Coluna Vitor Vogas
A Lei de Érica: o pacote de mudanças proposto pela nova presidente da OAB-ES
Sob a presidência de Erica Neves, OAB-ES mudará regras de processo para advogados chegarem a cargos em tribunais. Resolução que estabelece novas normas será uma das primeiras medidas da sucessora de Rizk. Entenda aqui as cinco mudanças fundamentais e por que elas serão editadas
![Érica Neves é presidente da OAB-ES](https://es360.com.br/wp-content/uploads/2025/01/Erica-Neves.jpg)
Érica Neves é presidente da OAB-ES
Sob a presidência de Erica Neves, a seccional capixaba da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB-ES) mudará profundamente as regras dos processos de formação de listas sêxtuplas para advogados chegarem a cargos da magistratura em tribunais como o TJES, o TRF e o TRT. Resolução que estabelece as novas normas será uma das primeiras medidas da sucessora de José Carlos Rizk Filho, eleita no dia 22 de novembro e empossada em 1º de janeiro.
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Conforme o planejamento da nova presidente, a resolução será apreciada e votada pelos membros do novo Conselho Seccional, na segunda reunião do ano, marcada para o próximo dia 24. Se for aprovada, já passará a valer para os próximos processos de formação de lista sêxtupla.
De acordo com a Constituição Federal, um quinto das vagas nos tribunais do país deve ser preenchida, em sistema de alternância, por membros da advocacia e do Ministério Público. É o chamado Quinto Constitucional.
Neste momento, por exemplo, há uma vaga em aberto no Tribunal de Justiça do Espírito Santo (TJES), que compete à advocacia capixaba. A vacância surgiu com a aposentadoria compulsória, por idade, do desembargador Annibal de Rezende Lima, em abril do ano passado.
Desde então, o processo deflagrado pela OAB-ES para preenchimento dessa vaga, no último ano da gestão de Rizk, gerou muitos questionamentos, inclusive do grupo político de Érica, por conta de uma série de fatores.
Foram esses problemas que levaram às cinco mudanças fundamentais previstas na resolução a ser editada pelo novo Conselho. Abaixo, explicamos uma a uma.
Os problemas identificados e as mudanças propostas por Erica
1. Inversão das etapas
Primeiro problema: a ordem, estabelecida pela gestão de Rizk, das duas etapas do processo que competem à própria OAB-ES.
O sistema é o de “peneiragem”, etapa por etapa, até se chegar ao novo desembargador. Numa primeira etapa, a OAB-ES reduz todos os candidatos inscritos a uma relação de 12 (a lista duodécima). Esta, numa segunda etapa, deve ser transformada em lista sêxtupla, a qual segue para o TJES. Num terceiro momento, em votação aberta no Pleno, os atuais desembargadores transformam a lista sêxtupla em lista tripla. Finalmente, o governador do Estado escolhe, dentre os três nomes, o próximo desembargador.
Muito bem: no ano passado, por resolução aprovada pelo Conselho Seccional em 2023, a primeira “peneirada” ficou a cargo da categoria. No início de novembro, a OAB-ES realizou uma consulta ampla e direta aos advogados e advogadas do Espírito Santo. Dos 23 candidatos inscritos, os 12 mais votados passaram à lista duodécima. Num segundo momento, no começo de dezembro, o Conselho Seccional, por votação secreta, escolheu seis desses 12 candidatos, formando então a lista sêxtupla enviada por Rizk ao TJES.
Erica e sua diretoria discordam dessa metodologia.
Querem que a ordem dessas duas etapas seja invertida, como vigorou até o processo anterior de preenchimento de vaga da advocacia no TJES, em 2021: primeiro, votação no Conselho Seccional para formação da lista preliminar de 12; depois, consulta direta à categoria, para que essa lista de 12 seja reduzida a seis nomes.
Assim, a palavra final na escolha da lista sêxtupla voltará a ficar com a classe. “A advocacia realmente escolherá a lista sêxtupla”, resume Érica.
2. Paridade de gênero
Outro problema identificado por Érica foi a falta de garantia de paridade de gênero entre homens e mulheres. Dentre os 23 candidatos, sete eram mulheres. Só uma passou à lista sêxtupla, entregue no início de dezembro por Rizk ao presidente do TJES, Samuel Meira Brasil Jr. Em julho de 2023, o Conselho Seccional chegou a votar uma proposta de instituição de cota de gênero, mas a medida foi rejeitada.
Érica agora vai incluir, na resolução, dispositivos que assegurem a relação totalmente igualitária: metade das vagas para cada gênero. Assim, forçosamente, três vagas da lista sêxtupla irão para mulheres, enquanto as outras três serão preenchidas por homens.
Na primeira fase do processo, quando o Conselho Seccional formar a duodécima, cada conselheiro será obrigado a votar em seis candidatos e seis candidatas. Do mesmo modo, na consulta direta à categoria para composição da lista sêxtupla, cada eleitor terá de votar em três candidatos e três candidatas.
O próprio sistema digital de votação terá uma ferramenta que assegurará essa divisão igualitária, separando os candidatos em dois “potes”: um só com os homens, outro só com as mulheres.
