fbpx

Coluna Vitor Vogas

Gilvan x Do Val no UFC: Unidos em Fiasco Colossal

MMA: Metidos a Macho Alfa, embora Muito Mais pra Aloprados em Momentos de Maiúsculo Absurdo, Mas Marcantemente Artificiais, ditados por um Marketing Meramente Autopromocional. Leia aqui a nossa análise completa

Publicado

em

Gilvan da Federal e Marcos do Val

Gilvan da Federal e Marcos do Val

Gilvan versus Do Val no UFC: Unidos em Fiasco Colossal. MMA: Metidos a Macho Alfa, embora Muito Mais pra Aloprados em Momentos de Maiúsculo Absurdo, Mas Marcantemente Artificiais, ditados por um Marketing Meramente Autopromocional.

> Quer receber as principais notícias do ES360 no WhatsApp? Clique aqui e entre na nossa comunidade!

Nas últimas duas semanas, o deputado federal Gilvan da Federal (PL) e o senador Marcos do Val (Podemos) ressignificaram essas duas siglas tão intimamente associadas ao universo das artes marciais (praticadas por ambos). Transpuseram-nas, com novos sentidos, ao universo político de Brasília e do Espírito Santo.

Receba as notícias da coluna no grupo de Whatsapp do Vítor Vogas.

Os episódios da baixaria foram amplamente noticiados, por isso nos ateremos a resumi-los.

Há duas semanas, começou o duelo Gil-Val – que já nasceu como um clássico da extrema-direita capixaba. Os dois foram filmados na CCJ do Senado trocando uma encarada a meio palmo de distância, daquelas de quem está muito perto de partir para as vias de fato. Não partiram. Partiram para o Instagram, cada um contando a própria versão.

Do Val relatou que, há tempos, Gilvan o vem provocando gratuitamente pelo Whatsapp. Na ocasião, então, ele desafiou o deputado a lhe dizer na cara o que viria escrevendo e o mandou se retirar do Senado. Gilvan, por sua vez, preferiu exercitar sua expertise: a provocação. Em suas redes, chamou Do Val de “Swat da Shopee”.

No dia 20 de junho, os dois foram flagrados a trocar dedo no peito e empurrão no saguão do Aeroporto de Vitória. Gilvan chegou a se colocar em posição de combate, erguendo uma guarda de boxe, pronto para trocar sopapos. Não chegaram a tanto. Do Val, pelo menos, parou aí. Gilvan achou que ainda era pouco e resolveu ir muito além, mostrando-se determinado a explorar o factoide até a última gota.

No último dia 26, profanando a sagrada tribuna da Câmara dos Deputados, a mesma de onde já discursaram os maiores vultos da política nacional, o deputado bolsonarista desafiou Do Val a resolver suas diferenças com ele da maneira mais civilizada já inventada pela espécie humana: luta corporal. “Qualquer academia, pode marcar, qualquer modalidade: no boxe, no MMA, vale-tudo… Eu tô à disposição!”

A quinta série surtou e espera ansiosa o próximo capítulo. Quiçá alguém proponha um balde de lama despejado no tatame, ringue ou octógono, para deixar tudo ainda mais interessante.

Os mais imaginativos já se puseram a pensar em Gilvan trajando um sungão e a inseparável bandeira brasileira à guisa de capa, como um autêntico lutador do telecatch que animava as matinês nos anos 1960, e Do Val vestido de instrutor da Swat, com aquela calça militar bem larga e na altura do umbigo.

Mas voltemos à seriedade. Comecemos pelo mais evidente: a acintosa falta de decoro não só no conflito em si, mas na maneira proposta para resolvê-lo.

Em todo esse reality show, o modo de agir de ambos passou a anos-luz de distância do comportamento que se exige de um homem público. O mínimo que se espera de nossos congressistas é que se comportem com a educação, a urbanidade e a civilidade impostas pelo espaço em que exercem os mandatos outorgados pelo povo (o Congresso Nacional!) e pelas nobilíssimas funções públicas que ocupam.

Portar-se com tal grau de primitivismo é um desrespeito aos brasileiros em geral, mas, acima de tudo, aos cidadãos capixabas que eles, supostamente, representam. Não é possível que o povo capixaba realmente se sinta representado por esse tipo de “representação” (no sentido teatral da palavra) grotesca; número cômico de mau gosto; comédia B da pior qualidade.

Mas o que mais estarrece não é nem tanto a falta de decoro, tampouco a absoluta falta de preocupação com a imagem deles mesmos e a do Espírito Santo projetada por dois homens adultos eleitos pelos capixabas com esse nível de infantilidade. O que mais estarrece, na verdade, é a falta de serventia, é a falta de retorno real, é a falta de trabalho efetivamente útil e produtivo para a população capixaba.

No centro do picadeiro, dois bobos disputando quem é mais bobo e fazendo ainda mais de bobos os cidadãos capixabas que, estupefatos, assistem ao circo. Capixabas que já têm uma bancada diminuta no Congresso e que estão praticamente desfalcados de dois congressistas.

