Personagens
Capixaba viraliza vendendo café no sinal após perder tudo
Após 40 dias vendendo café na confiança, Sanderley reconstrói a vida com apoio da sogra, fé e solidariedade dos capixabas

Sanderley Vargas, de 29 anos, vende café na confiança no semáforo da Avenida Carlos Lindenberg, em Vila Velha. Foto: Arquivo Pessoal
Todas as manhãs, antes do sol nascer, Sanderley Vargas, de 29 anos, prepara o que chama de seu “propósito”: levar café quente a quem passa pelo semáforo da Avenida Carlos Lindenberg, em Vila Velha. Ele não cobra, apenas confia. Deixa um papel com a chave do PIX e segue oferecendo o copo e um bom dia.
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Por trás do gesto simples, há uma história de dor, perda e recomeço. Há pouco mais de um ano, ele fechou a loja e quase a própria vida ao tentar atravessar a fronteira do México para os Estados Unidos. Morou nas ruas do México, passou fome, ao retornar falido para o Brasil, encontrou abrigo na casa da sogra e fé no que parecia restar: um café bem preparado.
Viralizou nas redes
Há três dias, Sanderley viralizou nas redes sociais ao mostrar sua rotina no semáforo. O vídeo em que compartilha seu “Propósito dos 30 Dias” ultrapassou milhares de visualizações e rendeu mais de 16,7 mil seguidores ao perfil no Instagram.
A proposta chamou atenção pelo formato: o cliente toma o café e paga se quiser. “Comecei com uma garrafa, deu certo. Aumentei para duas, depois três. Hoje, 40 dias depois, levo três de manhã e duas à tarde”, contou.
Durante 30 dias, ele guardou todo o dinheiro arrecadado dentro de garrafas térmicas, sem gastar nada. “Fiz isso direto. Sem tocar. E vi que a confiança gerou resultado.”
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De comerciante assaltado a morador de rua
Antes de chegar ao semáforo, ele tinha uma loja em Vila Velha, na Avenida Jerônimo Monteiro. Depois de ser assaltado, vendeu tudo e decidiu tentar a sorte no exterior. A jornada, porém, o levou a uma realidade que não esperava.
“No México, fui sequestrado duas vezes. Virei morador de rua. Vi crianças sendo abusadas na beira da estrada, vi policiais prestando continência para a máfia. Eu achei que só existia em filme, mas é pior do que filme”, relatou.
Sem dinheiro, apoio ou documentos, foi resgatado pela igreja e pelo consulado brasileiro. Voltou ao Espírito Santo “derrotado, destruído e falido”, como ele mesmo descreve. Foi acolhido pela sogra, Joelma, no bairro Zumbi dos Palmares, onde mora até hoje.

Antes de recomeçar no Espírito Santo, Sanderley Vargas passou por países da América Central em tentativa de chegar aos Estados Unidos. Foto: Arquivo Pessoal
Café, afeto e confiança
A renda inicial veio com entregas por aplicativo, usando uma moto alugada por R$ 370 por semana. Mas foi com o café que a vida começou a mudar. “O valor é dois reais, mas morador de rua não paga. Servidor público também não. Quem quiser, paga o que puder.”
O valor sugerido é de R$ 2 por copo, mas moradores de rua e servidores públicos não pagam. Ainda assim, ele afirma que não teve prejuízo. Alguns pagamentos surpreendem, como os PIX de R$ 50 que recebeu por apenas um café. A intenção, garante Sanderley, nunca foi lucrar com isso — mas entregar algo de valor para o dia das pessoas.
Mesmo sem cobrança obrigatória, ele garante: não teve prejuízo. E mais, viu na rotina do semáforo uma forma de reconstruir sua dignidade e sua fé na solidariedade. “O povo capixaba me honrou naquele semáforo e me gerou uma luz no fim do túnel.”
Um passo de cada vez
A repercussão do projeto chamou atenção de empresas do setor de café. Três delas já procuraram Sanderley para possíveis parcerias. Ele, no entanto, prefere ir com calma e aguardar a direção que Deus mostrar para ele.
Entre os planos, está o de criar um projeto social para oferecer café da manhã gratuito a pessoas em situação de rua de Vila Velha. “É o mínimo que posso fazer depois de tudo que recebi.”
Após tudo que viveu, ele diz que não se orgulha da tentativa de deixar o país, mas valoriza o aprendizado. “Descobri que a minha nação é extraordinária. Se não fosse por Deus, pela minha sogra e pela confiança das pessoas, eu não estaria aqui.”
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