Coluna Vitor Vogas
Aprovada a criação de 50 assessores de juiz no Poder Judiciário do ES
Assembleia também aprova, no mesmo projeto do TJES, criação de 20 funções gratificadas só para o setor de Tecnologia da Informação e Comunicação. Gasto com essa rubrica vai mais que duplicar

Justiça. Foto: Freepik
O Poder Judiciário do Espírito Santo terá mais 50 cargos comissionados para assessoramento de juízes, com salário de mais de R$ 6 mil. Essa é uma das muitas mudanças previstas em projeto de lei complementar do Tribunal de Justiça do Espírito Santo (TJES), aprovado em regime de urgência nesta segunda-feira (14) pela Assembleia Legislativa (Ales). O gasto extra com o pagamento de salários, em um ano, chegará perto de R$ 4 milhões (sem contar encargos trabalhistas, 13º e outros benefícios).
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O mesmo projeto cria 20 funções gratificadas para fortalecer a atuação da área de Tecnologia da Informação e Comunicação no Poder Judiciário, sendo cinco no valor de R$ 2 mil e 15 no valor de R$ 1,6 mil. O pagamento mensal do benefício para servidores do setor vai mais que duplicar.
A proposta também estabelece a criação de Laboratório de Inovação e Inteligência Artificial no TJES, além de novos órgãos na estrutura do Poder, como supervisões e coordenadorias, para as Varas de Família, as Criminais, as de Execuções Penais e as de Violência Doméstica e Familiar Contra a Mulher, bem como uma seção específica para atender a Ouvidoria da Mulher.
Adicionalmente, uma função gratificada já paga aos ocupantes de alguns cargos de chefia do tribunal (presidente, vice-presidente, corregedor-geral, entre outros) será estendida aos desembargadores que exercem outras funções de direção.
Os membros do Conselho Superior da Magistratura, que hoje recebem 1/30 do próprio subsídio por reunião, passarão a ter direito a uma gratificação mensal fixa correspondente a 15% do salário dos desembargadores, o equivalente a R$ 6.276,82.
Além disso, gratificação no mesmo valor passará a ser paga, mensalmente, aos membros da Comissão de Reforma do Judiciário, aos membros da Comissão de Regimento Interno e à chefe da Ouvidoria da Mulher do TJES.
Confira abaixo o detalhamento de cada mudança:
50 cargos comissionados
O projeto de lei complementar prevê a criação de mais 50 cargos comissionados de assessor de juiz. Segundo o presidente do TJES e autor do projeto, desembargador Samuel Meira Brasil Jr., o objetivo é “o atendimento das unidades judiciárias de primeiro grau com grande acervo ou elevada distribuição de processos, sem prejuízo dos cargos já existentes”.
A medida visa, portanto, “desafogar” as Varas e Juizados que estiverem sobrecarregados, com acervo processual acumulado, visando ao atendimento de metas de produtividade estabelecidas pelo Conselho Nacional de Justiça (CNJ).
“A criação dos novos cargos de assessor de juiz possibilitará uma maior efetividade quanto à resolução dos processos das unidades judiciárias com grande acervo ou elevada distribuição de processos, resultando, consequentemente, no incremento da prestação jurisdicional”, alega o presidente da Corte.
Calculadora: o gasto extra
De acordo com a tabela remuneratória do TJES, um assessor judiciário recebe salário bruto de R$ 6.197,90. Assim, o aumento anual de gastos, calculado em função dos salários brutos (sem contar 13º e outros benefícios), chegará perto de R$ 4 milhões.
- R$ 6.197,90 x 50 x 12
- Gasto extra com salários por mês: R$ 309.895,00
- Gasto extra com salários por ano: R$ 3.718.740,00
Funções gratificadas
Segundo o desembargador Samuel, “a proposta tem como objetivo principal a reformulação da estrutura e a criação de novas funções gratificadas na área de Tecnologia da Informação e Comunicação (TIC) do Poder Judiciário Estadual”.
Ano após ano, no relatório “Justiça em Números”, produzido pelo CNJ, o TJES tem figurado entre os piores tribunais do país nos indicadores de eficiência e produtividade, o que está diretamente relacionado com o ritmo de digitalização dos processos e das dinâmicas internas (Processo Judicial Eletrônico/PJe). O parque tecnológico defasado é, de fato, o calcanhar de Aquiles do TJES. Exatamente por isso, o tribunal contraiu um empréstimo de US$ 35,3 milhões junto ao Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID), assinado em dezembro do ano passado.
