fbpx

Coluna Vitor Vogas

Mesa Diretora: os possíveis erros na estratégia do governo Casagrande

Palácio tem grandes chances de emplacar Marcelo, mas pode ganhar perdendo: com a base dividida, custo político para derrotar Vandinho tende a ser bem maior. Discurso de unidade da base na Assembleia e da “independência dos Poderes” cai por terra na volta de apresentação do mandato e Casagrande se expõe de uma forma inaudita. Leia a nossa análise completa 

Publicado

em

Na próxima quarta-feira (1º), como já apontado aqui, o deputado Marcelo Santos (Podemos) tem grandes chances de ser eleito presidente da Assembleia Legislativa contra Vandinho Leite (PSDB), como candidato do Palácio Anchieta e com as bênçãos públicas do governador Renato Casagrande (PSB). Mas para alguns, de qualquer maneira, o governo Casagrande sai desse processo perdendo, enfraquecido na articulação política e com a base fraturada em algum grau (o tamanho da rachadura só se poderá medir após o pleito, mas alguma sequela ficará).

> Quer receber as principais notícias do ES360 no WhatsApp? Clique aqui e entre na nossa comunidade!

O simples fato de chegarmos a dois dias da eleição da Mesa Diretora com a possibilidade de haver uma insólita disputa entre dois deputados importantes de sua base expõe, no mínimo, falhas na articulação do governo. E é a prova maior do insucesso em transpor para a prática o discurso de “unificação da base”.

Receba as notícias da coluna no grupo de Whatsapp do Vítor Vogas.

Em pleno início de novo mandato, com o capital político revigorado após ter sido reeleito, Casagrande tinha tudo para mostrar força nos bastidores, capacidade de articulação e unidade política na nova Assembleia. Em vez disso, o que se viu foi uma articulação confusa que culminou com o próprio governador se vendo obrigado a entrar em cena para tomar as rédeas do processo, expondo-se publicamente para assumir um lado e externar seu “encaminhamento de voto” à base.

Dizendo-o claramente, o governador meteu o pé na porta, de uma maneira que não condiz com seu perfil de equilíbrio e discrição em matérias afetas a outros Poderes e que representa, no mínimo, interferência inadequada e nem um pouco republicana na decisão interna corporis de outra instituição, pondo por terra o discurso da separação e da independência entre os Poderes. O soft power e a autoridade discreta, que se sente sem precisar se revelar, deu lugar ao uso da mão pesada. 

Em circunstâncias normais, se tudo estivesse dentro do script do governo, e não prestes a fugir do seu controle, Casagrande jamais teria vindo a público se expor dessa maneira, sujeitando-se à pecha de “autoritário”, “truculento”, “desrespeitoso”… (os dois últimos adjetivos foram usados por Vandinho em entrevista a este espaço). 

Teria arbitrado, sim, o processo, e buscado influenciar a decisão dos deputados, mas mantendo-se a uma distância asséptica e sem dar a cara a tapa – como ele mesmo sempre fez e como em regra sempre fizeram seus antecessores. Todo governador procura influenciar a eleição da Mesa. Raros o fazem de forma tão ostensiva – e insisto: não é do feitio de Casagrande. 

Chutar a porta dessa maneira com certeza não estava nos seus planos quando as articulações começaram e, se a menos de 10 dias da eleição, ele sentiu a necessidade de o fazer, foi porque algo no meio do caminho deu muito errado: sob as barbas de Casagrande, o processo de sucessão de Erick Musso estava tomando uma direção totalmente imprevista e indesejada pelo Palácio Anchieta. 

A tendência mais forte, obviamente, é que o governo – com o tamanho de sua base e com todos os trunfos e benesses que tem a oferecer nas negociações – consiga mesmo emplacar Marcelo, o que de todo modo será uma vitória. Mas a que custo? 

Para muitos, em alguma medida, será o clássico “ganhar perdendo”, pois a base sairá do jogo trincada e a oposição, abrigada na chapa de Vandinho, de qualquer forma sairá fortalecida.

Para o próprio Vandinho, vale o contrário: preterido e de certo modo humilhado, não tem mais nada a perder a esta altura mantendo-se no páreo, pois, perdendo ou ganhando, sairá fortalecido. E mais: valorizou imensamente o seu passe nas negociações com o Palácio. 

Vandinho e seus principais aliados não cedem: insistem que registrarão a própria chapa contra a de Marcelo na quarta-feira. Mas, se isso não passar de um grande blefe, se ele estiver esticando a corda até o limite só para elevar o valor da fatura por eventual retirada, bem, jogo jogado, o custo político para eleger Marcelo será bem maior para o Palácio e este terá que fazer concessões bem maiores a Vandinho e seus articuladores. 

E o que foi que deu errado? Onde o governo realmente errou? 

“Se o governador não entra como entrou, Vandinho teria vencido. É fato”, atesta um deputado governista. “Daí o ineditismo de ele ter colocado a cara na reta e declarado apoio a Marcelo como declarou.”

Com efeito, até segunda-feira passada (23), o deputado do PSDB já havia reunido em torno de si pelo menos 20 apoiadores, incluindo muitos colegas da base aliada. 

Na segunda-feira, a pedido de Casagrande, o chefe da Casa Civil, Davi Diniz, passou a fazer contato com os deputados da base orientando voto em Marcelo. No dia seguinte, o próprio governador confirmou à coluna seu apoio a Marcelo e sua orientação de voto à base. 

