Coluna Vitor Vogas
Linhares: tudo sobre a eleição para prefeito mais emocionante do ES
No maior município acima do Rio Doce, disputa entre Lucas Scaramussa e Bruno Marianelli chega à reta final com desfecho totalmente imprevisível
Entre as dez cidades mais populosas do Espírito Santo, três prometem eleições para prefeito bastante apertadas, decididas voto a voto no dia 6: Guarapari, Colatina e Linhares. Nenhuma delas pode ter 2º turno. Os respectivos vencedores serão conhecidos no próximo domingo. Em Colatina, é grande o equilíbrio entre o atual prefeito, Guerino Balestrassi (MDB), e o ex-deputado estadual Renzo Vasconcelos (PSD). Em Guarapari, a quatro dias da votação, a disputa segue indefinida entre o vereador Rodrigo Borges (Republicanos) e o deputado estadual Zé Preto (PP).
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Mas Linhares é o palco da eleição mais emocionante do Estado em 2024. No maior município capixaba acima do Rio Doce, a disputa chega à reta final com desfecho totalmente imprevisível, polarizada entre o atual prefeito, Bruno Marianelli (Republicanos), e o deputado estadual Lucas Scaramussa (Podemos). A última pesquisa da Futura Inteligência para a Rede Vitória, publicada na última sexta-feira (27), mostrou empate técnico entre os dois nas intenções estimuladas de voto, separados, incrivelmente, por um décimo:
Bruno Marianelli: 36,3%
Lucas Scaramussa: 36,2%
Quando se analisa a série histórica da Futura, há um indicativo de crescimento e possível virada eleitoral por parte do atual prefeito. Na pesquisa anterior da série, publicada no fim de agosto, Lucas estava bem na frente: tinha 43,3% das intenções, contra 18,7% de Bruno. Agora, a “boca do jacaré” se fechou e, pela primeira vez, o atual prefeito aparece numericamente na frente.
Primeiro teste real de Marianelli nas urnas e prova de fogo para Guerino Zanon
Em jogo, está o governo da maior cidade da Região Norte do Estado, com a 6ª maior população (166,7 mil pessoas) e o 5º maior orçamento (mais de R$ 1 bilhão por ano, superando o de Cachoeiro, cuja população é maior). Desde o fim do século passado, Linhares se consolidou como a locomotiva do desenvolvimento econômico do interior capixaba, migrando de uma base agrícola para uma base industrial (embora o agronegócio ainda tenha peso importante na economia local).
Essa transição tem muito a ver com um personagem que não é propriamente o protagonista, mas um “coadjuvante de luxo” nessa disputa local: Guerino Zanon (PSD), prefeito de Linhares por nada menos que cinco mandatos, entre 1997 e 2022. A última eleição municipal, em 2020, foi vencida exatamente por Guerino, tendo como vice Bruno Marianelli, seu pupilo e afilhado político. Mas, em março de 2022, Guerino renunciou para se candidatar a governador, deixando a prefeitura nas mãos de Bruno, agora candidato à reeleição com apoio total de Guerino.
Hoje com 53 anos, Bruno iniciou uma longa parceria com Guerino logo no primeiro de seus cinco mandatos, em 1997. Após ter estudado toda a vida no Colégio Cristo Rei (escola particular de Linhares que pertencia a Guerino), Bruno acabara de concluir o curso de Administração Pública na FGV em São Paulo. Guerino, então, chamou-o para compor sua equipe de governo. O ex-aluno do professor de Física, então, virou seu aluno político.
Ao longo dos mandatos de Guerino, Bruno firmou-se como seu braço direito administrativo, sempre ocupando posições técnicas e estratégicas no alto escalão da prefeitura, à frente de secretarias como a de Finanças e a de Planejamento. Além de padrinho político, Guerino é o mestre e o mentor de Bruno. E é também, agora, seu maior cabo eleitoral.
O ex-prefeito mergulhou de cabeça na campanha do pupilo. Além de aparecer constantemente em seu programa de rádio e TV e manter muito ativas as próprias redes sociais, o ex-prefeito está sempre ao lado dele nas atividades de campanha – 24 horas por dia, nesta linha de chegada. Guerino está para Bruno em Linhares como Sergio Vidigal está para Weverson Meireles na Serra.