Enquanto exibem pelas redes sociais toda aquela masculinidade muito mais pueril que viril – do tipo “sou mais macho que você!”, “bate aqui se for homem!”, “te pego na saída!”, “o meu (ego) é maior que o seu!” –, os dois valentões se mostram muito pouco preocupados em trabalhar em prol do bem dos capixabas e da agenda realmente relevante para o estado que (em tese) representam e muito mais ocupados em se engalfinharem numa contenda inócua que só serve para mantê-los em evidência dentro das respectivas bolhas digitais.

Numa pauta, se é que se pode chamar assim, que leva do nada a lugar algum, a dupla Gil-Val persegue tão somente o aplauso fácil, ou a vaia fácil, mas isso na verdade não parece fazer muita diferença: na lógica das redes sociais e dos políticos que nela se criam, o importante é fabricar a controvérsia, despertar amor e ódio, dividir opiniões e atrair interações igualmente apaixonadas dos fãs e dos haters.

É disso que eles se alimentam e que depende sua existência política. “Falem mal, mas falem de mim.” Sua carinha de nojo vale tanto quanto um coraçãozinho; seu comentário enfurecido é até melhor que um like.

Mas e exercer o mandato que é bom?

Do Val já está na metade do sexto de longuíssimos seis anos de mandato no Senado e, a esta altura, é mais que legítima a pergunta: será só isso mesmo, até o fim?

Gilvan já está quase dobrando o Cabo das Tormentas, aproximando-se da metade do mandato

na Câmara, para o qual foi eleito em 2022 com a segunda maior votação entre os eleitores do Espírito Santo. Em meio a tantas e tamanhas confusões, também parece-nos legítimo questionar: qual tem sido a utilidade real do seu mandato para os capixabas? E, por favor, ninguém aqui está falando de emendas parlamentares ao Orçamento da União, que é o básico do básico do básico…

Para além de teorias conspiratórias e da insensatez ideológica, como os dois têm atuado nos debates e projetos de interesse estratégico para o Brasil e o Espírito Santo? Como têm atuado na agenda que realmente diz respeito aos interesses maiores do povo brasileiro e que efetivamente pode melhorar a vida da população em geral?

Presidem ou exercem algum protagonismo em alguma comissão do Congresso? Propuseram ou relataram algum projeto relevante, de profundo interesse nacional? Fizeram algum discurso marcante sobre tema da agenda real do país? Contribuíram, com opinião, ideia ou emenda, em algum debate fundamental? Ou estão lá, fazendo número no baixo clero?

Em 2023, Câmara e Senado passaram quase o ano inteiro debatendo e votando o projeto mais importante, em anos, para o desenvolvimento econômico do Brasil e a atividade empresarial, temas tão caros ao eleitorado de ambos: a reforma tributária. Se, numa análise macro, o Espírito Santo também ganha (como todos), é fato que o estado amargará inevitáveis perdas em alguns pontos específicos da reforma. Muitos parlamentares capixabas se posicionaram nas discussões. Muito ocupada com outras pautas, a dupla Gil-Val passou em branco.

E quanto ao destrave dos históricos gargalos logísticos do Espírito Santo para que a economia do Estado possa deslanchar? BR-101, BR-262, EF-118, portos, aeroportos? Como têm se envolvido? Que contribuição têm dado?

Queríamos poder dizer que é um jogo de soma zero, mas não é: o saldo é negativo. Já temos um time bem pequeno, numericamente limitado, mas estamos jogando com dois a menos no Congresso. A bancada capixaba só tem dez deputados federais, para fazer frente a bancadas três, cinco, até sete vezes maiores, em debates que opõem interesses de unidades da federação. Cada deputado desses conta muito, precisa multiplicar-se por vários, em vez de se anular e se ausentar das discussões.

No Senado, Casa do equilíbrio federativo, a representação é igualitária, não se dá segundo o tamanho da população de cada estado. Ali não está representada, como na Câmara, a população brasileira, mas as unidades da federação. Por isso, cada qual tem direito aos mesmos três senadores. O Senado, sim, muito mais que a Câmara, é o espaço para se buscar equilibrar o jogo… Mas três membros são muito pouco, e um a menos, neste caso, faz uma falta ainda maior, em termos proporcionais…

Gilvan da Federal

Desde que surgiu na Câmara de Vitória, em janeiro de 2021, Gilvan da Federal se notabilizou por duas características inseparáveis: fanatismo ideológico proporcional à agressividade verbal.

Típico produto do bolsonarismo em estado puro, o agora deputado federal é daqueles que só enxergam a política em preto e branco, reduzindo essa sofisticada atividade humana, cheia de nuances e contradições, a uma perpétua disputa binária entre direita e esquerda, com ares de cruzada santa do bem contra o mal, na qual o bem (a direita) prevalecerá rumo à Terra Prometida (um mundo sem a esquerda). É um político que depende do que Luiz Paulo Vellozo Lucas definiu aqui outro dia como “polarização estéril e histérica”.

