Coluna Vitor Vogas
Lelo se lança contra Rose de Freitas: “Vai ter disputa no MDB”
Com muitas críticas à gestão da rival interna, aliado de Hartung lançará chapa em convenção estadual em agosto a fim de recuperar o cargo que foi seu por muitos anos

Lelo Coimbra foi deputado federal. Foto: Pablo Valadares/Câmara dos Deputados
O ex-deputado federal Lelo Coimbra quer voltar a exercer a presidência do MDB no Espírito Santo. Em entrevista à coluna na sede estadual da Fundação Ulysses Guimarães, o aliado histórico do ex-governador Paulo Hartung (sem partido) lançou ontem (26) sua candidatura ao cargo, ocupado por Rose de Freitas desde março de 2021. Por resolução da direção nacional do MDB, Rose deve convocar uma convenção estadual, que precisa ser realizada até o dia 31 de agosto. Lelo avisa: “Vai ter disputa”. E completa: “Com certeza vou lançar uma chapa”.
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Nesse páreo, o ex-deputado espera ter a própria Rose como adversária. Assim, Lelo agora se apresenta como desafiante da ex-senadora, a quem reserva críticas veementes, prenunciando a reedição de um clássico duelo interno no MDB capixaba.
Lelo foi deputado federal por três mandatos, de fevereiro de 2007 a janeiro de 2019. O período em Brasília praticamente coincidiu com o da sua hegemonia sobre o MDB no Espírito Santo. Em 2018, entretanto, ele não conseguiu se reeleger. Logo depois, Hartung saiu do MDB. Pelos dois anos seguintes, o partido mergulhou numa batalha política e jurídica pelo comando estadual, travada entre Lelo e o também ex-deputado federal Marcelino Fraga, que acabaria expulso pela direção nacional em março de 2021.
No mesmo mês, após um período de intervenção no MDB do Espírito Santo, a cúpula nacional decidiu instalar uma Comissão Executiva Estadual Provisória e entregar o comando do órgão para Rose – como parte do acordo para a então senadora retornar ao MDB após passagem pelo Podemos e com isso fortalecer a bancada emedebista no Senado. Desde então, o órgão diretivo continua provisório, e Rose segue como presidente na mesma condição.
Segundo Lelo, o primeiro problema está aí. “O Estatuto do MDB estabelece que um filiado só pode presidir uma Comissão Provisória por 120 dias, prorrogáveis por igual prazo (ou seja, por oito meses)”. Mas o mandato de Rose, completa, já foi prorrogado várias vezes pela direção nacional, de modo que a ex-senadora já ocupa a presidência há 28 meses.
Sem mandato eletivo há mais de quatro anos, Lelo, 69, é secretário nacional da Fundação Ulysses Guimarães, órgão de formação política do MDB, e membro da Comissão Executiva Estadual Provisória constituída em março de 2021. Segundo ele, o edital da convenção estadual terá de ser publicado até oito dias antes da votação propriamente dita – portanto, até 23 de agosto.
Em teoria, como o órgão de direção estadual segue sendo provisório, a direção nacional do MDB tem plenos poderes para desconstituí-lo como e quando bem entender, trocando Rose por outro dirigente se assim quiser, sem necessidade de realização de convenção. Esta, porém, para Lelo, é essencial não só por uma questão de democracia interna: “Só a convenção dará ao próximo presidente a legitimidade necessária no processo de reconstrução do MDB no Espírito Santo”.
Lelo pretende inscrever e encabeçar uma chapa de oposição a Rose e já está se articulando para isso. Essas articulações, segundo ele, não incluem Paulo Hartung (“Não está envolvido”), mas outros membros da Executiva Provisória e dos órgãos diretivos municipais.
Hoje, conforme dados repassados por Lelo, citando registros do Tribunal Regional Eleitoral (TRE-ES), o MDB tem 25 Diretórios Municipais constituídos e 22 Comissões Municipais Provisórias. Isso significa que, das 78 cidades capixabas, 31 hoje não possuem órgão diretivo algum do MDB.
Somente os diretórios eleitos podem enviar delegados, com direito a voto, para a convenção estadual de agosto. O número de delegados por cidade varia conforme a votação obtida pelo MDB para o cargo de vereador nas últimas eleições municipais, em 2020.
Enquanto costura alianças junto às bases do partido, Lelo também se articula “por cima”. Segundo ele, o deputado federal Baleia Rossi (SP), presidente nacional do MDB, tem pleno conhecimento de toda a sua movimentação e tem sido informado diariamente por ele sobre os seus passos, “assim como Rose com certeza também está fazendo”. Vale frisar que o próprio Baleia convidou recentemente Hartung a voltar para o MDB.
Por sinal, pouco antes de eu começar a gravar com Lelo ontem, o ex-deputado pediu licença para atender a um telefonema em seu celular. À minha presença, usando linguagem cifrada, falou em “movimento com o ‘amigo’” e outras expressões do gênero. Ao encerrar, disse-me que do outro lado da linha estava o próprio Baleia.
Não tenho condições de avaliar o quanto esse momento teve de autêntico ou de teatral, mas a intenção pareceu-me translúcida: provar ao jornalista postado diante de si esse canal direto com a direção nacional do MDB, em São Paulo e em Brasília.
As críticas a Rose
As críticas de Lelo à gestão de Rose nesses últimos 28 meses espraiam-se por muitas direções. Vão muito além do péssimo resultado nas urnas em 2022 no Estado, do fato de o MDB ter sofrido uma diáspora na pré-campanha e não ter filiado ninguém, de não ter nem sequer conseguido registrar uma chapa de deputados federais, de sua chapa de estaduais só ter feito algo em torno de 10 mil votos e de, pela primeira vez na história, o partido não ter elegido nem sequer um parlamentar (estadual, federal ou senador) no Espírito Santo.
