Coluna João Gualberto
Coluna João Gualberto | Lideranças esgotadas
Análise aponta que a polarização política, agravada pela desconexão com evangélicos e jovens, explica a erosão de apoio ao governo Lula e projeta cenário desafiador para 2026

Enquanto o governo Lula enfrenta queda nas pesquisas, a polarização política brasileira revela um abismo entre esperanças progressistas e a ascensão do conservadorismo evangélico. Foto: Reprodução da internet
Temos visto, quase que diariamente, nos meios de comunicação, o crescimento do descontentamento dos brasileiros com o terceiro governo do presidente Lula. Grupos sociais como as mulheres e eleitores de territórios como os do Nordeste chamam a atenção nas quedas nas pesquisas. Os níveis de descontentamento, entretanto, são generalizados, não são fenômenos de bolhas sociais. Trata-se de algo mais amplo.
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As especulações sobre as razões que levaram o governo quase à lona têm sido feitas com muita frequência e nos mostram pontos importantes do processo de erosão da sua popularidade. Entretanto, é importante chamar a atenção para alguns pontos fundamentais no quadro de dificuldades ora instalado, o qual fatalmente complicará a situação do governo frente à sua própria sucessão, em 2026.
Em primeiro lugar, acredito que a maioria dos petistas não se deu conta de que foi mais Bolsonaro quem perdeu do que Lula quem ganhou a eleição de 2022. O ex-presidente teve crédito político ao organizar entorno de si o que podemos chamar de nova direita brasileira. Costurou com perfeição pontos concretos de insatisfação com o sistema vigente, agudizados pela incapacidade da então presidente Dilma Roussef para gerir a política.
O mérito de Bolsonaro e seu grupo foi perceber a força de renovação conservadora que portam os evangélicos, até então desprezados pelos políticos tradicionais e por intelectuais de uma forma geral. Ouso dizer que o fator chave que dá densidade ao pensamento dessa direita que hoje temos no Brasil é o cristianismo conservador. A Argentina, por exemplo, que não tem a mesma potência política dos evangélicos, busca sustentar o governo de Milei nas forças econômicas e de mercado. Aqui a narrativa reacionária cumpriu um papel eleitoral definitivo.
Essa nova direita venceu as eleições de 2018 comandada por Jair Bolsonaro e provocou uma disruptura totalmente inesperada, com derrotas importantes na maioria dos estados brasileiros. Entretanto, o governo que saiu das urnas nesse processo teve resultados muito ruins, com poucas entregas. Podemos dizer que Bolsonaro perdeu as eleições porque falou demais, tentou fazer muita graça e errou nos deboches da pandemia. Além disso, massacrou a cultura, as universidades e a ciência, de forma geral.
Lula deu aos setores que perderam em função dos excessos e incompreensões de Bolsonaro uma esperança de superar o atraso que estava colocado: ameaças ao meio ambiente, aos povos indígenas e às comunidades quilombolas, por exemplo. Creio que boa parte dos eleitores de Lula em 2022 esqueceu, naquele momento, o antipetismo e foi às urnas para evitar um segundo governo Bolsonaro. Creio mesmo que Bolsonaro perdeu por merecimento, ao passo que Lula ganhou jogando parado, impulsionado pelos erros do seu adversário e pela memória de seus feitos em governos anteriores.
Vencer uma eleição e montar um governo, quando boa parte dos seus eleitores não tem mais encantamento com sua liderança, não é simples. Sem o magnetismo pessoal de outros tempos e sem adesões emocionais fortes, como gostam os brasileiros, o governo começou tentando montar velhas lógicas. Nada de muito novo apareceu, destacando-se a repetição de antigas lideranças que acompanham Lula há décadas. O atual governo precisava ter encontrado novos eixos de relação com a sociedade, mas ao que parece não os encontrou, daí o mau desempenho nas pesquisas.
Vou ficar em dois exemplos: evangélicos e juventude. O governo do PT não encontrou meios de estabelecer uma relação qualificada com o mundo dos que antes chamávamos de crentes. Ficou na superfície, não trouxe nenhum quadro novo saído desses setores sociais e nem incluiu as demandas evangélicas nas políticas públicas. As suas redes de trabalhos sociais não foram beneficiadas, seus líderes também não. A prosperidade que desejam ficou nos discursos da direita.
As juventudes, sobretudo as de periferia, mas também as dos setores médios, com sua arte inovadora, seu engajamento nas redes sociais, seus desejos de igualdade e liberdade, não são compreendidas pelo atual governo. Na pior das posturas, Lula não fala para os jovens mais conservadores evangélicos e nem para os mais ligados aos temas identitários da classe artística, dos coletivos urbanos ou do público universitário.
O fato de ter vencido Bolsonaro ficou no passado. É preciso ir adiante no enfrentamento das velhas questões nacionais. O Brasil pode ter uma eleição presidencial no ano que vem sem as duas velhas raposas, e aí o novo se imporá. Parece ser esse o nosso caminho, buscando benefícios para todos, longe das ideologias que não geram bons governos.
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