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Coluna Vitor Vogas

Eugênio Ricas cotado para assumir lugar de Ramalho na Segurança

Na escolha de Casagrande, saiba o que pode contar a favor (ou não) do chefe da Polícia Federal no Espírito Santo para o cargo

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Lula manteve Eugênio Ricas no comando da PF no Espírito Santo. Foto: Reprodução

Na virada do governo Bolsonaro (PL) para o governo Lula (PT), entre os superintendentes regionais da Polícia Federal nas 27 unidades federadas, somente cinco não foram trocados. Um deles foi o delegado federal Eugênio Ricas (sem partido), superintendente da força policial no Espírito Santo. No início de 2024, três desses “sobreviventes” estão sendo substituídos ou transferidos pela direção geral para outra praça: os do Amapá, do Ceará e do Piauí. Ao lado do superintendente da PF no Rio Grande do Sul, Ricas é o único a permanecer no cargo desde o governo Bolsonaro. Mas talvez não por muito tempo.

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No Palácio Anchieta, o delegado federal é cotado (atenção: cotado) para assumir o cargo de secretário estadual de Segurança Pública, entregue na última quinta-feira (25) por Alexandre Ramalho (Podemos). O coronel da reserva da PMES saiu para se dedicar ao processo eleitoral – pode ser candidato a prefeito de Vitória, mas prefere concorrer em Vila Velha. Interinamente, o comando da Sesp foi assumido nesta quinta-feira (1º) pelo também coronel da PMES Márcio Celante.

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O governador Renato Casagrande (PSB) realmente considera a possibilidade de convidar Eugênio Ricas. É um dos nomes na mesa. Se o convite for formalizado e os dois chegarem a um bom entendimento sobre as linhas gerais de condução da Sesp, o delegado tem predisposição em aceitar o desafio.

A princípio, o governador poderia escolher um membro de carreira da Polícia Civil, que há muito tempo não vê um dos seus no topo da cadeia de comando da segurança pública estadual. Do segundo governo de Casagrande para cá, já passaram pelo cargo um policial federal (Roberto Sá) e dois policiais militares (Ramalho e Celante, seguido de Ramalho novamente). Uma corrente interna do governo defende a ideia de que agora é chegado o momento de prestigiar a outra força policial.

O próprio Casagrande, porém, não é fã da ideia de seguir (ou instituir) um “rodízio”, pois pode acabar refém do próprio critério futuramente. Além disso, dentro da própria Polícia Civil, não há hoje uma unanimidade, nem unidade política em torno de um nome que represente a categoria. Uma vez mais, o governador pode preferir buscar um quadro externo. É aí que entra Ricas.

O delegado é “externo” no sentido de não integrar uma força policial estadual, mas não é um “estrangeiro”: além dos muitos anos de atuação como delegado federal no Espírito Santo, o mineiro (com ligeiro sotaque) tem no currículo algumas passagens pelo primeiro escalão do Governo Estadual, inclusive sob a direção do próprio Casagrande.

No primeiro governo do pessebista (2011-2014), de 2013 a 2014, Ricas foi secretário estadual da Justiça. Responsável por dirigir todo o sistema prisional capixaba, a pasta é delicadíssima – compondo, ao lado da Sesp, o pilar complementar da estrutura da segurança pública do Estado. À frente da pasta, zerou as rebeliões.

Depois, no governo Paulo Hartung (2015-2018), ocupou duas posições no secretariado. Na primeira metade do mandato, voltou a chefiar a Sejus. Na segunda, uma nova missão: como secretário de Estado de Controle e Transparência, adquiriu conhecimento e experiência na área de compliance e aplicação da Lei Anticorrupção.

Foi por essa época que surgiram as primeiras especulações quanto ao nome de Ricas como possível candidato à sucessão de Hartung com o apoio do então governador (até porque este não preparou nenhum sucessor para si mesmo). Da parte de Hartung, não lhe faltou incentivo para isso, mas o delegado preferiu não dar o salto para o mundo político e partidário. Hartung acabaria decidindo não disputar a reeleição e, com o seu grupo órfão de representante no pleito, abriu caminho para o retorno de Casagrande ao Palácio Anchieta em 2018.

Ao sentar-se de novo na cadeira, Casagrande voltou com sangue nos olhos e determinado a “fazer a limpa de cima abaixo”: não aproveitou absolutamente ninguém que houvesse colaborado com o governo do seu antecessor. Como Ricas, além de secretário, havia se aproximado politicamente de Hartung, não chegou perto nem sequer de ser cogitado por Casagrande.