Para Bruno, após ter passado décadas à sombra de Guerino, como um burocrata, e de ter sido alçado automaticamente ao cargo de prefeito em 2022, esta é a primeira vez que ele será testado de verdade nas urnas. Para Guerino, também não deixa de ser uma prova de fogo: o ex-prefeito terá testados seu prestígio, sua popularidade e, acima de tudo, sua capacidade de transferir votos para outro candidato.
Em sua longa estrada política, é apenas a segunda vez que Guerino tenta fazer isso. E o primeiro teste não “deu bom”. Em 2004, após encerrar seu segundo mandato seguido, Guerino tentou eleger Vanderlei Ceolin como sucessor. Mas seu candidato perdeu para Zé Carlos Elias.
A permanência de Bruno no poder é importante para Guerino, é claro, não só para ele conservar sua influência sobre a Prefeitura de Linhares, mas para construir, em seu próprio reduto, uma base de oposição ao grupo do governador Renato Casagrande (PSB), de quem é adversário, mirando nas eleições estaduais 2026.
Lucas Scaramussa: apoio discreto do Palácio Anchieta
Aos 45 anos, pós ter perdido sua primeira eleição a prefeito para o próprio Guerino em 2020 – mas com votação acima das expectativas (29%) –, Lucas veio para esta campanha mais maduro, com mandato na Assembleia Legislativa e mais robusto politicamente. Essa “robustez” se manifesta no conjunto de apoios de peso reunidos em torno do advogado e professor de Direito.
Além do Podemos, a coligação de Lucas, “Linhares Merece Mais”, é formada por PRD, PDT, PSB, União Brasil e pela Federação PSDB/Cidadania.
O PRD é um partido tocado, indiretamente, pelo presidente da Assembleia Legislativa, Marcelo Santos (União), que apoia Lucas e até já apareceu no horário eleitoral pedindo votos para ele. Todos os outros partidos estão na base de apoio do governador Renato Casagrande (PSB).
O próprio governador não declarou apoio a Lucas, nem o fará. Não entrará na campanha em Linhares. Lucas não o apoiou para governador em 2022. Pertence à sua base na Assembleia, mas nem sempre vota com o governo. Mas, logicamente, é melhor ter um “meio aliado” na prefeitura da maior cidade da Região Norte do que o “aluno” de um notório desafeto como Guerino.
Como o apoio do Governo do Estado a Lucas se manifestou, então? Principalmente, na fase pré-campanha: nas articulações que permitiram a ele chegar para a disputa à frente dessa coligação robusta, repleta de partidos governistas.
Outro grande aliado de Lucas é o ex-deputado federal e secretário estadual do Meio Ambiente, Felipe Rigoni. Linharense, o presidente estadual do União é parceiro de Lucas desde os tempos em que eles fizeram o curso de formação de líderes políticos do RenovaBR.
Entre os dez deputados federais, pelo menos três estão com Lucas e já estiveram com ele em campanha: os dois do Podemos, Gilson Daniel e Victor Linhalis, e, ainda, Messias Donato, do Republicanos. Este é uma surpresa, já que o Republicanos é o partido de Bruno Marianelli.
Entre os líderes políticos locais, o destaque vai para o apoio do ex-deputado estadual Luiz Durão, maior líder do PDT no norte do Espírito Santo. Ele tem participado de encontros da campanha de Lucas. Nas últimas eleições, Durão tem mantido uma base cativa de, pelo menos, 10 mil eleitores em Linhares.
Lucas ainda conta com o apoio de cinco dos 17 vereadores linharenses, segundo as contas de seus colaboradores.
Mas o apoio mais pesado veio inesperadamente.
Zé Carlos Elias entra na campanha de Lucas
Na última segunda-feira (30), Zé Carlos Elias participou de um grande encontro promovido por Lucas em seu Comitê Central, no bairro Interlagos, e declarou apoio ao candidato, confirmado à coluna pelo próprio ex-prefeito:
“Decidi apoiar o Lucas pela alternância de poder e por causa das propostas dele. A população reclama muito. Tudo o que construímos lá atrás vem ficando deficitário, por falta de investimentos. Dos candidatos colocados, é o que mais se aproxima de mim.”
