Coluna Vitor Vogas
Pazolini vai pra cima de opositores na Câmara de Vitória
Em aguardada prestação de contas, prefeito tomou a ofensiva e respondeu ataques com ataques. Confira nossa análise e “melhores momentos” da sabatina
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No sentido da leitura: André Moreira, Karla Coser, Vinicius Simões e Lorenzo Pazolini
Foi com a faca nos dentes que o prefeito Lorenzo Pazolini (Republicanos) subiu à tribuna da Câmara de Vitória, na aguardada sessão especial de prestação de contas aos vereadores, realizada na manhã desta quarta-feira (12).
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Além de enumerar as realizações de seu mandato até agora, Pazolini adotou uma estratégia combativa: aos aliados, à Câmara e ao presidente da Casa de Leis, Leandro Piquet (Republicanos), reservou afagos, aproveitando a ocasião para tratar de melhorar uma relação ultimamente turbulenta com o Poder Legislativo; aos adversários atuais e do passado, distribuiu petardos.
Ciente de que os opositores viriam com fogo pesado e ansiavam pela rara oportunidade de confrontá-lo publicamente, Pazolini buscou se antecipar: nitidamente, compareceu ao plenário da Câmara com a estratégia premeditada de tomar a ofensiva. E foi à Casa determinado a não levar desaforo para a sua. Para isso, levou muita munição nos bolsos do paletó (como vídeos deixados “no ponto” e exibidos no telão, sob medida, a fim de rebater acusações que ele sabia que viriam).
Os questionamentos e críticas vieram, e vieram com força. Vinicius Simões (Cidadania), Karla Coser (PT) e André Moreira (PSol) bateram principalmente na reforma previdenciária municipal, nos protestos dos pescadores, no piso da enfermagem e em denúncias de irregularidades relativas à contratação de eventos culturais na cidade.
Mas, em vez de esperar os ataques para contragolpear, Pazolini decidiu surpreender o time adversário, indo para cima desde os primeiros minutos. Já na exposição inicial, afirmou, sem dar o nome, que um vereador ali merece ser cassado, por ter sofrido, segundo ele, condenação judicial definitiva. O nome não tardaria a sair da sua boca. No embate direto com Simões, Pazolini afirmou se tratar do vereador do Cidadania e ainda pediu providências à Corregedoria da Câmara.
Motivado por uma claque de servidores que lotaram as galerias – e não economizaram em impropérios contra os oposicionistas –, o prefeito devolveu fogo com fogo e tentou dar várias “invertidas”. Muitas vezes optou pelo sarcasmo e até entrou no “modo debochado”. Também não poupou críticas à administração do antecessor, Luciano Rezende (Cidadania), sem jamais mencionar o ex-prefeito.
Simões é aliado e correligionário de Fabrício Gandini (Cidadania) e de Luciano; Karla, do pai, João Coser (PT); Moreira, de Camila Valadão (PSol). Todos são pré-candidatos ao lugar de Pazolini no ano que vem. A prestação de contas foi mais uma prévia, um episódio piloto, da eleição municipal de 2024.
Abaixo, detalhamos os momentos mais quentes da sabatina, nos confrontos diretos do prefeito com seus três principais opositores:
Pazolini x Vinicius Simões
O embate mais pesado foi com Vinicius Simões. Sem detalhar o processo e a sentença, o prefeito afirmou categoricamente que o vereador sofreu condenação com trânsito em julgado (que não admite mais recursos) por ataques contra a honra alheia.
Aos gritos de “Condenado!” da claque, Pazolini disparou: “Estamos falando com uma pessoa que tem uma condenação judicial transitada em julgado. Foi condenado por mentir, por propalar inverdades na cidade. Não sou eu que estou dizendo. O Judiciário disse que ele é um condenado”.
Citado pelo prefeito, o Código de Ética da Câmara, no artigo 7º, IV, classifica como quebra de decoro “desacatar ou praticar ofensas físicas ou morais, dentro ou fora do Plenário, em razão do exercício da vereança, contra a honra de seus pares ou contra qualquer cidadão ou grupos de pessoas que assistam a sessões ou reuniões de trabalho da Câmara”.
