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Coluna André Andrès

Os raros vinhos de Osvaldo Amado, o senhor dos dias, meses e anos

Colecionador de prêmios e responsável por uma ampla gama de rótulos, o enólogo Osvaldo Amado agora se dedica à linha de vinhos Raríssimo

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Vinho Raríssimo Dão Branco NV, produzido por Osvaldo Amado só com a uva Encruzado. Foto: André Andrès

O Dão Branco, produzido por Osvaldo Amado, passa seis anos em barricas de carvalho. Foto: André Andrès

Os gênios de variadas áreas parecem ter um domínio especial sobre o tempo. Leonardo da Vinci congelou o sorriso de Mona Lisa e ele está lá, intacto, há séculos. João Gilberto modificava o andamento de uma música encurtando ou esticando notas num intervalo mínimo, e isso era o suficiente para imprimir à canção a sua marca inconfundível. São incontáveis os lances de Pelé nos quais ele parece retardar sua descida após um cabeceio ou adia um toque na bola e destrói defesas e goleiros. A seu modo, o enólogo Osvaldo Amado, colecionador de prêmios e responsável por uma enorme gama de rótulos, também domina o tempo, talvez o mais importante fator na vasta relação de variáveis existentes em todas as etapas da produção de um vinho.

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Do momento exato da colheita ao período de decantação da garrafa, tudo é uma questão de minutos, dias, meses, anos. “Há tempo de plantar, há tempo de colher”. O angolano Osvaldo entende o ensinamento bíblico como poucos. Ele foi para Portugal aos 14 anos. Embrenhou-se no mundo do vinho inicialmente no Dão e na Bairrada. Trocou o sonho de pilotar aviões pelas viagens constantes e inumeráveis para coordenar o trabalho em vinícolas na Espanha, Itália, África do Sul, Brasil. Tornou-se responsável por rótulos consagrados, como Casa de Santar, Cabriz, Quinta dos Encontros, Adega Cantanhede. Depois de milhares de quilômetros, 3.750 medalhas de ouro e prata e 650 milhões de litros de vinhos produzidos em diversos projetos, resolveu se dedicar a um trabalho pessoal. E o resultado é um vinho raro. Muito raro.

Os vinhos de Osvaldo Amado

A linha Raríssimo, da Casa dos Amados, justifica seu nome não pela dificuldade em ser encontrada. Ela traduz o real significado da palavra. Raro é algo exclusivo, incomum, quase único. Seus vinhos são assim. E assim são principalmente porque seus tempos de produção são excepcionais. Normalmente, vinhos brancos amadurecem em barricas ou em garrafas por três meses, seis meses, um ano. Pois o Raríssimo Branco NV, feito no Dão, fica 18 meses em carvalho e mais 72 meses em garrafa antes de ir ao mercado. As uvas do tinto da Bairrada foram colhidas em 2009. O vinho maturou dois anos em barricas e 11 anos em garrafa. Saiu da vinícola em 2022. No contrarrótulo, uma garantia igualmente rara: ele mantém sua qualidade até sete dias depois de aberto. O enólogo, aliás, recomenda usar esses dias todos para apreciar o vinho adequadamente, comprovando como ele evolui ao longo do tempo.

O tempo, no entanto, não é totalmente domável. Ele sempre encontra uma maneira de dar sua resposta. Em determinado instante, durante a apresentação de seus vinhos na Gran Cave, excelente adega da Mata da Praia, em Vitória, o enólogo, com um tinto feito de Baga em sua taça, observou, risonho, mas pensativo: “Este vinho tem tudo para durar mais 40 ou 50 anos e estará no seu esplendor. Certamente não estarei aqui, mas ele estará no seu esplendor…”. Talvez tenha sido o único momento equivocado do grande enólogo naquela tarde de vinhos perfeitos, pratos excelentes e organização impecável. Porque daqui quatro, cinco décadas, alguém abrirá uma garrafa, ficará espantado com a qualidade, o vigor, a riqueza do vinho e brindará ao trabalho de Osvaldo Amado. E ele terá, mais uma vez, domado o correr dos dias, meses e anos. Como só sabem fazer os gênios. E os magos…

