Coluna Vitor Vogas
A falta e o asfalto: a mais que presente ausência de Pazolini no debate da Band
Embora ele tenha faltado sem explicações ao primeiro debate entre os candidatos a prefeito de Vitória, presença de Pazolini pareceu mais concreta que o concreto do “Asfalto Vix”
Um “histrião”; um “fujão”, um “covarde”, um “omisso” e um “menino”; um “ser desumano”, um “coração de concreto” e um “coração de asfalto”; um “incompetente”, autor de “legislações bárbaras” e “ladrão de aposentadorias”.
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A escalação acima contém só alguns dos adjetivos, nem um pouco abonadores, dirigidos pelos cinco adversários eleitorais de Lorenzo Pazolini (Republicanos), presentes ao debate da TV Capixaba/Band ontem à noite, ao atual prefeito, ausente do debate. Quer dizer, “ausente” em termos. Ausente só fisicamente.
Poucas vezes se viu um candidato faltoso a um debate importante se fazer ao mesmo tempo tão presente, indiretamente, na lembrança e nas menções de todos os seus oponentes, ora criticando seu governo e sua forma de governar Vitória, ora sublinhando ainda mais o próprio fato de ele ter se eximido de enfrentá-los num debate cara a cara.
A ausência de Pazolini foi palpável; pesou mais que o concreto do “Asfalto Vix” no ar do estúdio montado no auditório da Fecomércio. Camila Valadão (PSol), Capitão Assumção (PL), João Coser (PT), Luiz Paulo Vellozo Lucas (PSDB) e até Du (Avante) não perdoaram a falta – aliás, não justificada – do atual mandatário, que apanhou, literalmente, de todos os lados: da esquerda socialista de Camila Valadão (PSol) à direita bolsonarista do Capitão Assumção (PL). Apanhou sem poder (nem fazer questão de) se defender. E, assim, aquela saraivada de críticas a torto e a direito ficaram sem revide, num debate que acabou se constituindo em um “todos contra o homem que não estava lá”.
Não parece exagero dizer que, sem subir ao palco – aliás, sem chegar perto do teatro –, Pazolini foi o protagonista da noite, posto que antagonista em comum dos cinco adversários que fizeram questão de comparecer. Se não protagonizou o embate sem sair de casa, no mínimo concentrou as atenções, desde a fala inicial da jornalista e colega Andressa Missio, mediadora do debate:
“O candidato Lorenzo Pazolini também foi convidado para estar aqui hoje, mas não compareceu e nem justificou a ausência”.
A partir daí, o eloquente vazio da cadeira de Pazolini – reservada para o prefeito e emblematicamente mantida no estúdio – foi preenchido pelas incontáveis menções a ele por parte dos adversários, desde o minuto um, notadamente por Camila, Coser e Assumção.
Primeiro a falar, o capitão não se fez de rogado, imprimindo, desde a primeira intervenção, a estratégia que marcaria sua participação no debate. De cara, afirmou que Pazolini estava se escondendo. Aliás, chamou tanto o prefeito de “fujão” que, lá para a metade do debate, Coser arrancou risadas dos outros participantes e da pequena plateia no auditório com um pequeno gracejo: “Minha pergunta seria para o ausente, o ‘fujão do Assumção’, mas, como ele não veio, vou perguntar para outro candidato…”
Em dada altura do certame, quiçá cansado do “fujão”, Assumção resolveu ser mais criativo: trocou-o por “histrião”. Um histrião é um bufão, é como eram chamados os comediantes na Roma Antiga. Bem, na arena da Band, felizmente, as armas foram só verbais. Cadeiras ficaram intactas. Mas os leões foram soltos em cima de Pazolini:
“Não fez nada em relação a isso, o fujão! Não fez nada até agora, é por isso que ele está fugindo! Não fez porque tem má vontade perversa, negativa…”, afirmou Assumção, por exemplo, em resposta a uma pergunta de Du sobre o aumento da poluição atmosférica na cidade. “Apregoa em suas redes sociais que a saúde de Vitória é a melhor do Brasil. Não sabe administrar! Aquele menino tá passando tempo na Prefeitura de Vitória”, detonou em outro ponto, ao responder também a Du.
Quando Assumção fala de histrionismo, a ironia maior está no fato de que, ocasionalmente, é o próprio deputado quem apela para o histrionismo como forma de chamar a atenção em seus pronunciamentos na Assembleia.