Em seguida, falando diretamente ao corregedor-geral da Câmara, Leonardo Monjardim (Patriota), o prefeito conclamou o órgão disciplinar da Casa a abrir processo por quebra de decoro parlamentar contra Simões. Para isso, antes de mais nada, algum cidadão de Vitória precisa protocolar denúncia contra o vereador. Pazolini não afirmou se fará isso, mas provocou a Corregedoria:
“Como ele pode continuar sendo vereador se ele infringiu o Código de Ética e Decoro Parlamentar? A Casa não pode ser omissa com esse tipo de conduta! Não dá para aceitar! O Código de Ética está sendo rasgado! Peço ao corregedor: a Corregedoria precisa se reunir e tomar as medidas adequadas. Existe uma sentença que está sendo desrespeitada. Isso tira a legitimidade desta Casa e afeta toda esta Casa.”
Simões não entrou no mérito das acusações, mas, por sua vez, também bateu pesado em Pazolini.
“O prefeito veio a esta Casa pedir a cassação de um vereador! Quero lembrar que quem tem que prestar contas é o senhor! Não são os vereadores que têm que prestar contas agora. Enquanto o senhor gasta o seu tempo me atacando, vou gastar meu tempo defendendo a cidade.”
O vereador classificou a reforma previdenciária de Pazolini como “cruel, covarde e feita sem diálogo”. “Foi a única do Brasil inteiro que passou a taxar os aposentados que ganham a partir de um salário-mínimo! Quando o senhor vai mandar para esta Casa um projeto corrigindo isso?”, cobrou.
Simões acusou Pazolini de incoerência. “O senhor, como deputado estadual, foi contra a reforma previdenciária estadual”. Pazolini respondeu que foi contra porque, num “vexame”, o texto do projeto de lei enviado à Assembleia Legislativa pelo governo Casagrande estava errado.
Simões, então, exibiu um vídeo com parte de um pronunciamento de Pazolini em plenário no dia da votação da reforma estadual na Assembleia, em 2019. No discurso, o então deputado pedia uma votação com mais diálogo e mais calma. Simões acusou o prefeito de mentir:
“Incapacidade moral”
“Eu tinha dúvidas sobre sua capacidade técnica de cuidar da cidade. Começo a ter dúvidas sobre sua capacidade moral, porque Vossa Excelência mentiu. Como deputado, defendeu diálogo, calma… e foi tudo isso que Vossa Excelência não fez [como prefeito].”
Assim como Karla Coser, Simões cobrou o pagamento do piso da enfermagem e atribuiu a greve dos enfermeiros da rede municipal à “falta de diálogo” do prefeito.
O vereador do Cidadania também centrou fogo em questões relacionadas à área cultural. Conforme já foi questionado em sessão da Comissão de Cultura, ele destacou que a Prefeitura de Vitória aportou mais de R$ 100 mil ao show do cantor Roberto Carlos, realizado na Praça do Papa no dia 21 de abril e organizado por uma empresa particular.
“A Prefeitura investiu no evento particular em troca de 400 ingressos. Quais foram os critérios para distribuição desses ingressos? E por que o senhor está investindo dinheiro público em evento privado? Para onde foi esse dinheiro? Qual é o seu interesse nisso?”
Simões ainda afirmou que a Prefeitura empenhou cerca de R$ 10 milhões para uma só empresa que organiza eventos culturais. “É quase todo o orçamento da Secretaria de Cultura!”
Invertendo os papéis de inquisidor e inquirido, o prefeito acusou Simões de ser um inimigo da cultura e aproveitou para alfinetar a gestão passada, de Luciano Rezende, aliado e correligionário do vereador.
