Coluna Vitor Vogas
Do Val: passaporte apreendido, contas bancárias e redes bloqueadas… e tem mais
Como se fosse pouco, senador ainda é alvo de nova operação e investigação da PF que apura até corrupção de menores. O motivo de tudo isso?
O senador Marcos do Val (Podemos) tem se notabilizado por uma irresistível propensão a se complicar sozinho e por uma incomparável vocação para a autossabotagem. Quando parecia que o senador pelo Espírito Santo não poderia piorar ainda mais a própria situação junto à Polícia Federal e ao STF, ele novamente provou que estávamos enganados.
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Cerca de três meses após ter recuperado o direito de publicar em suas redes sociais, por decisão de Alexandre de Moraes, Do Val, por ordem do mesmo ministro, volta a ter suas redes bloqueadas, mas desta vez não só as redes: o ministro também determinou o bloqueio geral de todos os bens e valores em nome dele e de suas contas bancárias, para assegurar o pagamento de multas em valor ainda não calculado.
Como se fosse pouco, também por ordem de Moraes, o senador foi obrigado a entregar seu passaporte diplomático à Polícia Federal (medida que visa impedir o risco de fuga do país). E agora é um dos alvos de uma nova investigação da PF que, entre outros crimes, apura até corrupção de menores.
E tudo isso por quê?
Por postagens e repostagens feitas por ele em suas redes sociais, de maneira 100% espontânea, desde que recuperou o direito de usá-las, há pouco mais de três meses.
A reportagem do site UOL teve acesso à decisão sigilosa de Moraes, do dia 7 de agosto, que determinou o bloqueio das contas de Do Val (bancárias e em redes sociais).
O ministro destaca as demonstrações de “completo desprezo” do senador pelo Poder Judiciário. O reiterado descumprimento, por parte de Do Val, de restrições impostas por ele, foi o que o levou a tomar a decisão de voltar a lhe vedar a utilização das redes e de bloquear todas as suas contas e bens, para garantir o pagamento de multas em valor ainda não calculado.
Segundo a reportagem do UOL, a nova frente de investigação da PF apura os ataques de bolsonaristas, entre eles Do Val, aos delegados e agentes da corporação que conduzem os inquéritos contra Jair Bolsonaro e seus apoiadores no STF.
Do Val teve as redes sociais bloqueadas pela primeira vez em junho de 2023, também por ordem de Moraes. A decisão foi tomada no bojo de outro inquérito sigiloso que tramita no STF, também sob a relatoria do ministro, no qual Do Val é investigado por outros crimes, como golpe de Estado, e por ter divulgado o teor de documentos secretos em suas redes sociais. Na ocasião, a PF cumpriu mandados de busca e apreensão na residência do senador em Vitória e em seu gabinete no Senado.
No dia 10 de maio deste ano, quase um ano depois, Moraes liberou as redes sociais do parlamentar, mas sob uma condição: a de que ele não tornasse a publicar, promover ou replicar ataques ou notícias fraudulentas, sob pena de multa diária de R$ 20 mil.
Vamos frisar: Moraes autorizou Do Val a voltar a usar suas redes, mediante a condição de não tornar a publicar, promover ou replicar ataques. A proibição total de uso das redes foi substituída por essa cautelar: ele só precisava se abster de publicar, promover ou replicar ataques.
Mas o que ele voltou a fazer a partir daí, quase imediatamente, segundo Alexandre de Moraes? Precisamente, publicar, promover e replicar ataques. E, nessa nova fase, não somente contra o próprio ministro. Os alvos passaram a ser, individualmente, agentes da Polícia Federal (pessoas físicas, muito mais vulneráveis, inclusive fisicamente, que um ministro da Suprema Corte do país).
A decisão de Moraes cita postagens feitas por Do Val entre 7 de junho (menos de um mês após recuperar o acesso às redes) e 16 de julho.
Em meados de julho, o blogueiro bolsonarista Alan dos Santos, figura central nessa nova investigação da PF, exortou apoiadores do ex-presidente da República na internet a atacar policiais que atuam ou atuaram nas investigações que vêm sendo conduzidas pelo STF e que atingem, principalmente, Bolsonaro, seus aliados e militantes bolsonaristas que atuaram nos atos golpistas de 8 de janeiro.
De acordo com a decisão obtida pelo UOL, Do Val foi um dos membros dessa guerrilha digital que atenderam prontamente à convocação de Allan dos Santos. A PF mapeou postagens do senador capixaba após o chamado do blogueiro.