O delegado, então, voltou para a instituição de origem e foi cuidar da vida. De 2018 a 2021, atuou como adido da Polícia Federal em Washington, capital dos Estados Unidos, participando de investigações internacionais. Em 2021, em pleno governo Bolsonaro, foi nomeado para assumir a chefia da Superintendência Regional do Espírito Santo.

No início, a relação com o governo Casagrande não foi das melhores, nem mesmo institucionalmente. Ricas ainda era considerado, se não integrante, no mínimo muito próximo ao grupo político de Hartung (e, de fato, ainda o era). No início de 2022, após conversas com o próprio ex-governador e o ex-secretário-chefe da Casa Civil José Carlos da Fonseca Júnior, então dirigente estadual do PSD, o delegado federal enfim se deixou seduzir pela ideia de se afastar da PF para mergulhar de vez na vida pública.

O plano, ao menos era o que ele acreditava, era entrar no próprio PSD para se candidatar ao Palácio Anchieta contra Casagrande. Sabe-se que, nos bastidores, Ricas era um potencial oponente respeitado pelo staff do governador. Só que as coisas não se desenrolaram como o delegado esperava. Em março de 2022, pertinho do fim do prazo para se decidir sobre filiação e candidatura, Ricas se deu conta de que, na realidade, não tinha nem garantia de legenda no PSD: precisaria disputá-la com o então prefeito de Linhares, Guerino Zanon, que trocou o MDB pelo PSD e acabou mesmo concorrendo ao governo pela sigla de Gilberto Kassab.

Ricas, então, pulou fora, sem esconder de interlocutores mais próximos o seu desapontamento. E, uma vez mais, seguiu cuidando da sua vida. Vale dizer: seguiu cumprindo seu papel institucional à frente da PF no Estado e não se envolvendo diretamente na política. Durante o processo eleitoral, manteve-se reservado, sem manifestar apoio a ninguém, para cargo algum.

Um detalhe importante, porém: da eleição passada para cá, a relação institucional dele mesmo e da PF no Estado melhorou sensivelmente com o governo Casagrande, conclusão extraída, por exemplo, de iniciativas conjuntas com as forças estaduais de segurança e, no plano mais político, encontros, fotos e postagens com representantes do Governo do Estado. No dia 4 de agosto de 2022, o próprio Coronel Ramalho havia sido obrigado a trocar a candidatura de senador pela de deputado federal. Foi visitar Eugênio Ricas e publicou foto ao lado dele, agradecendo-lhe pela “solidariedade”.

Post de Alexandre Ramalho com Eugênio Ricas (04/08/2022). Foto: Instagram de Ramalho

Atuando de maneira apartidária, Ricas segue sendo um técnico – e um bom técnico, como parece concordar todo mundo no Espírito Santo, independentemente de coloração política, e até fora do Estado.

Em seus anos no comando da PF no Espírito Santo, a Superintendência Regional saltou do 22º lugar para a 1º posição no ranking do Índice de Produtividade Operacional (IPO), medido pela cúpula da PF.

E aqui precisamos tornar ao início deste texto: maior atestado dessa “competência apartidária” é o fato de, no jogo do “resta um”, ele ter passado incólume pela mudança do governo Bolsonaro para o governo Lula. Ideologicamente, foi uma mudança radical, mas Ricas parece ter agradado ao comando central em Brasília tanto no governo de um como no do outro. Como servidor de carreira, segue dando sua contribuição no governo petista (de esquerda) como o fez no governo de extrema direita de Bolsonaro (o qual, diga-se de passagem, interferiu demais na PF e prejudicou a imagem da instituição).

Além da capacidade, Ricas é tido como um homem de integridade a toda prova. É difícil chamar alguém de “incorruptível”… Emblemático, porém, foi o episódio em que, como secretário, no meio do governo de Hartung, ele vinha sendo assediado por um empresário que havia lhe levado uma proposta de corrupção. Não apenas a proposta foi negada. Ricas preparou uma “armadilha” para o escroque, atraiu-o para uma conversa em lugar público e o prendeu em flagrante ali mesmo, com a ajuda de uma equipe policial. Honestidade é obrigação de qualquer um, mas é claro que conta pontos, ainda mais no meio político…

Ricas colaborou com Hartung? Colaborou. Pertenceu ao grupo do adversário de Casagrande? Pertenceu. Mas não só ele se distanciou desse grupo como os tempos são outros, e o comportamento político de Casagrande parece ter mudado, assim como seus critérios de nomeação (ou não nomeação).

