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Coluna Vitor Vogas

Deputados estudam revogar prisão de Assumção. Falta combinar com Moraes

No grupo dos parlamentares no Whatsapp e até no gabinete do presidente da Assembleia, procuram-se meios jurídicos para livrar das grades o deputado do PL. Colegas de Assumção evocam artigos da Constituição Federal e da Estadual. Marcelo Santos chegou a reunir juristas em busca de uma saída

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“União da classe”: deputados estaduais comemoram a eleição de Marcelo Santos para a presidência da Assembleia (01/02/2023). Crédito: Lucas S. Costa/Ales

Deputados estaduais do Espírito Santo discutem a possibilidade de revogar a prisão do Capitão Assumção (PL) por decisão do plenário da Assembleia Legislativa. A tese começou a circular e ser levada seriamente em consideração, desde o grupo formado pelos deputados no Whatsapp até o gabinete do presidente da Casa de Leis, Marcelo Santos (Podemos).

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Este, por sinal, abraçou como ninguém a causa de Assumção e tem feito intensas gestões nos bastidores em favor do colega, com o objetivo de ajudar a libertá-lo. Na manhã desta quinta-feira (29), o chefe do Legislativo Estadual chegou a convocar e reunir juristas em busca de um caminho legal para reverter a prisão do deputado de extrema direita.

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O primeiro caminho aventado é o citado no início deste texto, sugerido por deputados mais próximos de Assumção aos demais no “grupo do zap”. Em tese – apenas em tese –, a ordem de prisão decretada pelo ministro Alexandre de Moraes precisaria ser submetida ao plenário da Assembleia, cabendo aos outros 29 deputados confirmá-la ou não.

O ponto de partida é o artigo 53, § 2º, da Constituição Federal de 1988, que preconiza :

Art. 53, § 2º – Desde a expedição do diploma, os membros do Congresso Nacional não poderão ser presos, salvo em flagrante de crime inafiançável. Nesse caso, os autos serão remetidos dentro de vinte e quatro horas à Casa respectiva, para que, pelo voto da maioria de seus membros, resolva sobre a prisão.

Por perfeita simetria, é rigorosamente o que reza a Constituição Estadual de 1989 em relação aos deputados estaduais:

Art. 51, § 2º – Desde a expedição do diploma, o Deputado não poderá ser preso, salvo em flagrante de crime inafiançável, caso em que os autos serão remetidos dentro de vinte e quatro horas à Assembleia Legislativa, que resolverá, pelo voto da maioria de seus membros, sobre a prisão.

Não bastasse isso, deputados evocam entendimento firmado recentemente pelo Supremo Tribunal Federal (STF). Em julgamento de ações diretas de inconstitucionalidade, o Supremo decidiu que todos os direitos, prerrogativas e garantias inerentes aos deputados federais e senadores se estendem aos deputados estaduais (mas não aos vereadores, que estão em outra esfera).

Ora, em tese – sempre em tese –, o disposto nas leis maiores do ordenamento jurídico estadual e federal autorizaria a Assembleia a apreciar e sustar a prisão de Assumção, se a maioria dos deputados assim votasse.

A aplicação da tese, no entanto, esbarra em uma complicação de ordem prática e jurídica. Voltemos ao texto ipsis litteris da Constituição Estadual. Frisemos a parte que determina: “os autos serão remetidos dentro de vinte e quatro horas à Assembleia Legislativa”.

Pois então. Um conceituado jurista ouvido pela coluna afirma que, em princípio, para que o presidente da Assembleia pudesse de fato levar adiante essa ideia, seria preciso que Moraes desse o primeiro e imprescindível passo para assegurar a legalidade do processo: o ministro teria de comunicar oficialmente à Assembleia Legislativa, como instituição de origem do deputado preso em flagrante, não só a ordem de prisão como o teor da decisão, especificando os motivos etc., em prazo de 24 horas.

Não apenas isso ainda não foi feito como é duvidoso que Moraes chegue a tomar essa medida, por um motivo muito simples: o retrospecto do modo de atuação do ministro. Relator no STF dos sigilosos inquéritos das fake news, dos atos antidemocráticos e do 8 de janeiro, Moraes não tem dado ciência aos representantes de nenhuma casa legislativa em casos análogos, quando manda a Polícia Federal prender quem quer que seja no bojo de tais investigações, observa o jurista consultado por esta coluna.

Datado de 20 de fevereiro, o despacho de Moraes que determina a prisão de Assumção não faz nenhuma menção a isso. Consta “expeça-se o mandado de prisão preventiva”, “comunique-se à autoridade policial”, “ciência à Procuradoria-Geral da República”, “cumpra-se”, “publique-se esta decisão somente após o cumprimento do mandado”… Mas não consta “oficie-se a Assembleia Legislativa do Espírito Santo após o cumprimento do mandado”.

Como tem sido regra nos referidos inquéritos, Moraes é o dono da bola e não rola a pelota para ninguém. Se Marcelo quiser levar adiante essa “solução”, será uma medida politicamente ousada, juridicamente questionável e, provavelmente, inócua – sem nenhum efeito legal. A ordem do ministro não será revogada e Assumção seguirá preso apesar da votação na Assembleia.