Luiz Paulo, Coser e Camila: tabelas entre si
Luiz Paulo, Coser e Camila nitidamente foram para o debate com a mesma estratégia de se priorizem no direcionamento das perguntas. Os três acabaram fazendo algumas tabelas entre si, passando a bola um para o outro para cada um ter chance de expor suas ideias sobre determinado tema. Em todos esses momentos, o clima foi de diálogo amistoso. Não houve um único questionamento incisivo entre os três, muito menos críticas e cobranças entre si. As críticas, em comum, eram canalizadas para Pazolini.
Como não foi escolhido em nenhum momento para responder a perguntas de Coser, Camila ou Luiz Paulo, Assumção acabou interagindo mais com Du, e os dois também tabelaram para bater em Pazolini.
Em dado momento, mais para o fim do debate, ficou parecendo até que Du e Camila estavam tabelando para criticar Pazolini – ou ao menos concordando nas críticas, apesar de não terem nada a ver um com o outro –, para vocês verem a que ponto chegamos.
Algumas dessas dobradinhas foram mais explícitas, outras menos. Ao dirigir a Camila uma questão sobre a reforma da Previdência de Pazolini, Coser lhe pediu: “Comente um pouco sobre isso”. Não foi nem sequer uma pergunta, mas uma clássica “levantada de bola” para a outra chegar cortando. Ele só estava introduzindo o tema sobre o qual os dois concordavam previamente em concordar.
Em outro momento, foi para Luiz Paulo que Coser ergueu a bola, em aberta cumplicidade, unindo-se no mesmo pronome: “Nós tivemos experiência e oportunidade[de governar Vitória]…”. E o bate-bola foi este: “Vou falar o que eu fiz, depois você fala o que fez, e as pessoas em casa comparam com o que o atual prefeito fez, além de asfalto e pracinha”.
Aliás, não passou despercebido o tratamento bem informal dispensado entre os dois aliados do governador Renato Casagrande (PSB). Luiz Paulo, por exemplo, chamou Coser de João.
Na verdade, o clima geral entre os presentes foi bastante amigável. O único momento de franca discordância em todo o debate foi quando Camila – citando inclusive um filho pequeno, que frequenta uma creche em Vitória – disse divergir da ideia originalíssima de Du de implantar aulas de empreendedorismo, turismo e gastronomia na educação infantil da rede municipal, para crianças de três a seis anos de idade.
Camila chama Pazolini de “covarde”
Ainda no primeiro bloco, em sua primeiríssima participação, Camila chamou Pazolini de “covarde” por faltar ao debate. Usou como mote um episódio associado a violência política de gênero por parte do prefeito, em novembro de 2022:
“O atual prefeito e candidato à reeleição é muito corajoso para tirar microfone da mão da vice-prefeita, de uma mulher negra, mas muito covarde ao faltar a um espaço de debate como este, tão fundamental para a população capixaba”.
Essa foi a primeira alusão de Camila, mais implícita, ao dia em que Pazolini literalmente tirou um microfone da mão de sua vice-prefeita, Capitã Estéfane (Podemos), impedindo-a de discursar. A segunda foi explícita, numa pergunta dela a Luiz Paulo especificamente sobre o tema, no terceiro bloco.
No primeiro, ela e Luiz Paulo também bateram bola sobre o tema da segurança, e a psolista não poupou Pazolini:
Na eleição passada foi prometido pelo prefeito delegado paz e igualdade. E o que nós vimos na cidade de Vitória, infelizmente, foi o contrário da paz. Nós ampliamos os conflitos, principalmente nos territórios mais vulneráveis da nossa cidade. […] Falta planejamento., diálogo, monitoramento, análise, participação popular e articulação institucional. A atual gestão de Vitória isolou a nossa cidade do ponto de vista político”.
Ainda no primeiro bloco, a candidata do PSol chamou de “covardia” também a reforma previdenciária de Pazolini, falando em “legislações bárbaras”, “desumanidade” e “roubo que foi feito no salário de aposentados e aposentadas”. Luiz Paulo definiu-a como uma lambança.
Tabelando com Coser também a respeito da insegurança alimentar, a deputada condenou o atual prefeito pela não abertura do Restaurante Popular de Vitória, na Ilha de Santa Maria: “Uma coisa é o marketing do prefeito, outra coisa é a realidade. […] É tanta incompetência que não conseguiu sequer reabrir esse equipamento público tão fundamental no momento da pandemia, em que várias famílias estavam em insegurança alimentar”.
Coser: “Se faltar comida, come asfalto”
Mas quem viu o debate percebeu que ele teve dois grandes motes. O primeiro foi o já citado “fujão” de Assumção. O segundo foi a crítica de Coser a Pazolini, feita reiteradamente pelo petista, por conta do asfaltamento da malha viária de Vitória às vésperas do período de campanha, com fins, segundo ele, evidentemente eleitoreiros. De tão repetidos, os dois motes foram os bordões do debate.