Aquele “sangue nos olhos” de cinco anos atrás e a intransigência quanto a “quadros hartunguistas” cederam lugar a uma postura mais flexível. Ele tem dado mostras disso. A mais eloquente veio na montagem do novo secretariado para seu terceiro governo. Em dezembro de 2022, Casagrande escolheu ninguém menos que André Garcia para a Sejus e Enio Bergoli para a Agricultura.

Assim como Ricas, os dois fizeram parte do último governo de Hartung, mas também tinham participado do primeiro governo de Casagrande (2011-2014) e têm perfil reconhecidamente técnico mais que qualquer outra coisa. Questionado por mim à época sobre isso, Casagrande admitiu ter revisto seus critérios: no atual mandato, está aberto a aproveitar quem não tenha atuado de maneira profundamente política no governo do arquirrival.

Da mesma sorte, a melhora da relação institucional com o superintendente regional da PF de 2022 para cá indica ter ficado para trás o episódio da quase candidatura de Ricas contra Casagrande naquele ano.

O fator ideológico: direita progressista?

Num momento em que a polarização política do país ainda é muito forte e os critérios ideológicos são levados em conta para quase tudo, cumpre lembrar que Casagrande lidera um governo de centro-esquerda e seu partido, o PSB, é peça importante do governo Lula.

Ricas tem perfil mais de direita, mas uma direita bem moderada. Diga-se de passagem, a olho nu, parece bem menos à direita que o Coronel Ramalho… E as inclinações ideológicas do agora ex-secretário de Segurança nunca foram impedimento para que ele pudesse servir ao governo Casagrande (mas, antes de tudo, ao Estado), nem para que estabelecesse uma relação de parceria política com o governador.

Ricas não chega a ser um burocrata de gabinete, mas é certamente muito mais formulador e acadêmico que Ramalho e muito menos aquele estilo “vestir colete e ir para a rua chefiar operação policial”. Tem mestrado em Gestão Pública pela Ufes e gosta de debater e defender ideias em artigos sobre segurança pública. Algumas dessas ideias poder-se-iam dizer até “progressistas”, algo que na certa se coaduna com a visão do governo Casagrande para a área.

Ele é radicalmente contrário à facilitação do acesso de armas de fogo para a população civil. Na área penal e prisional, defende uma qualificação cada vez maior das prisões (com o sistema policial e judiciário prendendo, e mantendo preso, quem realmente representa grave risco à sociedade, em vez de superlotar os já abarrotados presídios com pequenos traficantes inexpressivos na grande indústria do crime organizado). Sua dissertação de mestrado explorou o tema.

Nesse aspecto, destoa bastante do discurso de Ramalho, um crítico infatigável do “prende e solta” (a polícia prende, a Justiça solta, o liberto volta a violar a lei, a polícia volta a prender e assim indefinidamente).

Uma imagem forte

Com Ramalho à frente da Sesp, o Espírito Santo encerrou 2023 com menor índice de homicídios registrados desde 1996. Para fechar com chave de ouro sua missão, janeiro, seu último mês no cargo, foi o melhor da série histórica na mesma estatística.

Não só pelos bons resultados deixados à frente da Sesp, mas pela imagem política muito forte consolidada pelo ex-secretário junto à opinião pública, vinculada a respeito e autoridade, Casagrande há de precisar substituí-lo por alguém cuja imagem se aproxime à de Ramalho nesse aspecto. Alguém que também inspire a ideia de “lei e ordem”, autoridade e respeito, pelo histórico de atuação e de bons serviços prestados à sociedade capixaba.

Isso também pode contar a favor de Ricas.

ES: República da Federal

Por fim, o governador acabou de nomear para a Sejus (pilar complementar da Sesp) ninguém menos que o também policial federal Rafael Pacheco. Ora, entre 2021 e 2022, o agora secretário de Estado da Justiça foi o braço direito de Ricas em seu gabinete na Superintendência Regional da PF. Os dois se conhecem muito bem e já trabalharam juntos aqui e alhures, até numa investigação internacional.

A fina sintonia na PF, se transferida para a segurança estadual, também pode pesar a favor de Ricas nessa escolha.

Vale lembrar que Casagrande já tem entre seus principais conselheiros outro policial federal: o secretário de Planejamento, Álvaro Duboc, foi quem levou Ricas para trabalhar no governo Casagrande lá atrás, em sua primeira administração.

O secretariado de Casagrande ainda tem um policial rodoviário federal: desde 2019, Edmar Camata é o secretário estadual de Controle e Transparência, cargo já exercido por Ricas entre 2016 e 2017.


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