Prefeito por dois mandatos – o último, de 2005 a 2008 –, Zé Carlos chegou a tentar se filiar ao PT para ser candidato novamente. Como está inelegível, o TRE-ES barrou sua filiação e, assim, ele não pôde disputar. Mas o “petismo” não pegou nele, muito menos algum tipo de associação com a esquerda, até porque ele mesmo nunca se declarou pré-candidato.
Ironicamente, foi Zé Carlos quem lançou a carreira política de Guerino, apoiando-o como seu sucessor na Prefeitura de Linhares, em 1996.
Além de Guerino, quem mais está com Bruno
O atual prefeito, por sua vez, encabeça a coligação “Compromisso com Linhares”, a maior de todas, composta por Republicanos, PP, MDB, PSD, DC, Novo, PMB e Avante. Ele tem o maior tempo de TV e rádio: pouco mais de quatro minutos, a cada bloco de 10.
Além de Guerino Zanon, os principais apoiadores de Bruno são o ex-presidente da Assembleia Erick Musso (presidente estadual do Republicanos) e três deputados federais: Amaro Neto (Republicanos) e os dois do PP, Da Vitória e Evair de Melo (este, um grande aliado de Guerino). Os quatro apareceram no programa eleitoral do prefeito nessa terça-feira (1º), além de já terem participado de encontros e atividades de rua ao lado de Bruno.
Dois ex-deputados estaduais da terra também estão com o candidato à reeleição: Eliana Dadalto (MDB), que chegou a ser cotada para vice, e o empresário Marcos Garcia (PP), que chegou a ensaiar lançar candidatura a prefeito, depois de ter se saído mal pelo PV em 2020.
A campanha do prefeito calcula que, dos 17 atuais vereadores, 11 estão com ele, incluindo o presidente da Câmara, Vicentini (DC). A coligação do prefeito tem um exército de 104 candidatos a vereador.
Segundo fonte ligada ao QG do prefeito, muitos grupos empresariais importantes de Linhares também apoiam Bruno, não por desgostarem de Lucas, mas por temerem desaceleração de uma máquina que já estaria “azeitada” desde os tempos de Guerino.
Uma curiosidade é que, assim como Casagrande, o vice-governador Ricardo Ferraço, presidente estadual do MDB, preferiu não entrar na campanha em Linhares. O MDB está na coligação de Bruno, mas o candidato preferido do Palácio Anchieta é Lucas.
Os respectivos vices
O candidato a vice-prefeito de Lucas é Franco Fiorot (União), ex-diretor-geral do Incaper. Agrônomo, ele foi secretário municipal de Agricultura no penúltimo governo de Guerino, de 2017 a 2020. Em 2023, assumiu o Incaper, a convite de Casagrande, ficando mais próximo, assim, do grupo político do governador, incluindo Rigoni.
É a primeira eleição disputada por Fiorot, que tem muito bom trânsito com os representantes do agro em Linhares (sindicato rural patronal etc.). É uma voz respeitada no meio rural.
Uma curiosidade é que o candidato a vice de Lucas é casado com a irmã dele. Sim, os dois são cunhados.
Outra curiosidade é que o pai de Franco Fiorot, Carlinhos Fiorot, chegou a ser secretário de Agricultura no governo de Zé Carlos Elias (2005-2008) e secretário de Cultura, Esporte e Lazer na administração de Nozinho Corrêa (2013-2016).
Já o vice de Bruno é o médico José Cardia (MDB), urologista respeitado na cidade e ex-vereador. Cardia chegou a presidir a Câmara de Linhares e concorreu a prefeito, em 2016, na última eleição disputada por ele, alcançando apenas 7% dos votos válidos.