O projeto aprovado na Assembleia estabelece que as novas funções gratificadas de assistente de chefia de seção na área de TIC serão exercidas por servidores efetivos. “Essa medida visa garantir que profissionais com expertise técnica e conhecimento institucional assumam posições de liderança e responsabilidade na área tecnológica do tribunal”, argumenta o desembargador Samuel.
Ele sustenta que, “ao fortalecer a estrutura de TIC, o Tribunal de Justiça do Espírito Santo estará melhor preparado para enfrentar os desafios da era digital, como a implementação do processo eletrônico, da inteligência artificial aplicada ao Direito e da segurança cibernética”.
Calculadora: o gasto extra
Hoje, no TJES, existe a Secretaria de Tecnologia da Informação, formada por duas coordenadorias, totalizando 10 seções.
Portanto, na atual secretaria, há dez chefes de seção com direito ao recebimento de uma função gratificada no valor de R$ 2.044,08.
Com a mudança, a Secretaria de Tecnologia da Informação passará a se chamar Secretaria de Tecnologia da Informação e Comunicação. Será composta por quatro coordenadorias, totalizando 15 seções. Por conseguinte, haverá mais cinco chefes de sessão com direito à função gratificada de R$ 2.044,08.
Além disso, para cada uma das 15 funções gratificadas de chefe de seção da nova secretaria, haverá uma função gratificada de assistente de chefia de seção, que será exercida por um servidor efetivo, no valor de R$ 1.635,26.
Portanto, no total, o TJES está criando mais 20 funções gratificadas para essa área, sendo cinco para chefes de seção e 15 para assistentes de chefe de seção.
Como é hoje:
- 10 chefes de seção recebem função gratificada de R$ 2.044,08 cada um.
- Total de funções gratificadas: 10
- Gasto total por mês: R$ 20.440,80
- Gasto total por ano: R$ 245.289,60
Como passará a ser:
- 15 chefes de seção receberão função gratificada de R$ 2.044,08 cada um.
- 15 chefes de seção receberão função gratificada de R$ 1.635,26 cada um.
- Total de funções gratificadas: 30
- Gasto total por mês: R$ 55.190,10
- Gasto total por ano: R$ 666.281,20
Gratificação para desembargadores
A legislação estadual vigente prevê o pagamento de uma gratificação aos desembargadores que exerçam cargos de chefia no TJES. O valor corresponde a um percentual do subsídio dos desembargadores, acrescido à remuneração dos beneficiados. Em linguagem do dia a dia, é um extra. A gratificação, porém, está sujeita à regra do “abate teto”. O que superar o teto constitucional, correspondente ao subsídio de um ministro do STF, é descontado do contracheque do magistrado.
O percentual da gratificação varia conforme o cargo ocupado.
Hoje, o benefício “só” é pago ao presidente do TJES (30% do subsídio de um desembargador); ao vice-presidente (25%); ao corregedor-geral de Justiça e ao vice-corregedor (20% cada um); aos presidentes de Câmaras Isoladas, ao ouvidor judiciário, aos supervisores e ao diretor da Escola da Magistratura (15% cada um).
Além disso, os membros do Conselho Superior da Magistratura recebem uma gratificação no percentual de 1/30 dos vencimentos (3,33% do subsídio) por sessão a que comparecerem.
O projeto aprovado na Assembleia amplia essa lista. E aumenta o percentual para os membros do Conselho Superior da Magistratura.
Os membros do Conselho Superior da Magistratura passarão a ter direito a uma gratificação mensal fixa correspondente a 15% do salário dos desembargadores.
Além disso, a gratificação de 15% passará a ser paga, mensalmente, aos membros da Comissão de Reforma do Judiciário, aos membros da Comissão de Regimento Interno e à chefe da Ouvidoria da Mulher do TJES.
Quem já recebe a gratificação, do presidente ao diretor da Escola da Magistratura, seguirá a recebê-la nos percentuais já previstos e discriminados acima.
