Coluna Inovação
A diferença entre estadistas e populistas
O governo JK consolidou um ciclo de crescimento e modernização no Brasil, combinando grandes obras, expansão industrial e efervescência cultural

Governo JK marcou um dos períodos mais prósperos e democráticos do Brasil, com crescimento econômico acelerado, grandes obras de infraestrutura e o surgimento de Brasília como símbolo de modernização. Foto: Arquivo pessoal
O governo JK foi um intervalo de relativa estabilidade entre períodos estressantes da política nacional. Eleito com 33,8% dos votos(não havia segundo turno) teve de governar sem maioria no Congresso e com uma oposição que vinha de tentativa de golpe militar para derrubar Getúlio e impedir a sua própria eleição e posse, motivada principalmente pela presença do PTB de João Goulart na chapa como vice-presidente. Essas e outras histórias são contadas no livro “JK, o artista do impossível” de Cláudio Bojunga.
> Quer receber as principais notícias do ES360 no WhatsApp? Clique aqui e entre na nossa comunidade!
Muitas vezes se vê hoje comentários na internet, de pessoas que desconhecem a história, argumentando que antigamente a imprensa relatava apenas fatos e hoje procura indevidamente analisar acontecimentos e emitir opinião. Carlos Lacerda era jornalista e com seus artigos demolidores foi adversário ferrenho de JK e mais ainda de Getúlio, sendo causa imediata do seu suicídio.
Getúlio era anticapitalista, confiava mais no Estado que na sociedade e dava precedência à política sobre a economia. JK aceitava de bom grado a desordem capitalista, nunca teve preconceito contra o lucro e sobrepunha a economia à política.
Juscelino era um sedutor como político. San Thiago Dantas dizia que ”Quem quiser ser inimigo de Juscelino deve ficar pelo menos a seis léguas de distância. O homem é uma pilha de simpatia humana”. Não tinha preconceitos ideológicos: ouvia adversários e opiniões discordantes e não se importava com a orientação filosófica ou doutrinária do interlocutor. Queria informar-se com opositores e seduzir adversários. Ulysses Guimarães dizia que “o homem público, sobretudo o Presidente, não pode ser amargo, ressentido. A vida pública se faz com felicidade e alegria – e Juscelino era homem feliz e alegre.” Democrata convicto dizia: “Quero a imprensa desatada, mesmo para ser injusta comigo.”
Imaginem como foi possível, em situação de minoria, aprovar a construção de Brasília e a mudança da capital. A oposição só aprovou porque não acreditou que seria possível e que JK encontraria no cerrado o seu “túmulo político”. Brasília custou caro – a inflação foi a 30,5% em 1960 – mas provocou a integração geográfica do país, ainda mais com a construção da Belém-Brasília, outra iniciativa sua.
Hoje temos inveja do ritmo chinês de crescimento, mas já fizemos coisas assim. JK fez um governo de realizações impressionantes, fora construir uma cidade inteira em cinco anos. Energia era uma obsessão. Encontrou 7 bilhões de m³ de água represada e deixou 82 bilhões. Construiu 20 mil km de estradas e pavimentou 5 600 km de rodovias já existentes. Entre 1956 e 1960 a economia teve taxa de crescimento de 8,1% ao ano, chegando a 10,8% em 1960. A participação da indústria no PIB passou de 20,4% em 1955 para 25,6% em 1960. Abriu a economia para participação estrangeira, inclusive para a indústria automobilística, em uma época onde a Ford se aferrava a um relatório suspeito segundo o qual não seria possível fundir um motor à explosão nos trópicos. Entendia também que o desenvolvimento físico do país demandava ser complementado pelo desenvolvimento cultural. Foi um dos períodos de maior efervescência cultural que explodiu depois na música, no cinema e nas artes em geral.
Para conseguir a adesão dos brasileiros, JK se transformou em missionário da refundação do país. Circulava de avião, muitas vezes em situações perigosas. Inspecionava rodovias e hidrelétricas, conversava com operários no canteiro de obras e explicava periodicamente ao país o andamento dos trabalhos. O ex-Senador Eduardo Suplicy diz que o seu primeiro professor de desenvolvimento econômico, ainda adolescente, foi JK explicando didaticamente seu Programa de Metas na TV. Esse é um grande papel do estadista: conversar, motivar, explicar e convencer.
Ser populista é mais fácil, basta fazer o que as pesquisas de opinião ou os algoritmos nas redes sociais comandam, manipulando ódios recíprocos. Fazer o que tem de ser feito é para estadistas como JK e não para populistas.
Na biografia falta aquilo que faltou sempre aos governantes brasileiros, a prioridade na educação básica. Mas JK teve papel fundamental na história do país.
Candidatíssimo a Presidente em 1965 foi cassado e teve os direitos políticos suspensos em 1964, assim como líderes de direita do movimento como Carlos Lacerda, também candidato, que os militares entendiam como ameaças ao seu poder. Muito tempo depois, perguntado o porquê da cassação de JK sem motivo, o General Figueiredo, revelando a baixeza desse período de inquisição política, foi sucinto: “Porque Costa e Silva quis”.
O governo JK foi um período de glória para a autoestima nacional. Nelson Rodrigues resumiu ao seu jeito o significado de JK: […] ele sacudiu dentro de nós insuspeitadas potencialidades. A partir de Juscelino surge um novo brasileiro.
Os artigos publicados pelos colunistas são de responsabilidade exclusiva de seus autores e não representam as ideias ou opiniões do ES360.
