Coluna Vitor Vogas
Câmara de Vila Velha aprova e salário de vereadores vai mais que dobrar em 2025
Parlamentares aprovaram projeto da Mesa Diretora em votação relâmpago na última sessão do ano, sem nem sequer publicarem o projeto no site oficial. Conheça as cifras e os argumentos dos autores. Na correria, plenário também aprovou novos planos de cargos e salários dos servidores municipais
Caros leitores e leitoras, interrompo minha folga nesta semana espremida entre o Natal e o réveillon para lhes dar esta notícia: a Câmara de Vila Velha aprovou aumento salarial de incríveis 104% para os próprios vereadores. O reajuste é válido para a próxima legislatura, a partir de 2025.
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O valor aprovado é mais de duas vezes maior que o atual. Hoje, de acordo com o Portal da Transparência da Câmara, um vereador de Vila Velha ganha R$ 7.430,00 brutos. Em janeiro de 2025, o salário saltará para R$ 15.193,35.
Além disso, o projeto aprovado estabelece o atrelamento dos reajustes dos vereadores à revisão geral anual dos salários dos servidores públicos municipais de Vila Velha, com vencimentos atualizados na mesma data e pelo mesmo índice, “através de norma legal específica de iniciativa da Mesa Diretora da Câmara”.
Mais até que as cifras e que o percentual de correção numa tacada só, merece relevo a maneira como se deu a aprovação do projeto de resolução, com o máximo de rapidez e o mínimo de transparência e de publicidade. De autoria da Mesa Diretora, o projeto não foi discutido nem sequer em plenário entre os vereadores, que dirá com a sociedade canela-verde.
Sem nem ao menos constar no sistema de consultas de proposições do site da Câmara, o projeto foi protocolado pela Mesa, lido, votado e aprovado a jato no mesmo dia. Na última segunda-feira (26), o presidente Bruno Lorenzutti (Podemos) o incluiu de supetão na pauta da última sessão do ano – uma sessão extraordinária, realizada às 19 horas do mesmo dia. O projeto foi aprovado em votação sumária. Tudo demorou menos de um minuto.
E esse não foi o único projeto importantíssimo aprovado pela Câmara sem a devida discussão nessa sessão extraordinária de segunda-feira – repito: a última do ano. No mesmo dia, o prefeito Arnaldinho Borgo (Podemos), aliado de Lorenzutti, enviou à Câmara um pacote de seis projetos de altíssima relevância para servidores municipais.
Entre eles, os planos de cargos e salários dos servidores (quadro geral, magistério e servidores da saúde), o projeto que altera as normas de pagamento da gratificação por produtividade a fiscais do município, o que cria a Lei Orgânica da Procuradoria Geral de Vila Velha e o que autoriza a concessão de abono para o funcionalismo. Esses projetos também nem sequer foram disponibilizados na página oficial da Câmara.
Às segundas-feiras, a Câmara de Vila Velha tem sessões ordinárias às 17 horas. Nessa segunda, houve sessão normal. Durante a sessão, a Mesa leu os projetos protocolados em cima da hora pela Prefeitura – sem tempo hábil para análise e discussão com os vereadores.
O plenário aprovou requerimento de urgência para votação dos projetos do Executivo. Também aprovou a realização de uma sessão extraordinária logo em seguida, com início às 19h05, para votação dos projetos do prefeito.
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Então, na pauta dessa extraordinária, em meio aos projetos da Prefeitura, a Mesa Diretora embutiu o próprio projeto de resolução que fixa o salário dos vereadores para a próxima legislatura. Foi o famoso jabuti.
O projeto do reajuste entrou como o primeiro item da pauta. Como se vê na gravação da sessão, disponível no site da Câmara – e único vestígio deixado sobre a tramitação expressa do projeto –, o vereador Léo Pindoba (Agir), 1º secretário da Mesa, fez a leitura do projeto, limitando-se a dizer as seguintes palavras:
“Discussão e votação única: processo protocolado sob o nº 8086, de iniciativa da Mesa Diretora da Câmara Municipal de Vila Velha, contendo projeto de resolução que fixa os subsídios para a legislatura 2025-2028 e dá outras providências. Quórum: maioria absoluta. Votação biométrica.”
Lorenzutti, então, assume a palavra: “Em discussão. Encerrada a discussão, vamos colocar em votação. Os vereadores a favor votam sim. Os contrários votam não. Painel aberto”.
Os dois falam mais rapidamente que locutores de futebol no rádio.
No painel de votação, conseguem-se contar 15 votos favoráveis e nenhum contrário. Todos os 15 vereadores presentes votam a favor. “Aprovado! Próximo!” arremata o presidente. Em cerca de 50 segundos, tudo está acabado.
O vereador Pindoba só chegou a dizer o número de protocolo do projeto. Pasmem: nem sequer o número do projeto é mencionado.
Na tarde desta terça-feira (27), após ter assistido ao vídeo da sessão, fiz uma exaustiva pesquisa no site da Câmara de Vila Velha, com um objetivo simples: encontrar e ler o projeto, para entender o que os vereadores tinham aprovado.
