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Coluna Vitor Vogas

“Peixada”: deputado é condenado a pagar R$ 30 mil por fake news

Rejeitando últimos recursos de Pablo Muribeca ao TRE-ES, tribunal mantém condenação do deputado e do ex-vereador Darcy Junior por propaganda irregular e negativa contra o Professor Renato Ribeiro

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Pablo Muribeca é deputado estadual

Pablo Muribeca é deputado estadual

O deputado estadual Pablo Muribeca (Republicanos) foi condenado pelo Tribunal Regional Eleitoral do Espírito Santo (TRE-ES) a pagar multa no valor de R$ 30 mil, por propaganda eleitoral negativa, durante a campanha do ano passado, contra o atual vereador Professor Renato Ribeiro (PDT). A sentença foi confirmada, na última segunda-feira (21), pelo TRE-ES. Na mesma ação, o ex-vereador Darcy Junior (Republicanos), aliado do deputado, sofreu igual condenação. Os membros do tribunal concluíram, por unanimidade, que Muribeca e Darcy mantiveram em suas redes sociais fake news em desfavor de Ribeiro, autor da ação contra eles, durante a maior parte do período oficial de campanha.

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Nas eleições municipais de 2024, Muribeca foi candidato a prefeito da Serra. Chegou ao 2º turno, mas perdeu a disputa para Weverson Meireles (PDT). Darcy, então vereador, foi candidato à reeleição, mas não teve êxito nas urnas. Já Renato Ribeiro, aliado do então prefeito Sérgio Vidigal (PDT), candidatou-se a vereador e conseguiu uma vaga na Câmara da Serra, com 3.606 votos, tendo sido empossado em janeiro deste ano. Foi o 9º vereador mais votado e, atualmente, faz parte da base de Weverson.

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Confirmada pelo TRE-ES em julgamento realizado na última segunda-feira, a sentença contra Muribeca e Darcy é consequência direta da chamada “Operação Peixada”, promovida pelo próprio deputado e aliados dele, então vereadores, no dia 17 de novembro de 2023, no Sine municipal da Serra – uma agência pública de empregos. À época, Ribeiro era subsecretário de Trabalho e Renda da Prefeitura de Serra, na gestão de Vidigal, e comandava diretamente a agência.

Apesar de os atores políticos envolvidos terem tratado a ação como “operação” e até a terem batizado com um nome impactante – dando ares oficiais à própria iniciativa –, o que houve, na realidade, não foi uma operação policial, mas uma espécie de “batida fiscalizatória” voluntária realizada, com grande alarde nas redes sociais, por Muribeca e vereadores de oposição à gestão Vidigal, entre eles Darcy.

Na referida data, eles foram de surpresa à repartição para, alegadamente, apurar no local uma denúncia, feita por uma servidora do Sine, sobre suposto direcionamento de vagas de emprego com fins eleitoreiros. Acusando o então subsecretário de “vender cargos” e “roubar emprego”, Muribeca filmou e postou toda a “operação” em suas redes sociais. Não houve acompanhamento nem respaldo do Ministério Público, da Polícia Civil ou de qualquer outro órgão investigativo competente.

“O prefeito está vendendo cargos através do Professor Renato e eu vou mostrar agora aqui”, afirmou Muribeca na postagem, usando também expressões como “loteamento de cargos através do Professor Renato”, “quem defende coisa errada é canalha” e “mais crime aqui”. “Enquanto você tá precisando de emprego, o prefeito tá vendendo cargo através do Professor Renato…”

Sem acusação formal, Ribeiro foi conduzido em uma viatura da Polícia Militar para depor em uma delegacia da Serra. Após a tomada do seu depoimento, foi imediatamente liberado. No mesmo dia, a Polícia informou, em nota oficial, que não houve flagrante nem foi constatado indício algum de crime praticado por ele.

A “Operação Peixada” levou a Prefeitura da Serra, na época, a acionar a Corregedoria da Assembleia Legislativa para apurar a conduta de Muribeca e a Câmara da Serra para fazer o mesmo em relação aos vereadores envolvidos.

O vídeo de Muribeca, acusando Ribeiro de “vender cargos” e “roubar empregos”, permaneceu no ar até o dia 26 de setembro do ano passado. Nessa data, na condição de candidato a vereador, Ribeiro acionou a Justiça Eleitoral: entrou com representação por propaganda eleitoral irregular contra a coligação “Muda Serra”, encabeçada por Muribeca, acusando-o de divulgar notícias sabidamente falsas em redes sociais.