Os vinhos Raríssimos

Raríssimo Bairrada DOC Branco 2017

– Produzido só com a uva Arinto, casta típica portuguesa. O amadurecimento aconteceu em barricas de carvalho francês (75% do vinho) e em tanques de inox (25%). Um branco muito fresco, com muita evolução em taça. Notas de frutas cítricas e também toque minerais. Está pronto para beber, mas promete grande longevidade. Um ponto importante: a Casa dos Amados trabalha com uma produção restrita, controlada. No caso de alguns rótulos, são pouco mais de 2 mil garrafas produzidas por safra.
Quanto: R$ 1.259,00

Raríssimo Dão DOC Clarete 2016

– Clarete é um tipo de vinho muito curioso. Chegou a ser o mais consumido no mundo durante um grande período, antes de os tintos tornarem-se predominantes, mais ou menos por volta do século XVII. É um tinto mais leve ou, para muitas pessoas, um rosé mais encorpado. O Raríssimo Clarete 2016 foi elaborado com Touriga Nacional (70%), Aragonez (20%) e Alfrocheiro (10%). Passou 48 meses em tanques de inox. Lembra e muito os tintos da Borgonha: muita fruta vermelha, um pouco de tabaco. Muito macio, gostoso, redondo. Uma beleza de vinho.
Quanto: R$ 699,00

Raríssimo Dão Branco NV

– O “NV” do rótulo desse vinho tem grande importância. Em Portugal, NV é usado para designar vinhos “não vintage”, ou seja, não safrados. São brancos e tintos feitos com mais de uma safra. Neste caso, foram usadas safras de 2011 (50%), 2014 (25%) e 2015 (25%) da casta Encruzado, cada vez mais apreciada e elogiada no Brasil. Passou 18 meses em barrica de carvalho francês, sendo 25% em barricas novas e 75% em barricas de segundo uso. Foi engarrafado em 2016 e passou por mais 72 meses de maturação em garrafa. Um branco estruturado, potente à sua maneira, cremoso. Tem muitos anos de vida pela frente.
Quanto: R$ 1.350,00

O Dão Tinto, da linha Raríssimo, passa 24 meses por barricas de carvalho. Foto: Divulgação.

O Raríssimo DOC Tinto, de Osvaldo Amado, já tem 15 anos, mas tem muita vida pela frente, como acontece com a produção do enólogo. Foto: André Andrès

Raríssimo Dão Tinto 2009

– O Dão e a Bairrada são regiões produtoras de vinhos longevos, capazes de durar muitos e muitos anos. O Dão Tinto de Osvaldo Amado é feito com 70% de Touriga Nacional, 20% de Aragonez e 10% de Alfrocheiro (segundo a ficha técnica do site da Casa dos Amados; o enólogo citou o uso de Jaen, outra casta típica portuguesa, mas ela aparentemente não foi usada nessa safra). Passou 24 meses em barricas de carvalho francês. A ficha técnica não esclarece, mas aparentemente ele passou 11 anos amadurecendo em garrafa, assim como seu “irmão” da Bairrada. É um tinto robusto, mas elegante. Já tem 15 anos de guarda, no entanto está jovem. Vai durar muito tempo, certamente. Produção limitada de 2.100 garrafas.
Quanto: R$ 1.899,00

Raríssimo Bairrada Tinto 2009

– Osvaldo Amado encerrou a apresentação de seus vinhos fazendo enormes elogios à Baga, casta típica da Bairrada. E deixou bem claro: “Ninguém fez mais vinhos com a Baga em Portugal”. O vinho passou 24 meses em barrica de carvalho francês e mais 11 anos em garrafa. Chegou ao mercado em 2022. Tinto muito estruturado, extremamente robusto. Muita fruta vermelha e muita elegância num vinho extremamente saboroso e com muitas décadas pela frente, como previu seu autor. Um grande tinto para encerrar uma prova memorável.
Quanto: R$ 1.899,00

*Os preços dos vinhos têm como referência os valores praticados pela Gran Cave.

André Andrès

Há mais de 10 anos escrevo sobre vinhos. Não sou crítico. Sou um repórter. Além do conteúdo da garrafa, me interessa sua história e as histórias existentes em torno dela. Tento trazer para quem me dá o prazer da sua leitura o prazer encontrado nas taças de brancos, tintos e rosés. E acredite: esse prazer é tão inesgotável quanto o tema tratado neste espaço.

Os artigos publicados pelos colunistas são de responsabilidade exclusiva de seus autores e não representam as ideias ou opiniões do ES360.