“Por que essa raiva toda contra a cultura e contra os produtores culturais? Tanta gente que estava desempregada, passando fome, e hoje estão se apresentando pela cidade, gerando renda, as comunidades estão recebendo apresentações culturais. Por que toda esse ódio da cultura e da cidade? Talvez seja porque Vossa Excelência tenha participado da gestão que mais retirou equipamentos culturais da cidade, que transformou a Praça do Papa num cemitério. Hoje a Praça do Papa recebe grandes atrações.”
Simões ainda perguntou a Pazolini se é verdade que há subsecretários municipais que possuem relação de parentesco com fornecedores da Prefeitura.
O prefeito rebateu: “Com relação a essas leviandades, é mais uma irresponsabilidade praticada por um vereador condenado por mentir. Procure os órgãos de controle. Faça as representações e ofereça as denúncias. Se não o fez é porque é omisso e quer jogar para a plateia. Se se omitiu é porque deve ter algum interesse escuso que não pode ser dito dessa tribuna”.
Pazolini x Karla Coser
Primeira opositora declarada a interpelar Pazolini, Karla Coser (PT) também foi dura. Começou criticando provocações feitas pelo prefeito já na exposição inicial – segundo ela, “falas direcionadas e agressivas a vereadores”. “Essa é a gestão do medo. É precisa saber manter o diálogo também com quem pensa diferente. Essa não é a postura que espero de um prefeito de Vitória.”
A petista afirmou que muitos eleitores de Pazolini em 2020 estão “decepcionados” com ele. Na última disputa municipal, o então deputado estadual derrotou João Coser (PT), pai da vereadora. “Depois de uma vitória da fantasia, a decepção é realidade. As pessoas estão decepcionadas com o seu projeto. E não adianta ouvir só a claque. Ouça também as pessoas que estão te criticando.”
O embate mais duro entre os dois se deu por conta dos recentes protestos dos pescadores de Vitória. Eles alegam que têm sido impedidos de realizar sua atividade devido a fiscalizações da Prefeitura e do Ibama. Por esse motivo, não participaram da tradicional Festa de São Pedro, padroeiro dos pecadores, no dia 2 de julho. Representantes da categoria têm ido à Câmara e alguns estavam presentes na prestação de contas.
“Os pescadores não são bandidos, estão com fome e precisam de uma solução. Qual é a solução da Prefeitura? O que vai ser respondido para os pescadores?”, questionou Karla.
Na resposta, Pazolini usou a mesma estratégia de inversão das posições, mas dessa vez com sarcasmo. Citou que o vereador André Brandino (PSC), aliado dele, “tem um projeto que resolve a questão”.
“Quantos vereadores assinaram o projeto? Tem 5 assinaturas! O quê?!? A nobre vereadora não assinou o projeto? Uai! Agora estou confuso, não estou entendendo mais nada. Mas ela defende os pescadores e não assinou o projeto?!? Isso é o avesso do avesso do avesso! É um estelionato, é lamentável essa postura! Lamento por esse desprazer que vocês estão tendo hoje, mas vocês estão sendo enganados”, afirmou o prefeito, dirigindo-se aos pescadores. E a Karla: “De maneira humilde, peço a Vossa Excelência que assine o projeto de lei do vereador Brandino, que resolve a questão.”
Discordando de que o dito projeto seja a solução para o problema, Karla lamentou o que considerou mais um desrespeito sofrido por ela em uma prestação de contas do prefeito.
“Tempos sombrios”
A vereadora também pisou forte na questão do piso da enfermagem, cobrando de Pazolini, no imperativo, o pagamento: “Pague o piso!”
Pazolini respondeu que o cadastro para isso já foi feito pela Prefeitura, mas que essa depende do repasse do Governo Federal. E voltou a inverter: “Como tem intimidade e abertura com o atual governo [Lula], Vossa Excelência pode nos ajudar. Peço humildemente que nos ajude”.
Passando à política habitacional, Karla afirmou que a Secretaria de Desenvolvimento da Cidade prometeu 1,5 mil unidades habitacionais, mas entregou menos que isso. E cobrou do prefeito: “Vamos terminar essa gestão sem adquirir nenhum prédio de interesse social? A entrega de escrituras é importante, mas insuficiente”.