Só então – no auge do período oficial de campanha, iniciado em 15 de agosto –, o vídeo foi retirado do ar: atendendo a um pedido liminar do candidato, a Justiça determinou a exclusão imediata da postagem de Muribeca. Esta, porém, àquela altura, já alcançara mais de 335 mil visualizações, além de mais de 10,8 mil curtidas.

O juízo de primeiro grau (53ª Zona Eleitoral da Serra) condenou o deputado e o então vereador Darcy Junior ao pagamento de multa de R$ 30 mil, cada um, por propaganda eleitoral irregular, a partir da divulgação de conteúdo inverídico e difamatório em rede social.

Os dois, então, recorreram da decisão ao TRE-ES, em fevereiro deste ano. No julgamento do mérito do recurso eleitoral, por maioria de votos, o tribunal confirmou a decisão de piso, mantendo a sentença, no dia 15 de abril.

O relator do recurso na Corte foi o juiz federal Alceu Maurício Júnior, que votou no sentido de acolher o recurso de Muribeca e anular a sentença de 1º grau. “Não se vislumbra a ocorrência de propaganda eleitoral antecipada negativa, seja por seu conteúdo não possuir relação com o pleito eleitoral ou pela ausência de preenchimento de requisito temporal, visto que a data de sua realização é 17 de novembro de 2023, ou seja, no ano anterior ao pleito”, argumentou o relator.

No entanto, a desembargadora Eliana Junqueira Munhós Ferreira pediu vista do processo e apresentou voto divergente, pela rejeição do recurso de Muribeca.

Eliana destacou “a falta de comprovação no momento da divulgação do vídeo, somada à posterior conclusão pela inexistência de provas de irregularidades” – ou seja: apesar de todo o estardalhaço, nada foi comprovado contra Ribeiro. Para a desembargadora, ao deixarem de cumprir o dever de verificar a fidedignidade das informações antes de publicá-las, Muribeca e Darcy “promoveram desinformação, manipulando os fatos para induzir o eleitorado ao erro e prejudicar a imagem do representante [Ribeiro]”.

Além disso, segundo ela, “o uso de termos categóricos como ‘canalha’ e ‘esquema de favorecimento’ inflamou o discurso público, criando um estado emocional e passional no eleitorado que, em última instância, foi prejudicial à imagem do representante”. A desembargadora concluiu que “restou demonstrada a configuração de propaganda eleitoral negativa por meio da divulgação de conteúdo notoriamente falso, calunioso e difamatório em desfavor do representante, com potencial para causar desequilíbrio na disputa eleitoral”.

A divergência inaugurada por Eliana foi seguida por todos os outros julgadores, deixando o relator com o voto vencido.

Diante do revés no Pleno, a defesa de Muribeca e Darcy entrou com novo recurso (embargos de declaração), questionando pontos do acórdão supostamente omissos ou obscuros. A Procuradoria Regional Eleitoral opinou pela rejeição dos embargos. Na última segunda-feira (21), em novo julgamento no Pleno do TRE-ES, por unanimidade, o colegiado rejeitou todas as alegações apresentadas no recurso e manteve a condenação do deputado e do ex-vereador. O voto da relatora, desembargadora Janete Simões, foi seguido pelos seis colegas. A decisão ainda não foi publicada.

“A fundamentação do acórdão é clara e suficiente, expondo que a publicação continha imputações categóricas de conduta criminosa sem provas, o que caracteriza conteúdo difamatório e desinformativo, típico de propaganda eleitoral negativa”, concluiu a relatora.

Procurada, a defesa de Muribeca e Darcy informou que agora, esgotadas as possibilidades de recurso à Corte Regional, vai recorrer da condenação ao Tribunal Superior Eleitoral (TSE). Segundo o advogado Rafael Teixeira de Freitas, um dos representantes da coligação, eles entrarão com recurso especial eleitoral no TSE.

De acordo com a assessoria do TRE-ES, embora os réus ainda possam recorrer à instância superior, a sentença deve ser cumprida imediatamente, ou seja, a multa já deve ser paga por cada um. “Em regra, os recursos eleitorais não têm efeito suspensivo, […] logo as decisões judiciais eleitorais, em regra, devem ter cumprimento imediato, salvo deferimento de pedido em sentido contrário.”

O valor da multa, nesse caso, deve ser recolhido diretamente aos cofres da União, e não ao autor da ação, já que não se trata de pedido de indenização, e sim de ação eleitoral. No entanto, o advogado de Ribeiro, Marcelo Nunes, informa que também pretende ajuizar ação de reparação por danos morais em face do deputado e do ex-vereador.

