Além disso, após um ímpeto inicial, ela já tinha perdido fôlego e vinha engasgando no asfalto. No primeiro ano, Denninho convocou muitas pessoas e realizou muitas oitivas. Mas a última reunião oficial de trabalho do grupo se deu há mais de um ano, em 8 de julho de 2024 – muito embora, no site da Assembleia, conste que a CPI se reúne a cada duas quintas. Desde então, o presidente só convoca reuniões para aprovar a prorrogação da vigência da comissão.
Vira e mexe o próprio Denninho faz diligências externas, como a fiscalização de postos de combustível, mas nunca é acompanhado por nenhum outro membro da CPI. Sob sigilo, uma fonte relata que pressões sobre empresários também viriam incomodando o presidente Marcelo Santos. Também pesou o receio de repercussão negativa para a Casa de Leis.
O que acontece agora?
O mínimo para manutenção dos trabalhos de uma CPI são três membros. Mas a dos Combustíveis não será extinta automaticamente, por falta de quórum. A princípio, os líderes das bancadas poderão indicar novos membros. É pouco provável que o façam. Em se confirmando a omissão dos líderes, o presidente da Mesa Diretora, Marcelo Santos não deve nem indicar substitutos, como prescreve o Regimento Interno, nem extinguir a CPI de ofício. Assim, a CPI deve ser arquivada quando se encerrar o ano legislativo ou, antes, quando se expirar seu atual prazo de duração.
Nesse ínterim, como presidente e membro solo, Denninho não poderá convocar alguém para depor nem realizar diligências em nome da CPI. Para tanto, a decisão precisa ser colegiada – e não existe mais um “colegiado”.
Na prática, a CPI acabou.
Justificativas
Único a mencionar um motivo em seu requerimento de renúncia, Danilo Bahiense alegou “conflito de agenda”. À coluna, exagerou: “Estou com muitos compromissos. Entre comissões e frentes parlamentares, são cerca de 40. Lá eu não posso dar atenção”.
João Coser argumentou que acaba de assumir a presidência estadual do PT, o que lhe impõe uma carga de novas tarefas. “Estou reduzindo minha presença em comissões para me dedicar com força às minhas tarefas de organização partidárias e às três comissões permanentes muito importantes das quais sou membro titular: Justiça, Agricultura e Direitos Humanos.”
Além da CPI dos Combustíveis, Coser renunciou às posições em duas comissões permanentes (a de Ciência e Tecnologia e a de Criança e Adolescente) e em uma especial: a do Acordo de Mariana. Esta última foi proposta e era presidida pelo deputado. Ele passou a presidência para a colega de bancada, Iriny Lopes (PT).
Mazinho confirmou que saiu a pedido de Marcelo Santos.
A assessoria de Muribeca respondeu que o deputado, “após verificar a saída de colegas, optou por acompanhá-los”.
Raquel Lessa e sua assessoria não responderam ao nosso questionamento.
MINIENTREVISTA
Denninho Silva: “Relatei dificuldades ao Marcelo”
Como o senhor avalia a renúncia em bloco dos colegas e a que atribui a debandada?
Recebo com naturalidade. Esse movimento é próprio do Parlamento, especialmente no último ano de mandato, quando cada deputado concentra energia nas áreas de maior afinidade e nas entregas que quer deixar como legado. É comum que haja alterações em CPIs, Comissões Permanentes e Frentes Parlamentares nesse período.
O próprio presidente Marcelo Santos pediu aos membros para renunciarem. Como o senhor avalia a iniciativa do presidente? Ele chegou a conversar com o senhor recentemente sobre a CPI?
Desde o início, dediquei grande esforço para estruturar os trabalhos da CPI em três frentes: primeiro, a análise documental, com dezenas de requerimentos e respostas de órgãos municipais, estaduais e federais; depois, a etapa de instrução e oitivas, ouvindo pessoas ligadas às denúncias já investigadas; e, por fim, as diligências externas, que exigiam apoio técnico do IPEM e da ANP. O IPEM, mesmo com limitações de equipe, sempre colaborou. Já a ANP, órgão federal, sendo a equipe que atende nosso estado lotada no Rio de Janeiro, alegando questões orçamentárias do Governo Federal, deixou de atender aos pedidos, o que travou parte fundamental das apurações. Some-se a isso a necessidade de parte das investigações envolverem Receita, Sefaz e Judiciário, além das questões de sigilo envolvendo inclusive multinacionais. Relatei todas essas dificuldades ao presidente Marcelo Santos, e, diante do limite de CPIs concomitantes [cinco, no máximo] e da espera de outras comissões para iniciar, entendendo que essas dificuldades não seriam superadas no curto espaço apenas com a vontade política do Parlamento, ele optou por iniciar a discussão sobre o encerramento, possibilitando que outras CPIs, com objeto de trabalho mais delimitado, por exemplo, possam ser instauradas.
Na minha apuração, ouvi de deputados que saíram que os trabalhos desde o início estavam muito concentrados no senhor. Era, nos bastidores, a “CPI do Denninho”. Além disso, não havia reunião formal de trabalho do colegiado desde meados do ano passado. Como o senhor responde a isso?
Atribuir a CPI unicamente a mim é um equívoco, embora compreensível, já que a presidência naturalmente concentra a condução dos trabalhos. Mas é importante registrar: nenhum requerimento de membro ou suplente deixou de ser considerado. Assumi o protagonismo porque o tema exigiu dedicação, articulação com órgãos externos e enfrentamento de resistências. Se a CPI avançou até onde avançou, foi justamente pelo esforço que tive em manter vivo o debate e as investigações, mesmo diante de tantas barreiras externas.
