Coluna Vitor Vogas
Análise: Agora presidente da Assembleia, Marcelo está mais perto ou mais longe do TCES?
Marcelo refuta pretensão de se lançar à vaga do conselheiro Sérgio Borges. Em tese, se ele quisesse, estaria mais forte que nunca para isso. Governo Casagrande, porém, tem outros planos para a vaga. Saiba quais…

No plenário, Marcelo comemora com colegas sua eleição para a presidência da Assembleia Legislativa (01/02/2023). Foto: Lucas S. Costa/Ales
No fim da tarde da última terça-feira (31), o deputado estadual Marcelo Santos (Podemos) compôs a mesa de autoridades da sessão inaugural do ano de trabalho do Tribunal de Contas do Estado (TCES), no auditório da instituição. Ainda na condição de 1º vice-presidente da Assembleia Legislativa, representou institucionalmente a Casa no lugar de Erick Musso (Republicanos), como fez incontáveis vezes nos últimos seis anos.
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Menos de 24 horas depois, sentou-se ao centro da Mesa Diretora, como novo presidente eleito do Poder Legislativo estadual, cuja sede fica ao lado do TCES.
Ao longo do processo que culminou com a eleição de Marcelo, muito se perguntou sobre a sua antiga e muito conhecida pretensão de chegar ao TCES numa vaga de conselheiro, algo tão proverbial na política capixaba quanto o sonho acalentado por Max Mauro de ver Max Filho sentado à cadeira de governador, ou o desejo nutrido por Ricardo Ferraço de um dia ocupar o mesmo assento.
A aspiração de Marcelo é conhecida porque ele tentou, e como tentou… Ora de maneira mais aberta, ora de maneira disfarçada, o deputado se movimentou inúmeras vezes nos últimos anos, tendo chegado a recolher assinaturas dos colegas, a fim de preencher cadeiras abertas no tribunal com a aposentadoria antecipada de conselheiros. As duas mais recentes foram as de José Pimentel, em 2017, e de Valci Ferreira, em 2019. Jamais vingou.
Agora Marcelo, já chamado aqui de o homem do “quase gol” nos últimos anos, acaba de marcar um golaço. E chega ao comando do Poder Legislativo estadual em um timing para lá de interessante: daqui a onze meses surge a nova vacância no Pleno do TCES, com a aposentadoria compulsória do conselheiro Sérgio Borges. Em 8 de janeiro de 2024, ele completará 75 anos. Quem escolherá o sucessor serão os 30 deputados estaduais, em votação secreta.
A pergunta necessária então é a do título: agora na presidência da Assembleia, Marcelo, 52 anos, fica mais perto ou mais distante do TCES?
Em uma primeira análise – desconsiderando eventuais acordos firmados por Marcelo com o Palácio Anchieta, a participação de Casagrande na chegada do aliado à presidência e a influência que terá o governador na escolha do sucessor de Borges –, poderíamos cravar: a princípio, fica mais perto. É claro que fica mais perto.
Com sua influência sobre os pares e, mais ainda, com o controle da caneta para nomear ou exonerar os mais de 300 comissionados ligados à Mesa e indicados pelos “eleitores”, o presidente da Assembleia, se quiser se lançar a uma vaga de conselheiro, com certeza larga em vantagem sobre qualquer concorrente. Falando em teoria, se Marcelo quiser se articular, terá na certa essa vantagem.
Isso, repito, desconhecendo toda a inegável influência do governador e do governo no recém-concluído processo de eleição da Mesa da Assembleia e no vindouro processo de sucessão de Borges.
Já quando colocamos tais fatores na conta, a resposta passa a ser a oposta: Marcelo sem dúvida alguma, ao chegar à presidência da Assembleia, sobretudo pela forma que chegou, fica muito mais distante do TCES.
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Vamos lá: é impossível ignorar o fato de que Marcelo só chegou aonde chegou por causa do Palácio Anchieta. E nesse caso, de modo muito específico, por causa de Renato Casagrande. O novo presidente da Assembleia só está sentado hoje onde está graças à entrada pessoal e sem precedentes do governador do Estado na campanha em prol do aliado, com direito a declarações públicas de voto nele e tudo mais.
Não é exagero dizer: Marcelo deve sua chegada à presidência pessoalmente a Casagrande. Não tivesse ele metido o pé na porta e dado um tapão no tabuleiro, a maioria das peças do jogo teriam seguido com Vandinho Leite (PSDB). O tucano estava virtualmente eleito.
