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Coluna Vitor Vogas

A enorme concessão do governo Casagrande na negociação com militares

Ao conceder aumento diferenciado para soldados da PMES e dos Bombeiros, governador volta atrás e contradiz o próprio discurso

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Casagrande em reunião com coronéis da PMES. Foto: PMES

O governador Renato Casagrande (PSB) anunciou na última quarta-feira (29), em suas redes sociais, a decisão de aumentar os salários dos agentes de todas as forças estaduais de segurança, por meio de projeto de lei a ser enviado para a Assembleia Legislativa.

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O anúncio em si não é propriamente uma novidade. Recompor as remunerações dessas categorias foi promessa de campanha de Casagrande em 2022. Entre julho e setembro deste ano, rodadas de negociação foram promovidas pela Secretaria de Gestão e Recursos Humanos (Seger) com as associações que representam os operadores da segurança pública. No começo de outubro, o governo chegou a apresentar um plano de reajuste a tais categorias – divulgado e debatido aqui.

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A grande Novidade, com ene maiúsculo mesmo, é a decisão de Casagrande de conceder a primeira parte do reajuste, em dezembro deste ano, em um percentual diferenciado para uma categoria específica: os soldados da Polícia Militar (PMES) e dos Bombeiros Militares. A decisão pegou de surpresa até os representantes dessas categorias, como os próprios relataram à coluna.

O aumento salarial vai contemplar policiais militares, bombeiros, policiais civis, policiais penais e agentes socioeducativos, totalizando 26.557 servidores, entre ativos e inativos (um em cada quatro servidores do Estado, arredondando as contas).

Se o projeto de Casagrande for aprovado pela Assembleia e depois sancionado por ele (como tudo indica que será), todos os profissionais da segurança receberão, a partir da folha de dezembro, os mesmos 4% de reajuste, independentemente da categoria e da patente, à exceção dos soldados. Estes receberão 14%.

Na realidade, a recomposição salarial dos agentes de segurança pública do Estado não se resume a esse aumento previsto para o mês inaugurado nesta sexta (1º). Conforme apresentado no dia 3 de outubro, o governo tem um plano de reajuste escalonado para as forças de segurança, dividido em quatro momentos.

O plano inicial previa a concessão de quatro parcelas de 4% de aumento para todos, ao fim de cada ano, até o encerramento do atual governo. Assim, todos os profissionais de segurança receberiam 4% de aumento agora, e mais 4% a cada mês de dezembro, até 2026.

É o plano 4×4%.

Entretanto, em seu anúncio nas redes sociais, Casagrande só tratou do aumento imediato, sem fazer nenhuma menção às parcelas seguintes. Isso deu margem a algumas dúvidas quanto a possíveis mudanças de planos.

Fontes do governo confirmam que o plano inicial está mantido, com um grande asterisco sobre os soldados das duas forças militares. Eis a única (e substancial) mudança no plano original.

Para os soldados, o plano de recomposição fica assim: 14% de reajuste agora (em dezembro de 2023) e depois três parcelas de 4%, sempre no mês de dezembro, nos três anos seguintes.

Para os demais, incluindo todas as outras patentes e categorias, fica tudo exatamente como estava planejado antes: quatro parcelas de 4%, a cada mês de dezembro, sendo a primeira agora e a última em 2026.

Resumindo, quem é soldado terá 14% (dez/23) + 4% (dez/24) + 4% (dez/25) + 4% (dez/26).

Quem não é soldado terá 4% (dez/23) + 4% (dez/24) + 4% (dez/25) + 4% (dez/26)

A última opção vale para todos os policiais civis, policiais penais e agentes socioeducativos. Vale, ainda, para todos os policiais e bombeiros militares cuja patente vá de cabo a coronel.

De todo modo, resta evidente que Casagrande está fazendo uma significativa concessão aos soldados – e, por conseguinte, aos policiais e bombeiros militares em geral, já que os soldados representam a base da pirâmide de tais categorias, tanto em termos hierárquicos como remuneratórios.