“Primeiro, o Conselho escolhe 12, paritariamente. O voto do conselheiro só será válido se ele escolher seis homens e seis mulheres. Depois, a classe escolhe seis, também de maneira paritária. O voto também só será válido se o advogado escolher três homens e três mulheres”, explica Érica.
3. Cláusula que impedirá a concorrência de calendários eleitorais
A cada três anos, a OAB-ES tem eleição aberta aos advogados e advogadas inscritos na entidade para escolha do presidente e da diretoria.
Eventualmente, pode ocorrer de o calendário de um processo para escolha de lista sêxtupla para vaga em algum tribunal coincidir, parcialmente, com o processo eleitoral dentro da OAB-ES (como ocorreu no ano passado).
Em casos assim, a regra será mudada, justamente a fim de evitar que haja uma concomitância e que um processo possa ser influenciado, ou “contaminado”, pelo outro.
A resolução de Érica vai estabelecer uma “trava”: se o processo para escolha de lista sêxtupla já estiver aberto e em andamento, terá de ser interrompido 30 dias antes do início do período oficial de campanha para a eleição à presidência da OAB-ES. Depois do processo eleitoral – em novembro –, o processo para formação da lista sêxtupla poderá ser retomado e seguir normalmente.
Por que isso? Érica explica com um caso concreto. Segundo a presidente, ela mesma foi prejudicada duas vezes, como candidata à presidência em oposição a Rizk, pela simultaneidade dos dois processos (o da presidência e o do Quinto): no ano passado, como dependiam dos votos do Conselho Seccional, presidido por Rizk, para chegar à lista sêxtupla, os candidatos à vaga no TJES se viram coagidos, segundo Érica, a apoiar a reeleição do então presidente.
“Nós fomos muito prejudicados tanto na eleição de 2021 como na de 2024. A gente concorreu com todos os candidatos do Quinto, porque era o método de sobrevivência deles. A partir da resolução, vamos suspender a eleição do Quinto 30 dias antes da abertura do período oficial de campanha à presidência. A lista sêxtupla pode esperar.”
4. Vedações aos candidatos
Além disso, também a fim de garantir o fair play na disputa, haverá uma cláusula proibindo candidatos de patrocinar evento, dar dinheiro para subseção e receber dinheiro, sob pena de desclassificação.
Os candidatos ao Quinto ficarão proibidos de declarar apoio e participar de evento de campanha de qualquer candidato à presidência. “Se quiser ser desembargador, afaste-se do pleito eleitoral, para não se contaminar também, com compromissos futuros, sendo ele desembargador. O que a gente quer é desembargador independente”, afirma Érica.
5. Voto aberto dos conselheiros
Por fim, na definição da lista duodécima, a votação no Conselho Seccional passará a ser aberta, ou seja, os mais de 40 conselheiros terão de declarar seus 12 candidatos (sendo seis mulheres e seis homens).
E vale para o atual processo?!?
Não, as novas regras não se aplicarão ao processo de preenchimento da vaga de Annibal no TJES, até porque o certame já está em curso. Valerá para os seguintes. Érica explica que deseja votar, editar e publicar a nova resolução o quanto antes, justamente pelo fato de que, no momento, não há nenhum processo aberto, na OAB-ES, para formação de lista sêxtupla do Quinto em nenhum tribunal.
Desse modo, argumenta ela, ninguém poderá alegar que a medida é casuística, ou seja, que a resolução com as novas regras está sendo adota em benefício de candidato A ou B.
E quanto à lista que está no TJES?!?
Quanto à lista sêxtupla que já está no TJES, para preenchimento da vaga de Annibal, Érica reforça informação antecipada aqui por ela mesma: com tantos problemas verificados no processo, ela e seus conselheiros estudam seriamente a possibilidade de pedir ao presidente Samuel Meira Brasil Jr. para devolver a lista à OAB-ES. Nesse caso, o processo será refeito do início – aí, sim, sob as regras a serem fixadas pela nova resolução, que já estará em vigor.
Segundo Érica, mesmo que não tenha havido ilegalidades, o processo, tal como foi feito, deixou “indícios de imoralidade”: “Eu vejo indícios de imoralidade, o que me incomoda muito. Mas não sei se isso é fundamento suficiente para a gente interromper e pedir uma lista de volta”.
De acordo com a presidente, a decisão será tomada, com muita calma e serenidade, pelo novo Conselho Seccional. Por enquanto, o tema não está pautado para a reunião do dia 24.
“Vamos definir uma estratégia e definir se ficaremos inertes ou não. Isso será tratado com muita tranquilidade porque, no Direito, a forma é tão importante quanto o resultado. Se a forma estiver incorreta, isso muitas vezes macula o resultado de tal forma que a gente precisa agir. Vamos fazer tudo com muita segurança. O TJES não escolherá a lista tríplice em fevereiro, então temos um mês para tratar isso com muita tranquilidade”, afirma a presidente.
“O Conselho é que vai decidir se a OAB-ES vai pedir a devolução ou não. O que a gente não pode é deixar a Ordem exposta nem ao erro nem à inércia diante de algum fato de que podemos ficar sabendo”, conclui.
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