Coluna Inovação
Coluna Inovação | A culpa é do empresário?
As dificuldades de contratar pessoal são um reflexo de problemas estruturais mais amplos na economia brasileira, que afetam diretamente a capacidade de pagamento de salários pelos empresários
Em matérias na imprensa, repercutidas na internet, sobre a dificuldade atual de contratar pessoal, muitos leitores sugerem que empresários deveriam pagar melhores salários que logo as pessoas apareceriam. A culpa seria dos empresários que privilegiariam preservar o lucro e egoisticamente evitariam aumentar salários.
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Existe um abismo de conhecimento sobre o que se passa na cabeça de um empresário e o que se passa na cabeça de quem nunca empreendeu. As dificuldades de manter uma empresa viva no Brasil não são perceptíveis para quem não vive esse problema. As sugestões rasteiras dos leitores raramente consideram os custos do empresário. Impostos altos, gastos para administrar esses impostos, crédito caro, legislação trabalhista adversária, custos com segurança que o estado deveria suprir, variação errática de câmbio e taxas de inflação, insegurança jurídica e tudo mais que torna a previsibilidade quase impossível. A dificuldade de entender é maior ainda para funcionários públicos que recebem seu salário no final do mês, sem risco de demissão.
Com certeza o empresário pagaria salário maior se isso fosse indispensável para manter a sobrevivência da empresa, mesmo às custas da margem por um período.
Na década de 1980 no Brasil, o movimento da qualidade nos ensinou que a equação Custo + Lucro = Preço fora substituída por Preço – Lucro = Custo. Em outras palavras, não é a empresa que determina o preço que vai vender, mas o cliente é que determina o preço que quer pagar. A empresa que procure administrar seu custo para conseguir uma margem que lhe interesse, diante de uma concorrência cada vez maior.
Nessa lógica de sobrevivência, não é a boa vontade do empresário de pagar melhores salários que determina sua decisão. É a boa vontade do mercado de aceitar um aumento de preço, considerando que os outros custos, que estão fora do seu controle, não são passíveis de redução e não estão na pauta dos leitores que reclamam.
Uma consequência natural dessa distorção é o aumento da automação de processos reduzindo a necessidade de pessoal com tecnologia em todos os níveis na indústria, no comércio e na agricultura. Embora inevitável, isso talvez fosse retardado dada a inconsequência do ponto de vista social no Brasil.
Porteiros são substituídos por câmeras com reconhecimento facial, caixas de supermercado por auto serviço, tratoristas por drones, carregadores por robôs humanoides, faxineiras por aspiradores digitais e até no restaurante a quilo da esquina a balança já emite a conta. Aqueles que antes procuravam emprego viraram Uber ou resolveram ficar na informalidade, acrescida muitas vezes de bolsas, necessárias muitas vezes do ponto de vista social, mas passíveis de redução de quantidade considerando que muitos fogem do emprego formal para não perdê-las.
O governo mantém seu custo, a ineficiência geral permanece, subsídios indevidos se mantém, o uso da tecnologia avança com muita importação e os salários ficam achatados.
A redução de gastos do governo, preconizada pela grande parte dos economistas, não precisa ser pelo lado social. As reformas trabalhista, previdenciária e tributária, as privatizações e concessões ajudam a reduzir gastos e melhoram a eficiência dos serviços públicos e a administração de custos das empresas. Fica faltando uma reforma administrativa e uma nova reforma da previdência, pelo peso enorme nas contas e o controle geral de gastos, indispensáveis para reduzir as taxas de juros e permitir um crescimento sem inflação e sem voos de galinha.
Sem todo esse peso, os empresários poderiam pagar melhores salários.
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