Os embargos de declaração, ponto a ponto

Nos embargos de declaração, a defesa de Muribeca e Darcy apresentou três argumentos centrais.

O primeiro é que a conduta de ambos não poderia ser classificada como propaganda negativa contra outro candidato uma vez que os fatos (a “Operação Peixada”) e a publicação do vídeo no Instagram de Muribeca datam de novembro de 2023, antecedendo, portanto, o período eleitoral. “Eventual apuração eleitoral só poderia ser realizada a partir da ótica da propaganda antecipada”.

O segundo é que “o direito fundamental à liberdade de expressão foi suprimido”, ou “violado”.

O terceiro tem a ver com uma entrevista dada por Muribeca ao “Bom Dia ES”, telejornal da TV Gazeta, no dia 17 de setembro de 2024, como candidato a prefeito da Serra, na qual ele reiterou as acusações a Renato Ribeiro – e, por extensão, à gestão de Vidigal e ao candidato do então prefeito, Weverson Meireles. A defesa alegou que o acórdão teria se baseado em “elementos estranhos aos autos, como a participação de um dos embargantes [Muribeca] em programa de televisão”. Segundo os advogados, esse material “sequer foi objeto de cotejo adequado nos autos”.

O voto da relatora, Janete Simões, é categórico. Ela rebateu, um a um, todos os pontos. “Constatada a inexistência de omissão, obscuridade ou contradição na decisão recorrida, os embargos de declaração são utilizados como mero inconformismo com o julgamento”, concluiu a desembargadora, acompanhada à unanimidade pelos pares.

Quanto à data da veiculação do vídeo, ela avaliou que o que vale no caso não é a data da postagem, e sim a da retirada do ar, conforme consta no acórdão de abril: “O acórdão reconhece expressamente que, embora postado em novembro de 2023, o vídeo permaneceu disponível até setembro de 2024, dentro do período oficial de campanha, sendo essa permanência relevante para a caracterização da propaganda eleitoral irregular”.

“A decisão analisada reconhece que o conteúdo permaneceu acessível em período eleitoral, com ampla difusão (mais de 335 mil visualizações), sendo essa circunstância suficiente para atrair a competência da Justiça Eleitoral e justificar o enquadramento como propaganda irregular”, julgou a relatora.

“A veiculação e permanência de conteúdo sabidamente inverídico e difamatório em redes sociais durante o período eleitoral configuram propaganda negativa irregular, ainda que a postagem original tenha sido realizada em data anterior ao início oficial da campanha”, completou.

Quanto à suposta supressão do direito à liberdade de expressão, ela contra-argumentou: “O acórdão rebate a tese de violação à liberdade de expressão, ao afirmar que esse direito fundamental não é absoluto e encontra limites na proteção à honra e na garantia de paridade entre os candidatos, nos termos da Constituição Federal e da jurisprudência do TSE”.

Já no tocante à alegação de que o acórdão teria se baseado em elementos estranhos aos autos, ela rebateu que a participação de Muribeca em programa de televisão (a entrevista ao “Bom Dia ES”) “constou expressamente na petição inicial da representação e integrou o conjunto probatório considerado”.

Para ela, a aludida entrevista não apenas reforçou as desinformações já disseminadas em mídia social, mas também ampliou seu alcance ao público televisivo, aumentando os potenciais danos à lisura do pleito. “A participação do representante [Muribeca] em programa televisivo, no período eleitoral, no qual reiterou o conteúdo ofensivo já disseminado na mídia social, potencializa o alcance da mensagem e amplia os efeitos danosos à honra do representado [Ribeiro] e à isonomia entre os candidatos.”

No entendimento de Janete, não restou dúvida quanto à prática de propaganda eleitoral negativa no caso concreto, caracterizada pela “divulgação de conteúdo sabidamente inverídico ou gravemente ofensivo à honra de candidato, com potencial de influenciar o pleito”.

“A análise do conteúdo revela imputações categóricas de prática ilícita ao representante [Ribeiro], sem lastro probatório, utilizando expressões como ‘venda de cargos’ e ‘roubando emprego’, o que configura difamação e desinformação”.

Por fim, ela negou o pedido de redução de multa formulado pela defesa: “Não merece acolhimento, considerando o alcance expressivo da propaganda irregular e a gravidade da infração, que comprometeu a isonomia entre os candidatos”.