Dito isso, vamos ao segundo ponto: o governo não quer “ceder” a vaga de Sérgio Borges para Marcelo. Não por ter algo contra o deputado do Podemos – se tivesse, não o teria posto à frente da Assembleia –, mas, basicamente, porque tem outros planos para a vaga: prefere emplacar outro nome no lugar estratégico de Borges.
“Estratégico”, lembremos, porque são os sete conselheiros do TCES, órgão auxiliar da Assembleia, que julgam contas de secretários de Estado e dão pareceres pela aprovação ou rejeição das contas do governador.
Dentro do Palácio Anchieta, o entendimento é que não se pode querer tudo.
Não tivesse Marcelo sido eleito presidente da Assembleia com as duas mãos do governo nas costas, ele até poderia sonhar com a vaga de Borges no TCES… Mas, uma vez na presidência da Casa, está automaticamente eliminado da corrida pela sucessão de Borges. “Política tem fila”, condensa uma fonte com livre trânsito nos corredores palacianos.
O fator Hudson Leal
Na formatação final da chapa única liderada por Marcelo na Assembleia, uma peça fundamental, mudada de posição na reta final do processo, transmite a plena convicção sobre a não intenção do governo em ver o parlamentar do Podemos na vaga de Borges: o ingresso de Hudson Leal (Republicanos) como 1º vice-presidente da Mesa Diretora.
Hudson está longe de ser considerado um aliado leal e constante do governo Casagrande. Aliás, há menos de duas semanas, fez críticas duríssimas ao governador por sua interferência pessoal e desbragada na eleição da Mesa. Se Marcelo virar conselheiro, Hudson assume a presidência interinamente e, em até cinco sessões, deve convocar nova eleição para a presidência.
Em tese, já ocupando o cargo, Hudson fica muito forte para disputar ele mesmo a presidência, até porque terá a caneta para manter ou trocar os comissionados atrelados à Mesa.
Foi em circunstâncias parecidas, por exemplo, que Theodorico Ferraço tornou-se presidente em 2012. O então presidente, Rodrigo Chamoun, foi eleito conselheiro do TCES. Ferraço era vice-presidente da Mesa, assumiu como interino, candidatou-se, venceu e ficou em definitivo no cargo. Ainda seria reeleito duas vezes, permanecendo até janeiro de 2017. Depois que o cara chega lá, é muito difícil tirá-lo.
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Mas o governo Casagrande agora não tem a menor intenção de deixar Hudson chegar à presidência.
E mais: o desenho final da chapa de Marcelo na certa passou pelo crivo do Palácio Anchieta.
Se o governo aceitou a absorção de Hudson na 1ª vice-presidência – uma das concessões feitas no acordo para a retirada da chapa Vandinho/Hudson –, o aval pode ser interpretado como o ingrediente que faltava para sabermos, definitivamente, que o governo não tem a menor intenção de “deixar” Marcelo ir para o TCES.
Nesse sentido, Hudson na 1ª vice-presidência é uma trava para eventual “engraçamento” de Marcelo.
Os nomes do governo para o TCES
O próprio Casagrande rechaça que seu acordo com o decano da Assembleia tenha passado por este tema:
“Não, não tem nenhum acordo com a Assembleia, com Marcelo ou com qualquer parlamentar sobre o Tribunal de Contas. A Assembleia vai discutir o Tribunal de Contas na hora certa e, se quiserem me ouvir, terei condições de ser ouvido com relação a esse tema. Está muito longe ainda”.
Sob anonimato, fonte do Executivo revela o contrário: o acordo de Casagrande com Marcelo para o colocar na Mesa Diretora teria incluído, sim, tal condição: a de não atrapalhar os planos do governo para a cadeira de Borges.
E quais são, então, os planos do governo Casagrande para a cadeira de Borges?
Ora, se Marcelo é indiscutivelmente um aliado do governador, não chega a pertencer ao seu mais estreito de círculo de confiança, de jeito nenhum. É daí, de dentro desse círculo, que vai sair o ungido por Casagrande.
Interlocutores da coluna na Assembleia e no Palácio Anchieta apostam principalmente em três nomes – todos da máxima confiança e do núcleo duro político de Casagrande.
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Os dois primeiros são jovens e pertencem a uma geração mais recente de aliados fortes do governo: o agora deputado estadual Tyago Hoffmann (PSB) e o chefe da Casa Civil, Davi Diniz (ex-Cidadania).
