Coluna Vitor Vogas
Por que Neucimar abandonou o partido que ele mesmo comandava?
E mais: por que muitos partidos devem ser riscados do mapa este ano, enquanto o PP tem tudo para se tornar um gigante político no ES?

Neucimar Fraga (primeiro à esquerda) entra no PP com as bênçãos de Arthur Lira (primeiro ao lado dele). Foto: Assessoria de Neucimar
A decisão do deputado federal Neucimar Fraga de trocar o PSD pelo PP, abandonando o partido que ele mesmo presidia no Espírito Santo, levanta algumas perguntas fundamentais. A primeira e mais inquietante delas: o que leva um dirigente partidário a dar adeus à própria legenda dias antes do fim do prazo para filiações de candidatos?
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A resposta repousa em duas palavras: o pragmatismo político que leva não só Neucimar, mas a classe política em geral, a priorizar a própria sobrevivência eleitoral, acima de conceitos como fidelidade partidária ou da adesão a programas ideológicos. O deputado federal é só um exemplo bem-acabado de um comportamento geral.
O motivo da decisão é confirmado pelo próprio Neucimar, tanto em conversa com a coluna como na nota oficial divulgada por ele às 18h30 desta quarta-feira (23), tornando oficial a sua mudança de partido. “O deputado federal decidiu entrar no PP, pois esta escolha vai viabilizar a construção de uma chapa mais competitiva [na disputa para a Câmara dos Deputados]”.
Primeira certeza: dirigentes em apuros
O movimento de Neucimar também realça três certezas de maneira exemplar. A primeira é que a proibição das coligações partidárias nas eleições de deputados neste ano abalou o antigo modus operandi dos caciques partidários e deixou a maioria deles bastante desorientados. Os dirigentes tiveram quatro anos, mas não fizeram o dever de casa.
Até então, o “dono” de um partido sem muitos candidatos competitivos poderia garantir ao menos a própria reeleição, escorando-se nos outros partidos integrantes da mesma coligação. Agora, não. Cada partido precisa se virar por si para lançar a própria chapa. No Espírito Santo, uma chapa completa de candidatos a deputado federal precisa ter 11 candidatos (sendo quatro mulheres, pelo menos). E, a bem da verdade, são bem poucos os partidos que hoje podem afirmar que possuem 11 pré-candidatos. Muitos deles, inclusive agremiações de médio porte, simplesmente não vão conseguir montar uma chapa.
Era o caso do PSD, sob a gestão de Neucimar. Ele então decidiu salvar a própria candidatura, pulando do navio que ele mesmo capitaneava e entrando de bom grado no bote salva-vidas do PP. Como ele, muitos farão. Para citar outro exemplo, trouxemos aqui na segunda-feira (21) o caso da deputada estadual Janete de Sá, que irá para o PSB mesmo sendo a presidente estadual do PMN.
Segunda certeza: sistema partidário derreteu
A segunda certeza é antiga, mas se fortalece ainda mais: o sistema partidário brasileiro derreteu, ruiu há muito tempo. Na sua imensa maioria, os mais de 30 partidos registrados no país não têm programa nem ideologia definida e seguida por seus filiados. Não passam de agrupamentos de políticos locais reunidos por conveniência, momentaneamente (isto é, durante as eleições), sob laços frágeis e logo desfeitos no mandato ou na eleição seguinte. São cartórios eleitorais autorizados pelo TSE.
Terceira certeza: o PP vai crescer muito no ES
A terceira certeza é que, na prática, após as eleições parlamentares deste ano, alguns partidos tendem a sumir do mapa político do Espírito Santo, enquanto outros poucos tendem a se agigantar. Um sério candidato a entrar na segunda categoria é o próprio PP. Muito grande em outros estados, mas até hoje apenas mediano no Espírito Santo, o Progressistas tem tudo para se tornar um gigante político no Estado após as eleições de outubro – se confirmado o embarque coletivo de figurões da política capixaba que está se anunciando.