O bolsonarismo em queda…
Às vezes até nos esquecemos, mas a eleição à Prefeitura de Linhares tem um terceiro candidato: o empresário Maurinho Rossoni, candidato do Partido Liberal (PL). Como outros candidatos do PL a prefeito de outras cidades, o bolsonarista tem feito campanha na linha “Deus, pátria, família e liberdade”, arvorando-se em único representante da “direita de verdade”.
Para impulsionar a sua campanha, ele já contou com a presença do deputado federal Gilvan da Federal, de Hélio Negão (deputado federal pelo Rio de Janeiro e amigo de Jair Bolsonaro) e até da ex-primeira-dama Michelle Bolsonaro.
Rossoni também tentou a todo custo tachar Lucas como “esquerdista”, pelo fato de que ele conta com o apoio do PSB – a exemplo do que faz o Coronel Ramalho (PL) em relação a Arnaldinho Borgo (Podemos) em Vila Velha. Arnaldinho, aliás, gravou pedido de voto para Lucas.
Nada disso colou. Rossoni tem 6,1% das intenções de voto, segundo a Futura.
… e a esquerda mais ainda
Mas, do ponto de vista ideológico, o que mais chama a atenção em Linhares é a ausência absoluta de representação da esquerda na eleição à prefeitura da maior cidade do norte do Espírito Santo. Há muito tempo, Linhares não tem nem sequer um representante da esquerda na Câmara Municipal.
O único candidato da esquerda à prefeitura, Galego (PT), acabou renunciando à candidatura.
Os três candidatos a prefeito são de forças diferentes inseridas no campo da direita.
Os motes, os discursos e as promessas de campanha
Com a campanha dirigida pelo marqueteiro Fernando Carreiro (o mesmo de João Coser em Vitória, Audifax na Serra e Dr. Coutinho em Aracruz), Bruno Marianelli tem apostado no mote “o mesmo compromisso”. Costuma dizer que não é de fazer promessas, mas de assumir compromissos.
Para a campanha, o maior desafio dos seus assessores foi “destravar” o prefeito, transformando o burocrata de gabinete em um candidato popular. “Ele entende da máquina pública de Linhares como ninguém. O desafio foi tirar esse concreto. Ele se destravou muito e hoje é um político realmente. O Lucas já vem construindo essa história de político há mais tempo que ele. Mas o Bruno está se saindo melhor que o mestre dele, Guerino”, conta um colaborador da campanha.
A equipe de Bruno ficou empolgada com o seu desempenho no debate promovido pela TV Gazeta na noite do último sábado (28) e aposta nisso como um fator que pode determinar a “virada” sobre Lucas. Na ocasião, o prefeito lançou o bordão “mãos que trabalham”.
Com jeito tranquilo, Bruno tem, entre os principais compromissos, a construção de uma rodoviária, mais uma escola de tempo integral, a estadualização do Hospital Geral de Linhares (municipal) e o “Projeto Interbairros”. Fruto de empréstimo de US$ 55 milhões contraído junto ao BID, o projeto engloba um conjunto de obras de desenvolvimento econômico sustentável, incluindo parques, pontes e macrodrenagem.
Com jeito também muito sereno e discurso de mudança e renovação, Lucas tem uma estrutura de campanha e marketing político bem menor. Mas seus auxiliares consideram sua campanha nas ruas “mais quente”, com mais calor humano, em contraponto a certa frieza atribuída ao atual prefeito.
O candidato de oposição tem falado muito em promover o desenvolvimento econômico da cidade, ampliar os serviços públicos com qualidade, construir uma Unidade de Pronto Atendimento (UPA), valorizar mais os servidores e devolver mais para Linhares, em entregas e serviços, aquilo que a prefeitura arrecada.
Reservadamente, o pessoal de Lucas acusa uso abusivo da máquina municipal na reta final de campanha, com comissionados em peso nas ruas em campanha para o atual prefeito.
Sem cerimônia oficial, um novo complexo esportivo foi inaugurado na última segunda-feira (ou, ao menos, removeram os tapumes em volta da obra): o Complexo Esportivo Cultural do Palmital.
A “entrega” foi destacada em postagem de Guerino Zanon no Instagram. O ex-prefeito chamou o novo equipamento de “presente para Linhares”.
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