Desde que chegou ao Congresso, guindado por seus mais de 80 mil votos, o ex-vereador tem se dedicado a caçar confusões também em Brasília. Esforça-se muito para se envolver em tumultos e bate-bocas com políticos de esquerda em comissões da Câmara. Mas ali é bem mais difícil se destacar pela polêmica gratuita.

Na Câmara de Vitória, ele era um de 15; na Federal, é um entre 511. E ali a concorrência é fortíssima: o que não falta no Congresso hoje em dia é personagem radical e/ou folclórico fazendo de tudo para se destacar da mesma forma em um dos piores Congressos da história do nosso país. Nesse ambiente, Gilvan é só mais um: suas peripécias se diluem no mar de insanidade e fanatismo em que o Congresso se transformou, e poderiam até passar despercebidas…

Até que ele resolveu trombar com Marcos do Val, um caçador de polêmicas, views e likes à sua altura.

Marcos do Val

Do Val se perdeu no personagem. Está à deriva no Congresso.

No governo passado (Bolsonaro), ele tinha as pautas do armamento civil e da cloroquina. Acabou a pandemia, ficou sem a cloroquina; ganhou Lula, perdeu Bolsonaro, virou governo, a pauta do armamento perdeu força. Bem no meio do mandato, com mais quatro anos pela frente, Do Val se viu sem mote, sem um gancho para seguir em frente. Inaugurou, então, a segunda metade do mandato da forma mais surreal possível.

De fevereiro a junho do ano passado, começando com a denúncia à Veja de que Bolsonaro teria tramado um golpe de Estado e com a própria renúncia fake, o senador criou uma confusão tão grande, mas uma história tão rocambolesca, com tantas versões conflitantes, com tramas conspiratórias tão confusas, com contradições tão grosseiras, com um enredo tão nonsense, que minou a própria credibilidade não apenas entre eleitores de outro espectro ideológico e/ou que já não gostavam dele, mas inclusive entre grande parte do eleitorado bolsonarista.

A julgar pelos comentários em suas postagens, depois de tantos blefes, muita gente que o admirava e o levava muito a sério passou a não lhe dar mais crédito e dizer que “fala muito, mas não age”, por conta das sucessivas bravatas de que estaria em posse de material para derrubar o governo Lula… Por incrível que pareça, muita gente levou isso muito a sério e depois, é claro, desiludiu-se, ao constatar que, obviamente, não havia nada: prometeu uma bomba nuclear, não entregou nem estalinho de São João.

Assim como Gilvan, Do Val depende fundamentalmente de uma bolha sustentada pelas redes sociais. Impedido por quase um ano de publicar nelas por decisão de Alexandre de Moraes – decorrente das muitas fake news espalhadas pelo senador –, Do Val passou esse período em ostracismo, sem pauta relevante, sem aparecer na mídia nem bem nem mal, salvo pelo episódio, também na linha nonsense, em que surgiu manipulando duas facas de fibra (furando uma laranja e um frasco plástico de álcool em gel) em uma comissão, “para testar a segurança do Senado”, em fevereiro deste ano.

Agora que recuperou o direito de postar nas redes sociais, Do Val parece parado no tempo, vivendo num presente perpétuo, prisioneiro do mesmo dia (8 de janeiro de 2023), como o personagem de Bill Murray (este, sim, um grande comediante) no clássico “Feitiço do Tempo”.

Obsessivamente, toda a sua energia psíquica e política, bem como todo o seu mandato (e, com ele, toda a onerosa estrutura do mandato, paga rigorosamente pelo cidadão brasileiro), são direcionados para duas únicas causas: combater Alexandre de Moraes e remoer a tese conspiratória de que o maior culpado pelos ataques do 8 de janeiro, contra o governo Lula, foi o próprio governo Lula.

Perito em técnicas de imobilização e de autossabotagem, Do Val é a maior vítima de si mesmo. Mentira tem pernas curtas e ele acaba tropeçando nas próprias de tanto que plantou desinformação e o fez de maneira confessa, como chegou a declarar algumas vezes em entrevistas e lives no ano passado – “ludibriar o inimigo”, “técnicas de inteligência”, “estratégia de persuasão” para obter “o engajamento da imprensa” etc.

Duelos medievais

Largamente usado para resolver por meio da violência querelas pessoais entre cavaleiros quando um deles tinha a “honra ferida”, a prática medieval do “duelo” vicejou por muitos séculos, prolongando-se na história até meados do XIX, mas há muito foi riscada do código comportamental aceito em sociedades modernas.

Delírio coletivo e terceirização da culpa

É curioso como, nos comentários às publicações de Do Val e, principalmente, Gilvan, um número incrível de seguidores culpa a “esquerda” pela briga entre eles. Os dois estariam “caindo nas armadilhas da esquerda” feitas para “dividir a direita”.

Se a dupla Gil-Val cai na armadilha armada por alguém, é naquela armada por eles mesmos.

Quem foi que moveu uma palha, um músculo que seja, para os dois brigarem entre si?


Valorizamos sua opinião! Queremos tornar nosso portal ainda melhor para você. Por favor, dedique alguns minutos para responder à nossa pesquisa de satisfação. Sua opinião é importante. Clique aqui