A terceira é uma integrante da velha guarda do PSB e uma das mais antigas e inseparáveis aliadas de Casagrande: a sua chefe de gabinete, Valésia Perozini, conselheira política, responsável por sua agenda e assessora dele desde os primeiros mandatos, nos anos 1990.
Davi e Valésia são discretíssimos. Operam nos bastidores. Davi é o principal emissário e articulador político de Casagrande junto aos deputados estaduais – os eleitores do sucessor de Borges.
Secretário de Governo e de Ciência, Tecnologia, Inovação e Desenvolvimento na administração passada, Tyago tem perfil mais político. Não por acaso se candidatou a deputado estadual, elegeu-se e acaba de assumir o seu primeiro mandato.
Planos alternativos para Tyago
Em princípio, Tyago é um nome muito forte para a vaga. Mas o próprio Casagrande pode ter outros planos para ele.
Desde o governo passado, em conversas reservadas e até em pronunciamentos, Casagrande tem destacado a importância de o seu grupo político produzir novas lideranças no cenário estadual. Ele sabe que não pode se reeleger em 2026 e que não estará aqui para sempre.
Em pleno início de carreira política, Tyago é uma aposta do PSB e de Casagrande. É difícil dar o primeiro passo no supercompetitivo mundo dos mandatos eletivos, e o do ex-secretário já está dado.
Agora que ele ali chegou e que apenas inaugurou uma promissora trajetória na política, não faria muito sentido cancelar o plano de voo para embicar seu avião para o TCES e passar mais de 30 anos com a toga de conselheiro (terá 44 em janeiro de 2024). Sob essa perspectiva da necessidade de renovação dos quadros do governo e do partido, seria um desperdício de potencial (e do esforço para fazê-lo deputado no pleito de 2022).
Muitos colegas de Tyago asseveram que ele está pessoalmente animadíssimo em começar a construir uma sólida carreira pública como detentor de mandatos.
Há até quem diga que estaria nos planos do governo lançá-lo a prefeito de Vitória já na eleição de 2024.
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Aliados entre si e do governo Casagrande na Assembleia, Tyago Hoffmann, Marcelo Santos e João Coser se cumprimentam e se abraçam após eleição da Mesa (01/02/2023). Foto: Ana Salles/Ales
Há controvérsias, pois seria uma colisão frontal com um aliado de extrema importância para o governo Casagrande: até as pedras da ladeira Graciano Neves, onde fica a sede do PT-ES, sabem que a prioridade do partido no Estado é a tentativa de retorno de João Coser à Prefeitura de Vitória no próximo ano.
Enfim, Marcelo Santos e o TCES: tão perto no tempo e no espaço… mas agora tão longe para ele.
O que diz o próprio
O próprio Marcelo Santos refuta qualquer intenção de pleitear a vaga de Sérgio Borges (ou qualquer outra a ser aberta no TCES). Em entrevista ao telejornal EStúdio 360 Segunda Edição na última quinta-feira (2), foi taxativo:
“Não está nos meus planos Tribunal de Contas. Eu abri mão para o governador Renato Casagrande quando eu tinha um número maior de assinaturas, véspera da eleição para ocupar esse cargo no Tribunal de Contas [o de Valci Ferreira, em fevereiro de 2019], demonstrando para ele um gesto, porque era muito importante para ele indicar a vaga que era da Assembleia. E além disso convenci os meus colegas a apoiarem para a vaga o conselheiro que ele indicou, [Luiz Carlos] Ciciliotti, um grande amigo e um grande técnico que está lá naquela Corte. Não tenho mais essa intenção. Já anunciei isso à imprensa, aos meus colegas, aos meus parceiros.”
Marcelo reafirmou o que declarou em primeira mão à coluna em novembro passado:
“Fizemos um planejamento estratégico. Meu caminho, depois de concluir os quatro anos deste mandato iniciado ontem, é Brasília. É ser candidato a deputado federal [em 2026].”
Na véspera, em coletiva de imprensa logo após sua eleição na Assembleia, o novo presidente já afirmara que o TCES está fora dos seus planos. “Nem a vaga de Sérgio Borges nem a de outro conselheiro no futuro?”, perguntei-lhe. Ele deu uma risada e uma resposta engraçada:
“Nem a de Sérgio, nem a de Antônio, nem a de José…”
E saiu caminhando, aos risos, dando por encerrada a entrevista.
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