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Afinal, o que querem os autores da campanha “Quem é John Galt?”

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O outdoor instalado em Vitória faz referência a um personagem da autora russa Ayn Rand. Foto: Reprodução

O outdoor instalado em Vitória faz referência a um personagem da autora russa Ayn Rand. Foto: Reprodução

Afinal, “quem é John Galt?” Os cartazes com a frase em branco sobre fundo preto se espalharam por Vitória nas últimas semanas e criaram expectativa sobre qual seria a intenção da campanha. Uma nova marca de roupas? Uma rede de lojas se preparando para chegar ao estado? Afinal, quem é John Galt?

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A pergunta permeia um livro chamado A Revolta de Atlas, da autora russa Ayn Rand. A obra é de 1957. A primeira edição brasileira tinha este mesmo nome: “Quem é John Galt?” No início do século passado, Ayn fugiu de seu país logo após a revolução russa. Foi para os Estados Unidos. Defensora ardorosa do capitalismo, desenvolveu uma obra mesclando filosofia e ficção. John Galt é personagem de um futuro indefinido. Nele, o Estado é extremamente opressivo, com regras e regulações severas. A referência ao regime instalado na Rússia em 1917 é clara. Ayn é extrema com o extremismo: para combater o comunismo faz uma defesa radical do capitalismo e do individualismo. John Galt personifica essa ideais. Figura misteriosa, ele busca convencer os mais variados agentes da sociedade a se rebelarem contra o sistema. Seus ideais podem ser resumidos na seguinte frase: “ “o único objetivo do homem é o seu próprio interesse; ninguém deve se sacrificar pelos outros, nem pedir que se sacrifiquem por você; o capitalismo de livre mercado é o sistema econômico ideal”.

O livro tem fãs e defensores ardorosos. Há uma profusão de vídeos no youtube ecoando as ideais do personagem. Elas resumem a teoria da “virtude do egoísmo”, apresentada pela autora russa. “O homem existe para que seu maior propósito moral seja o alcance de sua própria felicidade”, diz Ayn em sua obra.

E qual a relação do personagem com nossos tempos sombrios? John Galt é um personagem admirado por quem defende pensamentos liberais. Alan Greesnpan, presidente do poderoso banco central norte-americano, faz parte dessa lista. Donald Trump também. Aqui no Brasil, João Amoêdo, do Novo, é um dos muitos apreciadores da obra da escritora russa.

E também Roberto Rachewsky, presidente do Instituto Liberdade, uma ONG cujo propósito é “promover a cultura da liberdade no sul do País”. O instituto se inspirou na campanha deflagrada em Vitória e fez o mesmo movimento em Porto Alegre. Aqui, em Vitória, os responsáveis pela instalação dos outdoors preferem o anonimato (no Sul, o Instituto Liberdade assina os cartazes). Segundo Rachewsky, a campanha apoia “todos os indivíduos que criam e produzem valor na sociedade nesse momento dramático em que vivemos, estejam eles desempregados ou impedidos de trabalhar pelo governo”. O objetivo da ONG é “instigar as pessoas a lerem o livro e as obras de Ayn Rand para verem o que acontece com sociedades em que os indivíduos, profissionais liberais, trabalhadores da iniciativa privada em geral e empreendedores verdadeiros são regulados e taxados de forma extrema”.

Não dá para dissociar a campanha do atual momento. A intenção de seus autores é questionar as regras de isolamento social determinadas pelos governos como ferramenta de combate à pandemia. O presidente do Instituto Liberdade é um defensor da tese da imunização por rebanho, ou seja, a pandemia seria combatida a partir da contaminação de um grande número de pessoas, proposta radicalmente oposta ao isolamento social estabelecido na maior parte do país. Ou seja, em último estágio, ao provocar a curiosidade sobre as ideias de John Galt, os autores da campanha estariam tentando estimular ações de rebeldia contra a opressão do estado estabelecida a partir de uma alegada intromissão na individualidade das escolhas dos cidadãos.

A ideia é elaborada. Até demais. E isso não funciona muito em termos de publicidade. Porque boa parte das pessoas vai se deparar com o cartaz, estranhar a pergunta e… continuar sua vida pensando na possibilidade da chegada de uma nova marca de jeans com uma marca de nome curioso: John Galt.

Antonio Carlos Leite

Antonio Carlos tem 32 anos de jornalismo. E um tempo bem maior no acompanhamento das notícias. Já viu muitos acontecimentos espantosos. Mas sempre se sente surpreendido por novos fatos, porque o inesperado é a maior qualidade das coberturas jornalísticas. E também da vida...

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