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Coluna Vitor Vogas

Justiça afasta quatro vereadores da Serra acusados de corrupção

Juiz da 2ª Vara também aceitou denúncia do MPES oferecida contra os quatro parlamentares, incluindo o presidente da Câmara, Saulinho da Academia, e contra dois ex-vereadores (Luiz Carlos Moreira e Aloísio Santana)

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No sentido da leitura: Cleber Serrinha, Wellington Alemão, Saulinho da Academia e Teilton Valim: acusados pelo MPES

No sentido da leitura: Cleber Serrinha, Wellington Alemão, Saulinho da Academia e Teilton Valim: acusados pelo MPES

A Justiça Estadual determinou o afastamento cautelar dos quatro vereadores da Serra acusados de corrupção passiva pelo Ministério Público do Espírito Santo (MPES), acolhendo pedido liminar apresentado pelo órgão. A decisão, tomada pelo juiz da 2ª Vara Criminal da Serra, Gustavo Grillo Ferreira, atinge o presidente da Câmara Municipal, Saulinho da Academia (PDT), além dos vereadores Teilton Valim (PDT), Cleber Serrinha (MDB) e Wellington Alemão (Rede). Eles devem ser imediatamente afastados dos respectivos mandatos, por prazo indeterminado.

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Em outra decisão, também tomada na tarde desta terça-feira (23), o juiz Gustavo Grillo aceitou a ação penal proposta pelo MPES contra os quatro parlamentares e contra dois ex-vereadores da Serra: Luiz Carlos Moreira, presidente municipal do MDB, e Aloísio Santana. Os seis agora se tornam réus. Saulinho, Teilton, Cleber e Wellington passam a responder à Justiça por corrupção passiva, enquanto Moreira e Aloísio passam a responder por corrupção ativa.

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Os seis foram denunciados pela 8ª Promotoria Criminal da Serra por suspeita de envolvimento em um esquema de negociação e cobrança de propina em troca da aprovação de projetos de interesse de empresários na Câmara da Serra. O MPES pediu, cautelarmente, que os quatro atuais parlamentares fossem imediatamente afastados dos respectivos mandatos, para preservação da ordem pública.

De acordo com a decisão, durante o período do afastamento, os quatro vereadores poderão continuar recebendo normalmente a remuneração relativa ao exercício do mandato, “a não ser que a Câmara Municipal de Serra delibere de forma diversa”.

Enquanto estiverem afastados, os quatro vereadores ficam proibidos de frequentar a sede da Câmara da Serra e demais dependências administrativas do Poder Legislativo Municipal. Também ficam impedidos de fazer contato direto ou indireto com os todos coacusados e com testemunhas arroladas no inquérito e na denúncia, salvo quando a comunicação for necessária para o exercício da ampla defesa, mediante prévia autorização do juízo da Serra.

Eles ainda ficam proibidos de praticar qualquer ato de gestão ou deliberação em nome da Câmara ou de utilizar prerrogativas parlamentares que possibilitem a continuidade da execução dos atos pelos quais foram denunciados.

Os quatro precisam devolver imediatamente, se houver, de crachás, senhas, chaves, tokens ou quaisquer elementos de acesso a sistemas operacionais/aplicativos (intranet; sistema legislativo; webmail, dentre outros) que lhes permitam interferir na tramitação de proposições legislativas.

Segundo o juiz Gustavo Grillo, a suspensão do exercício do cargo foi necessária porque existe “vínculo funcional direto entre o ato legislativo pretendido e a contraprestação alegada (o fato é praticado em estreita ligação com a função pública), o que configura o nexo previsto para autorizar a medida excepcional”. Em outras palavras, o exercício do mandato é precisamente o que proporciona aos acusados a perpetuação da prática de captação de propina, pela qual foram denunciados.

Para o autor da decisão, a permanência dos quatro nos cargos implicaria risco real de manutenção do suposto esquema, principalmente levando-se em conta que três deles ocupam as principais posições da Mesa Diretora da Câmara: Saulinho (presidente), Cleber Serrinha (1º secretário) e Wellington Alemão (2º secretário).

“Ademais, a manutenção dos agentes no exercício pleno de suas funções importa risco real de continuidade de práticas semelhantes, dada a própria natureza do ilícito (negociação de votação/ ‘compra’ de legislação) e a facilidade de reiteração por meio do trânsito e desenvolvimento normal das atividades legislativas, notadamente pelo fato de que três dos vereadores aqui denunciados, pertencem à mesa diretora da casa legislativa, tudo, pois, a atestar forte poder de influência nos demais edis”, anotou o titular da 2ª Vara Criminal.

Segundo o juiz, o afastamento foi autorizado “de modo a assegurar a ordem pública e a regular instrução processual, sem antecipar juízo de condenação”.