A partir da reviravolta, duas perguntas passaram a ser feitas em todos os círculos políticos: por que Casagrande deixou Vandinho ir tão longe? E, se era para barrá-lo, por que não o fez antes?

Alguns participantes do processo, incluindo deputados simpáticos a Casagrande, apontam erro de timing, de cálculo político e de interpretação do cenário que veio se desenhando ao longo de janeiro.

Para ser mais específico, o erro capital de leitura do governo foi o de ter acreditado por tempo demais em algo difícil de se crer em qualquer tempo: que seria possível eleger Tyago Hoffmann (PSB) presidente da Assembleia. 

Se assim quisesse, desde o início de janeiro, o governo poderia ter manobrado o seu pesado navio na direção de Marcelo Santos. Não o fez. Inicialmente, deixou Marcelo ficar quase isolado no processo. 

No fim de dezembro, por iniciativa de Vandinho, Tyago e Hudson Leal (aliado do primeiro), foi formado um blocão que chegou a 24 dos 30 deputados – a princípio, voltado somente para a distribuição das vagas nas comissões temáticas. Mas todos sabiam que desse blocão sairia uma chapa para a Mesa Diretora. 

Tanto Vandinho quanto Tyago eram aspirantes à presidência, ou seja, concorrentes internos à mesma vaga no blocão, sendo Tyago muito mais próximo do Palácio Anchieta. Enquanto isso, Marcelo e outros cinco deputados mais ligados a ele foram deixados de fora. 

Para todos os efeitos, esse movimento do blocão, incluindo o isolamento de Marcelo, estava sendo chancelado pelo governo Casagrande e foi assim interpretado pelos próprios deputados governistas. Afinal, ninguém menos que Tyago Hoffmann – considerado a “cara” do governo Casagrande – estava entre os cabeças do blocão, além do líder do governo na Assembleia, Dary Pagung (PSB).

“Nada contra o Marcelo, mas, quando o Tyago entrou, eu pensei ‘ora, isso é um movimento amplo, com a chancela do governo’. Quando o deputado olha para o Tyago, enxerga o governo Casagrande. Ele tem na testa um carimbo onde se lê ‘Palácio Anchieta’”, afirma um parlamentar da base. 

Acontece que Vandinho foi mais rápido e mais esperto que Tyago, que o governo, que todo mundo… O tucano foi articulando a sua chapa à presidência por dentro do blocão e, quando o governo se deu conta, ele já tinha maioria consolidada para se eleger presidente, incluindo o apoio não só de deputados da base como também (e esse detalhe gelou espinhas no Palácio) de todos os deputados da oposição. 

“Vandinho, inteligentemente, soube usar Tyago e o seu ‘carimbo do Palácio Anchieta’. Com a presença de Tyago no grupo, Vandinho conseguiu atrair vários governistas para o blocão, enquanto articulava a chapa dele pelas costas de Tyago”, avalia o mesmo deputado governista.

Tyago, então, ao se dar conta da “bola nas costas”, afastou-se de maneira ostensiva das conversas do blocão, guinada que levou muitos colegas da base, até então totalmente propensos a votar em Vandinho, a parar para tentar compreender o que estava acontecendo. Talvez as coisas não fossem como se supunha até então.

Afinal, se o crivo do Palácio ao candidato oriundo do blocão (Vandinho) estaria representado pela presença de Tyago Hoffmann nas cabeças do blocão, essa chancela foi suspensa simbolicamente com a retirada dele. 

Por essa ótica, Tyago teve grande responsabilidade no fato de Casagrande ter deixado Vandinho ir tão longe. O governador foi deixando o movimento de Vandinho e Tyago avançar, em detrimento de Marcelo, talvez convencido de que Tyago pudesse vencer a disputa interna com Vandinho e se viabilizar por dentro do blocão. 

Marcelo, a boia de salvação

Mas Tyago nunca esteve nem perto de ter os votos necessários para isso. Até que, superado internamente por Vandinho, saiu de maneira brusca das discussões do blocão e foi se articular com Marcelo, boia de salvação do governo e do próprio Tyago.

O navio do governo começou então a se virar lentamente na direção de Marcelo. Mas a manobra poderia não ter se completado a tempo, pois a essa altura, acreditando que o apoio a Vandinho estava “liberado” pelo Palácio, muitos deputados da base já tinham firmado compromisso com o tucano e de repente se viram tomados pela dúvida: “Vandinho ou Marcelo? Quem é que a gente deve apoiar?”

Justamente a fim de sanar qualquer dúvida e passar a alguns deputados (votos decisivos em uma disputa apertada) a segurança necessária para retirar o apoio a Vandinho, foi que Casagrande viu-se premido pela necessidade de vir a público e dar declarações inequívocas: “Marcelo é o meu candidato”. 

Antes que fosse tarde, o governador pegou o leme e o girou com força na direção de Marcelo… Mas o navio ainda pode raspar no iceberg, com avarias que só poderão ser mensuradas no decorrer do mandato.


Valorizamos sua opinião! Queremos tornar nosso portal ainda melhor para você. Por favor, dedique alguns minutos para responder à nossa pesquisa de satisfação. Sua opinião é importante. Clique aqui