A busca mostrou-se infrutífera. O projeto simplesmente não estava disponível. Se qualquer cidadão quisesse saber o valor do salário aprovado pelos edis para si mesmos, não conseguiria fazer isso por meio da página oficial da Câmara.
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Certo mesmo, eu só tinha o número do processo. Mas sabia a autoria (Mesa Diretora), o ano (2022), o tipo de proposição (projeto de resolução). Com esses dados, normalmente, você consegue localizar o projeto que procura no site… se o projeto estiver mesmo disponível no site. Repito: simplesmente não foi publicado.
Já na seção de informações sobre as sessões plenárias, até o início da tarde desta terça, só havia o registro de realização da referida sessão extraordinária na véspera, com a lista de presença dos vereadores na sessão. Não havia a pauta nem a ordem do dia. No meio da tarde, publicaram a pauta – mas somente com o já conhecido número de protocolo do projeto e sem nenhum link para acessá-lo.
Recorri então à Diretoria de Comunicação da Casa. Por telefone e e-mail, solicitei o envio do projeto. Felizmente, fazendo a sua parte, o representante do setor atendeu ao meu pedido. No fim da tarde, enfim pude ler o projeto – algo que, insisto, um cidadão qualquer, sem os meios disponíveis à imprensa, foi impossibilitado de fazer.
O que eles argumentam
O principal (os números) são aqueles destacados logo no início deste texto. A justificativa merece atenção detida, mas pode ser resumida em dois argumentos capitais:
1. O salário dos vereadores de Vila Velha não é reajustado desde 2009; passou os 12 anos da Era Ivan Carlini sem correção, de modo que hoje está desfasado. Teria sido comido pela inflação acumulada do período.
Conforme a justificativa, o subsídio dos vereadores “não tem reajuste para reposição das perdas inflacionárias desde o ano de 2009, e a inflação acumulada entre o período de 2009 a 2022 foi de aproximadamente 122,42%, o que representaria um valor de subsídio atualizado de R$ 16.525,66 [hoje], de acordo com o IPCA/IBGE”.
2. Mesmo elevando os próprios salários para R$ 15,1 mil a partir de 2025, os vereadores ainda vão receber menos do que teriam direito a receber. A futura quantia está aquém dos R$ 26 mil que, legalmente, eles poderiam ganhar – considerando o limite constitucional de até 75% do subsídio dos deputados estaduais.
Na semana passada, a Assembleia Legislativa aprovou projeto de lei da sua Mesa Diretora que fixou os novos valores do subsídio dos deputados estaduais para a legislatura 2023-2026, com previsão de reajuste de forma escalonada.
A partir de 1º de fevereiro de 2025, eles vão receber R$ 34,7 mil. Pela regra dos 75%, a partir da mesma data, vereadores de Vila Velha teriam o direito de receber até R$ 26 mil – muito mais que os R$ 15,1 mil que efetivamente passarão a ganhar.
É o que eles argumentam.
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Não há dedicação exclusiva
Em todo caso, vale sempre ponderar o seguinte: o exercício da vereança não pressupõe dedicação exclusiva nem em Vila Velha nem em nenhum dos mais de 5,5 mil municípios do país.
Vale dizer: ao exercerem o mandato, vereadores não estão obrigados a abdicar de suas ocupações de origem nem de outras fontes de renda. Na verdade, raramente o fazem. A regra é eles seguirem exercendo suas profissões e/ou tocando seus negócios enquanto participam das reuniões das comissões e das sessões plenárias.
Na verdade, a discussão de fundo é se o trabalho dos vereadores deveria mesmo ser remunerado ou se deveria ser pro bono – como em outras partes do mundo.
Nem os vereadores viram
Relatos de fontes da Câmara ouvidas para esta coluna dão conta de que, na verdade, nem mesmo os vereadores chegaram a ler ou ver uma cópia do projeto do reajuste antes de o votarem em plenário.
Não houve reunião do presidente Lorenzutti com os colegas para tratar especificamente deste assunto. Ao longo de segunda-feira, houve, sim, conversas dos vereadores com o presidente e com representantes da Prefeitura para falarem sobre os projetos de planos de cargos e salários que a gestão Arnaldinho pretendia enviar.
Em meio a essas conversas, o presidente teria manifestado a intenção de enfim pautar para votação o projeto dos reajustes, atendendo a um pleito muito antigo de colegas na Câmara de Vila Velha. Muitos o estavam pressionando.
Como última observação, registre-se que a princípio a Câmara teria sessão ordinária nesta quarta-feira (28) de manhã, o que não mais ocorrerá. A realização de uma extraordinária já na noite de segunda-feira também foi uma maneira de limpar a pauta o mais rápido possível, com o mínimo debate, e apressar ao máximo a votação de projetos sensíveis tanto para a Câmara como para a Prefeitura.
Diga-se de passagem, não tenho nem ideia do que dizem os projetos enviados pela Prefeitura, tampouco disponíveis no site da CMVV. Mas os servidores hão de querer saber.
OBSERVAÇÃO
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