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Coluna Vitor Vogas

Os planos e a expansão da Defensoria Pública do Espírito Santo

No dia em que tomou posse para novo mandato à frente da DPES, Vinícius Chaves de Araújo contou como pretende cumprir seus dois principais compromissos políticos: nomear mais defensores públicos e espalhar essa força de trabalho pelo interior do Estado

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Vinícius Chaves de Araújo, defensor público-geral do ES. Foto: DPES

Vinícius Chaves de Araújo, defensor público-geral do ES. Foto: DPES

A Defensoria Pública do Espírito Santo (DPES) existe para garantir que todos tenham acesso à justiça, incluindo os cidadãos mais vulneráveis, que não podem pagar um advogado. Sua tripla missão é a orientação jurídica, a promoção dos direitos humanos e a defesa, em todos os graus, dos direitos individuais e coletivos, de forma integral e gratuita. Está na Constituição Federal.

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A importância da instituição é grande, sobretudo para os cidadãos mais pobres. Mas somente nos últimos anos a DPES tem conseguido se estruturar melhor. O caminho ainda é longo. A desfasagem de defensores é grande. E é por isso que o defensor público-geral, Vinícius Chaves de Araújo, empossado ontem (10) à noite, assume seu segundo mandato seguido à frente do órgão com duas metas bem delineadas: ampliar a força de trabalho e expandir a atuação da DPES pelo interior do Espírito Santo. Sua meta é, nos próximos dois anos, nomear 35 novos defensores e espalhar esse novo batalhão por comarcas hoje desguarnecidas.

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A Defensoria Pública existe desde 1994, quando foi publicada sua Lei Orgânica. O defensor público-geral tem mandato de dois anos, podendo ser reconduzido por mais um biênio. O processo de escolha é idêntico ao do Ministério Público Estadual (MPES): em consulta direta à categoria, os defensores formam uma lista tríplice, encaminhada ao governador, com os três mais votados. Este, então, escolhe um dos três.

Isso não foi necessário nem na primeira eleição de Vinícius, em 2022, nem em sua reeleição, em dezembro do ano passado. Em ambas, ele foi candidato único, “facilitando a escolha” do governador Renato Casagrande (PSB). Na última votação, no dia 16 de dezembro, ele obteve o voto de 95% dos 152 membros que participaram. “Unifiquei os grupos e, como o Renato [Casagrande] foi reeleito, a gente já tinha uma proximidade com o governador. Então a classe entendeu que era o momento de me manter no cargo”, afirma o defensor público-geral.

Vinícius inicia o segundo biênio no cargo com o objetivo maior de colher o que plantou no primeiro: até o fim de sua gestão, em fevereiro de 2027, espera nomear os 35 novos defensores aprovados no concurso público lançado por ele em 2023, no início de seu primeiro mandato. Após a realização de todas as etapas do processo – organizado pela Fundação Carlos Chagas, de São Paulo –, falta muito pouco para a publicação dos resultados. Dois candidatos que estavam sub judice farão a prova no próximo sábado. O chefe da DPES espera poder publicar a lista de aprovados no Diário Oficial do Estado antes do carnaval.

Como consta na Lei Orgânica de 1994, jamais alterada, existem no Espírito Santo 269 vagas de defensores públicos. Essa é a previsão legal. Hoje, no entanto, só 159 desses cargos estão providos (cerca de 60%). Há, portanto, um deficit de 110 defensores só para se cumprir o que diz a Lei Orgânica.

O problema é histórico e, segundo Vinícius, tem a ver com a baixa atração da carreira oferecida pela DPES até bem pouco tempo atrás, em função dos baixos salários – não na comparação com a renda média do “trabalhador comum brasileiro”, mas com o que é pago pela Defensoria Pública de outros estados.

Segundo Vinícius, a DPES chegou a ter 216 defensores em 2013, após a realização de um grande concurso público. Mas o índice de evasão foi enorme. Uma vez empossados, muitos foram aprovados para outros concursos e migraram para outras carreiras, inclusive para serem defensores em outras unidades da federação.

“Demos posse a muitos. Mas a carreira não era tão atrativa, então muitos saíram. Tínhamos um salário muito ruim. A gente perdia defensor a cada dois, três dias, para outras Defensorias. Então a gente estava treinando defensores para outras Defensorias. Alguns também se aposentaram nesse período. Conseguimos estabilizar isso em 2020, quando realmente começamos a parar de perder defensores”, relata Vinícius.

O que houve de tão importante em 2020, para a instituição, foi um primeiro “salto salarial”, graças a uma lei estadual, proposta pelo então defensor público-geral, Gilmar Batista, que melhorou substancialmente o salário da categoria.

“E, no ano passado, demos outro salto”, complementa o sucessor de Gilmar. Aí, sim, foi “o salto do gato”, com a lei estadual aprovada pela Assembleia e sancionada por Casagrande a partir de iniciativa de Vinícius.

