Dia a dia
ITA descumpriu compromissos com o governo e vai receber multa milionária
Companhia aérea do grupo Itapemirim vinha recebendo alertas da Secretaria Nacional do Consumidor pelo mau atendimento

Clientes que compraram passagens da ITA para voar na última sexta, 17, e sábado, 18, esperaram em Guarulhos por solução. Foto: Redes Sociais/Reprodução
Com as operações paralisadas desde a última sexta-feira, 17, a companhia aérea ITA, do grupo Itapemirim, já vinha recebendo alertas da Secretaria Nacional do Consumidor (Senacon), ligada ao Ministério da Justiça e Segurança Pública (MJSP), pelo mau atendimento aos seus clientes nos últimos meses. Apesar de fazer compromissos ao órgão de que aperfeiçoaria seus procedimentos, a empresa passou ao largo de corrigir os problemas.
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O desfecho do caso, que frustrou planos de milhares de passageiros, exigiu uma mudança de postura da Senacon, agora focada num processo administrativo que pode culminar em multas milionárias para a ITA.
Em entrevista à reportagem, a secretária nacional do consumidor, Juliana Domingues, relatou que o órgão já havia feito três reuniões com representantes da empresa durante os meses de operação da companhia. O roteiro, segundo ela, era sempre o mesmo: a ITA se comprometia a melhorar o atendimento aos consumidores, mas os compromissos assumidos não eram cumpridos. Segundo o órgão, as maiores reclamações dos clientes em relação à ITA eram relacionadas a cancelamento de voos, dificuldade e atraso na devolução de valores pagos, além de cancelamento indevido de passagens.
“Nós tínhamos perspectiva de boa-fé da empresa em se adequar melhor a esse mercado”, afirmou a secretária sobre o acompanhamento feito pela secretaria. Os contatos com a ITA, no entanto, não bastaram. A paralisação das atividades da empresa na última sexta impactou cerca de 46 mil passageiros. “Fomos pegos absolutamente de surpresa com a paralisação e não disponibilização de apoio (ao consumidor)”, disse Domingues. Segundo ela, a Senacon já tinha inclusive uma reunião agendada com representantes da companhia para a primeira quinzena de janeiro de 2022.
A secretária afirmou que houve “clara” violação da empresa ao Código de Defesa do Consumidor, uma vez que a ITA não teria disponibilizado canais de comunicação adequados aos seus clientes na crise. “A empresa já está sendo processada oficialmente pela Senacon. No momento que a empresa tinha que ampliar os canais de comunicação, ela deixou um e-mail. A companhia colocou os consumidores numa situação de hipervulnerabilidade”, disse.
Nesta terça-feira, 21, a Senacon cobrou esclarecimentos da Itapemirim e abriu um novo processo administrativo. A companhia teria de explicar até a meia noite de ontem o ocorrido na semana passada. Além disso, o órgão determinou a apresentação de um plano de atendimento aos consumidores afetados pelo fim de sua operação.
Ao final do processo, o órgão poderá aplicar uma multa que pode totalizar R$ 11 milhões à Itapemirim. O valor não é convertido para os consumidores lesados, mas direcionado ao Fundo de Defesa dos Direitos Difusos (FDD). A multa não exclui eventuais reparações individuais, que podem ser buscadas por outros consumidores em Procons e no Judiciário, além de eventuais sanções a serem aplicadas pela Anac.
ITA sempre teve índices de resolução de conflitos abaixo dos concorrentes
De acordo com dados da Senacon, o índice de resolução de conflitos entre a ITA e os consumidores sempre esteve abaixo das outras companhias aéreas, desde julho, quando a empresa se cadastrou na plataforma de resolução de litígios com passageiros. Isso, segundo a secretária Juliana Domingues, sempre preocupou o órgão.
A Senacon identificou que o índice de reclamações solucionadas da Itapemirim atingiu 59,17%, abaixo da Azul, que soluciona 92% das reclamações, 79% da Gol e 75% da Latam.
Além disso, o índice de satisfação dos clientes para com a companhia também era o mais baixo: medido de 1 (nota mais baixa) a 5 (mais alta), a Itapemirim era classificada como nota 2, frente a 4,3 da Azul, 3,3 da Gol e 2,9 da Latam.
“Desde o início da operação, os índices não eram satisfatórios, já que as concorrentes sempre estiveram na média dos 80%. Estávamos preocupados”, contou Juliana Domingues, ao informar que, devido aos baixos índices, a Senacon já havia instaurado um processo administrativo contra a empresa.
Segundo o órgão, as maiores reclamações dos clientes em relação à ITA, neste período, estavam relacionadas a cancelamento de voos, dificuldade e atraso na devolução de valores pagos, além de cancelamento indevido de passagens. “Houve um descaso muito grande com os consumidores”, considerou Juliana Domingues.
A secretária avalia que o ocorrido com a Itapemirim não é, necessariamente, um sinal de que não será possível que uma quarta companhia aérea ingresse no mercado brasileiro no curto, médio ou longo prazo.
Segundo ela, isso será facilitado quando o governo finalizar a implantação de mudanças regulatórias no setor. Do ponto de vista concorrencial, Domingues avalia que o mercado é marcado por barreiras à entrada e, atualmente, enfrenta problemas econômicos decorrentes da pandemia da covid-19 somados à alta do dólar.
Por outro lado, a secretária reconhece que a falta de concorrência, por vezes, ocasiona em serviço ruim prestado ao consumidor, como no caso da ITA. “Mercados mais competitivos têm menos problemas. E já que apenas três empresas operam no Brasil, isso traz uma série de externalidades negativas para o consumidor.”