“No dia 17/07/2024, com o avanço das investigações promovidas nos autos da Pet 12.404/DF, a Polícia Federal indicou que, após o anúncio realizado por ALLAN LOPES DOS SANTOS nas suas redes sociais, diversas pessoas aderiram à sua campanha e começaram a tentar intimidar os policiais federais que atuam (ou atuaram) nos procedimentos investigatórios em curso nesta SUPREMA CORTE, por meio do envio de ‘e-mails’ anônimos, de exposição de dados pessoais, de publicações de fotografias dos policiais e/ou de seus familiares nas redes sociais. Dentre as pessoas, a autoridade policial indicou que o Senador da República MARCOS DO VAL, desde o dia 07 de junho de 2024, estaria descumprindo a medida cautelar de abstenção de publicação, promoção, replicação e compartilhamento dos ataques e notícias fraudulentas, objeto desta investigação”, anotou Moraes, em trecho da decisão, publicado pela reportagem do UOL.
O ministro afirma que a conduta do parlamentar justifica a imposição de multa diária.
“As condutas do Senador da República MARCOS DO VAL, que insiste em desrespeitar as medidas cautelares impostas nestes autos, revelam o seu completo desprezo pelo Poder Judiciário, comportamento já verificado anteriormente nesta Pet 10.975/DF e que justificaram a imposição de MULTA DIÁRIA para assegurar o devido cumprimento das decisões desta CORTE, não havendo qualquer justificativa para o desrespeito das medidas cautelares impostas”, registrou Moraes em outro trecho da decisão sigilosa.
Segundo a reportagem do UOL, a PF verificou que primeira postagem do senador desrespeitando a cautelar de 10 de maio ocorreu em 7 de junho. De acordo com os investigadores, menos de um mês após ter reavido o direito de usar as redes, Do Val teria começado a desrespeitar a decisão do STF ao postar ataques e críticas a delegados e agentes da PF.
Em publicação feita no dia 16 de julho, atendendo à “convocação” de Allan dos Santos, Do Val afirmou que poderia fazer uma suposta “denúncia” contra o delegado federal Fábio Shor, que indiciou Bolsonaro nos inquéritos das joias e das fraudes em cartões de vacinação, por ser protegido pela prerrogativa da imunidade parlamentar.
Em nota divulgada à imprensa, a defesa do senador afirma ter recebido com espanto e “profunda preocupação” a decisão de Moraes. A medida, segundo seus advogados, prevê o bloqueio até do salário do parlamentar e representaria um “verdadeiro asfixiamento de sua vida financeira”. A defesa afirma ainda que o senador sempre se posicionou em defesa da PF e que não tomou conhecimento dessa nova investigação sobre os ataques a delegados e outros investigadores da corporação.
Corrupção de menores
Na manhã dessa quarta-feira (14), Marcos do Val foi um dos alvos da Operação Disque 100, deflagrada pela PF. De acordo com reportagem da Agência Estado, o senador é acusado de corrupção de menores nessa investigação. Moraes determinou a apreensão do passaporte diplomático do parlamentar.
A acusação se deve a um vídeo republicado por Do Val em suas redes sociais. Originalmente, o vídeo foi publicado na conta de uma filha, menor de idade, do blogueiro bolsonarista Oswaldo Eustáquio, também alvo da Operação Disque 100. Na gravação, outros dois filhos de Eustáquio citam nominalmente um delegado que cumprira mandado de busca e apreensão na casa do blogueiro. O vídeo foi compartilhado pelo senador do Espírito Santo.
O próprio Eustáquio é acusado de corrupção de menores por usar os filhos para atacar autoridades. Segundo a PF, quando postagens sobre policiais foram feitas no perfil da filha do blogueiro, ela estava dormindo, “indicando sua efetiva utilização por maiores de idade, inclusive responsáveis legais, para a realização das condutas de obstrução das investigações”. As contas da filha menor de idade de Eustáquio foram bloqueadas.
Na representação enviada ao ministro Alexandre de Moraes, os investigadores argumentaram que Marcos do Val “promoveu publicações de exposição / intimidação, inclusive envolvendo a gravação de menores de doze anos de idade, reproduzindo as afirmações feitas por ambos”. Para a PF, ao repostar o vídeo, Do Val estimulou a jovem a expor mais dados de policiais e seus familiares.