Até então, um defensor em início de carreira ganhava R$ 16 mil. Com a nova lei, esse salário inicial passou para R$ 24 mil – aumento de 50%. Com a progressão na carreira – a chamada “ascensão funcional” –, um defensor pode se aposentar ganhando R$ 35 mil. Portanto, dependendo da faixa salarial, um membro da DPES, hoje, pode ganhar de R$ 24 mil a R$ 35 mil por mês. Até poucos anos atrás, o piso era de R$ 10 mil.

Com certeza, foi uma valorização e tanto. Em poucos anos, o salário mais que dobrou. “Estabilizamos a carreira hoje”, afirma Vinícius.

Afinidade com Casagrande” e crédito suplementar

Com o provimento de mais 35 cargos, o número total de defensores subirá para 194 (72% das vagas existentes). Ainda haverá 75 em aberto. “Talvez não seja o ideal, mas é o momento de darmos os passos com um crescimento mais ordenado, com mais planejamento”, explica Vinícius.

Segundo o defensor público-geral, os 35 aprovados não poderão ser nomeados todos de uma vez, mas gradativamente, conforme a disponibilidade orçamentária da DPES. A Defensoria Pública não é um Poder – até porque seu chefe é escolhido pelo governador –, mas é uma instituição autônoma. Assim como a Assembleia, o TJES, o MPES e o TCES, tem direito a parte do orçamento anual elaborado pelo Governo do Estado e trabalha com autonomia orçamentária e financeira.

Para 2025, o orçamento da DPES está perto de R$ 150 milhões – com sobras, o melhor e maior de sua história. Mas essa cifra atende às demandas do órgão? Aí depende. Segundo Vinícius, para conseguir nomear os 35 aprovados já este ano, ele precisará pedir crédito suplementar ao governador. Já fez isso, aliás. Depois da sua recondução, em dezembro, os dois já se falaram sobre o tema.

“É sempre necessário a gente dialogar e mostrar a nossa realidade. E ele se mostrou disposto a dialogar sobre o orçamento”, conta o chefe da DPES. “Se você comparar com os das outras instituições, realmente é um orçamento quatro vezes menor. Mas é um orçamento que foi construído com o Governo do Estado e estamos sempre dialogando para aumentá-lo.”

Vinícius, por sinal, mantém excelente relação política com o governador, de quem se considera um aliado. “Temos afinidade política.”

Ele reconhece, porém, que os aprovados no concurso poderão não ser nomeados ainda este ano. “Esse é o sonho. Mas estamos nessa batalha para conseguirmos equacionar essa questão orçamentária. É preciso um aporte financeiro para conseguirmos fazer. Tenho até quatro anos para nomeá-los. Vou nomear de acordo com a nossa disponibilidade orçamentária. Se alguém se aposentar nesse tempo, por exemplo, isso nos dá uma folga”.

Indagado sobre uma meta, ele estabelece: “Até o fim da minha gestão [em janeiro de 2027], espero nomear os 35 e então fazer o planejamento de um novo concurso, se for necessário.”

Concurso voltado para o interior

Mais que uma meta, ele também afirma uma certeza: independentemente da quantidade, todos os aprovados que forem nomeados irão para comarcas no interior do Estado. “É um compromisso político que tenho.”

Jurisdicionalmente, o Espírito Santo é dividido em 69 comarcas. A DPES chegou a atuar em 63. Hoje, está presente em apenas 26 (as quais correspondem a 70% da população capixaba). O concurso em andamento já foi pensado para cobrir esse deficit.

“Precisamos expandir para o interior. Todos esses defensores públicos irão para o interior. Vamos reforçar a atuação dos núcleos regionais e capilarizar para os outros locais”, revela Vinícius.

Dos 159 membros em atividade atualmente na DPES, 80% estão lotados na Grande Vitória. Ele conta que, embora esta informação não constasse no edital (nem poderia), no dia da prova oral, ele tratou de esclarecer a condição em uma preleção aos candidatos: “Fui lá e disse para eles: ‘Vocês não me venham pedir para trabalhar na capital. Pode desistir agora. Não precisa nem fazer a prova oral. Este concurso é pro interior’. É um compromisso político que tenho com os deputados”.

Além do compromisso político, é uma forma de a DPES se adequar à Emenda Constitucional nº 80, de 2014. Essa emenda fixou que, no prazo de oito anos (vencido em 2022), a União, os estados e o Distrito Federal deveriam contar com defensores públicos em todas as unidades jurisdicionais. Após o fim do prazo, “a lotação dos defensores públicos ocorrerá, prioritariamente, atendendo as regiões com maiores índices de exclusão social e adensamento populacional”.