Para o ex-deputado federal e ex-líder estadual da legenda, sua antiga adversária interna não conseguiu organizar o MDB e administra o partido como se fosse uma extensão da sua casa, tomando decisões de maneira individual e centralizadora. Segundo ele – e limito-me a reproduzir suas palavras –, a presidente estadual simplesmente não convoca reuniões, as decisões da Executiva Provisória são tomadas “monocraticamente” por ela e nem sequer são registradas em atas.
“Até a presente data, a Executiva nunca se reuniu desde que ela assumiu a presidência em março de 2021. Todos os processos decisórios da Rose foram feitos em seu domicílio e monocraticamente. Ela nunca convocou uma reunião e nenhum dos seus atos está regulado em ata. Em nenhum momento houve presença da Rose na sede do partido, exceto quando ela teve que fazer o registro de sua candidatura ao Senado e durante a sua campanha, mas pouquíssimas vezes. A sede partidária é um deserto. Tem secretária, tem funcionários, mas não é um ambiente nem de reuniões nem de movimentação partidária. Ela não tem a sede do partido como referência da sua movimentação e do seu trabalho.”
“Túnel sem luz”
Segundo Lelo, o MDB hoje “não é ambiente nem de estabilidade nem de diálogo”. “Rose, quando entrou, não conversava com ninguém, conversava muito pouco. Botou o partido num silêncio e num túnel sem luz. Passou a conversar a partir de março deste ano, quando a Executiva Nacional baixou a resolução determinando o cronograma e os prazos para a realização das convenções municipais e da estadual.”
Debandada
O ex-deputado aponta falta de planejamento eleitoral que, em 2022, teria custado uma perda em massa de pré-candidatos competitivos, como Guerino Zanon (que foi para o PSD para disputar o Palácio Anchieta) e Luzia Toledo (que migrou para o Republicanos para tentar voltar para a Assembleia). Lelo teme que a história se repita em março de 2024, com as eleições municipais batendo à porta.
“Nenhum deputado estadual veio para o partido. Nenhum federal veio para o partido. Até agora, considerando quem tem mandato no Espírito Santo, essa gestão só filiou um vereador de Guarapari. Essa gestão promoveu a inércia no partido, a desagregação e o distanciamento entre os filiados, entregues aos seus próprios desígnios. Não foram fixadas diretrizes para 2022, não há perspectiva para as eleições de 2024 e 2026, e é presumível a desfiliação de quadros do MDB, notadamente na próxima janela partidária. Antes disso, vai se dar o inverso: quem se sentir inseguro não vai querer entrar”, prevê o ex-deputado.
Órgãos debilitados
Conforme os números apresentados por Lelo, em março de 2021, o MDB-ES tinha 46 Diretórios Municipais, 23 Comissões Provisórias e só nove cidades capixabas sem representação formal do partido. Hoje, há 25 Diretórios Municipais, 22 Comissões Provisórias e 31 municípios sem representação. Na última categoria, sem nem sequer um órgão provisório no momento, estão cidades-chave como Vitória, Linhares e Colatina. Isso a cerca de um ano da campanha municipal, com as articulações pré-eleitorais e montagens de chapas a pleno vapor.
Irregularidades e “terceirização”
Lelo ainda acusa que, em algumas das comissões provisórias recém-instaladas em alguns municípios, verificam-se irregularidades (“Membros sem filiação alguma ou filiados a outros partidos”, diz ele). Em outras, estaria em andamento um processo de “terceirização” do partido:
“Rose diz que está chamando todo mundo pra dentro, mas não é verdade. Ela excluiu todos os históricos. Ela anuncia convite de filiação a Arnaldinho, Euclério e outros prefeitos, mas nenhum deles está vindo. Todos eles querem o MDB, e é compreensível isso, para comandar o MDB em suas cidades, mas sem sair do partido em que hoje estão. É uma terceirização de diretórios municipais do MDB.”
“Mandato de transição”
Lelo afirma que, se for eleito, pretende exercer um mandato de “transição” no MDB-ES e está propenso a não concorrer à reeleição na próxima convenção estadual, em 2025 – o mandato da Executiva a ser eleita em agosto terá duração de dois anos. Nesse caso, se eleito pelos convencionais no mês que vem, o ex-deputado conduziria o partido nos preparativos para as eleições municipais de 2024, mas poderia abrir mão desse poder na antessala da próxima eleição estadual, em 2026.
“Não quero me perpetuar, mas fazer o processo de resgaste do MDB. Nas condições em que o partido está sendo tocado, eu me coloco à disposição para um processo de transição no partido”, afirma o aliado de Hartung. “Não quero ser presidente por ser presidente, para ficar presidente. Admito ser presidente para dar um passo seguinte, para uma reconstituição do partido, com um novo Diretório, inclusive com a minha participação, mas não necessariamente na condição de presidente.”
Sobre Ricardo Ferraço
Lelo confirma que o vice-governador Ricardo Ferraço (PSDB) também foi convidado por Baleia Rossi para voltar ao MDB. E opina: “Ricardo é um nome muito bem-vindo. Ele é um quadro preparado, que será governador em abril de 2026, com direito a reeleição, vai analisar, vai se movimentar. Se ele vier para o partido, tem todo o meu apreço e o meu apoio. E é um quadro que acho importante nesse processo, seja agora, seja adiante”.
Sobre Paulo Hartung
“O Paulo se move muito no ambiente nacional. Não se coloca dentro do processo eleitoral local. Mas, se ele decidir vir para o MDB, seria um bom retorno.”
