Coluna Vitor Vogas
O aumento do espaço da direita no próximo governo Casagrande

Renato Casagrande e Ricardo Ferraço. Foto: Divulgação
“Não será o mesmo governo”, repete Casagrande desde a reta final da campanha. Não será mesmo, e uma das chaves da mudança pode estar aí: ouvindo e compreendendo o recado das urnas, o governador tende a dar mais espaço a forças de centro-direita em sua próxima gestão. Na coluna de hoje, procuramos explicar por quê.
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É preciso tomar muito cuidado com generalizações e conclusões precipitadas como a de que “o Espírito Santo é um estado conservador”, ou a de que “o Espírito Santo é um colégio eleitoral de direita”. Desde que as eleições estaduais pelo voto popular direto foram reinstituídas no Brasil, no pleito de 1982, os capixabas jamais escolheram um governador declaradamente de direita.
Na eleição deste ano, a escrita se manteve, com a reeleição de Renato Casagrande (PSB). Além disso, o deputado federal mais votado foi um petista (Helder Salomão), enquanto o recordista de votos para a Assembleia (Sérgio Meneguelli) diz que “de conservador, não tem nada”.
De todo modo, um fato se impõe: ao passo que consagraram alguns políticos de esquerda, as eleições de outubro mostraram inegavelmente o crescimento e a atual força política da direita no Espírito Santo. A direita ampliou seu espaço político. E isso deve se traduzir na próxima administração de Casagrande.
Repetindo 2018, Bolsonaro teria sido eleito em 1º turno se dependesse apenas da vontade dos capixabas. No 2º turno, derrotou Lula com autoridade no Estado, alcançando 58% dos votos válidos.
Na Câmara Federal, dos dez eleitos para a bancada capixaba, só dois são de esquerda: os petistas Helder e Jack Rocha. Na Assembleia, assim como no Congresso, a representatividade da direita cresceu muito, enquanto a esquerda elegeu muito poucos parlamentares. Com cinco deputados eleitos, o PL de Bolsonaro terá a maior bancada no Parlamento capixaba.
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Aprofundando uma tendência observada já na atual legislatura, o plenário da Assembleia que iniciará o mandato no dia 1º de fevereiro terá, predominantemente, uma cara de centro-direita – mesmo semblante da Câmara dos Deputados e do Senado nos próximos quatro anos.
Quanto ao PSB, apesar da vitória de Casagrande, o partido do governador foi muito mal votado nas eleições legislativas. Frustrando as elevadíssimas expectativas dos socialistas capixabas, o PSB só fez três deputados estaduais (menos do que tem hoje) e um mísero federal (Foletto, reeleito “a duras penas”, como ele mesmo reconheceu à coluna). No Espírito Santo, o partido tinha certeza de que faria dois federais, assim como em 2018. Portanto, também na Câmara, o PSB capixaba encolheu.
Nacionalmente, a mesma coisa: contando todos os estados, a agremiação de Casagrande só conseguiu eleger 14 federais. A partir de 2023, terá apenas a 9ª maior bancada da Câmara.
Somado a esse encolhimento da esquerda e do PSB em especial, é preciso levar em conta como se construiu a vitória eleitoral de Casagrande: de maneira altamente pragmática, o governador “socialista” fez uma série de concessões ideológicas e incorporou muitas forças de direita ao seu palanque – logo, implicitamente, ao seu futuro governo.
O que prevaleceu foi o pragmatismo de Casagrande, uma das suas características mais marcantes como líder político. Que me desculpem Manato e companhia, mas, à parte a polarização ideológica – e a estratégia dos adversários de sublinhar a todo instante o “socialismo” de Casagrande –, a campanha do governador decididamente não foi a campanha de um candidato de esquerda. Aliás, deliberadamente não o foi. Se você perguntar para qualquer “esquerdista raiz”, ele dirá o mesmo.