De todo modo, sempre falando em tese, como é que funcionaria?

Na verdade, de maneira bem singela.

Bastaria ao presidente da Assembleia convocar uma sessão, ler o teor da decisão aos colegas e pautar a votação em plenário. Se a maioria absoluta (16) não votasse pela manutenção da prisão, o deputado estaria solto, por decisão soberana do plenário. O presidente participaria da votação. O resultado poderia ser publicado por meio de decreto no Diário do Poder Legislativo.

> “Escárnio flagrante”, “discursos criminosos” e “subversão da ordem”: o que diz Moraes sobre a conduta de Assumção

O precedente de Durão

Em anos recentes, a Assembleia só teve um caso de deputado preso em flagrante durante o exercício do mandato. Foi Luiz Durão, levado à prisão pela Polícia Civil do Espírito Santo após flagrante em um motel no município da Serra, em janeiro de 2019, por suspeita de estupro de menor de idade. Depois ele acabaria inocentado na Justiça.

Naquela oportunidade, nem Polícia Civil nem ninguém chegou a comunicar oficialmente a Assembleia sobre a prisão, e ficou por isso mesmo. Mas o caso, logicamente, era bem diferente do atual. Até pelo crime de que foi acusado, a prisão de Luiz Durão era um enorme constrangimento para a Casa, e ninguém queria arcar com o ônus político de apoiar a sua soltura imediata.

Agora, uma parte dos colegas gostaria de ver Assumção em liberdade.

As gestões de Marcelo Santos

Marcelo tem atuado em nome de Assumção como se fosse o seu maior advogado, procurador do colega nas searas política e institucional. Tirá-lo de trás das grades virou questão de honra para ele. O primeiro e eloquente sinal disso já tinha sido dado por ele na nota divulgada pela Secretaria de Comunicação da Assembleia em plena madrugada desta quinta-feira (29), saindo veementemente em defesa de Assumção e da preservação das prerrogativas parlamentares do colega, na linha “mexeu com um deputado, mexeu comigo”.

Além de buscar o aconselhamento de juristas, Marcelo tem feito contatos com atores políticos influentes. A coluna apurou que ele cogita abordar a chefe do MPES, Luciana Andrade, autora da primeira representação contra Assumção que culminou com as medidas cautelares determinadas por Moraes contra ele em 10 de dezembro de 2022, e também signatária do pedido de prisão em face do deputado, datado de 17 de janeiro de 2023, por descumprimento flagrante de uma das cautelares impostas por Moraes: a proibição de usar redes sociais.

Os motivos oficiais da prisão

Reiteradamente, nos dias 22 (duas postagens), 23 (três postagens), 24 (duas postagens), 25 (duas postagens), 26 (três postagens) e, ainda, no tenebroso 8 de janeiro de 2023, Assumção publicou vídeos em sua rede social TikTok (@capitaoassumcao22). Também usou a plataforma Kwai, com vídeos republicados por terceiros.

Para ficar em um exemplo, no dia 8 de janeiro de 2023, Assumção publicou um vídeo em que aparecia rindo com deleite dos atos de vandalismo e escancarado golpismo praticados por apoiadores de Jair Bolsonaro na Praça dos Três Poderes, em Brasília. Riso inequívoco de escárnio. Arrematou com o dizer: “Já dizia aquela máxima: Supremo é o povo, não é verdade?! Rsrs”.

No vídeo em questão, “o investigado Lucínio Castelo de Assumção (Capitão Assumção) protagoniza escárnio sobre os recentes ataques antidemocráticos sofridos nas dependências físicas dessa Suprema Corte naquela data”, registrou a chefe do MPES no pedido de prisão formulado nove dias depois, em 17 de janeiro de 2023.

“Ressalte-se que os vídeos aqui apresentados foram, ainda, como de costume, objeto de intensa pulverização no aplicativo Whatsapp, de modo que os odiosos discursos promovidos pelo investigado alcançam grande difusão social”, também anotou Luciana Andrade na petição, deferida por Moraes no dia 20 de fevereiro de 2024 (semana passada), mais de um ano após a apresentação do pedido.

Além da prisão preventiva, o ministro condenou Assumção ao pagamento de multa de R$ 20 mil, “pelo descumprimento da medida cautelar de proibição de participação em redes sociais imposta na decisão de 10/12/2022”.

Errata

No texto original desta publicação, escrevemos que seriam necessários os votos da maioria absoluta dos deputados (no caso concreto, 16) para reformar a decisão judicial, portanto para sustar a prisão decretada pelo ministro do STF. É o contrário, no entanto, de acordo com o procurador-geral da Assembleia Legislativa, Anderson Sant’Ana Pedra.

Segundo ele, serão necessários 16 votos em plenário para se manter a prisão de Assumção decretada pela autoridade judicial. A Procuradoria-Geral da Assembleia, afirma Sant’Ana Pedra, seguiu a doutrina jurídica e os entendimentos aplicados pela Câmara dos Deputados em casos análogos.

Nossa informação inicial foi corrigida no texto acima.


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