Coluna João Gualberto
Coluna João Gualberto | Nacionalismos e protecionismos
Análise traça paralelos entre o protecionismo histórico, marcado por substituição de importações e tarifas alfandegárias, e as recentes políticas de Trump

Protecionismo econômico. Foto: DALL·E 3
Quando estudamos a história econômica e empresarial brasileira, aprendemos que nossa industrialização foi bastante tardia. Enquanto a Europa já avançava na produção em massa de bens de consumo, através de indústrias, ainda estávamos imersos na economia agrícola, éramos grandes produtores de café. Nossa tímida era industrial só se iniciou no final do século XIX, com a produção têxtil e de outros itens de consumo menos sofisticados e com menor uso de tecnologia.
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Essa nascente indústria era voltada sobretudo para a produção que atendia aos setores com menor renda. Os mais abastados podiam consumir produtos elaborados em outros países, mais caros e sofisticados. Quando a Primeira Guerra Mundial impôs barreiras reais nos mares para a importação, nossas indústrias tiveram que se adaptar para atender a um mercado de classes com maior poder de consumo, ou para substituir peças de equipamentos que não poderiam ser comprados dos fornecedores estrangeiros habituais. Afinal, tínhamos que resolver as coisas por aqui mesmo.
Assim, tivemos que começar um processo de substituição de importações de produtos que nunca havíamos fabricado. Os bens mais simples que se usam nas cozinhas das casas, como louças e talheres, por exemplo, eram produzidos aqui para as classes populares e comprados fora pelos mais ricos. Na impossibilidade de serem importados durante o conflito, produtores nacionais passaram a atender a demandas de outros setores sociais.
Uma vez constituído esse processo como interesse econômico, começaram as pressões sobre o governo para que, com o fim do conflito mundial, houvesse condições para a continuidade da produção brasileira. Medidas governamentais foram tomadas, iniciaram-se as políticas públicas do processo da chamada substituição de importações. Grosso modo, eram formas de proteger os interesses da indústria nacional com tarifas que elevavam os preços da importação e assim viabilizavam a produção local.
Em alguns casos era mesmo proibida a importação, como por longos anos ocorreu com algumas bebidas alcoólicas, entre elas o whisky e os vinhos, além de muitos outros produtos. Essas medidas restritivas ao consumo de produtos de outras nacionalidades permitiram que nossas empresas tivessem acesso a um mercado que não teriam em condições concorrenciais. De fato, elas cresceram e, protegendo a produção nacional, o Brasil construiu um parque industrial de grande porte.
Entretanto, nem tudo foram vantagens. Escondidas pelo protecionismo e pelo nacionalismo dos governos, muitas empresas não desenvolveram inovações tecnológicas de importância. Acabamos tendo produtos mais caros do que os importados, e frequentemente com qualidade inferior. Esse estado de coisas só começou a ser superado no início os anos 1990, no governo Collor, quando Luiz Paulo Vellozo foi Secretário Nacional de Indústria e Comércio, órgão que corresponde hoje ao Ministério com as mesmas funções. Na ocasião, foi a secretaria sob o comando de Luiz Paulo que supervisionou esse processo.
Nessa época teve início o salto para o processo de inovação e ganhos de produtividade que hoje se tornaram comuns no Brasil. Lembro aos leitores de tudo isso porque o governo Trump trouxe para a pauta política a questão do protecionismo, do nacionalismo produtivo, para justamente oferecer barreiras ao ingresso naquela economia de produtos com condições mais competitivas do que as produzidas localmente. Isso me parece um processo anacrônico, já muito usado no passado, mas que hoje é muito problemático.
A brutal globalização da economia mundial criou cadeias produtivas integradas, e muito do que o consumidor hoje compra, na verdade, não tem mais uma nacionalidade específica. Um bom exemplo são os automóveis, cujas peças e partes integrantes são produzidas em muitos países diferentes. Não creio mais ser possível haver uma política de restrição à aquisição de bens feitos em outras economias – como já foi feito no passado – sem penalizar brutalmente os consumidores.
Os preços sobem, a inflação aumenta, uma guerra comercial se instala com severas consequências internacionais e o jogo diplomático tem que ser substituído por medidas de força. O resultado é um jogo difícil de ser controlado globalmente, ou seja, são medidas tomadas fora do contexto político em que possa ser controlado.
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