Coser por vezes foi duro como o concreto do asfalto (ou a cabeça e o coração de Pazolini, segundo ele); por vezes, foi até engraçado no grau de sarcasmo.
Começou fazendo uma conta, ao responder sobre a população em situação de rua: com R$ 20 milhões do total de R$ 220 milhões gastos com o chamado “Asfalto Vix”, de acordo com o petista, colocaria essas pessoas numa casa de aluguel e construiria moradias para elas. “Quem faz asfalto não tem inteligência, não tem sabedoria. Concreto nem é obra”, prosseguiu.
Em seguida, em tabela com Camila Valadão sobre insegurança alimentar, o deputado e ex-prefeito voltou à carga: “Vi um prefeito falando que acabou com a pobreza em Vitória. Deve viver em outra cidade, talvez na Suíça, porque não sobe os morros. […] O prefeito não conseguiu reformar o Restaurante Popular, o que é uma vergonha. […] Ele não consegue entregar porque ele não quer matar a fome. Não é só incompetência, é um trabalho mesmo para chegar ao final do mandato sem dar uma marmita a ninguém. Má vontade, coração duro mesmo. […] Esse é o tema principal de qualquer cidadão que tenha coração. […] E a prefeitura, com tanto dinheiro, gastando tudo em asfalto, que não alimenta e não dá saúde”.
Coser inventou até o “coração de asfalto”: “É um ser desumano. É um ser que tem coração de concreto, coração de asfalto. É duro, insensível e desumano”. Disse que o republicano tem a cabeça ainda mais dura que o coração: “Quem faz asfalto não pensa. […] Asfalto nem é obra. […] Cabeça dura”. E chegou a provocar risos no auditório, o que nem é muito do seu perfil: “Alguém come asfalto? Alguém estuda com asfalto? Todo mundo tem 30 quilos de asfalto em casa. Se faltar qualquer coisa, come asfalto”.
Duras também foram as palavras do petista sobre o atual prefeito. Ele prometeu rever toda a legislação de Pazolini referente à Previdência Municipal, “feita com bases mentirosas”. Afirmou que Vitória está “perdida” com um prefeito como Pazolini e que é urgente “trocar a liderança”: “Nós não temos líder. […] Humilhou a vice. Não dialoga com ninguém, nem com o setor empresarial. Com esse nós não vamos a lugar algum. A cidade está paralisada. Nós estamos literalmente ilhados. A primeira coisa é mudar o líder”.
Citando a obra “Cidade Partida”, do jornalista Zuenir Ventura, Coser afirmou ainda que, contrariamente ao próprio discurso de “Paz e União”, “a atuação do prefeito atual dividiu mais Vitória”: “Temos uma cidade partida”.
O livro de Zuenir é sobre o Rio de Janeiro e foi citado aqui dia desses, numa análise sobre as narrativas opostas de Coser e Pazolini no horário eleitoral.
BASTIDORES
O merchan do Du
Du (ele mesmo: o da Kawasaki) usou o debate da Rede Capixaba para fazer o melhor merchandising da sua vida. Vestiu uma camiseta branca com o nome da marca japonesa de motocicletas representada por ele no Espírito Santo e a frase: “Let the good times roll”.
Contato físico… mas sem agressão
Durante o debate, pelo menos duas vezes, houve contato físico entre dois candidatos. Mas calma: felizmente, não chegamos nem perto de testemunhar uma agressão no estilo Datena x Marçal. É que os púlpitos do candidato que perguntava e do que respondia ficavam muito próximos. Eles, esticando o braço, conseguiam mesmo se tocar. E isso ocorreu duas vezes, de maneira intencional, mas amigavelmente.
Respondendo a uma questão de Du sobre o pó preto emitido por grandes empresas poluidoras, Assumção deu um tapinha cúmplice no braço do empresário: “Dizem até, candidato Du, que ele [Pazolini] tem um padrinho lá dentro”.
Por sua vez, Coser apontou para Luiz Paulo e encostou o dedo nele, também amistosamente, ao dizer que completou a construção de escolas inciadas no governo do antecessor.
A tornozeleira de Assumção
Assumção passou o debate inteiro com a tornozeleira eletrônica à mostra, na perna esquerda, por cima da bainha da calça. Mas o dispositivo ficou meio “camuflado” porque é preto, mesma cor da calça que ele vestiu.
Luiz Paulo: “Sou a novidade”
Pouco antes do começo do debate, a equipe técnica pediu aos candidatos, já sentados, para passarem o som dos respectivos microfones. Na vez de Luiz Paulo, ele não resistiu à autoironia: “Sou Luiz Paulo, a novidade nesta eleição”.
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