Calculadora: o incremento salarial
Hoje, o salário bruto de um desembargador é de R$ 41.845,49. Desse modo, com a gratificação, os respectivos vencimentos (sem desconto pela regra do abate teto) saltam para:
Presidente
- Gratificação: R$ 12.553,64 (30%)
- Total: R$ 41.845,49 + R$ 12.553,65 = R$ 54.399,13
Vice-presidente
- Gratificação: R$ 10.461,37 (25%)
- Total: R$ 41.845,49 + R$ 10.461,37 = R$ 52.306,86
Corregedor-geral de Justiça e vice-corregedor
- Gratificação: R$ 8.369,09 (20%)
- Total: R$ 41.845,49 + R$ 8.369,09 = R$ 50.214,58
Presidentes de Câmaras Isoladas, ouvidor judiciário, supervisores, diretor da Escola da Magistratura e, se o projeto virar lei, também a ouvidora da Mulher, os membros do Conselho Superior da Magistratura, da Comissão de Reforma do Judiciário e da Comissão de Regimento Interno
- Gratificação: R$ 6.276,82 (15%)
- Total: R$ 41.845,49 + R$ 6.276,82 = R$ 48.122,31
O cálculo, logicamente, só diz respeito ao benefício em análise. Não considera uma série de outros penduricalhos a que os desembargadores têm direito.
Sem acúmulo
É importante ressaltar que um mesmo desembargador não pode acumular essa gratificação pelo eventual exercício de dois ou mais cargos de chefia. Se o novo projeto do TJES for sancionado, essa vedação seguirá valendo. Nesse caso, o desembargador deve escolher (optando, naturalmente, pelo maior percentual).
Para darmos um exemplo concreto, o atual presidente do tribunal, Samuel Meira Brasil Jr., também é um dos cinco membros titulares do Conselho Superior da Magistratura. Ele não pode acumular os 30% de gratificação que já recebe pelo exercício da presidência com a gratificação a que teria direito pela participação no Conselho.
Laboratório de I.A.
O projeto também prevê a implantação de um inédito Laboratório de Inovação e Inteligência Artificial, diretamente vinculado à presidência do TJES. Segundo o presidente, o espaço será um “centro agregador de ideias e iniciativas voltadas para o aperfeiçoamento do serviço judiciário, haja vista que o cenário atual, marcado por rápidas transformações tecnológicas e pela digitalização dos processos judiciais, exige uma estrutura organizacional robusta e adaptável na área de TIC”.
De acordo com o desembargador Samuel, as iniciativas surgem como resposta à crescente demanda nessa área e à “necessidade de profissionais qualificados e especializados no setor de tecnologia, essenciais para a modernização e eficiência da prestação jurisdicional em nosso Estado”.
Novos órgãos
O projeto ainda institui novas coordenadorias na estrutura do TJES, a saber:
- Coordenadoria das Varas Criminais;
- Coordenadoria das Execuções Penais;
- Coordenadoria das Varas de Família;
- Coordenadoria das Varas de Violência Doméstica e Familiar Contra a Mulher, bem como uma seção específica para atender a Ouvidoria da Mulher.
Vinculadas à presidência do TJES, as quatro futuras coordenadorias serão integradas, cada qual, por um desembargador indicado pelo Tribunal Pleno e por um juiz vitalício, também escolhido pelo Pleno. Em todos os casos, os atos de supervisão serão exercidos pelo desembargador e os executivos e administrativos, pelo juiz de Direito.
“Redução de gastos”
Apesar da criação de cargos e funções gratificadas, na justificativa do projeto, o presidente do TJES informa que, no conjunto das mudanças previstas pelo (extenso) projeto, o impacto financeiro na verdade será negativo.
Segundo ele, no orçamento e nas despesas do Poder Judiciário Estadual, haverá redução de R$ 1.933.000,00 até o fim deste ano. Para 2026 e 2027, a estimativa é de uma redução de aproximadamente R$ 2.729.000,00 por ano.
Assim, até o fim de 2027, o TJES estima que economizará cerca de R$ 6,5 milhões. Perguntamos à assessoria do tribunal quais são as “medidas compensatórios” que possibilitarão a redução de gastos, na contramão da criação de cargos e funções. Se obtivermos resposta, este texto será atualizado.
De todo modo, um trecho da proposta de lei determina que ficam bloqueadas as nomeações para cargos de juízes de Direito em algumas Varas e Juizados Especiais nos municípios de Vitória, Vila Velha, Cariacica e Colatina.
