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Coluna André Andrès

VinES, a nova marca dos vinhos finos do Espírito Santo

Projeto pretende estimular produção de vinhos de qualidade. VinES também deseja promover o enoturismo, principalmente nas serras capixabas

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Carrereth Sauvignon Blanc, vinho da Cave Rara e Tabocas Orange Alvarinho. Foto: Divulgação

Carrereth Sauvignon Blanc, vinho da Cave Rara e Tabocas Orange Alvarinho. Foto: Divulgação

Quem visita o clássico “A Dança”, de 1910, no Hermitage, em São Petesburgo, possivelmente desconhece o fato de Henri Matisse ter revisitado a obra cerca de 40 anos depois em condições bem pouco favoráveis. Desde o início dos anos 1940, uma doença limitadora de movimentos fez o francês trocar o pincel pela tesoura e o papel. O artista mudou sua produção, buscou soluções, encontrou saídas. Corria a década de 1950 quando Matisse retomou o tema e produziu “La Danse – La Chevelure” (A Dança – Os Cabelos), obra encantadora. Assim é a arte, assim é a vida: impõe a necessidade de adaptações para seguirmos em frente. Pois esse caminho de adaptações vem sendo trilhado por outros tipos de artista, aqueles dedicados a elaborar vinhos finos no Espírito Santo. Como as terras capixabas estão distantes dos padrões de referência da produção vinícola, os desbravadores capixabas estão buscando soluções para concretizar suas ideias. E, agora, um ambicioso projeto, denominado VinES, promete ajudá-los.

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A Dança, de Matisse. Reprodução

A obra “A Dança”, produzida por Matisse em 1910 e em exposição no Hermitage. Foto: Reprodução

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Ambição bem dosada não faz mal a ninguém. No caso do projeto encabeçado pelo Sebrae e Senac, com apoio de Senar, Embrapa e Secretaria da Agricultura, a ambição começa pelo nome. A pronúncia correta de VinES é “Váines”, numa referência a palavras em inglês relacionadas ao vinho, como “wine”. A sigla também brinca com “Vin”, vinho em francês, e, logicamente, remete ao estado com o “ES”. Abaixo desse rótulo está uma série de adaptações dos produtores para conseguir entregar um vinho de qualidade. E acredite: eles estão conseguindo. Há tintos e brancos produzidos no Espírito Santo capazes de espantar quem entende do assunto. Ao servir uma taça para quem está provando pela primeira vez, a pergunta surge quase automaticamente: “Esse vinho é daqui?” É… pois é…

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Quem já faz parte da VinES

O projeto conta, inicialmente, com a produção das vinícolas Tabocas (de Santa Teresa), Carrereth (da Pedra Azul) e Cave Rara (Da Quinta dos Manacás, em Venda Nova do Imigrante). Em comum, elas adotaram as mudanças necessárias para cultivar Cabernet Sauvignon, Merlot, Syrah e até Alvarinho nas serras capixabas. Isso é bem complexo porque o clima e o solo do Espírito Santo estão bem distantes daqueles encontrados nas regiões do Douro, de Rioja, de Mendoza ou Bento Gonçalves, para citar um exemplo mais próximo. Por isso a solução foi adotar técnicas como a dupla poda das videiras e a colheita no inverno (nas regiões mais tradicionais, ocorre no verão).

Os resultados têm sido surpreendentes. O Sauvignon Blanc assinado por Rodolpho Carrereth está em um patamar comparável ao de vinhos brancos feitos com essa uva em vales de produção nobre no Chile. O Alvarinho de Vinicius Corbellini tem alcançado grande número de fãs, e assim sucessivamente. Há várias questões a serem resolvidas. A principal delas talvez seja o volume de produção. Na noite de lançamento da VinES, no dia 30, no Hotel Senac, a Cave Rara apresentou seu Sauvignon Blanc. O vinho provocou curiosidade. E logo alguém perguntou sobre quantas garrafas haviam sido produzidas. “Exatas 106 garrafas”, respondeu Gustavo Vervloet, responsável pela vinícola.

A Dança, - Os Cabelos, obra de Matisse.

“A Dança – Os Cabelos”, obra de Henri Matisse produzida no início da década de 1950. Foto: Reprodução

Muito além do Espírito Santo

Existem questões técnicas e existem também aspectos estratégicos relacionados ao projeto. Se todos os objetivos forem alcançados, dentro de mais algum tempo teremos mais produtores de uvas finas, a ampliação do número de vinícolas, o surgimento de polos de enoturismo no estado. Sonho? Nem tanto. Até poucos anos, falar na produção de vinhos finos no Brasil era falar única e exclusivamente em Bento Gonçalves. Ao longo do tempo, Santa Catarina conseguiu seu lugar. Depois, veio o Vale do São Francisco. E mais recentemente tivemos o surgimento de excelentes produtores na Mantiqueira (tanto em Minas quanto em São Paulo), no interior de Goiás, na Bahia. A lista é longa.

Junto com o surgimento desses produtores, vêm os apaixonados por vinho, os apreciadores da boa gastronomia, os interessados em aprender mais sobre o tema ou simplesmente quem gosta de visitar lugares bonitos e agradáveis. Foi assim com Mucugê, no coração da Chapada Diamantina. Nesse cenário improvável, surgiu a UVVA, vinícola ganhadora de prêmios e ponto central do polo enoturístico no qual se transformou a região. Se isso foi possível em Mucugê, a 470 quilômetros de Salvador, é bastante possível imaginar a repetição desse sucesso em regiões de acesso muito mais fácil, como ocorre com Santa Teresa e a Pedra Azul.

O primeiro da VinES

Como se vê, a ambição do projeto vai muito além da pronúncia do nome. VinES pretende ser a base de uma ampliação dos horizontes e dos negócios proporcionados pelos vinhos finos no Espírito Santo. Não é tarefa simples, mas, atenção, um passo fundamental dessa caminhada já foi dado: a qualidade alcançada pelos tintos e brancos a partir das adaptações colocadas em prática no estado é um início bastante promissor. São vinhos prontos, acabados? Não, de maneira alguma. Têm muito a evoluir, mas isso é absolutamente natural. Antes de criar novas versões de “A Dança”, Henri Matisse teve de aprimorar sua nova técnica ao longo de um bom tempo. Valeu a pena: a beleza de sua obra em tesoura e papel, de 1952, é tão incontestável quanto a grandiosidade da tela de 1910. São modos de produção diferentes, com resultados igualmente admiráveis. Se é assim com as telas, por que haveria de ser diferente com os vinhos? Afinal, guardadas todas as proporções, nos dois casos estamos falando de arte…

André Andrès

Há mais de 10 anos escrevo sobre vinhos. Não sou crítico. Sou um repórter. Além do conteúdo da garrafa, me interessa sua história e as histórias existentes em torno dela. Tento trazer para quem me dá o prazer da sua leitura o prazer encontrado nas taças de brancos, tintos e rosés. E acredite: esse prazer é tão inesgotável quanto o tema tratado neste espaço.

Os artigos publicados pelos colunistas são de responsabilidade exclusiva de seus autores e não representam as ideias ou opiniões do ES360.