Em publicação na tarde dessa quarta-feira (14) no X (antigo Twitter), onde sua conta seguia ativa, o senador declarou que as decisões proferidas por Moraes “violam frontalmente a Constituição da República”. Disse, ainda, que a apreensão do seu passaporte diplomático foi realizada sem qualquer justificativa legal ou fundamento:
“É mais uma demonstração clara das ilegalidades que vêm sendo cometidas contra mim. Não há motivo algum para que meu passaporte seja retido, pois não tenho qualquer intenção de fugir do Brasil. Continuo firme no exercício do meu mandato, e nada justifica essa medida draconiana”.
A nota de Marcos do Val na íntegra
Comunicado do Senador Marcos Do Val
Prezados,
Devido à impossibilidade de estar em Brasília por conta do bloqueio da conta de ressarcimento de passagens, uma medida arbitrária que me impede de exercer plenamente meu mandato, venho a público, primeiramente, pedir desculpas por não poder estar presente. Para representar-me e ler este pronunciamento, designei o senador Eduardo Girão, meu amigo e companheiro de luta, que tem ombreado comigo desde o início dos acontecimentos de 8 de janeiro.
Seguimos.
Minhas contas pessoais e a conta do meu gabinete foram bloqueadas, impedindo-me de cumprir integralmente minhas responsabilidades como Senador da República. Além disso, fui falsamente acusado de possuir um valor de 50 milhões de reais, algo que jamais existiu e que pode ser facilmente verificado na minha declaração de renda. Como se isso não bastasse, o bloqueio integral do meu salário impossibilitou que eu custeasse o plano de saúde de minha filha e da minha mãe, que está em tratamento contra o câncer.
Hoje, 14 de agosto, fui surpreendido pela visita de policiais federais em minha residência, com a ordem de apreender meu passaporte, sem que houvesse qualquer decisão judicial, sem que o Senado fosse devidamente comunicado sobre o cumprimento de tal mandado, e sem a prévia ciência do presidente desta Casa. A apreensão do meu passaporte diplomático, realizada sem qualquer justificativa legal ou fundamento plausível, é mais uma demonstração clara das ilegalidades que vêm sendo cometidas contra mim. Não há motivo algum para que meu passaporte seja retido, pois não tenho qualquer intenção de fugir do Brasil. Continuo firme no exercício do meu mandato, e nada justifica essa medida draconiana.
Essas decisões, proferidas pelo Ministro Alexandre de Moraes, violam frontalmente a Constituição da República em diversos pontos:
1. Violação da Imunidade Parlamentar: A interferência indevida no exercício das minhas funções legislativas é um ataque direto à prerrogativa que me foi conferida pelo povo. Nenhum parlamentar deve ser impedido de exercer seu mandato por questões que extrapolam os limites legais.
2. Desproporcionalidade das Medidas: O bloqueio total de meus ativos financeiros, sem qualquer garantia de subsistência, é uma medida desproporcional e afronta a dignidade humana. A Constituição é clara ao proteger o direito à vida e à subsistência, e essas medidas vão contra esses princípios fundamentais.
3. Violação do Princípio da Separação dos Poderes: O bloqueio das minhas contas pode ser interpretado como uma tentativa de constranger o Poder Legislativo, violando a separação dos poderes. Esta é uma linha que nunca deveria ser cruzada em uma democracia.
4. Violação do Direito ao Contraditório e Ampla Defesa: Se essas medidas foram tomadas sem me dar a oportunidade de defesa, configuram uma violação do direito ao contraditório. Todos têm direito a ser ouvidos antes que medidas tão drásticas sejam implementadas.
5. Bloqueio Indevido de Salários: O bloqueio das contas destinadas ao recebimento de salários não só é inconstitucional, como também coloca em risco a minha capacidade de subsistência e o bem-estar de minha família, uma situação inaceitável em um Estado que se diz de Direito.
6. Extrapolação de Competência: Por fim, é necessário questionar se o Supremo Tribunal Federal agiu dentro de suas competências ao determinar essas medidas. Vivemos em um país onde as competências dos poderes são claramente delimitadas, e essa decisão levanta sérias dúvidas sobre a sua legitimidade.
Ademais, é preciso destacar a gravíssima omissão da imprensa em relação a esses ataques contra a Constituição e as prerrogativas constitucionais. Como podemos sustentar uma democracia vibrante se a imprensa, que deveria ser a guardiã da verdade e da liberdade, permanece calada e omissa? A ausência de denúncias por parte da mídia sobre essas flagrantes ilegalidades é uma afronta ao papel fundamental que a imprensa deve desempenhar em uma sociedade democrática.
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