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O contrato social e o mito da simplicidade: o barato que sai caro

O contrato social é, para uma empresa, o que a certidão de nascimento é para uma pessoa: marca o começo da vida jurídica

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O contrato social registra quem são os sócios, o que a empresa faz, onde funciona, como funciona e quem decide o quê. Foto: Freepik

O contrato social registra quem são os sócios, o que a empresa faz, onde funciona, como funciona e quem decide o quê. Foto: Freepik

O contrato social é, para uma empresa, o que a certidão de nascimento é para uma pessoa: marca o começo da vida jurídica. Ele registra quem são os sócios, o que a empresa faz, onde funciona, como funciona e quem decide o quê. Parece simples, mas não é. E é justamente aí que mora o problema.

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No Brasil, um país onde se abre empresa com uma facilidade surpreendente, a maioria das sociedades limitadas nasce com contratos sociais padronizados, tirados da internet ou prontos no escritório de contabilidade. Modelos genéricos, que resolvem tudo em duas ou três páginas. O motivo? Pressa e economia. Afinal, no início, tudo que o empreendedor quer é abrir logo as portas. Mas esse atalho tem um custo alto, que geralmente aparece quando surgem os primeiros conflitos.

Contratos sociais genéricos até cumprem o básico: registram dados essenciais e atendem às exigências da Junta Comercial. Mas não vão além. Não preveem conflitos, não regulam bem a saída de sócios, não tratam da sucessão e tampouco definem critérios claros para deliberações. É como construir uma casa sem pensar no encanamento ou na estrutura: quando vem o problema, tudo desaba

E os problemas vêm. Um caso muito comum envolve cláusulas mal redigidas que travam a administração da empresa. Um exemplo real: cláusula que exige unanimidade para qualquer alteração no contrato social. Parece inofensivo, mas, em um caso concreto, isso impediu a destituição de um administrador ineficiente, apesar da oposição da maioria dos sócios à sua permanência. Foi necessária a intervenção do Superior Tribunal de Justiça para esclarecer que a destituição possui quórum legal específico. O resultado foi um cenário de desgaste, insegurança e uma crise que poderia ter sido evitada com uma cláusula contratual bem elaborada.

Outro risco dos contratos padrão é a aplicação automática das regras do Código Civil, que muitas vezes não refletem o desejo dos sócios. Por exemplo, se nada for previsto, os sócios respondem solidariamente pela integralização do capital. Em caso de morte, a valoração das quotas segue o balanço patrimonial, que dificilmente traduz o valor real da empresa. Esses detalhes fazem diferença e podem ser ajustados por cláusulas específicas, desde que alguém tenha o cuidado de prever isso desde o início.

A personalização do contrato social não é um capricho jurídico, é uma ferramenta de gestão e segurança. Um contrato bem feito organiza a empresa, protege os sócios, facilita a tomada de decisões e evita litígios. Ele dá previsibilidade, segurança e pode até atrair investidores. É parte da maturidade empresarial.

O ideal é que esse contrato seja elaborado com apoio de um advogado especializado, que compreenda o negócio e proponha cláusulas específicas. Os sócios também precisam participar ativamente, para que o documento reflita seus valores, acordos e expectativas. Quando isso acontece, o contrato deixa de ser um simples papel para se tornar um verdadeiro manual de convivência societária.

Ignorar essa etapa, por pressa ou economia, pode sair caro. Muito caro. No mundo empresarial, o mito da simplicidade do contrato social já custou a sobrevivência de muitas empresas. E, no fim, é sempre a mesma lição: o barato sai caro.

Este texto expressa a opinião do autor e não traduz, necessariamente, a opinião do Instituto Brasileiro de Executivos de Finanças do Espírito Santo.


Gabriel de Souza Schaydegger*Gabriel de Souza Schaydegger é Graduando em Direito na FDV, Estagiário no escritório Alexandre Dalla Bernardina e Advogados Associados, integrante do Comitê IBEF Agro e membro do IBEF Academy.

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O IBEF Academy é o programa de auto formação do IBEF-ES, com foco em gestão, economia, finanças e filosofia. Seu objetivo é contribuir para a evolução do ambiente de negócios no Espírito Santo, qualificando profissionais e fortalecendo o ecossistema econômico e financeiro do estado.

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