Dia a dia
Famílias relatam ameaças e coação em desocupação de Jabaeté
Mais de 800 famílias foram removidas após decisão judicial; relatos incluem venda irregular de lotes e intimidações

Área de Jabaeté, em Vila Velha, após desocupação judicial. Foto: Patrícia Battestin
Muitas famílias retiradas das áreas Vila Esperança e Vale Conquista, em Jabaeté, Vila Velha, afirmam ter sofrido ameaças, coação e até pressões para construir rapidamente suas casas. A secretária de Assistência Social, Letícia Goldner, relatou que muitas famílias foram enganadas por pessoas que se apresentavam como responsáveis pela área.
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“Muita ameaça, muita coação, muita venda de terrenos. Nós atendemos uma pessoa que pagou R$ 20 mil em agosto, com documento em mãos. Quando chegavam relatos de quem tinha ‘ganhado’ o espaço, vinha junto a condição de construir em dois ou três dias para permanecer”, disse.
Segundo a secretária, alguns moradores chegaram a se esconder para retirar seus pertences. “Tivemos pessoas que diziam: ‘estou aqui escondida, porque se souberem que eu estou aqui, não vou poder voltar para pegar minhas coisas’.”
Histórico da disputa judicial
A ocupação na área começou em 2016, em um terreno alagadiço conhecido como Vila da Esperança. Uma primeira reintegração foi realizada em 2017, mas parte das famílias migrou dentro da própria fazenda, o que levou os proprietários a mover uma nova ação em 2019.
A decisão final, proferida pelo Tribunal de Justiça do Espírito Santo (TJES) em agosto de 2025, determinou a reintegração de posse. “Todas as audiências de conciliação deixaram claro que a posse da terra não tinha dúvida. A desembargadora pedia às lideranças que avisassem às famílias que a reintegração iria acontecer, mas parte delas preferiu sustentar a promessa de um ‘milagre’ que impediria a saída”, contou Goldner.
Ela reforçou que a área é de propriedade particular e que a Prefeitura nunca teve ingerência direta no processo. “Desde 2022, fomos convidados pela Justiça apenas a colaborar, não tínhamos autorização para integrar o processo como parte.”
Atuação da Prefeitura e critérios de apoio
Com a confirmação da desocupação, a Prefeitura montou um ponto de atendimento em Jabaeté, que já recebeu 380 famílias até esta terça-feira (9). De acordo com Goldner, em 2022 foi realizado um levantamento socioeconômico, que identificou 690 famílias na área. “A partir desse cadastro, cruzamos dados com o CadÚnico e outras bases. Encontramos 135 famílias em maior vulnerabilidade, que realmente precisavam de apoio financeiro para recomeçar.”
O auxílio previsto inicialmente era de R$ 2.222, valor definido a partir de acordo com a empresa dona do terreno. No entanto, a Prefeitura enviou à Câmara uma proposta de ampliação: até R$ 3.622, pagos em duas parcelas, para até 493 famílias. “Esse recurso é para reorganizar a vida em outro espaço, onde haja água, luz e saneamento, o que não existia na ocupação”, explicou a secretária.
Benefícios e serviços emergenciais
Além do recurso financeiro, a empresa proprietária se comprometeu a disponibilizar veículos para transporte de móveis e espaço de armazenagem por até 21 dias. Do total de famílias atendidas até agora, 204 disseram ter para onde ir provisoriamente.
O atendimento inclui ainda apoio psicossocial, encaminhamentos escolares para crianças e adolescentes, além do recolhimento de animais em situação de abandono. A ação conta com a participação de diversas secretarias municipais.
Perspectiva habitacional
A secretária destacou que o município tem investido em políticas de moradia. As famílias em maior vulnerabilidade foram inseridas no Sistema Habitacional de Interesse Social e poderão ser contempladas pelo Minha Casa Minha Vida. Estão em construção 272 unidades em Jabaeté e Vale Encantado, em terrenos doados pela Prefeitura.
“O direito à moradia é legítimo, mas muitas famílias foram ludibriadas. Nosso papel agora é oferecer escuta qualificada, encaminhamento e condições para que possam se reorganizar em locais adequados”, afirmou Goldner.
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