A denúncia: gravação bombástica

A denúncia por corrupção resultou de investigação, também conduzida pelo MPES, deflagrada a partir de um áudio gravado em 2024 e entregue pelo então vereador Anderson Muniz. Trata-se de uma reunião realizada pelos quatro vereadores acusados de corrupção passiva e outros colegas, nas dependências da Câmara da Serra, no dia em que seria votado um projeto de lei enviado pela Prefeitura da Serra. A proposta de lei visava viabilizar a regularização de imóveis pertencentes ao poder público, mas utilizados há muito tempo por particulares no município.

No diálogo, os parlamentares discutem abertamente maneiras de obterem vantagens indevidas como contrapartida para aprovarem o projeto, incluindo o possível pagamento da quantia de R$ 100 mil e até um terreno no bairro Carapebus que valeria mais que isso, oferecido pelo intermediário de um empresário interessado na aprovação da matéria. Eles chegam a falar em uma emenda, apresentada por Wellington Alemão (Rede), para atender a interesses privados de terceiros, ampliando as possibilidades de regularização de imóveis, em troca do pagamento de vantagem indevida.

Para o MPES, o diálogo também indica que a prática seria habitual na Câmara da Serra e também teria sido empregada durante a tramitação de outros projetos estratégicos do Poder Executivo Municipal de grande importância para agentes privados, como o Plano Diretor Municipal (PDM).

Entenda o caso

A denúncia contra os seis suspeitos foi apresentada, no dia 14 de agosto, pela titular da 8ª Promotoria Criminal da Serra, à 2ª Vara Criminal da comarca.

Antes de decidir se acolhia ou não a denúncia, o juiz Gustavo Grillo devolveu os autos à titular da ação, para que se manifestasse sobre a possibilidade de propor aos acusados um Acordo de Não Persecução Penal (ANPP). Introduzido no Código de Processo Penal pelo Pacote Anticrime, em 2021, um acordo dessa natureza permite aos acusados arcar com penas mais brandas, mediante o cumprimento de algumas condicionantes. Entre elas, a confissão dos crimes.

No 1º grau, a promotora responsável pelo caso decidiu não propor o ANPP. Além da gravidade dos atos imputados aos acusados, ela argumentou que, em momento algum, durante a fase investigatória, os vereadores confessaram os crimes apurados, sendo esse um dos pré-requisitos fundamentais para oferecimento de um acordo desse tipo. Para a promotora, a propositura de um acordo como esse também seria insuficiente para reprimir as condutas pelas quais os vereadores foram denunciados.

O juiz, então, abriu prazo para que as defesas dos acusados pedissem, se assim quisessem, a remessa dos autos para a análise da instância revisora – no caso, a Procuradoria-Geral de Justiça. O pedido de fato foi apresentado pelas defesas dos quatro parlamentares. Em posse das petições, o juiz decidiu, no último dia 5, remeter o processo para nova análise da 8ª Promotoria Criminal da Serra. Pelos mesmos motivos, a promotora voltou a se negar a oferecer um acordo. O processo, então, “subiu” para o gabinete do procurador-geral de Justiça, Francisco Martínez Berdeal.

Na quarta-feira (17), Berdeal também concluiu que não cabe acordo nesse caso. Basicamente, os argumentos do chefe do MPES são os mesmos apresentados pela titular da ação. O mais importante deles: a insuficiência do acordo para reprovação e prevenção do crime em tela, atribuído aos quatro vereadores.

Para Berdeal, “há fortes indícios de que os fatos denunciados não se configuram como episódio isolado, mas como práticas reiteradas e planejadas, com registros de situações semelhantes no passado e a possibilidade de novas ocorrências”.

De acordo com o MPES, “o posicionamento também está em consonância com a jurisprudência consolidada do Superior Tribunal de Justiça (STJ), segundo a qual o ANPP não constitui direito subjetivo do investigado, sendo legítima a recusa do Ministério Público quando ausente o requisito subjetivo”.

Em nota, a assessoria do MPES informou que “a decisão foi fundamentada no art. 28-A do Código de Processo Penal, que exige, além dos requisitos objetivos, a presença do requisito subjetivo: a suficiência do acordo para a reprovação e prevenção do crime. Nesse caso, a Procuradoria-Geral de Justiça (PGJ) concluiu que o benefício não seria adequado, diante da gravidade institucional das condutas, da repercussão coletiva e do risco de reincidência”.

Com isso, esgotaram-se as possibilidades de oferecimento de acordo para os vereadores acusados. O processo então retornou para a 2ª Vara Criminal da Serra, e coube ao juiz Gustavo Grillo decidir se recebia ou não a denúncia oferecida pelo MPES e se atendia ou não ao pedido de afastamento cautelar apresentado pelo órgão.

Nesta terça-feira (23), o magistrado tomou suas decisões.