Por meio de uma parceria com o Instituto Jones dos Santos Neves, o órgão de pesquisa do Espírito Santo vai entregar à DPES um estudo para que esses 35 novos defensores possam ser distribuídos de uma forma mais técnica, em função do Índice de Desenvolvimento Humano (IDH) das cidades.

“Eles analisaram o IDH dos municípios, a quantidade de processos, a quantidade de pessoas vulneráveis em cada município, para que a gente possa melhorar essa distribuição, para que não fique uma distribuição aleatória, mas equilibrada de acordo com a realidade e as necessidades de cada localidade”, conta o defensor público-geral.

Segundo o artigo 98 do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias (incluído pela Emenda Constitucional nº 80/2014), “o número de defensores públicos na unidade jurisdicional será proporcional à efetiva demanda pelo serviço da Defensoria Pública e à respectiva população”.

Conforme pondera Vinícius, também não adianta nomear os 35 aprovados de uma vez sem que eles nem sequer tenham estrutura para trabalhar… o que nos leva à sua última grande proposta.

Os núcleos modulares

A proposta de Vinícius visa à expansão da estrutura física de trabalho da DPES pelas comarcas do interior da maneira mais simples e econômica possível, sob a inspiração de uma iniciativa exitosa da Defensoria Pública do Maranhão. Na verdade, o projeto é capitaneado pelo Ministério da Justiça e foi iniciado no estado do Nordeste, onde já foram instalados 49 “núcleos modulares”.

“São núcleos que já vêm pré-moldados, estruturas de rápida instalação. Não é como um caminhão ou uma estrutura itinerante. Você precisa de um terreno para montar uma base, conectar a rede elétrica e rede de esgoto. Mas podem ser implementados em até 60 dias. É mais rápido, mais barato e totalmente sustentável, com uso de placas solares e reaproveitamento da água da chuva”, descreve o defensor público-geral.

Os núcleos têm tamanho variado, podendo comportar de um a seis defensores. O custo de instalação depende, é claro, do tamanho. Mas, em média, segundo Vinícius, um núcleo como esse, para dois defensores, com área de 120 metros quadrados, custa R$ 850 mil para ser instalado.

Sua meta, afirma, é implantar até 20 desses núcleos nos próximos dois anos, até o fim do seu mandato, pelo interior do Espírito Santo.

Segundo ele, o Ministério da Justiça já lhe prometeu dez núcleos modulares – para cumprir metade da meta –, mas ainda não especificou o tamanho nem o prazo de entrega. E quanto aos demais? “Estou dialogando com os prefeitos para conseguirmos implementá-los.”

Gasto com pessoal e reforma administrativa

Para este ano, dos quase R$ 150 milhões do orçamento estadual previstos para a DPES, R$ 96 milhões deverão ser gastos com pessoal, segundo estimativa do chefe do órgão.

A DPES não tem servidores efetivos. Somente alguns cedidos pelo Governo do Estado. Vinícius planeja promover um concurso pequeno, para contratação de alguns efetivos.

Projeto apresentado por Vinícius e transformado em lei no ano passado (o mesmo que melhorou sensivelmente os salários dos defensores) também criou 89 cargos comissionados na estrutura administrativa da DPES. Metade deles já estão providos. O projeto também redesenhou o organograma da instituição, criando órgãos internos e extinguindo outros, obsoletos. “Foi a maior reforma administrativa da história da instituição.”

Além de funcionários terceirizados, a DPES ainda conta com um incrível exército de 350 estagiários de graduação e, ainda, 50 estagiários de pós-graduação. Vinícius estuda criar uma residência jurídica na instituição, com direcionamento da Escola Superior da DPES.

Quem é Vinícius Chaves de Araújo

Capixaba nascido em Mantenópolis, na divisa com Minas Gerais, Vinícius Chaves de Araújo tem 45 anos. Cresceu em Vitória, formou-se em Direito pela Ufes e foi aprovado no primeiro concurso público para a DPES. É defensor público do Espírito Santo desde 2007.

Já trabalhou em Aracruz, na Serra, em Venda Nova do Imigrante, em Santa Maria de Jetibá, em Linhares e em Vitória. Ocupou diversos cargos na administração superior da DPES, entre os quais o de subdefensor público-geral (2012 e 2015, 2019 e 2022) e o de corregedor-geral no biênio 2020/2022 – todos durante gestões de Gilmar Alves Batista como defensor público-geral.

Em 2022, elegeu-se defensor público-geral pela primeira vez, como candidato único. Em dezembro do ano passado, foi reeleito, novamente sem concorrentes.

Embora o regramento interno permita que defensores públicos (exceto o defensor público-geral) se licenciem para exercer cargos comissionados no Governo do Estado, Vinícius nunca o fez. O regramento interno também permite filiação partidária, mas ele não tem nenhuma.