Desde antes da campanha propriamente dita, já apontávamos aqui: Casagrande não quer se colocar nessa disputa como candidato de esquerda, muito menos como “o candidato da esquerda”; queria apostar essa corrida ocupando a raia central.
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Isso estava evidente, por exemplo, na relutância do governador em abraçar Lula como seu candidato a presidente. Como nunca escondeu de ninguém, ele preferia que o PSB ajudasse a construir uma candidatura da “terceira via”. Vencido pelo partido – e, mais uma vez, pelo pragmatismo que lhe ditava a necessidade de atrair o PT para sua aliança e implodir a candidatura de Contarato –, ele acabou cedendo.
O deslocamento de Casagrande para o centro também ficou evidente na coalizão construída por ele – “aliança ampla”, como ele costuma chamar: um conglomerado de aliados de matizes os mais diversos, incluindo partidos de direita (o Podemos, o PSDB capixaba) e até bolsonaristas, como o PP, sem falar em um sem número de apoiadores declarados de Bolsonaro.
Nesse grande emaranhado ideológico, forças opostas, do PT ao PSDB, do PCdoB ao PP, passaram a se espremer sob o mesmo teto e sobre o mesmo palanque – tão perto, todavia tão distantes.
Em plena campanha, perguntei a Casagrande em entrevista ao EStúdio 360 se ele era o candidato da esquerda. “Eu sou também o candidato da esquerda”, respondeu ele, enfatizando o “também” e confirmando, na escolha das palavras, sua estratégia de não ficar preso a um campo fixo para conseguir expandir seu alcance eleitoral.
E, na maior de todas as evidências de que não queria ser tomado como “o candidato da esquerda, Casagrande ainda escolheu, como seu companheiro de chapa, ninguém menos que Ricardo Ferraço (PSDB), conservador de direita e eleitor de Bolsonaro.
Aí veio o inesperado 2º turno contra Manato (PL), levando Casagrande a acentuar essa sua inflexão, partindo da esquerda em direção ao centro. No mesmo movimento, ele também concedeu maior espaço a setores da direita moderada nesse aglomerado de forças que venceu as eleições com ele.
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Isso ficou consubstanciado no voto “Casanaro” – estratégia nunca condenada por Casagrande, e sim veladamente encorajada. Foi a evidência última do pragmatismo de Casagrande e de como ele, para ganhar a eleição, dispôs-se a ir muito além das fronteiras da sua esquerda natal. E, se até ali o abraço dele em Lula tinha sido cheio de dedos, no 2º turno ele passou álcool em gel nas mãos e manteve distanciamento social do próprio candidato a presidente.
Na soma desses fatores – o recado das urnas com a vitória de forças de direita nas eleições parlamentares; a configuração da próxima Assembleia da qual seu governo vai depender; a necessidade de montar uma base parlamentar agregando deputados de centro-direita; a participação imprescindível da direita em sua campanha para derrotar “o governador do Bolsonaro” –, é quase consensual entre aliados de Casagrande, inclusive em sua atual equipe: o “Casagrande – Parte 3” deverá ser um governo menos de esquerda (ou ainda menos de esquerda) e com muito mais espaço para a direita; um governo equilibrado do ponto de vista ideológico; um governo, enfim, mais ao centro.
Haverá espaço, é claro, para forças de esquerda. É evidente, por exemplo, a necessidade de acomodar o PT. Mas essas forças terão de se sentar à mesa (de trabalho) com forças de direita. E o PSB, é consenso, terá de abrir mão de espaço e aceitar ter um tamanho menor, mais representativo do que foi o desempenho da sigla nas urnas.
Será particularmente interessante, imagino, observar uma reunião dos secretários no gabinete do governador, ou analisar aquela tradicional foto do secretariado tirada logo após a posse coletiva. A imagem deverá estampar essa heterogeneidade.
Como deve se dar, efetivamente, essa ampliação do espaço da direita no próximo governo, proporcional à retração da esquerda, é o assunto a ser explorado aqui em nossa coluna de amanhã.
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