E o mais interessante a notar é que, ao fazê-lo, Casagrande cai em contradição, desmentindo o próprio discurso. Até o início de outubro, quando a proposta “4×4% para todos” foi apresentada às associações pela Seger, os representantes do governo se mostravam inflexíveis, incluindo o secretário de Estado de Gestão e Recursos Humanos, Marcelo Calmon, e o próprio governador.

Em entrevista à coluna publicada no dia 5 de outubro, Calmon foi taxativo: “A proposta apresentada é o nosso limite”. Poucos dias depois, em 11 de outubro, Casagrande foi ainda mais peremptório: “É a proposta final do Governo do Estado”.

Menos de dois meses depois, o governo que se mostrava determinado a não ceder um milímetro acaba fazendo essa considerável concessão aos pleitos da categoria. A linha riscada no chão foi apagada e jogada mais para lá; o “nosso limite” foi, sem cerimônia, alargado; e o que se dizia “final” provou-se plenamente mutável.

Depois dos anúncios e entrevistas do começo de outubro, o Palácio Anchieta passou a fazer mistério sobre esta pauta. O projeto, só enviado ontem à noite para a Assembleia, demorou um inesperado tempo para ser finalizado.

Tudo indica que os técnicos da Seger e da Secretaria de Estado de Governo (SEG) passaram estes últimos dois meses debruçados sobre as calculadoras, fazendo contas intermináveis para saber se havia espaço financeiro para a concessão do aumento diferenciado para os soldados, nesta primeira das quatro etapas do plano de recomposição. E aí também se podem incluir os técnicos do IPAJM (dado o impacto previdenciário da medida). Pelo jeito, concluíram que sim.

O desempenho da arrecadação de ICMS neste ano está superando as expectativas do próprio governo. O Executivo acaba de elevar em 2,5 pontos percentuais a alíquota do ICMS modal, e a Secretaria da Fazenda estima que a medida possa representar um acréscimo de receita da ordem de R$ 700 milhões por ano a partir do início da vigência (se bem que o governador se comprometeu a direcionar todo esse “dinheiro novo” para investimentos em infraestrutura, não para pagamento de pessoal).

Sejam quais forem as fontes do recurso que darão sustentação ao reajuste turbinado para os soldados, elas na certa existem (do contrário, o governo não o faria). A decisão está tomada e é, sem dúvida alguma, importantíssima para os beneficiários. Fará uma diferença substancial no soldo do (e daí vem a palavra) soldado que atua na ponta, na linha de frente da luta diária contra o crime.

O aumento de 14% valerá como um grande “impulso inicial”, bem maior que o dos demais, na escalada da valorização salarial, justamente para aqueles que mais precisam, por estarem na base da montanha. Diminuirá consideravelmente a diferença da remuneração dos soldados da PMES e dos Bombeiros para a dos cabos, patente imediatamente acima.

De todo modo, fica sublinhado o registro: ao fazer essa enorme concessão, o governador voltou atrás em sua decisão inicial.

E contrariou o próprio discurso.

Sem prejuízo de outros aumentos

Cumpre lembrar que, além do reajuste anual específico para as forças de segurança, os servidores dessas categorias terão direito a receber normalmente os reajustes lineares eventualmente concedidos pelo governo, nos próximos três anos, a todo o funcionalismo estadual.

Polícia Civil e Polícia Penal

O pacote de projetos enviado por Casagrande à Assembleia também inclui a reestruturação dos percentuais de promoção dos delegados da Polícia Civil, além dos 4% de aumento para eles agora em dezembro e o mesmo percentual no mesmo mês em 2024, 2025, 2026. Inclui, ainda, o aguardado projeto que cria toda a estrutura da nova carreira da Polícia Penal, formada pelos profissionais que trabalham no sistema penitenciário estadual.