Pazolini novamente replicou com uma alfinetada: “Sua sugestão é voltar àqueles tempos sombrios das desapropriações? É esse o desejo de Vossa Excelência?” Como prefeito, o hoje deputado estadual João Coser enfrentou acusações na Justiça por supostas irregularidades em processos de desapropriação, mas acabou inocentado.
Karla ainda cobrou a revisão da reforma previdenciária: “São mais de dois anos de sofrimento para os aposentados. O que está faltando para a Prefeitura apresentar a proposta? O senhor vai corrigir os erros cometidos com a pior reforma previdenciária do Brasil?”
Segundo Pazolini, se a reforma não tivesse sido feita, as finanças municipais teriam entrado em colapso.
Pazolini x André Moreira
Maior alvo dos insultos lançados das galerias pela claque da Prefeitura, André Moreira ouviu gritos como “André Nojeira”, “Gardenal” e “advogado de porta de cadeia”.
O psolista começou afirmando que Pazolini só compareceu à Câmara após ele apresentar um pedido de impeachment. Arquivado na última segunda-feira (10) pelo presidente da Casa, Leandro Piquet, o pedido se baseava em três argumentos, sendo um deles o não comparecimento dentro do prazo legal para essa sabatina.
Outra alegação era a de que o prefeito teria praticado promoção pessoal ao aparecer cantando ao microfone com artistas durante shows pagos pelo município. Esse foi exatamente o primeiro questionamento de Moreira, que também o levou, entre outras razões, a representar contra Pazolini no Tribunal de Contas do Estado (TCES): “O senhor continuará a fazer aquelas participações cantando junto com as atrações? Temos o seu compromisso de que não fará mais isso?”
Pazolini afirmou que o processo no TCES na verdade foi extinto de plano, sem julgamento de mérito.
“Vossa Excelência perdeu. Seu processo não foi sequer conhecido, nem sequer foi julgado. Não sou eu quem está dizendo. O processo é tão mal feito, tão mal instruído, que a própria Corte de Contas nem sequer o conheceu. O próprio tribunal disse: está tão mal feito que não dá nem para julgar o mérito”, disse Pazolini, exibindo no telão uma informação oficial do TCES.
O vereador do PSol retrucou: “Na verdade, o que o senhor teve do Tribunal de Contas foi uma segunda chance. O senhor não leu direito. O tribunal reconheceu que pode ter havido autopromoção, só que achou que o risco era baixo. Aproveite a segunda chance e se comprometa.”
“Vitória do amor”
Pazolini, então, voltou a buscar dar aquela “invertida” no oponente, também pintando-o como inimigo da cultura (e da felicidade):
“Não sei por que tanta perseguição à cultura. É triste, principalmente neste pós-pandemia. Isso ou é cegueira deliberada ou é vontade de não entender o óbvio. Vamos seguir sem perseguir a cultura como alguns estão fazendo aqui hoje. Vamos continuar construindo com amor, sem ódio”, disse o (não lulista) Pazolini.
“Esse discurso de ódio não transpassa as barreiras desta Casa, não chega aos corações das pessoas. As pessoas querem ser felizes. Estamos devolvendo a felicidade às pessoas”, emendou.
Assim como Simões, Moreira quis saber se algum subsecretário municipal é parente de representante de alguma empresa prestadora de serviços à Prefeitura. “Busque os órgãos de controle. Mas cuidado, porque a resposta pode ser igual àquela ali”, ironizou Pazolini, referindo-se ao desfecho da ação no TCES. “Aí fica lamentável…”
Assim como seus dois colegas na bancada da oposição, o psolista criticou o prefeito pela reforma previdenciária, quis saber qual era o déficit atuarial do município em 2021 e o acusou de ter mentido sobre os motivos de seu voto contrário à reforma estadual, na resposta a Simões.
“Nossa responsabilidade evitou o colapso. Se os vereadores não tivessem votado, hoje estaríamos no colapso absoluto”, reiterou Pazolini.
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