Só na chapa de deputados federais, o PP já contava com seu presidente estadual, o secretário estadual de Desenvolvimento Urbano, Marcus Vicente, e com os deputados federais Evair de Melo e Josias da Vitória, filiado no último dia 11. Agora, chega Neucimar. Nos próximos dias, tudo indica que será a vez da família Ferraço: o patriarca, Theodorico Ferraço, candidato à reeleição na Assembleia; sua mulher, Norma Ayub, candidata à reeleição na Câmara Federal; e o filho, Ricardo Ferraço, cotado para compor chapa majoritária com Renato Casagrande (PSB). Os três já deram tchau para o União Brasil.
Além do clã Ferraço, o PP espera a filiação do deputado estadual Marcos Garcia, de saída do PV. O empresário do agronegócio e de outros ramos em Linhares também é candidato a deputado federal.
As informações são confirmadas à coluna por Neucimar e Da Vitória.
O raciocínio de Neucimar: por que ele optou pelo PP?
Fica uma última pergunta inquietante: se a chapa de deputados federais do PP-ES já estava tão pesada (com Marcus Vicente, Evair e Da Vitória), por que Neucimar acredita que terá maiores chances de reeleição em uma chapa que ficará ainda mais pesada com a chegada dele mesmo e, no mínimo, de outra deputada com mandato (Norma Ayub)?
Em seu estilo altamente pragmático – desnudando sem rubor a “política como ela é” –, Neucimar explica sua tese: com as mudanças na legislação eleitoral, proibindo as coligações nas eleições para deputados e reduzindo o número máximo de candidatos por chapa, tornou-se mais interessante, para quem já tem mandato, unir forças com quem se encontra na mesma situação, juntando-se todos em uma mesma chapa para disputar a reeleição.
Pelas contas de Neucimar, com essa escalação, a chapa do PP fará pelo menos três, podendo chegar a quatro dos dez assentos de deputado federal pelo Espírito Santo.
“O projeto do PP foi o que mais me atraiu porque está sendo formado um bloco de candidatos: eu, Norma, Marcos Garcia, Da Vitória, Marcus Vicente, Evair, além dos que eu levarei para o PP, como a Renata Fiório, que está disposta a nos acompanhar para o partido que formos. Com esses nomes, acredito que a chapa do PP possa fazer pelo menos três vagas. Só com esses nomes, calculando com base na votação de cada um na eleição passada, a chapa passaria de 300 mil votos totais. Nosso [matemático] Oswald de Souza já fez as contas. Estamos trabalhando com o coeficiente eleitoral de 190 mil votos para uma chapa fazer um deputado federal. Nesse cenário, a chapa que fizer a primeira vaga preenche a segunda com 240 mil votos. Com 350 mil votos, faz a terceira. Acima de 410 mil, faz a quarta.”
Ou seja: nesse novo formato de disputa, a tendência é que os candidatos mais competitivos (os famosos “puxadores de votos”) se reúnam em algumas poucas chapas, em vez de se espalharem por várias chapas de vários partidos, até para não “dispersar forças”. A consequência previsível é que pouquíssimos partidos realmente consigam lançar chapas de deputados.
Em última instância, muitos dos partidos menores tendem a ser riscados do mapa político – “depuração” que, inclusive, é um dos objetivos da reforma eleitoral de 2017, a qual pôs fim às coligações nas eleições proporcionais (vereadores e deputados).
“Como são só dez vagas de federais, a gente entende que ficar dispersados nos traz mais transtornos. É melhor ficarmos todos numa chapa forte do que ficar numa chapa em que a desistência de qualquer candidato pode dificultar a sua eleição. No Espírito Santo, você tem 12 partidos tentando fazer chapa de federais e no máximo seis partidos em condições de formar uma chapa completa. O PP agora passa a ter condições reais de eleger de três a quatro federais”, explica Neucimar, que vai além:
“Com esse movimento se consolidando amanhã [nesta quarta-feira], alguns nomes que ainda estão soltos podem migrar para essa chapa do PP, como o Jorge Silva. Dentro dessa nossa linha de raciocínio, é melhor disputarmos uma eleição sabendo que não seremos surpreendidos por alguma desistência na chapa. É melhor você disputar com cinco candidatos fortes numa mesma chapa que vai eleger quatro do que disputar com dois numa chapa que não vai eleger nenhum.”
Palavras de Neucimar, o sobrevivente político por excelência.
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